Por CPT RO
Edição: Comunicação Nacional
Uma liderança do Seringal Belmont sofreu uma tocaia com intento de assassinato na última sexta-feira (01), em Porto Velho (RO). Outra das lideranças do grupo, João Teixeira, já foi assassinado na noite do dia 07 de outubro, após ser ameaçado em relação ao conflito de terras existente no local.
Pelo que é conhecido até o momento, o crime que vitimou João Teixeira de Souza, também conhecido como Mineiro ou João da Van, segue sem conclusão oficial. Nem mandantes, nem autores foram oficialmente identificados ou presos, seguindo o padrão habitual de impunidade dos crimes cometidos contra pequenos agricultores no estado de Rondônia, o que contribui para a que a violência continue no local.
Na última sexta-feira, dois homens armados disparam mais de dez vez em direção a casa onde estava a liderança, um dos antigos posseiros da área que ainda não conseguiu voltar a antiga terra dele. Afortunadamente, ele tinha saído do local um pouco antes. Nas imagens das câmeras de segurança, que filmaram tudo, é possível ver os disparos e o cachorro correndo apavorado. Uma mulher presente conseguiu se esconder e se trancou na casa. Logo que o posseiro chegou, pediu ajuda de um vizinho e chamaram a polícia, que descobriu dez cápsulas de calibre 12 no local onde os agressores dispararam.
A liderança que escapou da tocaia solicitou, há meses, a inclusão no Programa de Defensores de Direitos Humanos. Não é a primeira vez que é perseguido e que teve que fugir do local.
Histórico
Ele é um dos mais antigos posseiro da área, que ocupava desde 2014, com morada, roças, estrada construída pela Prefeitura – agora interditada judicialmente por um fazendeiro – e padrão de energia elétrica instalado. Porém, em 2020, em plena pandemia, junto com todos os seus vizinhos, sofreu uma reintegração de posse ordenada de um dia para outro. Quando conseguiu se defender judicialmente, demostrando com os outros posseiros a antiguidade da posse, a ordem de despejo foi suspensa pela mesma magistrada.
No entanto, quando tentaram voltar ao local, em agosto de 2022, foram atacados de noite por jagunços armados, que tentaram pegar as lideranças do grupo e queimaram criminosamente a única casa que tinha restado em pé. Em vez de receber proteção, de novo foram expulsos policialmente de forma irregular. Acampando no Incra por mais de ano, após conseguir suspender um georreferenciamento irregular da área, as famílias foram na entrada do Parque Natural de Porto Velho, próximo as suas antigas posses.
Em situação de grave vulnerabilidade, os acampados foram apoiados pela CPT-RO e por numerosas entidades sociais. Atendidos pela Defensoria Pública, conseguiram que a mesma magistrada ordenasse o retorno deles. Porém, mesmo reiterada a ordem judicial, a ordem não foi cumprida. Assim deram tempo para um desembargador, de forma surpreendente, suspender liminarmente a ordem dos dois magistrados e impedir o retorno deles ao local.
Mesmo assim, sem mais poder aguardar por moradia e produção de alimentos, a área foi ocupada pelo grupo de antigos posseiros do Seringal Belmont. No TJ /RO tramita processo que analisa a questão possessória, estando no aguardo a publicação do teor do julgamento do último dia 29-10-2024 (AUTOS N. 0811952-51.2023.8.22.0000 AGRAVO INTERNO E AGRAVO DE INSTRUMENTO). Ao mesmo tempo, segue em tramitação na justiça federal – (TRF1 Discriminatória 0007402-11.2008.4.01.4100, perante a 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJRO) que trata da retomada da área para a União por descumprimento do título concedido.
Em março deste ano, a área foi visitada pela Missão em Rondônia da Comissão Nacional de Combate à Violência, presidida pela Ouvidora Agrária Nacional, Cláudia Dadico. Posteriormente, a intervenção do Incra confirmando a natureza pública da terra e o interesse da autarquia pela área, tem levado a esfera da Justiça Federal diversos processos da disputa do local, que pelas proximidades da cidade de Porto Velho, está ambicionado para fins imobiliários.
A resolução do conflito continua pela via dos fatos, provocando este estado de permanente de tensão no local, agravada pelos recentes episódios de violência e barbárie, tristemente costumeiras no estado. Enquanto demora de resolução jurídica do caso, permanece a violência com mancha severa no campo de Rondônia.
Em nota conjunta, entidades pastorais analisam impactos de grandes obras ferroviárias em Mato Grosso e a invisibilização de povos indígenas e comunidades tradicionais em estudos técnicos
Estratégias de destruição: Ferrogrão e outras ferrovias. Foto: ANTT
O Mato Grosso está batendo todos os recordes para se tornar um estado sem Amazônia Legal, sem Cerrado, sem Pantanal, sem água e, logo, sem vida. O rumo tomado busca transformá-lo em um grande deserto de monoculturas que produzem commodities para atender o mercado externo. Parte dos estoques de grãos são transportados por empresas ferroviárias como a Rumo Logísticas até os portos marítimos das regiões sul e sudeste para lá embarcarem em direção ao mercado europeu e chinês.
