Edição: Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações da CPT Regional Amapá
A CPT Regional Amapá emitiu Nota de Repúdio diante da violência no campo no Estado, que vitimou fatalmente o trabalhador Antônio Candeia Oliveira, conhecido como “Maranhão”, de 72 anos. O idoso foi assassinado na tarde do último sábado (23), em uma fazenda no município de Amapá, localizado a 310 km da capital Macapá, em meio a uma discussão por terras.
O crime foi registrado em vídeo e infelizmente compartilhado nas redes sociais. Mesmo com o inquérito policial ainda no início, o empresário Francisco Canindé, marido da prefeita eleita Kelly Lobato (União Brasil), foi preso em flagrante acusado de ser o mandante do homicídio, após se apresentar à delegacia. Apontado como executor, o ex-militar Antônio Carlos Lima de Araújo se entregou na delegacia de Macapá, acompanhado de quatro advogados.
O delegado responsável pelo caso, Stephano Dagher, acredita que o crime pode ter sido premeditado pelo grupo, que teria provocado a vítima para justificar uma reação violenta e alegar legítima defesa.
“Há algum tempo, a CPT vem denunciando que a falta de política de reforma agrária do Estado do Amapá poderia levar a episódios cada vez mais frequentes de violência, e nas suas extremas consequências à perda de vidas humanas. E agora mais uma vez aconteceu o atentado contra a vida, que é o dom maior concedido por Deus”, afirma um trecho da carta.
Confira o texto completo:
Trinta anos após o assassinato da família Magave no lugar conhecido como "Pacas", o município de Amapá é atingido por outro fato de violência no campo que levou à morte de um senhor conhecido pelo apelido de Maranhão. O Regional Amapá da Comissão Pastoral da Terra (CPT) repudia, veementemente, esse ato de violência praticado por um militar da reserva na tarde do último sábado, 23 de novembro de 2024, no município de Amapá (AP). O inquérito policial está apenas no início, mas tudo indica haver participação no assassinato de um empresário que não tem necessidade alguma de se apropriar de terra pública para própria subsistência.
Há algum tempo a CPT vem denunciando que a falta de política de reforma agrária do Estado do Amapá poderia levar a episódios cada vez mais frequentes de violência e nas suas extremas consequências a perda de vidas humanas. E agora mais uma vez aconteceu o atentado contra a vida que é o dom maior concedido por Deus.
É com frequência também que a CPT efetua denúncias as autoridades competentes a aplicação em todo o Estado de forças policiais efetivas e da reserva por parte de empresários para coagir simples e pobres moradores do campo. Embora seja um pequeno quantitativo que se dispõe a tais coerções, não deixa de ser preocupante apesar de o Estado permanecer omisso em muitas das denúncias realizadas pela CPT a tais atos.
A frieza e a covardia empregadas pelo assassino nos causam profunda indignação e reforçam um quadro já anunciado de agravamento da violência no campo amapaense. O nosso povo tem sofrido, cada vez mais, com diversas práticas violentas, incluindo constantes ameaças de morte, agressões, destruição de casas e roçados, além de despejos judiciais fundamentados em decisões questionáveis, que visam atender aos interesses privados de empresas e famílias com poder político e financeiro.
Neste momento de dor e indignação, a CPT manifesta sua solidariedade à família enlutada e conclama a sociedade a repudiar este ato bárbaro e cobrar das autoridades competentes que o crime seja rigorosamente apurado e que os culpados sejam punidos com o rigor da lei.
Macapá (AP), 25 de novembro de 2024.
Comissão Pastoral da Terra Regional Amapá
Salmos 103:6
"O SENHOR faz justiça e juízo a todos os oprimidos"
Por Carlos Augusto Pantoja Ramos*
Do blog Meio Ambiente, Açaí e Farinha
Caríssimas e Caríssimos:
Venho aqui socializar algumas reflexões sobre o Projeto de Lei 182 (disponível neste link), que trata do Sistema Brasileiro de Comercialização de Emissões (SBCE) e que cria um mercado de carbono regulado no Brasil, na tentativa de precificar as emissões dos gases de efeitos estufa que intensificam o aquecimento global. Assim, primeiramente recomendo a leitura da ótima matéria da Agência Pública intitulada Brasil aprova mercado regulado de carbono; saiba como ele deve funcionar, assinada pela jornalista Isabel Seta (disponível neste link), que apresenta um resumo muito interessante do tema.
