Por: Assessoria de Comunicação | MPF-PA
Após denúncia do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal condenou o fazendeiro João Luiz Quagliato Neto, proprietário da Fazenda Brasil Verde, localizada em Sapucaia (PA), e o gerente da propriedade, Antônio Jorge Vieira, pelos crimes previstos no artigo 149, do Código Penal (redução a condição análoga à de escravo) e artigo 207, §1º e §2º do Código Penal (aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional). Eles foram condenados a 7 anos e 6 meses de reclusão, além de multa. O MPF pretende recorrer para aumentar as penas.
A sentença decorreu da condenação do Estado brasileiro na Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Fazenda Brasil Verde e foi resultado de mudança jurisprudencial que interpretou como imprescritível o crime de redução à condição análoga à de escravo. Em suma, a Corte declarou a responsabilidade do Brasil por violar o direito a não submissão à escravidão e ao tráfico de pessoas (em transgressão ao artigo 6.1 do Pacto de San José da Costa Rica) e impôs a obrigação de investigar, processar e eventualmente sancionar as graves violações de direitos humanos ocorridas na citada propriedade rural.
Em 2001, foi instaurado inquérito policial para apurar os fatos e os autos tramitaram, inicialmente, perante a 2ª Vara da Justiça Federal de Marabá, sendo posteriormente declinados ao Juízo da Comarca de Xinguara (PA), ocasião em que o processo teria desaparecido sem que fosse restaurado. Contudo, a Corte determinou a reconstituição do processo, ensejando assim a instauração de procedimento pelo MPF e que culminou na sentença em tela.
Condição análoga à de escravo — Conforme fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), feita em março de 2000 na Fazenda Brasil Verde, 85 trabalhadores estavam sem receber os seus pagamentos, sofriam restrição da liberdade de locomoção e eram submetidos a constante vigilância armada. Além disso, suas carteiras de trabalho haviam sido retidas e não tinham acesso a qualquer direito trabalhista, entre outras irregularidades. A fiscalização só ocorreu após dois trabalhadores, ambos menores de idade, fugirem da fazenda e relatarem a prática do trabalho em condições análogas à de escravo e a ocorrência de violência praticada contra os empregados do local à Polícia Federal.
Segundo as investigações, os trabalhadores eram alojados em barraco improvisado que não apresentava mínimas condições de habitabilidade. Eles se aglomeravam em redes e a água por eles utilizada para fins de higiene pessoal e consumo era coletada de um córrego próximo ao alojamento, sendo também utilizada pelos animais, imprópria, portanto, para o uso. Eles ainda tinham que fazer suas necessidades fisiológicas ao relento, pois não havia instalações sanitárias adequadas.
Indo além, os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), indispensáveis à execução segura das atividades, não eram fornecidos gratuitamente. Quando disponibilizados, eram descontados do pagamento devido aos trabalhadores, assim como os próprios instrumentos de trabalho (a exemplo de foices).
Por fim, havia na Fazenda Brasil Verde a chamada servidão por dívida, uma vez que os empregados, nessas circunstâncias, se viam compelidos a continuar trabalhando indeterminadamente por conta dos vínculos feitos pelos débitos contraídos com o empregador. As dívidas geravam, ainda, restrições de locomoção dos trabalhadores por meio de constante vigilância armada. De acordo com levantamentos feitos pelo MPF, a Fazenda Brasil Verde agiria com o mesmo modus operandi desde o fim da década de 1980.
Acompanhe outras notícias do caso: https://www.cptnacional.org.br/publicacoes/noticias/trabalho-escravo/5082-justica-aceita-denuncia-do-mpf-por-trabalho-escravo-na-fazenda-brasil-verde-pa
A classe trabalhadora brasileira vem sofrendo nos últimos anos condições de trabalho e de vida cada vez mais precarizadas. Não por acaso, é nessa conjuntura que muitas pessoas têm sido submetidas a situações desumanas de trabalho, obrigadas a trabalharem em condições degradantes, sem direitos básicos. Isso tem nome: trabalho escravo.
Em 2022, de acordo com os dados da Campanha Nacional da CPT contra o trabalho escravo, mais de 2.500 pessoas foram resgatadas de trabalho escravo no Brasil, sendo 2.218 somente no campo, onde 207 casos foram identificados. Este é o maior número em 10 anos. Em comparação à média dos 8 anos anteriores, esses números apresentam uma multiplicação por mais de dois. Situação confirmada nos primeiros 100 dias de 2023: já foram identificados 67 casos e resgatadas 1.179 pessoas, sendo 962 só no meio rural. Alguns casos ganharam repercussão nacional na mídia, chamando a atenção da população e suscitando questionamentos a respeito da terrível exploração que está por trás da produção de vários itens que chegam às nossas mesas.
Em operação realizada em Senador José Porfírio, no sudoeste do Pará, foram resgatados cinco trabalhadores por suposta submissão a condições semelhantes às da escravidão. Entre eles, uma era menor de idade, com 14 anos. A equipe de fiscalização encontrou, ainda, uma criança de um ano e quatro meses, filha de uma das trabalhadoras resgatadas.
Foto: MPT-RS
Diante das denúncias de trabalho escravo na colheita de uva em Bento Gonçalves (RS), a CPT-RS vem a público se manifestar, em nota, sobre o sistema escravagista sempre escondido na Serra Gaúcha envolvendo mais de 200 trabalhadores baianos.
Alguns dos trabalhadores ouvidos pelo regional, muitos jovens, indicaram aliciamentos com promessas de salário, hospedagem e alimentação. As denúncias estão sendo apuradas pelos Ministério do Trabalho e Emprego e Ministério Público do Trabalho e polícias Federal,
A CPT-RS também reforça o seu compromisso junto aos trabalhadores e exige apuração de todas as possíveis irregularidades e ilegalidades cometidas pelas vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton. "É preciso combater com firmeza todo tipo de exploração do trabalho humano. Não podemos aceitar que o progresso de uma cidade aconteça às custas da violência e da opressão", diz trecho da nota.
Leia na íntegra:
Após enfrentar uma ação judicial por prestar serviços financeiros a produtores de combustíveis fósseis, o banco francês BNP Paribas enfrenta agora uma nova demanda questionando o seu apoio à promoção do desmatamento, do trabalho escravo e de violações a direitos de povos originários no Brasil
Foto: Getty Images
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Campanha de Olho Aberto Para não Virar Escravo e 6ª Semana Social Brasileira, lançam nota em referência ao Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, que tem como o marco a Chacina de Unaí (MG), ocorrida em 28 de janeiro de 2004
Imagem João R. Ripper