Para isso, o estado mato-grossense tem feito parcerias públicas-privadas confusas, atualmente tais como a Ferrogrão, a Ferrovia Norte Brasil, a Ferrovia Autorizada de Transporte Olacyr de Moraes (Ferrovia Estadual do Mato Grosso) e a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste. Essas ferrovias estão em diferentes estágios de construção, mais ao sul já estão em operação, mais ao norte em fase de planejamento e entre leste e oeste, sendo construídas.
"É preocupante a falta de análise global e integrada dos impactos socioambientais e violações de direitos humanos desses empreendimentos"
A construção de ferrovias no estado de Mato Grosso envolve uma série de implicações sociais e ambientais, especialmente ao se considerar a vasta extensão de novas linhas ferroviárias previstas, aproximadamente 1.700 quilômetros.
Também é preocupante a falta de análise global e integrada dos impactos socioambientais e violações de direitos humanos desses empreendimentos. Grupos sociais que vivem nos territórios por onde passam estas estradas de ferro estão sendo deixados de lado, sem serem escutados nos processos decisórios de obras de infraestrutura.
Alguns dos principais pontos de preocupação são:
Impacto Ambiental
Impacto Social
Estratégia Isolada e Fragmentada
A abordagem para se discutir esses projetos tem sido feita de forma isolada, na tentativa de se evitar uma maior mobilização e resistência por parte da sociedade civil e grupos ambientalistas. Obras de infraestrutura devem servir para o desenvolvimento de uma região no seu aspecto social, ambiental e econômico. Sem uma visão integrada, os impactos cumulativos de múltiplos projetos podem passar despercebidos, levando a um aumento significativo de riscos sociais e ambientais. Afinal, para quem serve a infraestrutura de logística que está sendo implementada para o estado de Mato Grosso.
O modelo de desenvolvimento adotado pelo estado aponta para um problema recorrente: a ganância humana, desconectada das realidades sociais e ambientais, geram projetos grandiosos e de grande impacto (obras faraônicas), cuja motivação principal é o favorecimento de interesses econômicos, de setores como o do agronegócio, mineração e petroleira. Por que não podemos ter uma infraestrutura que mantenha as florestas e os que lá vivem? Para nós, a infraestrutura é a própria floresta e devemos pensar em projetos que fomentem esta visão antes que seja tarde.
Há um desequilíbrio entre o ganho econômico imediato e os prejuízos a longo prazo, tanto para o meio ambiente quanto para as pessoas afetadas. Em um mundo onde as questões climáticas e de justiça social são cada vez mais urgentes, essa desconexão entre os interesses econômicos e a realidade socioambiental representa um grande desafio, ou melhor, uma catástrofe anunciada. Vide exemplo da usina hidrelétrica de Belo Monte.
"É urgente atualizar os estudos e projetos das ferrovias para incorporar os impactos climáticos e povos indígenas e povos e comunidades tradicionais no processo decisório"
Mapa de ferrovias do estado do Mato Grosso. Crédito: Sinfra
No mês de setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a retomada dos estudos da Ferrogrão, que ligará Sinop (Mato Grosso) ao Porto de Miritituba e Santarém (Pará). Trata-se da ampliação da malha ferroviária até Lucas do Rio Verde. O traçado original do projeto contempla 933 km de extensão, interligando todas as ferrovias do estado de Mato Grosso ao restante do Brasil.
É urgente atualizar os estudos e projetos das ferrovias para incorporar os impactos climáticos, as realidades socioambientais atuais e incluir povos indígenas e povos e comunidades tradicionais no processo decisório durante a fase de licenciamento. No contexto do Mato Grosso e do Brasil, onde os efeitos das mudanças climáticas são cada vez mais evidentes, a desconsideração desse componente nos estudos e nas obras ferroviárias é uma grande falha pois, como já mencionado, são projetos que geram desigualdades nas regiões por onde passam.
A Ferrogrão, assim como outras ferrovias em planejamento, tem sido alvo de críticas não apenas pelo impacto ambiental, mas também pela falta de atenção aos conflitos fundiários e à complexidade social da região. A expansão de ferrovias sem resolver os problemas fundiários e sem incluir um plano robusto de mitigação de impactos climáticos pode agravar ainda mais as tensões sociais e aumentar os danos ambientais. Dentre elas:
Incorporação dos impactos climáticos: A desconsideração de critérios socioambientais nos estudos técnicos é uma omissão crítica. Com a crescente degradação ambiental e as consequências das mudanças climáticas, qualquer projeto de infraestrutura precisa incluir cenários climáticos para evitar maiores desastres ecológicos e sociais.
Conflitos fundiários: As ferrovias não podem avançar sem a resolução adequada dos conflitos de terra, principalmente em estados como Mato Grosso, onde há uma longa história de disputas por terras entre proprietários de terra, comunidades tradicionais e indígenas. Esses conflitos tendem a se intensificar com obras de grande porte se não forem abordados de maneira justa e transparente.