Gostaria de contribuir com esse momento de discussões sobre a regulação o mercado de emissões. Tenho algumas ressalvas sobre o PL:
1️⃣ Acho estranho que não seja citado no texto do PL a Lei 14.119, que trata da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais e que traz importantes amarrações para salvaguardas, obrigatoriedades sobre métricas e respeito a outros sistemas nacionais importantes como o Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
2️⃣ O Plano Anual de Alocação previsto no PL precisa também ter suas versões nas discussões subnacionais: não é possível que o Estado do Pará apresente seu quadro de venda de créditos de carbono sem discutir com a sociedade, sem apresentar (agora entendendo que há possibilidade) de um Plano Estadual de Alocação.
3️⃣ No caso de comunidades de povos indígenas e de povos e comunidades tradicionais (artigo 47), onde o consentimento resultante de consulta livre, prévia e informada (CPLI), prevista na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) será custeado pelo desenvolvedor interessado, percebo uma possibilidade de fragilização futura de direitos. Entendo que apesar de garantidas a supervisão dos ministérios públicos federal e estadual, Funai e Câmara Temática de Povos e Comunidades Tradicionais, o texto precisava ser contundente sobre as metodologias a serem utilizadas, uma vez que a consulta é um ato da comunidade. Desenvolvedores interessados podem pagar e interferir nas metodologias de CPLI? Como membro de vários grupos técnicos que atuam junto a comunidades tradicionais, recomendo que fiquemos alertas às tentativas de "diluição" da voz e vez das comunidades.
4️⃣ O tratamento dado a mercado voluntário, diferenciando-o de mercado privado na prática não existe; acompanho desde 2018 os controversos projetos de carbono na região do Marajó e vejo que esse "voluntariado" age aproveitando-se de comunidades e famílias que sofrem forte pressão econômica e social.
5️⃣ Espero que o comitê técnico consultivo permanente (artigo 8), conte com a participação de profissionais e cientistas com experiência em projetos e estudos em diversos biomas brasileiros de proteção da floresta e apoio a comunidades tradicionais e povos indígenas. A atuação desse comitê nas elaborações sobre mensurações e índices será fundamental para evitar o predomínio de valorações advindas dos mercados especulativos e de grandes conglomerados. O governo do Pará, por exemplo, aceitou sem debater no campo da ciência o valor de 15 dólares / tonelada de carbono indicada pela Coalização Leaf, formado por EUA, Reino Unido Noruega e mega corporações como Amazon, Bayer, Nestlé. Nesta relação público-privada, qual é o potencial de endividamento de estados e municípios em nome do clima?
Não resta dúvida que a futura lei que irá instituir o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) é um avanço em uma área sombria que avançava na Amazônia tal qual uma nau europeia de 1500. Até então o comando estava no capital especulativo, suspeitíssimo em evadir divisas e com alto poder de expropriação de territórios de povos indígenas e comunidades tradicionais.
Sinceramente compreendo que o Estado Brasileiro deve liderar de fato a discussão mas sei que haverão orquestrações para que o sistema criado seja liderado pelo capitalismo de carbono ou sua forma híbrida envolvendo estados nacionais e subnacionais. Cabe a nós estarmos atentos e cobrar que os recursos econômicos de origem pública sejam maiores do que aqueles vindos dos projetos privados/voluntários de carbono, pois é sim temerária a possibilidade de perdas sistemáticas de direitos. É imprescindível monitorar junto às instâncias previstas no SBCE os casos de abusos ambientais, econômicos, sociais e intergeracionais.
Aproveitando, envio os seguintes textos que publicamos sobre os mercados de carbono:
✅ Sobre os projetos de carbono na Amazônia: por que contratos que duram uma geração? / Boletim de dezembro de 2023 do Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais, disponível neste link;
✅ O mercado de carbono e os impactos negativos sobre as comunidades do campo / Comissão Pastoral da Terra / Caderno Conflitos no Campo Brasil 2023, disponível neste link;
✅ O caso da comercialização de créditos de carbono em Portel, Marajó, Pará - disponível neste link (uma versão deste artigo com mais profundidade sobre o tema está sob avaliação da Revista Científica Estudos Interdisciplinares).
A paz é filha da justiça, filha da justiça climática.
Forte abraço.
