Por Flavia Horta / ASCOM Arquidiocese de Manaus
Colaboração e Fotos: CPT Regional Amazonas
De 15 a 17 de novembro, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) realizou uma formação com o tema ‘Juristas Populares’ para agentes de base e lideranças dos estados do Amazonas, Roraima e Amapá com o objetivo de fortalecer a articulação junto os órgãos de defesa como o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública Estadual (DPE) a Defensoria Pública da União (DPU) e entidades parceiras na construção de estratégias de defesa dos territórios e das comunidades.
A formação contou com o apoio de Fernando Merloto, Defensor Público do Ministério Público Federal no Amazonas (MPF); Eduardo Sanches, procurador da República do Ministério Público Federal (MPF); Ronilson Costa (da Coordenação Nacional da CPT); Afonso Chagas, professor universitário de Rondônia; e assessoria de Maika Muller.
De acordo com Luís Xavier, coordenação CPT Amazonas, o curso teve como finalidade fortalecer o conhecimento técnico sobre organização social: “O curso nos preparou para elaborar, encaminhar e acompanhar a denúncia e a Justiça. Aprendemos sobre o direitos das comunidades e o direito de cada cidadão como objetivo fomentar essa multiplicação desse conhecimento na base, no assentamento onde o povo está inserido e que já sofreu ataques e agressões, seja por crime ambiental, violência contra pessoa ou ameaça de morte. A mulher também teve destaque na questão do ‘Direito da Mulher’ de se proteger."
"A ideia é manter esse curso permanente no processo de formação dos agentes da Pastoral da Terra, até porque as legislações mudam, os conceitos mudam e por isso deve ser contínuo e constante que o agente do ‘CPT’ tenha formação”, concluiu Luís Xavier.
Por Comunicação CPT Nacional,
com informações da CNBB e Prelazia do Marajó
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) Regional Pará emitiu Nota de Pesar pelo falecimento do bispo emérito da Prelazia do Marajó, Dom José Luís Azcona Hermoso, ocorrido nesta quarta-feira, 20 de novembro de 2024. Dom Azcona tinha 84 anos de idade e estava internado em cuidados paliativos no Hospital Porto Dias, em Belém.
Nascido em Pamplona, na Espanha, Dom Azcona é reconhecido internacionalmente pela luta contra o tráfico humano e contra o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes no Marajó, bem como a devastação ambiental e a pesca predatória na região, uma luta de 37 anos no episcopado, sucedido por Dom José Ionilton Lisboa, atual presidente da CPT.
Confira a nota completa, que também pode ser baixada aqui.
“Se com Ele morremos, com Ele viveremos” (2 Tm 1,11).
Caro Dom Ionilton,
Nós da Comissão Pastoral da Terra do Regional Pará lhe saudamos, e também à toda a Prelazia do Marajó, neste dia em que o bispo emérito Dom Jose Azcona fez a sua Páscoa definitiva. A todo o povo de Deus presente nesta Prelazia – povo marajoara, vida consagrada e padres – estendemos nossos sentimentos de solidariedade e amizade, assim como nossas orações e a esperança do consolo eterno junto de Deus. Somos gratos a Dom Jose pela acolhida e espaço dados à CPT na Prelazia, da mesma forma como também atuou em outras frentes sociais contra a violação da dignidade e dos direitos humanos, revelando verdadeiro amor a Deus e ao povo.
Desejamos que o testemunho e as boas obras de Dom Azcona fecundem as terras marajoaras e alimentem uma fé corajosa e comprometida no coração de cada fiel que habita esta Prelazia.
Com nossos sinceros pêsames,
Comissão Pastoral da Terra
Regional Pará
Belém, 20 de novembro de 2024
Audiência Pública em Goiânia e Missão Territorial em Santa Helena de Goiás contam com participação de comunidades, especialistas convidadas e com divulgação de pesquisa inédita
Nos dias 26 e 27 de novembro, será realizada, em Goiânia e em Santa Helena de Goiás, a Jornada Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida em Goiás, uma iniciativa da Campanha Cerrado e da Comissão Pastoral da Terra Regional Goiás (CPT Goiás), que conta com a participação de pesquisadoras de diversas áreas, ativistas e comunidades do campo.
A jornada conta com duas grandes ações: uma Missão Territorial, no dia 26 de novembro, no Acampamento Leonir Orback, em Santa Helena de Goiás (GO), e, no dia 27, a Audiência Pública intitulada “Os impactos dos Agrotóxicos em Goiás”, na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (ALEGO), em Goiânia.