Grandes impactos: Faz-se necessário avaliar os impactos de uma obra em um raio maior que 10 quilômetro, pois muitas vezes eles ultrapassam as previsões técnicas, afetando populações e ecossistemas a grandes distâncias. Isso inclui desmatamento indireto, deslocamento de comunidades e alteração dos ciclos hídricos locais.
Uma análise estratégica e participativa, envolvendo todas as partes interessadas, é essencial para mitigar esses impactos. Isso incluiria a realização de Estudos de Impacto Ambiental (EIA) abrangentes e consultas públicas verdadeiramente representativas intermediadas pelo Estado.
Propomos uma visão que vai além da simples atualização técnica dos projetos: uma conversão para a Ecologia Integral e o reconhecimento dos Direitos da Natureza como base ética para qualquer empreendimento. Esse pensamento, inspirado por princípios ecológicos e de justiça social, reflete a necessidade de uma mudança profunda na forma como concebemos o desenvolvimento econômico e sua relação com o meio ambiente.
A Ecologia Integral, um conceito amplamente difundido por movimentos ambientais e até por encíclicas papais como a Laudato Si’, defende a ideia de que as questões ambientais, sociais, econômicas e culturais estão interconectadas. Quando consideramos os impactos de um projeto de infraestrutura, como uma ferrovia, devemos olhar para o conjunto de relações entre os seres humanos, a sociedade e a natureza. Isso implica pensar não só na eficiência econômica, mas também nos direitos das comunidades locais e na preservação dos ecossistemas.
Terras indígenas próximas ao traçado da Ferrogrão
Terra Indígena | Distância (km) |
TI Praia do Mangue | 4,19 |
TI Praia do Índio | 7,84 |
TI Baú | 29,91 |
TI Sawré Juybu | 30,9 |
TI Sawré Muybu | 31,59 |
TI Panará | 38,98 |
TI Mekragnoti | 47,7 |
TI Andira-Marau | 83,68 |
TI Gleba Iriri | 83,81 |
TI Xipaya | 98,62 |
TI Kuruáya | 100,37 |
TI Escrivão | 103,61 |
TI Batelão | 117,33 |
TI Rio Arraias | 120,99 |
TI Cachoeira Seca | 124,21 |
TI Parque do Xingu | 152,51 |
TI Maraó | 156,9 |
TI Capoto/Jarina, | 164,58 |
TI Munduruku | 169 |
TI Kayabi | 169,23 |
TI Roro-Walu | 169,79 |
TI Manoki | 224,94 |
InfoAmazonia
Direitos da natureza
Respeitar os Direitos da Natureza: Esse conceito sugere que a natureza deve ser tratada como um sujeito de direitos, e não apenas como um recurso a ser explorado. Isso implica que ecossistemas, florestas, rios e a biodiversidade devem ter o direito à preservação e regeneração. Qualquer empreendimento que ameace esses direitos estariam em desacordo com uma ética da ecologia integral.
Planejamento que considere o todo: Não se trata apenas de cumprir exigências ambientais mínimas, mas de pensar em soluções que integrem o desenvolvimento humano e a proteção ambiental. Obras de infraestrutura deveriam ser planejadas com participação dos grupos impactados para minimizar o impacto ambiental, utilizando tecnologias sustentáveis, traçando rotas que causem menores danos e compensando adequadamente qualquer impacto inevitável.
Justiça social e resolução de conflitos fundiários: Reconhecer os direitos das comunidades afetadas, sejam elas tradicionais, indígenas ou rurais, é parte da Ecologia Integral. Um verdadeiro processo de escuta e participação é necessário para garantir que os interesses dessas populações sejam respeitados e que os conflitos fundiários sejam resolvidos de forma justa, evitando o deslocamento forçado ou a marginalização.
Longo prazo: A conversão para uma Ecologia Integral exige um foco em sustentabilidade a longo prazo. Projetos como ferrovias precisam ser pensados para que seus benefícios sejam duradouros e não causem danos irreparáveis ao meio ambiente. Isso significa avaliar seus impactos sobre o clima, a biodiversidade e as populações humanas não só hoje, mas também nas próximas décadas.
Ao incorporar esses princípios, estaríamos avançando para um modelo de desenvolvimento que não apenas gera “riqueza”, mas também garante que essa “riqueza” seja distribuída de forma justa e que o meio ambiente seja protegido para as gerações. Isso é vital em um contexto como o do Brasil, onde a biodiversidade e os bens naturais são fundamentais para nossa existência, mas também são vulneráveis e finitos.
Mato Grosso, 07 de novembro de 2024
Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
Comissão Pastoral da Terra(CPT)
Grupo de Trabalho Infraestrutura e Justiça Socioambiental
Por Campanha Nacional em Defesa do Cerrado
Sobre a terra devastada por monocultivos tóxicos de soja e milho transgênico, indígenas Guarani Kaiowá – mulheres, crianças, homens, jovens e idosos – montam barracas de lona e iniciam mais uma retomada de parte da Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica, em Douradina, Mato Grosso do Sul. Desde 2011, a TI foi identificada e delimitada pela Funai (Fundação Nacional do Índio) em 12 mil hectares, mas a demarcação foi barrada por ações judiciais, em um estado que protagoniza escândalos na venda de sentenças judiciais.