(*) Carlos Augusto Pantoja Ramos é Engenheiro Florestal, Mestre em Ciências Florestais; Doutorando do Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares (INEAF) da Universidade Federal do Pará; Membro do Coletivo Campesino Amazônico – COCA e do Grupo de Trabalho Amazônico - GTA. É colaborador voluntário da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Marajó e da Federação dos Trabalhadores Agricultores e Agricultoras Familiares no Estado do Pará - FETAGRI no Marajó. Estuda os mercados de carbono desde 2018.
Por Flavia Horta / ASCOM Arquidiocese de Manaus
Colaboração e Fotos: CPT Regional Amazonas
De 15 a 17 de novembro, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) realizou uma formação com o tema ‘Juristas Populares’ para agentes de base e lideranças dos estados do Amazonas, Roraima e Amapá com o objetivo de fortalecer a articulação junto os órgãos de defesa como o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública Estadual (DPE) a Defensoria Pública da União (DPU) e entidades parceiras na construção de estratégias de defesa dos territórios e das comunidades.
A formação contou com o apoio de Fernando Merloto, Defensor Público do Ministério Público Federal no Amazonas (MPF); Eduardo Sanches, procurador da República do Ministério Público Federal (MPF); Ronilson Costa (da Coordenação Nacional da CPT); Afonso Chagas, professor universitário de Rondônia; e assessoria de Maika Muller.
De acordo com Luís Xavier, coordenação CPT Amazonas, o curso teve como finalidade fortalecer o conhecimento técnico sobre organização social: “O curso nos preparou para elaborar, encaminhar e acompanhar a denúncia e a Justiça. Aprendemos sobre o direitos das comunidades e o direito de cada cidadão como objetivo fomentar essa multiplicação desse conhecimento na base, no assentamento onde o povo está inserido e que já sofreu ataques e agressões, seja por crime ambiental, violência contra pessoa ou ameaça de morte. A mulher também teve destaque na questão do ‘Direito da Mulher’ de se proteger."
"A ideia é manter esse curso permanente no processo de formação dos agentes da Pastoral da Terra, até porque as legislações mudam, os conceitos mudam e por isso deve ser contínuo e constante que o agente do ‘CPT’ tenha formação”, concluiu Luís Xavier.
Por Comunicação CPT Nacional,
com informações da CNBB e Prelazia do Marajó
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) Regional Pará emitiu Nota de Pesar pelo falecimento do bispo emérito da Prelazia do Marajó, Dom José Luís Azcona Hermoso, ocorrido nesta quarta-feira, 20 de novembro de 2024. Dom Azcona tinha 84 anos de idade e estava internado em cuidados paliativos no Hospital Porto Dias, em Belém.
Nascido em Pamplona, na Espanha, Dom Azcona é reconhecido internacionalmente pela luta contra o tráfico humano e contra o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes no Marajó, bem como a devastação ambiental e a pesca predatória na região, uma luta de 37 anos no episcopado, sucedido por Dom José Ionilton Lisboa, atual presidente da CPT.
Confira a nota completa, que também pode ser baixada aqui.
“Se com Ele morremos, com Ele viveremos” (2 Tm 1,11).
Caro Dom Ionilton,
Nós da Comissão Pastoral da Terra do Regional Pará lhe saudamos, e também à toda a Prelazia do Marajó, neste dia em que o bispo emérito Dom Jose Azcona fez a sua Páscoa definitiva. A todo o povo de Deus presente nesta Prelazia – povo marajoara, vida consagrada e padres – estendemos nossos sentimentos de solidariedade e amizade, assim como nossas orações e a esperança do consolo eterno junto de Deus. Somos gratos a Dom Jose pela acolhida e espaço dados à CPT na Prelazia, da mesma forma como também atuou em outras frentes sociais contra a violação da dignidade e dos direitos humanos, revelando verdadeiro amor a Deus e ao povo.
Desejamos que o testemunho e as boas obras de Dom Azcona fecundem as terras marajoaras e alimentem uma fé corajosa e comprometida no coração de cada fiel que habita esta Prelazia.
Com nossos sinceros pêsames,
Comissão Pastoral da Terra
Regional Pará
Belém, 20 de novembro de 2024
Audiência Pública em Goiânia e Missão Territorial em Santa Helena de Goiás contam com participação de comunidades, especialistas convidadas e com divulgação de pesquisa inédita
Nos dias 26 e 27 de novembro, será realizada, em Goiânia e em Santa Helena de Goiás, a Jornada Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida em Goiás, uma iniciativa da Campanha Cerrado e da Comissão Pastoral da Terra Regional Goiás (CPT Goiás), que conta com a participação de pesquisadoras de diversas áreas, ativistas e comunidades do campo.
