Publicado no site do Movimento Munduruku
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Quarta-feira, 26 de março de 2025 nós guerreiros e guerreiras Munduruku do alto e médio Tapajós fechamos a dois dias a BR 163 km 25 em Itaituba, localizada sobre a ponte Igarapé Itapacurazinho, manifestando que SOMOS CONTRA o Marco Temporal e a Mesa de conciliação comandada pelo anti-indígena Gilmar Mendes que quer negociar nossos direitos já garantidos na Constituição. Ficaremos aqui até o final da votação!
Revoguem a lei 14.701 JÁ!
Nossos Guerreiros e Guerreiras se reuniram para barrar a BR 163, utilizando pneus e madeiras para interditar a via, em protesto, para dialogar com a população e chamar a atenção do poder público, sobre nosso território, nós decidimos! Nosso protesto é legítimo e deve ser respeitado!
Neste primeiro momento que estamos nos manifestando de forma pacífica, sofremos agressões físicas, xingamentos, nossos materiais foram quebrados. O racismo e o discurso de ódio dos caminhoneiros que transportam soja para os portos do agronegócio em Miritituba tem se intensificado a cada momento. Na noite do dia 25 em respeito a decisão judicial, nós liberamos a pista, e os caminhoneiros mesmo assim jogaram pedras e atacaram um de nossos guerreiros. Respeitamos o direito de todos e a via ficou aberta toda a noite, mas nosso direito de manifestação não está sendo garantido e nem a nossa segurança. Pedimos providencias dos órgãos urgentemente para garantir nossa segurança, pedimos que eles estejam aqui conosco para garantir nosso direito de manifestação. Quem será responsável se algo acontecer com nossa comitiva, será o estado, que protege sojeiros e garimpeiros que estão invadindo nosso território.
Nosso Movimento Munduruku de resistência reivindica os direitos do povo. Os ruralistas do Congresso e Senado, querem acabar com os nossos direitos e com nosso território e principalmente com as vidas indígenas, e agora o STF através do Ministro Gilmar Mendes quer rasgar a nossa Constituição e negociar nossos direitos. O governo precisa também se manifestar e proteger nossos direitos, principalmente o de sermos consultados, conforme a convenção 169 da OIT e a nossa própria Constituição. Estamos ocupando e fechando a BR 163, para que o STF respeite a nossa Constituição, acabe com essa Mesa de Conciliação e revogue de vez a Lei 14.701/23 do marco temporal que inclusive já foi decidida por essa Suprema Corte que ela seria inconstitucional. Nem o governo, congresso ou STF podem decidir sobre nossas vidas e nossos territórios, sem antes nos consultar.
Então, neste momento, estamos enviando as nossas mensagens direto ao congresso nacional e ao STF em Brasília. Para que o Ministro Gilmar Mendes possa respeitar nossa história e acabar com essa conciliação dentro do STF. Vamos continuar lutando pelos direitos dos povos indígenas de todo Brasil. Nós lutamos pelos direitos de nossas crianças, jovens e idosos.
Queremos o fim da mesa de conciliação do STF comandada pelo ministro Gilmar Mendes!
Queremos a revogação da Lei do Marco Temporal 14.701/23.
Sawe
25.03.2025: Bloqueio de rodovia no Pará: povo Munduruku em luta contra a lei 14.701/2023
por Vívian Marler / Assessora de Comunicação do Regional Norte 2 da CNBB
O Regional Norte 2, em Belém (PA), recebeu nos últimos dois dias (25 e 26), o primeiro dos cinco encontros regionais preparatório para a COP30, o ‘PRE-COP NORTE’ do Projeto ‘Igreja Rumo à COP 30’, realizado pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, que através de formações voltadas para lideranças da Igreja, promoveu um entendimento mais profundo sobre as mudanças climáticas e suas consequências. Participaram mais de 50 representantes dos Regionais Norte 1 (AM/RR), Norte 2 (PA/AP), Norte 3 (TO), Noroeste (AC/RO), Nordeste 5 (MA) e Oeste 2 (MT).