Na retomada Yvy Ajhere, lideranças Guarani Kaiowá recebem jornalistas para uma conversa sobre a luta por terra e território. Crédito: Rebeca Bastos - Ascom AATR
Falta tudo na retomada: água potável, alimento, remédios, cuidado médico para quem precisa, falta segurança – jagunços a serviço de fazendeiros rondam dia e noite o local. Sobra a violência do Estado, que se faz presente pela ausência, no total desamparo ao povo que, desde 1500, tenta recuperar seus territórios invadidos e saqueados por Europeus e, agora, por fazendeiros do agronegócio que exportam grãos à China e países da Europa.
É por causa dessa ausência estatal, ancorada no racismo histórico e colonial que estrutura a sociedade brasileira, que os Guarani Kaiowá, segundo maior povo indígena do Brasil, com mais de 64 mil habitantes no Mato Grosso do Sul, entendem que nenhuma demarcação de suas terras será feita, mesmo sendo lei, e que a única forma de estar em seu tekoha (lugar em que se é, na língua guarani) é por meio das retomadas. A demarcação tem sido feita pelos próprios indígenas, com seus pés, rezas e cânticos.
Barracas de lona da retomada são instaladas sobre os campos de soja e milho de fazendas do agronegócio exportador. Falta água e comida nas retomadas, e o solo está contaminado com agrotóxicos. Crédito: Tales Damascena - Kalunga Comunicações
Ao todo, o povo Guarani Kaiowá demanda como suas terras ancestrais 700 mil hectares em todo o Mato Grosso do Sul, cerca de 2% da área do estado, que tem 35 milhões de hectares. No entanto, há décadas eles têm sido obrigados a viver em reservas diminutas, que confinam milhares de pessoas em espaços insuficientes para a manutenção de seus modos de vida.
As mais recentes retomadas aconteceram em julho desse ano, na Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica, em Douradina. Ao todo existem, hoje, sete retomadas nessa TI. Os ataques de fazendeiros, jagunços e policiais militares aos indígenas em seus territórios reocupados são virulentos. Atropelamentos, tiros com armas de fogo e bala de borracha, espancamentos, perseguição, tortura, tentativas de assassinato. São inúmeros os relatos de violência contra as pessoas acampadas noticiados pela imprensa.
A Força Nacional foi enviada em julho pelo governo federal para garantir alguma segurança aos indígenas diante do aumento da violência de ruralistas contra eles. Ainda assim, houve denúncias de que policiais da Força Nacional estavam interagindo amistosamente com jagunços que cercavam as retomadas para atacar os Guarani Kaiowá. Em agosto, as equipes da Força se retiraram de uma das regiões sem prévio aviso – mesmo com a tensão instalada –, deixando o caminho livre para novos ataques. Jagunços fortemente armados avançaram contra os Guarani Kaiowá, atirando com armas de fogo e balas de borracha; 10 indígenas foram feridos.
Reunião do povo Guarani Kawioá com jornalistas na retomada Yvy Ajhere, na Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica, na zona rural de Douradina, Mato Grosso do Sul. Crédito: Tales Damascena - Kalunga Comunicações
Um deles, um jovem de 20 anos, levou um tiro na cabeça, e até hoje segue com a bala alojada no crânio. O atendimento inicial recebido por ele no hospital público de Dourados, capital do Mato Grosso do Sul, a 40km do local do ataque, foi marcado por mais violência. "O jovem contou que ouviu de um policial militar, que estava no hospital, que o tiro deveria ter sido para matar. 'Ele disse que o tiro foi errado. Que deveria ter atingido no meio do peito. ‘Que assim matava logo o vagabundo'", afirma reportagem sobre o caso.
No Mato Grosso do Sul, estado dominado por monocultivos de grãos do agronegócio exportador, a sanha contra os povos originários é histórica. Há pelo menos 20 anos, a violência que se vê hoje contra as retomadas da Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica já se enraizava no estado, degenerando em expulsões, torturas, sequestros, assassinatos e massacres. Em 2016, o Conselho Aty Guasu Guarani Kaiowá e entidades apoiadoras da causa indígena, protocolou junto à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) uma denúncia contra o Estado brasileiro "por violações aos direitos previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos, no Protocolo de San Salvador e na Convenção de Belém do Pará".
Lideranças indígenas falaram a jornalistas sobre sua espiritualidade e sobre a força das nhandesi e nhanderu para a permanência no território. Crédito: Júlia Barbosa - CPT Nacional
Atualmente, a instabilidade jurídica das demarcações e a violência de ruralistas e latifundiários contra os povos indígenas em todo o Brasil, e em especial no Mato Grosso do Sul, se intensificou com a lei do marco temporal, aprovada pelo Congresso em outubro de 2023, determinando que os indígenas somente têm direito à demarcação das terras que estavam ocupadas por eles na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.