As atividades são abertas ao público e têm como o objetivo de divulgar e debater os resultados de pesquisas, uma delas inédita, sobre o impacto dos pesticidas na saúde da população do campo em Goiás, além de fazer a oitiva e ampliar o grito de socorro de comunidades que são cotidianamente expostas a várias formas de contaminação por agrotóxicos utilizados nos grandes monocultivos presentes em todas as regiões do estado.
Missão Territorial
A Missão Territorial tem como proposta reunir a comunidade do Acampamento Leonir Orback com especialistas ou estudiosos do assunto, para discutir a realidade local de exposição aos agrotóxicos, refletindo sobre os problemas e possíveis caminhos para seu enfrentamento. Estarão presentes na Fernanda Savicki, da Fundação Oswaldo Cruz, Andreya Gonçalves Costa, professora do Laboratório de Mutação Genética da UFG (LABMUT/UFG) e Jaqueline Pivato, da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida, além de representantes da Campanha Cerrado e CPT Goiás.
Durante a atividade, o LABMUT/UFG irá apresentar, em primeira mão, os resultados de estudo inédito realizado com material coletado na comunidade no último mês de julho. A pesquisa analisou geneticamente amostras de sangue e fluido bucal de moradores da comunidade, identificando os danos genéticos associados à exposição a substâncias agrotóxicas.
O impacto dos agrotóxicos no Acampamento Leonir Orback vem sendo monitorado pela CPT Goiás e Campanha Cerrado desde 2021, a partir das denúncias realizadas pelas famílias locais, que relatam constantes problemas de saúde relacionados à intensa exposição aos produtos aplicados em lavouras de soja e cana de açúcar em propriedades vizinhas. Estudo realizado entre 2022 e 2023, publicado em “Um dossiê sobre agrotóxicos nas águas do Cerrado”, da Campanha Cerrado, revelou a contaminação da água da comunidade com pelo menos 5 diferentes tipos de agrotóxicos.
Audiência Pública
Para debater a problemática com o conjunto da sociedade, em especial com autoridades do estado, a caravana será finalizada com a Audiência Pública “O Impacto dos Agrotóxicos em Goiás”, no Auditório Francisco Gedda, na Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (ALEGO).
A Audiência será presidida pela deputada estadual Bia de Lima e a mesa será composta por Fernanda Savicki, da Fundação Oswaldo Cruz, Jaqueline Pivato, da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida, Miller Caldas Barradas, pesquisador do Laboratório de Mutação Genética da UFG (LABMUT/UFG), Leila Lemes, da CPT Goiás, Laureana Fernandes, do Acampamento Leonir Orback e outros convidados.
A audiência contará ainda com a presença de comunidades do campo de diversas regiões do estado, que levarão os seus depoimentos sobre a questão dos agrotóxicos para a discussão.
SERVIÇO
Jornada Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida em Goiás
26 e 27 de novembro - Santa Helena de Goiás e Goiânia (GO)
PROGRAMAÇÃO:
26 de novembro - Santa Helena de Goiás (GO)
Missão Territorial
9:00 - Roda de Conversa sobre os impactos dos agrotóxicos na vida das comunidades em Goiás - No Acampamento Leonir Orback (Zona Rural)
14:00 - Entrega da Premiação do Edital de Vídeos Inéditos da Agro é Fogo Atendimento à imprensa - No Acampamento Leonir Orback (Zona Rural)
15:00 - Ato de solidariedade na cidade com entrega de alimentos (Sta Helena)
27 de novembro - Goiânia (GO)
Audiência Pública: Impactos dos agrotóxicos em Goiás
Local: Auditório Francisco Gedda - Assembleia Legislativa do Estado de Goiás,
7:30 - Café da manhã
9:00 às 12:00 - Audiência Pública
Contatos para imprensa:
Marilia da Silva - Assessoria CPT Goiás - 62 99940-4656
Heloisa Sousa - Assessoria CPT Nacional - 62 9252-743
Leia na íntegra a carta assinada por 60 organizações e movimentos sociais de todo o Brasil
Araguatins, município localizado na região norte do Tocantins, tem como seu fundador Vicente Bernardino Gomes, que chegou na região em 1868, trazendo trabalhadores escravizados que havia adquirido como pagamento de uma dívida, entre eles: Julião Barros, Sarafina Benedita Batista e seu filho Henrique Julião Barros - respectivamente, bisavós e avô paterno de Salvador Batista Barros, falecido griô (ancião) da comunidade quilombola da Ilha de São Vicente. O fragmento dessa história está registrado no livro “De São Vicente a Araguatins: Cem anos de história”, escrito e publicado em 1970 por Leônidas G. Duarte. Depois da abolição da escravatura, em 1888, os ex-escravizados receberam a terra como doação e começaram a povoar o território, formando o quilombo Ilha de São Vicente. Desde então, a família Barros ocupa ancestralmente a ilha, território de convívio de diferentes gerações.