No primeiro painel ‘A Igreja e seu papel histórico de profetismo diante da crise socioambiental’, Dom Erwin Kräutler, bispo Emérito da Prelazia do Xingu (PA). “Estamos aqui reunidos para nos preparar para a COP 30, que é tão importante para nós como Igreja, porque nós acreditamos que Deus nos colocou neste lado, porque lá para nós é a Amazônia e temos uma grande responsabilidade na Amazônia e das futuras gerações. A nossa Igreja tem algo para dizer e temos que nos abrir exatamente para essa nova visão. Na visão bíblica, Amazônia não é para o lucro. A Amazônia é para viver e para sobreviver. De modo especial, conheçamos os povos originários e vivam na nossa Igreja, que é a Amazônia. A área aqui também é a sua visão da vida. E neste século os homens vivem também pensando na sobrevivência dos seus filhos, de seus netos. Que Deus nos ajude”, clamou o bispo emérito do Xingu.
O professor Mário Tito comandou o segundo painel com o tema ‘Conferências do Clima em tempos de crise: contexto geral e temas centrais’, onde falou sobre as conferências ambientais até chegar na COP fazendo reflexões sobre os principais pontos, desde o que é a governança global, que é a questão ambiental, o que atravessa as fronteiras dos países até reunir todos aqueles que estão de alguma forma envolvidos no problema, para tomar decisões que sejam ajustadas a interesses. Relembrando as Conferências ambientais desde 72 e Estocolmo, passando pela ECO 92 no Rio de Janeiro, dentre outras, falou, ainda, sobre o Desenvolvimento Sustentável, que foi a grande ideia dessas conferências, assim como a necessidade de os países serem mais assertivos.
“Há a necessidade de os países serem mais assertivos, mais claros na tomada de decisões deles, ou seja, comprometimentos com metas bem concretas e bem definidas. Porque é nessa perspectiva que surgem as COP. Na verdade, a conferência das partes daqueles que assinam um tratado, é um documento entre os Estados nacionais para tomada de decisões. Então, são esses membros, os Estados Partes. Eles realizam a COP anualmente, e nós estamos na COP 30 esse ano”, explicou Mário Tito.
Durante a tarde de ontem foi trabalhado junto com os presentes os ‘Eixos Temáticos da Conferência do Clima’ que foram debatidos por eixo temático como desmatamento zero, convergência entre clima e biodiversidade, transição ecológica e energética para uma economia de baixo carbono e financiamento.
Representantes do Regional Norte 1 (Amazonas e Roraima) no Pré-COP Norte
A professora Ima Vieira, pesquisadora do Museu Emilio Goeldi, revelou uma transformação profunda e preocupante do maior bioma tropical do planeta durante o terceiro painel ‘Crise climática e eventos extremos no bioma amazônico e área litorânea da macrorregião Norte’, e fez uma panorâmica sobre a crise ambiental que a Amazônia enfrenta há mais de três décadas após a Cúpula da Terra no Rio de Janeiro em 1992.
“As mudanças climáticas têm provocado alterações dramáticas na região com o aumento de temperatura que amplificam significativamente o risco de incêndios e provocam impactos devastadores na região. Os eventos de secas críticas têm sido particularmente impactantes e vivida pela Amazônia em 2005, 2010, 2015-16 e mais recentemente em 2023-24, especialmente durante os anos de El Niño. As consequências são profundas, os rios com níveis drasticamente reduzidos, mortandade em massa de peixes, isolamento de comunidades ribeirinhas e interrupção da navegação fluvial.
As transformações ultrapassam os limites ambientais, atingindo dimensões sociais e econômicas. A região tem experimentado um aumento da ilegalidade, elevação no número de assassinatos rurais e mudanças significativas nas práticas de agricultura familiar. A produtividade agrícola está em declínio, com previsões cada vez mais pessimistas para o futuro. Lembrando, ainda, que a Amazônia perdeu 12% de sua superfície hídrica, com 20% das 11.216 microbacias apresentando impactos de alto a extremo”, alertou a pesquisadora que aponta ações urgentes para que ações sejam tomadas.
“A Igreja tem papel importante e o Papa Francisco prega que as soluções passam pela Ecologia Integral. O tempo para agir está se esgotando. A Amazônia não é apenas um problema regional, mas uma questão global que demanda atenção, compromisso e ação imediata de toda a comunidade internacional. A COP30, surge como uma oportunidade para discutir e implementar estratégias de fortalecimento das comunidades locais para enfrentamento da crise climática”, inteirou Ima.