Um mês antes da aprovação da lei pelo Congresso, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a tese do marco temporal. Agora, porém, além da lei – inconstitucional – já aprovada, está em discussão o Projeto de Emenda à Constituição (PEC) número 48, que pretende incluir na carta magna a tese do marco temporal.
Visita de jornalistas e comunicadoras populares
Diante de todo este cenário de violência colonial, especialmente em territórios ocupados pelos Guarani Kaiowá no Cerrado sul-matogrossense, a Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais da Bahia (AATR), a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE) e a Articulação Agro é Fogo, em parceria com entidades e movimentos da sociedade civil que trabalham na defesa do Cerrado e dos povos e comunidades tradicionais que o coabitam, realizaram em Dourados, entre os dias 13 e 16 de outubro, o “I Encontro de Comunicadoras/es Populares e Jornalistas: o Cerrado e seus Povos”.
O encontro reuniu 20 jornalistas do sul, sudeste e centro-oeste do país, além de comunicadoras e comunicadores populares quilombolas, indígenas e de comunidades tradicionais de diferentes territórios do Cerrado, com o objetivo de ampliar a difusão das informações sobre este bioma, seus povos e comunidades, e os desafios na defesa dessa região ecológica.
Encontro entre indígenas Guarani Kaiowá e jornalistas aconteceu em outubro, e contou com a presença de profissionais do sul, sudeste e centro-oeste do país. Crédito: Rebeca Bastos - Ascom AATR
De modo especial, o encontro propiciou às pessoas participantes um contato mais próximo com a luta dos Guarani Kaiowá por meio de visitas às retomadas Laranjeira Nhanderu II, na Terra Indígena Brilhantepeguá, no município de Rio Brilhante, e à retomada Yvy Ajhere, na Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica, em Douradina, tendo no horizonte possibilidades de denúncia sobre as violações sofridas, considerando que as dinâmicas que se desenham nesta localidade têm se configurado como modelo a ser projetado para todo o Cerrado.
Jornalistas e comunicadoras foram recebidas com cantos e danças rituais e puderam ouvir, por horas, relatos em primeira pessoa das violências sofridas, perpetradas ao longo de décadas pelo estado brasileiro e latifundiários, mas também estratégias de resistência baseadas na força espiritual das nhandesy e nhanderu – rezadoras e rezadores –, no respeito à ancestralidade, na coletividade e na soberania alimentar ancorada nos modos de vida tradicionais. Na retomada Laranjeira Nhanderu II, a produção agroecológica dos Guarani Kaiowá é escoada para instituições de ensino locais, por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que é federal.
As visitantes foram estimuladas pelas lideranças a fazer denúncias, mas também anúncios sobre as conquistas do povo, como o destaque de jovens Guarani Kaiowá que se dedicam aos esportes e participam de competições oficiais, o ingresso em universidades, a formação de mestras e doutoras indígenas na academia, a manutenção da cultura, a força da sabedoria de anciãs e anciãos, o protagonismo das mulheres Guarani Kaiowá nas lutas e a força ancestral do povo e sua disposição em retomar e permanecer em seu tekoha.
Primeiro dia do Encontro de Povos e Comunidades do Cerrado se inicia com o tema “Água” e é finalizado com Troca de Sementes
Na primeira manhã do encontro “Das Re-existências brota a vida”, mais de 200 pessoas de comunidades e povos de todos os estados do bioma Cerrado compartilharam seus processos de resistência diante das ameaças às águas de seus territórios.
Na mística de abertura, Maria Roxa, pajé do povo Akroá Gamela, abençoou todos os participantes do encontro com rezas e encantamentos, juntamente com outros indígenas presentes. Na atividade seguinte, a Grande Roda “Cerrado: Berço das Águas”, a anciã compartilhou relatos sobre a luta de seu povo, juntamente com Isidora Oliveira, do Povoado de Caruaru (Bahia), e Miguelina de Oliveira, da Comunidade São Manoel do Pari (Mato Grosso).
Dona Maria Roxa narrou a destruição promovida por grileiros que tentaram se apropriar de suas terras. “Nosso território foi devastado e tomado. Derrubaram os juçarais, os cocais, aterraram os igarapés. Era tudo na cerca elétrica, não tínhamos mais licença para ir buscar o nosso sustento nos campos”.
Com organização, o povo Akroá Gamela conseguiu retomar o território. “Depois que retomamos o que era nosso por direito, os nossos encantados ficaram alegres. O rio já retornou a ser o que era. Eles devastaram tudo e o que nós estamos fazendo é replantando para tirar o sustento de nossos filhos, netos e bisnetos”, relatou.
Um grito pelas comunidades e pelas águas de todo o Cerrado
Em 2017, uma jovem de Correntina, em um protesto contra a apropriação das águas da região pelo agronegócio, gritou diante da polícia, que reprimia o movimento popular: “Ninguém vai morrer de sede às margens do Rio Arrojado!”