A jornada conta com duas grandes ações: uma Missão Territorial, no dia 26 de novembro, no Acampamento Leonir Orback, em Santa Helena de Goiás (GO), e, no dia 27, a Audiência Pública intitulada “Os impactos dos Agrotóxicos em Goiás”, na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (ALEGO), em Goiânia.
As atividades são abertas ao público e têm como o objetivo de divulgar e debater os resultados de pesquisas, uma delas inédita, sobre o impacto dos pesticidas na saúde da população do campo em Goiás, além de fazer a oitiva e ampliar o grito de socorro de comunidades que são cotidianamente expostas a várias formas de contaminação por agrotóxicos utilizados nos grandes monocultivos presentes em todas as regiões do estado.
Missão Territorial
A Missão Territorial tem como proposta reunir a comunidade do Acampamento Leonir Orback com especialistas ou estudiosos do assunto, para discutir a realidade local de exposição aos agrotóxicos, refletindo sobre os problemas e possíveis caminhos para seu enfrentamento. Estarão presentes na Fernanda Savicki, da Fundação Oswaldo Cruz, Andreya Gonçalves Costa, professora do Laboratório de Mutação Genética da UFG (LABMUT/UFG) e Jaqueline Pivato, da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida, além de representantes da Campanha Cerrado e CPT Goiás.
Durante a atividade, o LABMUT/UFG irá apresentar, em primeira mão, os resultados de estudo inédito realizado com material coletado na comunidade no último mês de julho. A pesquisa analisou geneticamente amostras de sangue e fluido bucal de moradores da comunidade, identificando os danos genéticos associados à exposição a substâncias agrotóxicas.
O impacto dos agrotóxicos no Acampamento Leonir Orback vem sendo monitorado pela CPT Goiás e Campanha Cerrado desde 2021, a partir das denúncias realizadas pelas famílias locais, que relatam constantes problemas de saúde relacionados à intensa exposição aos produtos aplicados em lavouras de soja e cana de açúcar em propriedades vizinhas. Estudo realizado entre 2022 e 2023, publicado em “Um dossiê sobre agrotóxicos nas águas do Cerrado”, da Campanha Cerrado, revelou a contaminação da água da comunidade com pelo menos 5 diferentes tipos de agrotóxicos.
Audiência Pública
Para debater a problemática com o conjunto da sociedade, em especial com autoridades do estado, a caravana será finalizada com a Audiência Pública “O Impacto dos Agrotóxicos em Goiás”, no Auditório Francisco Gedda, na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (ALEGO).
A Audiência será presidida pela deputada estadual Bia de Lima e a mesa será composta por Fernanda Savicki, da Fundação Oswaldo Cruz, Jaqueline Pivato, da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida, Miller Caldas Barradas, pesquisador do Laboratório de Mutação Genética da UFG (LABMUT/UFG), Leila Lemes, da CPT Goiás, Laureana Fernandes, do Acampamento Leonir Orback e outros convidados.
A audiência contará ainda com a presença de comunidades do campo de diversas regiões do estado, que levarão os seus depoimentos sobre a questão dos agrotóxicos para a discussão.
SERVIÇO
Jornada Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida em Goiás
26 e 27 de novembro - Santa Helena de Goiás e Goiânia (GO)
PROGRAMAÇÃO:
26 de novembro - Santa Helena de Goiás (GO)
Missão Territorial
9:00 - Roda de Conversa sobre os impactos dos agrotóxicos na vida das comunidades em Goiás - No Acampamento Leonir Orback (Zona Rural)
14:00 - Entrega da Premiação do Edital de Vídeos Inéditos da Agro é Fogo Atendimento à imprensa - No Acampamento Leonir Orback (Zona Rural)
15:00 - Ato de solidariedade na cidade com entrega de alimentos (Sta Helena)
27 de novembro - Goiânia (GO)
Audiência Pública: Impactos dos agrotóxicos em Goiás
Local: Auditório Francisco Gedda - Assembleia Legislativa do Estado de Goiás,
7:30 - Café da manhã
9:00 às 12:00 - Audiência Pública
Contatos para imprensa:
Marilia da Silva - Assessoria CPT Goiás - 62 99940-4656
Heloisa Sousa - Assessoria CPT Nacional - 62 9252-743
Leia na íntegra a carta assinada por 60 organizações e movimentos sociais de todo o Brasil
Araguatins, município localizado na região norte do Tocantins, tem como seu fundador Vicente Bernardino Gomes, que chegou na região em 1868, trazendo trabalhadores escravizados que havia adquirido como pagamento de uma dívida, entre eles: Julião Barros, Sarafina Benedita Batista e seu filho Henrique Julião Barros - respectivamente, bisavós e avô paterno de Salvador Batista Barros, falecido griô (ancião) da comunidade quilombola da Ilha de São Vicente. O fragmento dessa história está registrado no livro “De São Vicente a Araguatins: Cem anos de história”, escrito e publicado em 1970 por Leônidas G. Duarte. Depois da abolição da escravatura, em 1888, os ex-escravizados receberam a terra como doação e começaram a povoar o território, formando o quilombo Ilha de São Vicente. Desde então, a família Barros ocupa ancestralmente a ilha, território de convívio de diferentes gerações.