Divididos por grupos os participantes, ao final do dia, debateram sobre o ‘Documento de Base e Subsídio para a Incidência Política da Igreja na COP 30 – Um chamado à conversão ecológica, formação e resistência às falsas soluções climáticas’ que exige, de todos, uma postura profética, que denuncie falsas soluções climáticas e anuncie a esperança de uma nova sociedade, baseada na justiça, na fraternidade universal com todas as criaturas e no cuidado com a Casa Comum, refletindo a esperança de que a COP 30 seja um marco de resistência e transformação, guiada pela força das comunidades e pela visão de uma igreja em saída, comprometida com a justiça socioambiental e a dignidade de todos os seres.
Francisco Meireles, presidente do Conselho Nacional do Laicato no Brasil no Regional Norte 1 – CNLB N1 e membro do Conselho do Regional Norte 1 no Amazonas e Roraima, acredita ser importante a participação de todos os meios e agentes sociais dentro da Igreja para refletir sobre a PRÉ-COP “a importância da PRÉ-COP para o Norte é ter a participação de todos os meios e agentes sociais envolvidos dentro da nossa Igreja Católica, para que possamos refletir e trazer realmente as pautas que são de suma importância para essa mudança climática que está acontecendo nos últimos anos principalmente aqui no Brasil, na Amazônia. Que seja realmente frutuosa e que leve as nossas bases, as nossas comunidades, paróquias e áreas missionárias, a reflexão de um processo de mudança de atitude, de hábito de cada pessoa”.
A Igreja do Norte do Brasil, reunida em Belém, coloca-se como porta-voz para ajudar os chefes de Estado a conhecerem a realidade da região, como coloca Dom Francisco Lima Soares, bispo da Diocese de Carolina no Maranhão “a importância da PRÉ-COP Norte para todas as populações, de modo especial as ribeirinhas, é porque o grande acontecimento da COP 30 vem pelos seus chefes de Estados. Eles que tomam as decisões. Mas a Igreja se reúne para propor e para lembrar que existem dificuldades nos povos ribeirinhos e nos povos da floresta, nas cidades, nas periferias das cidades e mostra que as mudanças climáticas estão corroborando para isso. Então, é importante que a Igreja tenha uma palavra no momento da COP 30. Por isso o Norte, se reunindo aqui em Belém, começa a fazer esse olhar que às vezes os chefes de Estados não veem que existe”.
Indígena, pescador, quilombola e agricultor estiveram reunidos em uma Mesa Redonda que debateu sobre as experiências nos territórios e maretórios, que deu voz a Eduardo Soares, Secretário da Articulação Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM para a COP 30, sobre a ‘Cúpula dos Povos’, que falou sobre a mobilização dos povos pela terra e pelo clima da articulação da reforma “a realização da COP 30 vem fazendo tanto nos territórios humanitários como na articulação com os movimentos populares, um fortalecimento do debate sobre a justiça climática, sobre as questões socioambientais, e a REPAM tem realizado atividades feitas pela articulação ou apoiadas nos territórios, como as perspectivas em relação às convergências que a gente tem feito junto com os territórios humanitários, mas também com os movimentos no sentido de fortalecer a essa articulação com a COP 30”, contou Eduardo Soares.
O encontro finalizou com uma Celebração Eucarística onde foi entregue um “Guia para multiplicação” e envio dos multiplicadores, sob a presidência de Dom Joaquim Hudson de Souza Ribeiro, bispo auxiliar da Arquidiocese de Manaus, pertencente ao Regional Norte 1.
“O PRÉ-COP NORTE foi muito rico em suas colocações, alertas e sugestões para a COP 30, formamos multiplicadores que irão replicar o conhecimento adquirido ao longo desses dois dias, que na verdade foi mais um reforço para toda a nossa luta, como Igreja. Que possa ecoar junto aos chefes de Estado da COP 30, e aos que indiretamente estão envolvidos nesta problemática, assim iremos ampliar a preocupaçãp da Igreja, junto as comunidades, na defesa da Casa Comum e incentivando ações concretas pela justiça climática e a ecologia integral”, fechou o evento Dom Paulo Andreolli, bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém e articulador da Igreja Rumo a COP 30.