Em 2010, a comunidade sofreu um despejo ilegal. No mesmo ano, a comunidade recebeu, da Fundação Cultural Palmares, a certificação de autodefinição como remanescentes de quilombo. Em seguida, o Incra - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - passou a dar andamento às ações de identificação histórica, antropológica da comunidade, que culminou na titulação definitiva. A luta pela regularização do quilombo se tornou conhecida internacionalmente há mais de 20 anos, a partir do trabalho da liderança quilombola Fátima Barros, que ancestralizou, mas inspirou a defesa de direitos quilombolas em todo o país.
De acordo com o artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT da Constituição Federal, "aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos". Dessa forma, em 20 de novembro de 2023, o presidente Lula entregou ao quilombo Ilha de São Vicente o Título de Concessão de Direito de Uso sobre a Terra. Cinco dias depois, o título foi entregue dentro do próprio território, sendo dedicado aos ancestrais que morreram sonhando com a regularização. O documento entregue por Edmundo Costa, superintendente do Incra no Tocantins, informa que a comunidade quilombola é a única responsável legal pelo território.
O quilombo foi reconhecido pelo Governo, mas parte da população araguatinense, embasada em comportamentos de autoridades regionais, tem insistido em desrespeitar a história desse povo. O prefeito de Araguatins, Aquiles da Areia, incentiva o desrespeito contra o quilombo ao negar e duvidar da história da comunidade e reproduzir informações falsas por diversas vezes. Em entrevista para uma rádio de Araguatins no dia 14 de novembro, ele afirmou que o quilombo se formou em 2023 e disse que deseja fazer uma estrada dentro da comunidade, sem nenhuma consulta, para facilitar o acesso, sendo que os quilombolas têm o rio como via. Além disso, o prefeito tem um discurso que encoraja pessoas não quilombolas a permanecerem no território mesmo findando o prazo de desintrusão determinado pelo Incra. A saída das pessoas não quilombolas é uma determinação legal que garante o bem viver da comunidade quilombola.
O território da Ilha de São Vicente é de usufruto exclusivo dos quilombolas e isso precisa ser respeitado. Conforme o prazo de desintrusão delimitado pelo INCRA, os não quilombolas têm menos de um mês para sair do território. Em meio ao Mês da Consciência Negra, é importante que se conscientizem sobre a importância de fazerem cumprir a Lei, o está postulado na Constituição Federal e o que está sendo orientado pelo INCRA. Apesar da legitimidade da luta por direito quilombola, a comunidade sempre sofreu ataques racistas, algo que se intensificou após a titulação do território, e também ameaças de morte, crimes que ferem a dignidade humana. Isso ocorre porque há anos pessoas não quilombolas têm tido expectativas em possuir lotes dentro do quilombo, incentivadas por autoridades públicas que alimentam falsas esperanças a partir de argumentos inconstitucionais.
A presente Carta vem a público trazer a Memória da Luta de Fátima Barros e dos outros ancestrais do quilombo Ilha de São Vicente, diante do atual contexto histórico, expressar apoio, solidariedade e força à comunidade quilombola da Ilha de São Vicente. As falsas narrativas e todo ataque racista contra o território representam ameaças não apenas à população quilombola, mas também a outras tantas lutas, territórios e comunidades habitantes no Tocantins. Todo o direito à terra e ao Bem Viver para o povo quilombola! Que neste Mês da Consciência Negra possamos acompanhar boas notícias para o Quilombo Ilha de São Vicente! Estamos com vocês.
Assinam essa carta em apoio e solidariedade à comunidade quilombola da Ilha de São Vicente, as seguintes entidades, movimentos sociais e instituições:
Acesse a Carta em PDF e compartilhe!