Em 2010, a comunidade sofreu um despejo ilegal. No mesmo ano, a comunidade recebeu, da Fundação Cultural Palmares, a certificação de autodefinição como remanescentes de quilombo. Em seguida, o Incra - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - passou a dar andamento às ações de identificação histórica, antropológica da comunidade, que culminou na titulação definitiva. A luta pela regularização do quilombo se tornou conhecida internacionalmente há mais de 20 anos, a partir do trabalho da liderança quilombola Fátima Barros, que ancestralizou, mas inspirou a defesa de direitos quilombolas em todo o país.
De acordo com o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT da Constituição Federal, "aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos". Dessa forma, em 20 de novembro de 2023, o presidente Lula entregou ao quilombo Ilha de São Vicente o Título de Concessão de Direito de Uso sobre a Terra. Cinco dias depois, o título foi entregue dentro do próprio território, sendo dedicado aos ancestrais que morreram sonhando com a regularização. O documento entregue por Edmundo Costa, superintendente do Incra no Tocantins, informa que a comunidade quilombola é a única responsável legal pelo território.
O quilombo foi reconhecido pelo Governo, mas parte da população araguatinense, embasada em comportamentos de autoridades regionais, tem insistido em desrespeitar a história desse povo. O prefeito de Araguatins, Aquiles da Areia, incentiva o desrespeito contra o quilombo ao negar e duvidar da história da comunidade e reproduzir informações falsas por diversas vezes. Em entrevista para uma rádio de Araguatins no dia 14 de novembro, ele afirmou que o quilombo se formou em 2023 e disse que deseja fazer uma estrada dentro da comunidade, sem nenhuma consulta, para facilitar o acesso, sendo que os quilombolas têm o rio como via. Além disso, o prefeito tem um discurso que encoraja pessoas não quilombolas a permanecerem no território mesmo findando o prazo de desintrusão determinado pelo Incra. A saída das pessoas não quilombolas é uma determinação legal que garante o bem viver da comunidade quilombola.
O território da Ilha de São Vicente é de usufruto exclusivo dos quilombolas e isso precisa ser respeitado. Conforme o prazo de desintrusão delimitado pelo INCRA, os não quilombolas têm menos de um mês para sair do território. Em meio ao Mês da Consciência Negra, é importante que se conscientizem sobre a importância de fazerem cumprir a Lei, o está postulado na Constituição Federal e o que está sendo orientado pelo INCRA. Apesar da legitimidade da luta por direito quilombola, a comunidade sempre sofreu ataques racistas, algo que se intensificou após a titulação do território, e também ameaças de morte, crimes que ferem a dignidade humana. Isso ocorre porque há anos pessoas não quilombolas têm tido expectativas em possuir lotes dentro do quilombo, incentivadas por autoridades públicas que alimentam falsas esperanças a partir de argumentos inconstitucionais.
A presente Carta vem a público trazer a Memória da Luta de Fátima Barros e dos outros ancestrais do quilombo Ilha de São Vicente, diante do atual contexto histórico, expressar apoio, solidariedade e força à comunidade quilombola da Ilha de São Vicente. As falsas narrativas e todo ataque racista contra o território representam ameaças não apenas à população quilombola, mas também a outras tantas lutas, territórios e comunidades habitantes no Tocantins. Todo o direito à terra e ao Bem Viver para o povo quilombola! Que neste Mês da Consciência Negra possamos acompanhar boas notícias para o Quilombo Ilha de São Vicente! Estamos com vocês.
Assinam essa carta em apoio e solidariedade à comunidade quilombola da Ilha de São Vicente, as seguintes entidades, movimentos sociais e instituições:
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