O Pré-COP Norte, foi o primeiro dos cinco encontros regionais preparatórios para a COP30. A próxima reunião Pré-COP Nordeste acontecerá nos dias 11 e 12 de julho em Juazeiro (BA), seguido da Pré-COP Sul de 18 a 20 de julho, em Governador Celso Ramos (SC), Pré-COP Leste de 25 a 27 de julho, em Belo Horizonte (MG), finalizando com a Pré-COP Centro-Oeste no dia 6 de agosto em Bonito (MS).
A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, também chamada de COP30, acontecerá na capital paraense no período de 10 a 21 de novembro.
Com informações do Cimi Regional Norte 1 , CPT Regionais Amazonas e Ceará
Edição: Carlos Henrique Silva (CPT Nacional)
A Romaria no encontro das águas dos rios Negro e Solimões simboliza a união e a ligação dos povos que habitam a Amazônia. Foto: Jesuítas Brasil / Divulgação
No Dia Mundial da Água, celebrado no último sábado (22), povos e comunidades nos estados do Amazonas e do Ceará se mobilizaram nas ruas, rios e demais fontes de águas, chamando à atenção da sociedade para a urgência da preservação dos recursos hídricos e o direito universal à água, especialmente para as populações mais vulneráveis.
Em Manaus (AM), centenas de pessoas participaram da 2ª Romaria organizada pelo Fórum das Águas, do qual fazem parte a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental (SARES) e mais de 60 organizações sociais e religiosas. O evento trouxe o tema “Nossas vozes na COP30 em defesa da água e da vida na Amazônia” e o lema “Luta por preservação e acesso para todos!”.
Foto: Ligia Apel / Cimi Regional Norte 1
A concentração aconteceu no Porto da Ceasa, reunindo organizações sociais, ativistas, comunidades ribeirinhas, indígenas, cidadãs e cidadãos comprometidos com a causa ambiental. Os participantes partiram em barcos e seguiram em romaria até o Encontro das Águas, onde os rios Negro e Solimões se encontram e formam o Rio Amazonas. O ato simbólico sublinhou a luta contra a privatização dos serviços de abastecimento e a crise hídrica que afeta milhões de pessoas na Amazônia.
“Na terra sagrada de Ajuricaba, no coração hídrico do mundo, onde esses gigantes se encontram e as águas que nascem como goteira dos Andes e fluem pelos povos e territórios até aqui para se encontrarem, o segredo da unidade na diversidade é revelado. A voz da terra se levanta e os filhos e filhas das águas e das florestas ouvem o seu chamado e o amplificam”.
Assim poetizou Mateus Amazônia, representante da organização Converge Amazônia, que reuniu durante três dias, povos, comunidades e organizações para definirem estratégias de resistência rumo à Cúpula dos Povos e à COP 30. O encontro das águas simboliza a união e a ligação dos povos que habitam florestas, comunidades, aldeias e cidades amazônicas, situadas às margens dos rios amazônicos.
A alusão ao líder indígena Ajuricaba, do povo Manaós, originário da região onde a cidade de Manaus foi construída, traz essa unicidade para a resistência. Ajuricaba resistiu à colonização portuguesa, negando-se à escravidão e lutando pela libertação dos povos indígenas no século XVIII.
Foto: Ligia Apel / Cimi Regional Norte 1
Evocando as divindades amazônicas, Iara, Iemanjá, Oxum, Cobra Grande entre outras Mães, o coordenador-geral da Articulação Amazônica dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana (Aratrama), Pai Alberto Jorge, convocou os participantes da Romaria das Águas a se sintonizarem com o lugar, a natureza e o Sagrado que envolvia tudo e todos.
“É preciso que Manaus venha, encha os barcos de pessoas que gritem: vamos salvar nosso rio, vamos salvar nossas águas. Elas pertencem a nós, não à [empresa] Águas de Manaus, não pertence ao governador, não pertence aos políticos, mas ao povo. Unamos nossas forças e nossa fé e peçamos ajuda a Deus e aos irmãos para continuarmos na luta em defesa das águas e da vida”, concluiu.