82% das pessoas resgatadas do trabalho escravo são pretas ou pardas, conforme números da campanha permanente da CPT “De Olho Aberto para Não Virar Escravo”
Trabalhadores da Cana Juazeiro-BA17. Foto: João Zinclar
Instituído em novembro de 2011, por meio da Lei Nº 12.519, o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra rememora a data do falecimento de Zumbi dos Palmares. Líder do Quilombo dos Palmares durante o período do Brasil colonial, Zumbi é hoje reconhecido como ícone da resistência negra à escravidão e pela prática da cultura africana no Brasil.
Contudo, na contramão das expectativas que a figura do líder suscita, o trabalho escravo não deixou de ser uma realidade no Brasil. Números atualizados registrados pela Campanha nacional permanente da CPT “De Olho Aberto para Não Virar Escravo” mostram que, em 2023, quase 3.500 pessoas foram encontradas em situação de trabalho escravo. Delas 3.288 foram resgatadas em ações coordenadas pelo Ministério do Trabalho.
Os dados da Campanha apontam ainda que, desde que se iniciou o registro, em 1995, até 2024, a pecuária tem sido o setor de atividade com o maior número acumulado de casos identificados de trabalho escravo – 2.115, ao todo. Em seguida, figuram as lavouras - com 910 casos, incluindo entre outras culturas de grãos, de frutas, canaviais - e as carvoarias (501). Nos últimos 10 anos, o número de casos em lavouras passou a ultrapassar os da pecuária.
Perfil dos trabalhadores
Trabalhadores negros, nordestinos e com baixa escolaridade são os principais entre os resgatados do trabalho análogo ao escravo. Nos últimos dez anos, mais de 34% das vítimas resgatadas de trabalho escravo não haviam completado o 5º ano e a faixa etária mais afetada foi de jovens homens de 18 a 24 anos. Além disso, pelo menos 53% do total de trabalhadores é da região Nordeste do país, segundo dados do Registro Nacional do Seguro-Desemprego analisados pela CPT.
Carvoaria Buritirama (BA). Foto: João Zinclar.
Quando é traçado o perfil racial, entre os anos de 2016 e 2023, 82,0% das pessoas resgatadas são negras – que se autodeclaram pretas ou pardas. Nesse período, mais de 12 mil pessoas foram resgatadas do trabalho escravo no país. Dessas, 65,8% se declararam pardas, 16,8% pretas, 16,0% brancas, 1,4% indígenas e 0,4% como amarelas.
Na visão de Cecília Amália Cunha Santos, procuradora do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Araguaína (TO), esses números demonstram a herança colonialista do país e a reprodução da lógica escravocrata entre a elite brasileira. “A gente não vive mais no sistema colonial, oficialmente, mas as ideias da colonialidade continuam nas nossas relações. Então a percepção de que as pessoas negras não são dotadas de dignidade por parte dos patrões e empregadores, ainda está entranhada nas nossas elites”, explica.
A procuradora destaca ainda a vulnerabilidade da população negra decorrente desse passado escravocrata e do sistema racista ainda existente. “Do mesmo jeito que as pessoas brancas têm um acúmulo de privilégios, as pessoas negras, ao longo dos anos, passam por situações sociais, acumuladas por gerações, de déficit de acesso a direitos básicos, que acabam colocando essas pessoas historicamente numa situação de vulnerabilidade, mais expostas ao trabalho escravo. São tanto fatores sociais, desse histórico de acúmulo de violações aos direitos, quanto essa percepção colonialista, que ‘coisifica’ as pessoas negras”.
Trabalho escravo no ambiente doméstico
No recorte de gênero, os dados mostram que, entre 2016 e 2023, 10.349 homens foram resgatados do trabalho escravo, enquanto que as mulheres correspondem ao total de 972 vítimas. Deste último número, as mulheres negras representam a maior porcentagem de resgatadas – isto é, 765 pessoas ao todo, quase 80%.
Brígida Rocha, agente pastoral da CPT regional Maranhão e integrante da Campanha “De Olho Aberto para não Virar Escravo”, destaca a manutenção do trabalho escravo em ambiente doméstico, que acomete principalmente as mulheres negras. “Os resgates que já aconteceram são principalmente de pessoas negras, algumas idosas que não tiveram acesso à educação, não têm contato com a família, não criaram novos relacionamentos, não tiveram acesso à saúde, não tiveram direitos previdenciários respeitados, têm fraudes em seus nomes ou não têm documento civil organizado”, detalha.