A frase foi ecoada por todos os presentes e se tornou um grito de resistência das comunidades do oeste da Bahia, que vivenciam a progressiva morte de seus rios, riachos e nascentes por conta da construção de estruturas gigantescas de desvio e drenagem de leitos e extração de água do subsolo para irrigação da monocultura.
A história foi compartilhada por Isidora Gonçalves, que apresentou ao encontro o Mapeamento das Águas Mortas do Oeste da Bahia, resultado da cartografia social iniciada junto às comunidades da região em 2018. “São 7 mil quilômetros de águas mortas e 3 mil quilômetros de águas em estado crítico no oeste baiano. Isso mostra o impacto dos pivôs centrais e piscinões implantados pelo agronegócio”, denunciou Isidora, que incentiva todas as comunidades a fazerem o mapeamento de suas águas.
Miguelina de Oliveira, da comunidade São Manoel do Pari, no Mato Grosso, disse: “Eu sinto uma dor no coração de falar do Cerrado e das nossas águas, do jeito que está. No Mato Grosso, para nós que somos camponeses, da agricultura familiar, é muito dolorosa a situação, por causa do agronegócio. A gente tem resistido à seca, à falta de água, e é só por Deus, porque os ‘grandes’ de lá só pensam neles mesmos. O rico, quanto mais tem, mais quer. E não importa que vende a alma para o diabo. Eles vão devastando, desmatando e cavoucando, porque lá também tem ainda a mineração. Os garimpos também estão chegando para dentro das cidades e dos territórios”, narrou Miguelina.
Miguelina destaca ações coletivas que têm contribuído para a recuperação de áreas nas comunidades. “Os conhecimentos populares têm nos alimentado. O reflorestamento das nascentes tem como nosso patriarca o Baltazar, que tem sido um pioneiro e incentivador. As comunidades estão aprendendo isso. Eu tenho um pensamento assim: se o Cerrado acabar, nós também morremos. O Cerrado vive dentro da gente, a gente vive no Cerrado. Ele traz para nós toda a vida, toda a água.”
Isolete Vischinieski, da Articulação das CPTs do Cerrado, fez a síntese da roda, falando sobre a importância das águas do Cerrado para as principais bacias hidrográficas do Brasil, do Uruguai e do Paraguai. “O que nos une no Cerrado são os veios das águas. É o sangue que corre no Cerrado, que nos mantém vivos. Somos povos bonitos, que sustentam este Cerrado em pé. Onde há mata? Onde há comunidade. Nós, que estamos caminhando juntos, somos os verdadeiros guardiões destes territórios. O Cerrado interliga nosso Brasil e tem relação com todos os outros biomas, e por isso ele é tão diverso e importante. Estamos falando que o Cerrado é vida”, disse Isolete.
Isolete fez um apanhado histórico dos grandes projetos de desenvolvimento implantados pelo Estado brasileiro, que, ao longo de nossa história, não trataram este bioma com a devida importância e cuidado, promovendo sua devastação. Primeiramente, a Revolução Verde e o projeto nacional de expansão da agropecuária, que avançou sobre os territórios de Minas, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Depois, o projeto Matopiba, juntamente com os grandes projetos de hidrelétricas e mineração. “Esse território que é vida vai se tornando um território de resistência, de projetos que querem nos matar, e nós dizemos: não – não vamos morrer. Se o Cerrado morrer, nós também morremos”, arrematou Isolete.
A manhã foi finalizada com a Fila do Povo, onde a fala foi aberta a todos os participantes que quiseram relatar a situação das águas de seus territórios, compartilhando conflitos vividos, ações de preservação e cuidado, e experiências de resistência e enfrentamento do agronegócio.
No período da tarde, o grande grupo se dividiu para as oficinas formativas com os seguintes temas: Mulheres e geração de renda; Juventudes e defesa dos territórios; Autocuidado, cuidado coletivo e segurança; Comunicação popular; Incêndios e Protocolo de Segurança. Ao final do dia, as discussões de cada grupo foram partilhadas com todo o coletivo.
À noite, foi realizada a Troca de Sementes e a Feira de Produtos das Comunidades, onde, com alegria e orgulho, mulheres e homens apresentaram os resultados de seus trabalhos junto à terra. Nas comunidades, as sementes crioulas representam a ancestralidade, a resistência na terra e a tradição de partilha, como também defendem a possibilidade de um futuro fraterno, com soberania alimentar e popular. "Nós somos o Cerrado. No dia que o Cerrado acabar, nós também morremos. O Cerrado precisa ficar em pé. Nós precisamos preservar essa troca de sementes e de experiências para preservar o Cerrado", expressou Miguelina.
Fonte: BRASÍLIA (Reuters)/ Foto: Reuters
Representantes de movimentos, comunidades tradicionais e entidades que integram a Articulação Agro é Fogo estarão no Mato Grosso do Sul entre os dias 12 e 13 de novembro de 2024 para denunciar e sensibilizar a sociedade sobre a problemática dos incêndios criminosos que ocorrem no Pantanal.