Pai Alberto Jorge e Padre Sandoval Alvez Rocha representando a luta pela Casa Comum. Foto: Jesuítas Brasil / Divulgação
Padre Sandoval Alvez Rocha, membro do Sares e coordenador-geral do Fórum das Águas, adverte que “apesar da riqueza hídrica da Amazônia, milhões de pessoas sofrem com a falta de acesso à água potável e ao saneamento básico” e afirma que, em Manaus, os serviços de abastecimento estão privatizados há 25 anos e, em todo esse tempo, vem gerando tarifas elevadas e atendimento precário, especialmente nas periferias.
Dados e informações como essas levaram a organização da Romaria das Águas e da Semana das Águas em Manaus, mostrando que esse Bem Comum está sendo seriamente ameaçado pelas catástrofes climáticas, consequências dos ataques à natureza para exploração econômica indiscriminada dos seus recursos.
“Nós temos passado por momentos muito tristes. Passamos por grandes secas, causadas por questões naturais e também pela grilagem de terra, o garimpo ilegal, o desmatamento e o agronegócio que aumenta o latifúndio e não dá oportunidade para as pequenas famílias e as comunidades tradicionais continuarem seus modos de vida, de preservação e conservação da natureza, também nos diversos rios que são afluentes do Amazonas. As enchentes acima da média que começam agora também trazem ameaças às comunidades ribeirinhas, mas se nós mantermos na luta permanece de preservação da floresta e biodiversidade, vamos ter água potável, que é um dom da vida, da natureza e da Trindade Santa. A água não é mercadoria nem negocio, mas um bem destinado a todas as pessoas”, afirmou o pe. Manuel do Carmo, agente da CPT Amazonas.
Foto: Jesuítas Brasil / Divulgação
Imagens: equipe de comunicação da Juventude Mandacaru de Canindé
As Romarias das Águas promovidas pela CPT Ceará e pelas dioceses locais são momentos de fé, resistência e compromisso com a defesa dos territórios e dos recursos hídricos no semiárido. Em 2025, diversas comunidades se mobilizam para essas celebrações, reafirmando a luta pelo direito à terra e à água. No domingo, 23 de março, a Diocese de Crateús realizou a Romaria das Águas nas paróquias de Independência, Quiterianópolis e Tauá e no Assentamento Nova Pintadas, em Nova Russas, fortalecendo a espiritualidade e a organização popular. Além disso, o Assentamento Itaurú, na paróquia de Ararendá, diocese de Itapipoca (paróquia de Arapari) e o sertão de Canindé também foram palco dessas peregrinações, reunindo camponeses e camponesas, pastorais e movimentos sociais, em um clamor pela vida e pela preservação dos bens comuns.
Em Canindé, as comunidades ligadas à Paróquia São Francisco das Chagas, realizaram a Romaria das Águas no sábado (22) com bastante animação, unindo a equipe local da CPT e do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST). Estiveram presentes várias instituições civis e religiosas, movimentos e sindicatos.
Com o tema “Louvado sejas, meu Senhor, pela nossa irmã água”, a Romaria iniciou às 07:30 da manhã com uma concentração na Quadra da Gruta, seguida de caminhada até o Açude São Mateus e a celebração eucarística às margens do açude. Ao final da celebração, a comunidade plantou uma árvore às margens do açude para simbolizar o compromisso com a natureza e em defesa da Casa Comum.
Algumas falas de representantes das comunidades ao longo do evento:
“Estaremos firmes e fortes caminhando, cantando e soltando nossa voz, porque a água faz parte da gente e não pode ser uma mercadoria.”
“Este é um momento de renovarmos nossas esperanças e nos manifestarmos em defesa dos nossos direitos”. Foram
“Realizamos nossa romaria das águas para celebrar e reivindicar nosso direito a ela.”