“No caso das trabalhadoras escravizadas, além da questão racial, elas são também atravessadas pela questão de gênero e por serem vistas nesse lugar do trabalho de cuidado não remunerado”, evidencia Cecília. Ela também explica que esses casos de trabalho doméstico decorrem da extrema vulnerabilidade financeira de famílias marginalizadas, que oferecem o trabalho das filhas, ainda crianças, em troca de estudos e acolhimento – que nunca se concretizam e culminam em trabalhos compulsórios.
Diversas entidades se reuniram em junho na campanha #SôniaLivre, em defesa da liberdade de Sônia. Foto: Divulgação
O caso de Sônia Maria de Jesus, encontrada em situação de trabalho escravo na residência do desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC), Jorge Luiz de Borba, exemplifica tantos outros casos de mulheres mantidas em situação de trabalho escravo doméstico. Resgatada pelo Grupo de Fiscalização coordenado pelo Ministério do Trabalho em junho do ano passado, Sônia passou 40 dos seus 50 anos a serviço da família Borba.
Mulher negra e com profunda deficiência auditiva, Sônia nunca recebeu salário, assistência médica ou instrução formal. Além disso, ela sofreu violências físicas e vivia em situação degradante em um quarto na residência. Sônia foi tirada muito cedo da sua família biológica e mantida incomunicável durante todos esses anos.
Em setembro de 2023, com autorização do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Mauro Campbell, avalizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça, ela foi levada de volta à residência onde passou décadas cativa e onde permanece até hoje, e impedida de se relacionar com seus familiares. Em muitas histórias semelhantes, a defesa apresentada pelos exploradores tem sido a mesma: para negar qualquer relação de trabalho com a sua empregada, usam a narrativa de que essa mulher era “como filha da família”.
A ação da CPT
Fundada em junho de 1975, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) surgiu da necessidade de denunciar a desigualdade e violência no campo no Brasil. A primeira denúncia de trabalho escravo foi realizada em outubro de 1971, por meio da carta pastoral "Uma Igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social", escrita pelo bispo da prelazia de São Félix do Araguaia (MT), dom Pedro Casaldáliga, um dos fundadores da Pastoral.
Desde 1995, por meio da Campanha nacional “De Olho Aberto para Não Virar Escravo”, a CPT trabalha nas frentes de acolhimento e apoio às vítimas do trabalho escravo e busca de alternativas, na denúncia de empregadores que utilizam mão de obra escrava, além de monitorar e cooperar para o aprimoramento de políticas públicas visando a erradicar o trabalho escravo.
“A CPT participa do fluxo de atendimento a vítimas do trabalho escravo, hoje formalizado em nível nacional, desde a acolhida aos trabalhadores e trabalhadoras, o registro de suas denúncias, as articulações para que ocorram as fiscalizações, a sistematização de dados e a elaboração de materiais para processos formativos e informativos. Nós conseguimos elevar essa capacidade de trabalhadores, trabalhadoras e da sociedade de refletirem sobre as causas culturais da escravidão e, também, de pensar nas estratégias de combate, a exemplo do que a gente tem feito junto a alguns municípios com forte incidência do problema, por meio da Rede de Ação Integrada para Combater a Escravidão – o programa Raice”, conta Brígida.
Em abril deste ano, durante o lançamento da publicação “Conflitos no Campo Brasil 2023”, a Comissão Pastoral da Terra anunciou a ação de sustentabilidade “Chega de Escravidão”, de modo a levantar fundos para seguir realizando sua missão no apoio à autonomia dos povos e comunidades em seus territórios. Entre no site www.chegadeescravidao.org.br e saiba mais sobre como fazer parte desta ação.
*os dados da Campanha “De Olho Aberto para Não Virar Escravo”, constantemente atualizados, são de acesso aberto. Para este texto, foram utilizados dados do dia 14.11.2024
Com informações do Tapajós de Fato e Conselho Indígena Tupinambá do Baixo Tapajós (CITUPI)
Fotos: Marta Silva (Tapajós de Fato), Leonardo Milano e Pedro Alcântara (CITUPI)
Edição: Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional)
O eco do grito de cerca de 400 indígenas contra o projeto da Ferrogrão ressoou nas águas do rio Tapajós no último sábado (16), durante o 7º Grito Ancestral. Do alto dos pedrais da ilha de Ilagé, localizada na aldeia Jacaré, os manifestantes paralisaram de forma pacífica por cerca de seis horas o transporte fluvial no rio Tapajós, em Santarém, no Pará.