O bioma foi o que mais sofreu com os incêndios em quatro décadas, atingindo quase 60% do bioma, e a ação humana segue como a principal causa, de acordo com o estudo do MapBiomas.
As ações objetivam chamar a atenção do poder público e da sociedade civil para o agravamento progressivo das queimadas criminosas no Pantanal, a formulação de estratégias coletivas para a prevenção e o enfrentamento ao processo de devastação, bem como, denunciar os impacto que as cicatrizes do fogo deixam nas comunidades tradicionais e nos territórios indígenas.
A agenda de ações contempla a realização do Seminário “Ecoando as vozes do Pantanal na defesa dos territórios de vida e da sociobiodiversidade”, que ocorrerá no dia 12 de novembro (Dia do Pantanal); e de uma Audiência Pública intitulada “O impacto dos incêndios nos modos de vida, saúde, segurança alimentar e renda das comunidades tradicionais pantaneiras”, agendada para o dia 13 de novembro.
As atividades ocorrerão no município de Corumbá (MS) e contará com a participação de representantes de povos originários e comunidades tradicionais do Pantanal, pesquisadoras e pesquisadores, e organizações sociais que compõem a Articulação Agro é Fogo. Nesse período, a Articulação também lançará uma campanha nacional de combate a devastação do Pantanal.
Considerada a área mais alagada do mundo, sua destruição significa impactos à vida dos povos e comunidades tradicionais pantaneiros, a morte da sociobiodiversidade e dos recursos naturais da região. Fatores que se intensificaram com a seca prolongada e as queimadas criminosas, o que acelera as mudanças e desequilíbrio climático na região. De acordo com o Monitor do Fogo, no Pantanal, a área queimada entre janeiro e setembro de 2024 aumentou 2.306% em comparação à média dos cinco anos anteriores. Foram queimados 1,5 milhão de hectares nos primeiros nove meses do ano.
Segundo o Dossiê da Articulação Agro é Fogo, o avanço da agropecuária no Pantanal, junto a ações políticas do Estado e ausência de políticas públicas efetivas de combate e fiscalização dos incêndios, vêm, por anos, acionando o contexto atual. Desde 2020, os incêndios têm atingido áreas no entorno do Rio Paraguai, que antes eram permanentemente alagadas, mas depois de 2019 apresentam períodos de seca que deixam a região suscetível ao fogo como foi registrado nos incêndios recentes.
Em comparação ao mesmo período em 2023, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE Queimadas), houve um aumento, esse ano, de 716% nos focos de calor no Pantanal. Foi o bioma que mais queimou em comparação aos outros. E, considerando que se trata do menor bioma do Brasil, a situação de devastação é acelerada. Corumbá, que é o maior município do bioma, foi onde 72% da área queimada foi afetada duas ou mais vezes, e também foi onde mais se perdeu a superfície de água em 2024, em comparação a 2021.
Conforme nota técnica do Mapbiomas, o Pantanal foi o bioma que mais secou ao longo da série histórica. Em 2023, o bioma apresentou uma superfície de água anual de 381 mil hectares, o que representa uma redução de 61% em relação à média histórica. Comparado a 2018, o ano da última grande cheia do bioma, a superfície de água em 2023 foi 50% menor. O período de seca antecedeu o atual cenário de incêndios em 2024.
Os eventos ocorrerão no Instituto Federal de Mato Grosso do Sul (IFMS), campus Corumbá, e terá a presença de povos e comunidades tradicionais pantaneiras, jornalistas e autoridades locais. A atividade é aberta ao público.
A Articulação Agro é Fogo reúne mais de 50 movimentos, organizações e pastorais sociais que atuam há décadas na defesa da Amazônia, Cerrado e Pantanal e seus povos e comunidades. Surgiu como reação aos incêndios florestais e queimadas criminosas que assolaram o Brasil em 2019 e 2020 e, desde então, denuncia que, no caso dos incêndios, o fogo está ligado à cadeia do agronegócio, à grilagem e ao desmatamento. Além disso, traz o anúncio de povos e comunidades tradicionais que resistem em seus territórios e que utilizam o fogo como prevenção dos incêndios e gerador de vida, com cuidado e respeito.
Serviço:
Articulação Agro é Fogo promove incidência política sobre o processo de devastação no Pantanal
Seminário “Ecoando as vozes do pantanal na defesa dos territórios de vida e da sociobiodiversidade”
Data e horário: 12/11, 8h às 17h (MS) | Local: IFMS - Rua Pedro de Medeiros, 941, Bairro Popular Velha – Corumbá/MS
Audiência Pública - O impacto dos incêndios nos modos de vida, saúde, segurança alimentar e renda das comunidades tradicionais pantaneiras.