O texto faz parte da cobertura da Jornada Contra os Agrotóxicos em Goiás e se soma aos esforços de organizações e pesquisadores que denunciam como o uso de venenos em larga escala impacta a população rural no estado
Por Marilia da Silva | CPT Goiás
No último mês de novembro, Maíra Mathias, jornalista de O Joio e o Trigo, esteve em Goiás para a cobertura da Jornada Contra os Agrotóxicos, a convite da Campanha Cerrado. No dia 13 de março ela publicou a matéria “Uma comunidade tenta se salvar do veneno”, que pode ser lida na íntegra aqui.
Na viagem, Maíra acompanhou a missão territorial da jornada no Acampamento Leonir Orback, ligado ao MST, em Santa Helena de Goiás (GO), onde conversou com famílias que vivenciam a exposição sistemática a venenos pulverizados em lavouras vizinhas. A partir daí, deu início a uma investigação jornalística para entender porquê essas pessoas e o local onde vivem não estão sendo protegidas por nenhum mecanismo do estado.
No Acampamento Leonir Orback não faltam relatos e registros sobre a convivência adoecedora com o veneno. “O Leonir Orback é uma tripa de casas no meio de um mar de monoculturas do agronegócio. De um lado, cana. Do outro, se alternam plantações de soja, milho e sorgo”, descreve a matéria. As narrativas também revelam como até mesmo as equipes de atendimento à saúde do município desconsideram a exposição ao veneno enquanto possível causa de problemas de pele e outros sintomas de intoxicação, sem qualquer exame prévio.
Um dos objetivos da Jornada contra os Agrotóxicos foi apresentar à comunidade o resultado de estudos realizados a partir de amostras de material colhido no local. A matéria repercute também a pesquisa realizada pela Campanha Cerrado em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz, que analisou água coletada nessa e em outras comunidades do cerrado brasileiro. No Leonir Orback, as coletas foram realizadas em rio, açude e poço da comunidade, em março de 2022 e janeiro de 2023. O resultado da análise revela a presença de 4 agrotóxicos em altas quantidades.
A reportagem abordou também o estudo realizado pela geneticista Andreya Gonçalves Costa e o biomédico Miller Caldas Barradas do Laboratório de Mutação Genética da Universidade Federal de Goiás (Labmut/UFG) com amostras de sangue e fluido bucal de moradores o acampamento. O estudo busca identificar como a exposição aos agrotóxicos constante tem danificar o DNA dos trabalhadores rurais, fator para o desencadeamento de doenças graves.
“A análise do material biológico encontrou alterações e mutações no DNA e teve resultados parecidos com a que tinha sido feita na água do acampamento. O agrotóxico mais encontrado no corpo dos acampados também foi o glifosato. Depois veio o chumbinho, usado para matar ratos, seguido por fipronil e tordon (um herbicida que resulta da mistura de picloram com 2,4 D). A lista segue, com um total de 12 agrotóxicos”, traz a reportagem.
A reportagem levantou o histórico de luta da comunidade, que luta pela desapropriação de terras do Grupo Naoum, proprietário da Usina Santa Helena e outras fazenda em Santa Helena de Goiás, e devedor de bilhões aos cofres públicos. O objetivo do MST é conseguir que as fazendas sejam desapropriadas para pagamento de dúvidas. A reportagem procurou o Grupo Naoum, mas não obteve resposta.
A legislação sobre pulverização em áreas próximas de comunidades é classificada pela reportagem como “inexistente ou fraca”. Uma instrução normativa do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), de 2008, diz que a pulverização aérea pode ser realizada a 250 metros de distância de mananciais de água, moradias isoladas e agrupamentos de animais e a 500 metros de povoações, cidades, vilas, bairros e mananciais de captação de água para abastecimento de população. Uma portaria mais recente, de 2021, estipula a distância mínima de 20 metros para pulverização com uso de drones.
A pulverização terrestre, seja com uso de tratores como o Uniport ou por bombas costais, a normatização é feita pelos estados. Goiás é um dos poucos estados que regulamenta a atividade, com uma lei de 2016 que teve trechos modificados por outra, de 2018. “Essas mudanças tratam exatamente das distâncias que devem ser observadas na aplicação dos agrotóxicos. O estado previa, por exemplo, uma distância de 2 mil metros para pulverizações aéreas em áreas próximas de cidades, povoados, vilas… Isso caiu para 500 metros (mesma distância estipulada pelo governo federal)”, resume.