“Nós estamos aqui […], para reivindicar a defesa do território, a defesa de nossas vidas”, reafirma Raquel Tupinambá, coordenadora do Conselho Indígena Tupinambá.
Liderança indígena, Raquel Tupinambá, denuncia a falta de consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas do baixo Tapajós/ Foto: Marta Silva (Tapajós de Fato)
O grito esse ano denunciou o projeto de construção da EF-170, a Ferrogrão, corredor ferroviário de quase 1000 km que pretende ligar a cidade de Sinop (MT) ao distrito de Miritituba, em Itaituba (PA), para ampliar o corredor logístico do agronegócio pelos rios da Bacia Amazônica.
A bordo dos barcos, barcaças e bajaras que trafegam pelo rio, representantes dos povos hastearam faixas e bandeiras em repúdio ao projeto que cortará ao menos seis terras indígenas, onde vivem 2,6 mil pessoas, além de 17 unidades de conservação. Além disso, o aumento do escoamento da produção de grãos prevê a intensificação do volume de exportação de grãos pelo rio Tapajós.
O ato reuniu povos Tupinambá, Munduruku, Arapiun, Kumaruara, Jaraqui, Tapajó, Tapuia, Apiaka, Kayapó, e de comunidades ribeirinhas do Baixo Tapajós e de Montanha e Mangabal, que durante os dias 15 a 17 participaram do 7o Grito Ancestral, unindo forças para protestar contra o “projeto de morte” da Ferrogrão, mas também para se fortalecerem em sua espiritualidade e ancestralidade.
Comunidades ribeirinhas também apoiaram a manifestação contra os grandes projetos / Foto: Marta Silva (Tapajós de Fato)
Os rituais entoados nesse espaço sagrado emanaram a força da ancestralidade em defesa da vida: rio, água, povo. Os protestos dos povos indígenas deste fim de semana demonstram a importância de escutar as vozes dos povos originários, que dependem diretamente do equilíbrio ambiental para sua sobrevivência.
“[…] Nós vivemos uma pressão muito grande aqui dos comboios de balsa que passam todo dia no nosso território, carregados com grãos […] Então, nesse sentido, nós temos chamado a atenção, porque está impactando diretamente nós, que moramos aqui, e agora, com a Ferrogrão, que é um grande projeto, e vai aumentar ainda mais a quantidade de soja que vai vir a ser transportada, aumentando a pressão sobre os nossos territórios, sobre nossos rios”, relata Raquel Tupinambá.
A Aliança contra a Ferrogrão reúne 39 movimentos e organizações da sociedade civil, incluindo a Comissão Pastoral da Terra (CPT) Regional Pará/Equipe Itaituba, que esteve presente apoiando o ato.
O ato deste ano marca o 7º ano do grito, que pelo 2º ano consecutivo acontece nos pedrais da Ilha de Ilagé, na aldeia Jacaré, dentro da Reserva Tapajós-Arapiuns (PA), no território indígena Tupinambá, local sagrado para os indígenas por ser um berço de reprodução de várias espécies aquáticas. Esse espaço sagrado corre riscos reais de ser destruído se houver a necessidade de dragagem do rio Tapajós.
“Há uma possibilidade real de escavação e explosão dos pedrais, que são espaços encantados, espaços de reprodução dos peixes. Isso vai representar para nós que vivemos do peixe, um grande prejuízo. Então, nesse sentido, nós estamos aqui também para reivindicar, para chamar a atenção do poder público, dos governantes, para que nossos direitos sejam respeitados. Chega de violação de direitos, e é por isso que nós estamos aqui, para dizer não à Ferrogrão”, enfatiza Raquel.
Acompanhe o que já publicamos sobre este caso:
27.06.2024 - Representantes de povos indígenas e comunidades tradicionais emitem Carta Aberta em protesto contra a Ferrogrão
31.07.2024 - Por que a sociedade civil está rompendo com o GT Ferrogrão?
24.10.2024 - Conselho Nacional de Direitos Humanos recomenda ao Governo suspensão do projeto Ferrogrão
08.11.2024 - Estratégias de destruição: Ferrogrão e outras ferrovias
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Massacres no campo
#TelesPiresResiste | O capital francês está diretamente ligado ao desrespeito ao meio ambiente e à vida dos povos na Amazônia. A Bacia do Rio Teles Pires agoniza por conta da construção e do funcionamento de uma série de Hidrelétricas que passam por cima de leis ambientais brasileiras e dos direitos e da dignidade das comunidades locais.