Com informações e imagens do Coletivo Da'uk
Indígenas do povo Munduruku, após 14 dias de bloqueio da rodovia BR-230 em Itaituba, no sudoeste do Pará, foram recebidos nesta terça-feira (15) pelo ministro Gilmar Mendes no Supremo Tribunal Federal (STF). A principal pauta é a contestação à conciliação instituída pelo Tribunal para discutir a aplicação da Lei nº 14.701/2023, recentemente aprovada pelo Congresso Nacional. Essa lei trata da regulamentação das demarcações de terras indígenas e surgiu em resposta à decisão do STF que considerou inconstitucional o chamado "marco temporal".
Durante a audiência, os Munduruku fizeram críticas ao STF por negociar com representantes do agronegócio e da mineração sem a participação efetiva de povos indígenas afetados. A comitiva entregou ao ministro uma carta assinada por seis organizações do povo Munduruku. O documento destaca que o STF tem realizado “reuniões fechadas, sem consulta livre, prévia e informada, enquanto processos de demarcação seguem ameaçados ou paralisados”.
Os Munduruku também se posicionaram contra a proposta de Gilmar Mendes, considerada ilegítima pelo movimento indígena, que pretende substituir a lei 14.701/23. Em troca de extinguir o marco temporal, a proposta do decano do Supremo impõe obstáculos no processo de demarcação, indenização a fazendeiros pelo valor da terra nua, uso da Polícia Militar em despejos de retomadas e prevê que projetos considerados de “relevante interesse público da União” possam ser implementados em terras indígenas mesmo sem o consentimento das comunidades afetadas.
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se retirou da conciliação em agosto de 2024, apontando falta de paridade nas negociações. Um dos principais questionamentos foi a possibilidade de decisões por maioria de votos, o que colocava os indígenas em desvantagem frente a representantes do agronegócio, governos estaduais e Congresso Nacional.
Sem os indígenas, os trabalhos continuam com representantes do agronegócio, dos governos estaduais, do governo federal – representado pela Advocacia Geral da União (AGU), pela Fundação Nacional do Povos Indígenas (Funai) e do Ministério dos Povos Indígenas, e do Congresso.
Ainda na carta entregue ao ministro, os Munduruku defenderam que decisões sobre terras indígenas devem respeitar a Constituição e o direito à consulta previsto na Convenção 169 da OIT. “Não reconhecemos essa mesa de negociação sem nossa presença ou consentimento!”, diz a carta. Apesar de os indígenas só terem sido recebidos após bloquearem a BR-230 por duas semanas, o ministro Gilmar Mendes afirmou que as portas do STF e do gabinete estão abertas para o diálogo com os povos indígenas.
“Foi uma dificuldade conseguir essa reunião. Foram dias e noites pegando sol e chuva, paralisando o transporte de cargas na rodovia. Foi preciso mexer no bolso do agronegócio para conseguirmos que fôssemos ouvidos no STF”, critica Alessandra Korap, liderança Munduruku.
A reunião foi concluída sem compromissos assumidos em relação às demandas apresentadas, segundo os indígenas, mas o ministro anunciou que levará em consideração os argumentos dos Munduruku nas próximas etapas do processo de conciliação.
Os Munduruku, junto com outras lideranças indígenas, entendem que a nova legislação desrespeita direitos originários e perpetua ameaças aos seus territórios. O encontro com Gilmar Mendes sinaliza um esforço dos povos indígenas para serem ouvidos diretamente pelos ministros da Corte, buscando garantir que seus direitos constitucionais sejam respeitados no processo de mediação e julgamento.
Saúde Indígena
Ainda nesta terça-feira, representantes do Povo Munduruku do Alto e Médio Tapajós participaram de uma reunião com o Secretário de Saúde Indígena (SESAI), realizada em Brasília/DF. O encontro teve como principal objetivo discutir a situação da saúde indígena nos territórios Munduruku e apresentar demandas urgentes da comunidade. A mobilização também contou com uma ocupação na sede da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
Entre as reivindicações apresentadas estão:
- Participação da SESAI na equipe de pós-desintrusão;
- Adoção de medidas eficazes para o combate à contaminação por mercúrio;
- Ampliação e fortalecimento do sistema de saúde indígena na região do Médio e Alto Tapajós;
- Reforço no orçamento anual destinado ao Distrito Sanitário Especial Indígena do Rio Tapajós (DSEI-RT);
- Melhoria na infraestrutura das Casas de Saúde Indígena (CASAI);
- Elaboração de planos para garantir segurança alimentar e acesso à água potável para o povo Munduruku;
- Inclusão sistêmica dos saberes medicinais tradicionais Munduruku, com o devido respeito e reconhecimento, buscando o equilíbrio entre as práticas tradicionais e a ciência médica ocidental.