O Joio e o Trigo procurou a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, a Agrodefesa e a Secretaria de saúde sobre os procedimentos que desrespeitam as normativas sobre pulverização e sobre os casos de contaminação no acampamento. Em nota, a Agrodefesa solicitou que, no momento da aplicação de agrotóxicos no entorno do acampamento, notifiquem o fiscal da unidade do município para apuração de possíveis irregularidades e adoção de medidas punitivas legais, mas frisou que, segundo relatos do próprio fiscal, a comunidade se instalou no local onde já havia lavouras. (Importante questionar se, para este fiscal, este fato irresponsabilizaria os lavoureiros quando à contaminação de pessoas, que sabidamente vivem no local, em ações pulverizações realizadas fora dos parâmetros legais?)
A Secretaria Estadual de Saúde disse, em nota, que fiscaliza a situação do acampamento e que o município de Santa Helena é prioritário quando o assunto são os agrotóxicos e afirma que, o estudo realizado pela Fiocruz e Pastoral da Terra, que analisou a água do acampamento, motivou ações do programa VSPEA em 2024. A Secretaria do Meio Ambiente não respondeu aos questionamentos da reportagem.
A matéria completa de O Joio e o Trigo pode ser lida aqui.
Rafael Nascimento / CPT João Pessoa (PB)
Fotos: Equipe CPT João Pessoa (PB)
“De passo em passo a gente vai chegando à terra prometida, de mão em mão a gente vai tirando as cercas desta vida”.
Na manhã desta terça-feira, 25 de março, a Câmara Municipal de Sobrado, na Paraíba, sediou uma audiência pública decisiva para a aprovação da proposta de aquisição de parte da Fazenda Antas, situada nos municípios de Sobrado e Sapé. O momento representou um grande passo na luta pela terra na região.
Participaram do evento camponeses e camponesas do acampamento Fazenda Antas, representados pela jovem Josilene, além de autoridades e lideranças de movimentos sociais. Entre os presentes estavam o superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Antônio Barbosa; o prefeito de Sobrado, Léo Mendes; o procurador do Incra, Valdemir de Souza; representantes do Ministério Público Federal e da Defensoria Pública; a vereadora Graça, de Sobrado; Rafael Reginaldo, da Comissão Pastoral da Terra; e Alane Maria, vice-presidenta do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas. Também compareceram técnicos do Incra e moradores da região.
Na ocasião foram discutidos aspectos relacionados à proposta de aquisição da propriedade rural, a exemplo das razões para que isso ocorra, a regularidade do domínio do imóvel, os dados cadastrais, os aspectos agronômicos e ambientais, a viabilidade e capacidade de assentamento, o valor de mercado do imóvel, conforme o Laudo de Vistoria e Avaliação (LVA), e as condições de pagamento para a transação.
A audiência marcou o início de um processo de reparação histórica e justiça social. Como disse o líder camponês João Pedro Teixeira antes de seu martírio, em 1962: “Eu sei que nego vai morrer, que essa luta vai ser abafada, vai ficar como fogo de monturo por baixo. Mas quando se levantar mais tarde, caboclo... aí não tem água que apague esse fogo”. A aquisição de parte do imóvel da Fazenda Antas, é um marco significativo para a Reforma Agrária no Brasil, pois é o berço das Ligas e Lutas Camponesas na Paraíba.
A comunidade Barra de Antas traz em suas raízes históricas muita luta e resistência, iniciadas por João Pedro Teixeira e Elizabeth Teixeira - cujo centenário foi recentemente celebrado e será homenageada com o nome do novo e primeiro assentamento da Reforma Agrária do município de Sobrado (PB). A ocupação pelas famílias camponesas ocorreu em 19 de novembro de 1997 e, desde então, elas resistem na área.
Nos últimos anos, a comunidade enfrentou negação de direitos, mas também acumulou importantes conquistas. Entre elas estão a criação do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas, o reconhecimento da comunidade como Tradicional Ribeirinha pelo Ministério Público Federal, e a aprovação de um projeto para construção de sessenta moradias pela Companhia Estadual de Habitação Popular (CEHAP). Outras vitórias incluem a implantação de calçamento na rua principal, a construção de um campo de futebol, melhorias na escola local, a construção de um centro de convivência, a luta contra a implantação de uma barragem no rio Gurinhém, e a proposta de construção de uma ponte ou passagem molhada sobre o mesmo rio.