Data e horário: 13/11, 8h às 12h (MS) | Local: IFMS - Rua Pedro de Medeiros, 941, Bairro Popular Velha – Corumbá/MS
Atendimento Imprensa:
Ludmila Almeida - 62 986005595
Bruno Santiago - 11 99985 0378
Instagram: @agroefogo
Site: https://agroefogo.org.br/
E-mail: agroefogo@gmail.com
O encontro contou com momentos de mística, memória das mulheres que fizeram e fazem parte da história da CPT, partilha de experiências, cuidado coletivo e oficina de Arpillaria
Por Heloisa Sousa | CPT Nacional
Foto: Heloisa Sousa
Entre os dias 21 e 24 de outubro, o Coletivo de Mulheres da Comissão Pastoral da Terra (CPT) reuniu cerca de 37 agentes e coordenadoras da Pastoral em uma atividade no município de Hidrolândia, Goiás. Na noite de chegada, foi realizada uma dinâmica de acolhimento e cuidado coletivo.
No dia 22, as participantes da atividade puderam rememorar a trajetória dos 50 anos da CPT, trazendo a história e olhar das mulheres na luta por terra e território. Pela manhã, agentes de várias regionais que fizeram parte dos primeiros anos dessa caminhada fizeram relatos de suas experiências. Pompéa Bernasconi, agente histórica da CPT, contou sobre a formação da Pastoral e a luta à luz do evangelho contra a repressão na época. Em seguida, Ivaneide Minozzo, falou sobre as lutas no Mato Grosso do Sul, onde ela é agente, nesses primeiros anos de CPT.
"Se o povo soubesse a força que tem, ninguém os dominaria” - Pompéa Bernasconi
Marina Rocha (CPT Bahia), Sônia Martins (CPT Rio de Janeiro) e Antônia Calixto (CPT Maranhão), por meio de vídeo, trouxeram seus depoimentos sobre a atuação, desafios enfrentados pela CPT e também por elas e a presença marcante das mulheres na caminhada, a exemplo de Irmã Dorothy Stang.
“A gente está indo para 50 anos, para o Congresso da CPT, e é impossível pensar os 50 anos da CPT sem revisitar a história das mulheres. Sejam as mulheres agentes da CPT ou as mulheres que estão longe, no processo de ocupar a terra, que resistem e que estão reconstruindo um novo jeito de ser, de saber e de fazer a CPT aqui e no Brasil”, destacou Sônia, que também apresentou sua perspectiva enquanto mulher negra na luta por terra no Rio de Janeiro.
Falou também Isabel Diniz, coordenadora da CPT Paraná, que foi a primeira mulher coordenadora nacional da CPT, no final da década de 90. Nesse período, ocorreu a reestruturação da instituição, das linhas de ação da Pastoral – que inclui o eixo temático das águas – e a realização do I Congresso da CPT, em 2001, que contou com forte presença das trabalhadoras e trabalhadores do campo e das florestas.
“A gente não pode cantar ‘pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer’ e ter medo de realmente fazer isso.” - Maria Mendonça, coordenadora CPT Roraima
Dando continuidade, Amélia Romano, secretária executiva do Centro de Estudos Bíblicos do Mato Grosso do Sul (Cebi MS), trouxe a reflexão sobre a prática da CPT a partir da palavra de Deus e a presença da mulher no evangelho. “Precisamos fazer a leitura da Bíblia com os pés no chão da realidade, porque só assim vamos entender onde as mulheres estão na Bíblia”.
Bordando direitos
Ainda no dia 22, na parte da tarde, Elisa Estronioli, integrante da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), apresentou o contexto histórico em que surge a arte das “Arpilleras”, prática chilena em que mulheres bordavam mensagens de resistência no tecido da juta. A prática, que funciona como ferramenta de organização e denúncia, é hoje muito utilizada pelas mulheres no MAB, que inspiraram as companheiras no encontro a contar suas próprias histórias por meio da arpillaria.
A partir da explicação de Elisa, as participantes se dividiram em grupos para partilhar sobre quem são, de onde vêm, suas trajetórias, desafios e realizações dentro da CPT. O momento, que se dividiu entre os dias 22 e 23, foi de aproximação e inspiração para que os grupos pudessem elaborar seus próprios bordados.
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A oficina também contou com a escrita das cartas que acompanharam os bordados, onde questões como ancestralidade, acolhimento entre as mulheres, assédios, machismo, a construção de espaços seguros dentro dos movimentos e pastorais e a esperança de um futuro mais acolhedor foram levantadas. Além disso, a criação e fortalecimento dos espaços para contar as histórias femininas nas lutas, reafirmando as memórias das mulheres da CPT, foram reivindicados. “É preciso rasgar caminhos e romper as ideias de dominação”, destacou uma das participantes.
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As cartas e artes produzidas durante o encontro serão publicadas nas redes da CPT Nacional. Fique de olho!
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Massacres no campo
#TelesPiresResiste | O capital francês está diretamente ligado ao desrespeito ao meio ambiente e à vida dos povos na Amazônia. A Bacia do Rio Teles Pires agoniza por conta da construção e do funcionamento de uma série de Hidrelétricas que passam por cima de leis ambientais brasileiras e dos direitos e da dignidade das comunidades locais.