A conquista do assentamento Elizabeth Teixeira representa mais um capítulo dessa história de luta. Com uma área de 133,48 hectares de terras férteis, o assentamento se consolidará como um espaço de produção e resistência para as famílias camponesas.
“Quando chegar na terra, lembre de quem quer chegar, quando chegar na terra, lembre que tem outros passos pra dar”.
A luta continua! Viva a Resistência do Povo!
Por Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações da CPT Regional Pará
Fotos: Luzinaldo / CPT Pará
A ansiedade é grande para as famílias moradoras da Ocupação Jane Júlia (antiga Fazenda Santa Lúcia), no município de Pau D’Arco (PA), pela desapropriação e transformação da área em assentamento da reforma agrária. Um passo importante de promoção da justiça e superação das feridas causadas pela perda de vidas, em mais um triste episódio de violência no campo no estado do Pará: o conhecido Massacre de Pau D’Arco, ocorrido em 24 de maio de 2017 durante uma operação policial que vitimou 10 trabalhadores rurais, sendo nove homens e uma mulher, Jane Júlia, que leva o nome do acampamento.
A comunidade recebeu neste início de semana (dias 24 e 25 de março), uma visita técnica da Comissão de Soluções Fundiárias do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJ-PA), e também participou de uma audiência da Comissão, na qual as famílias conseguiram a suspensão da liminar de despejo e da ação de reintegração de posse movida contra elas pela família proprietária da área, e que vem tirando seu sossego há muitos anos.
Na visita técnica, o juiz que coordena a Comissão de Soluções Fundiárias em relação a este processo visitou a ocupação e pode ver de perto como vivem as famílias, suas casas, a produção de alimentos, o trabalho ali desenvolvido, os locais de convivência coletiva, como a sede da associação, além de se reunir com as famílias para esclarecer sobre o processo judicial, explicando sobre as atribuições da Comissão.
Já nesta terça (25), aconteceu a audiência visando um acordo sobre o processo de reintegração de posse movido pela pretensa proprietária, que vem se arrastando desde 2013. Ao longo deste período, três reintegrações de posse foram cumpridas, a última delas já após o Massacre. Contudo, as famílias continuam resistindo e aguardando uma solução por parte do Judiciário e do Incra.
Nas últimas semanas, as famílias vêm comemorando o avanço muito positivo em relação ao caso: a assinatura de desapropriação da área por interesse social pelo presidente Lula, no último dia 07. Após a assinatura do decreto, o Incra avançará com a desapropriação da área.
“Na audiência, as famílias ganharam uma força maior: nós conseguimos a suspensão da liminar de reintegração de posse e do processo em si. O processo agora vai ser encaminhado para a Vara Agrária de Redenção (PA), para que o acordo seja homologado e o processo permaneça paralisado durante os próximos 6 meses”, comemora a advogada popular Andréia Silvério, que participou da audiência representando o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH).
Andréia Silvério ainda enfatiza a importância de hoje o Estado garantir a dignidade das famílias envolvidas neste conflito:
“Se lá atrás o Estado foi um agente causador da violência, promovendo o massacre em 2017, hoje vemos outra postura do Judiciário e do INCRA, se distanciando da violência e da repressão frente ao conflito, e tentando garantir a solução a partir da conciliação entre as partes, o que é possível em razão do decreto de desapropriação da área. Para as famílias é fundamental que se concretize a criação do assentamento e o acesso às demais políticas públicas, como escolas, posto de saúde, estradas, e acesso a crédito para melhoria da produção. Trata-se de um dever de reparação do Estado em memória às vítimas do Massacre, seus familiares e sobreviventes.”
Além do CNDH, também estavam presentes: famílias da Ocupação Jane Júlia, o agente Luzinaldo, representando a CPT; o advogado José Vargas Júnior, do Coletivo Veredas, que representa judicialmente as famílias da ocupação desde 2017; a Defensoria Pública Estadual (DPE) e o Ministério Público Estadual (MPE).
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