por Vívian Marler (Comunicação do Regional Norte 2),
com informações de Laíse Carmo (ASCOM da Arquidiocese de Palmas) e Ludimila Carvalho (CPT Regional Araguaia-Tocantins)
Entre os dias 5 e 6 de setembro, aconteceu em Palmas/TO o ‘V Encontro de Ecoteologia’. Estiveram presentes cerca de 50 pessoas representando os estados do Tocantins, Pará, Amazonas e Mato Grosso.
O evento, realizado pela Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM) em parceria com o Regional Norte 3 e Arquidiocese de Palmas, foi um convite para conversão ecológica proposta pela Encíclica Laudato Si, do Papa Francisco, levando os presentes a refletirem sobre a atual realidade da natureza e as ações práticas que cada ser humano pode desenvolver para ajudar na resistência e sobrevivência da sociobiodiversidade, ameaçada pelas queimadas, desmatamento e violências. O encontro foi a oportunidade de fazer com que os presentes tivessem a oportunidade de compreender melhor a realidade atual do país.
A CPT Regional Araguaia-Tocantins apresentou a oficina “Olhares de ecopolítica e ecoprofecia no Cerrado Amazônico”, com o frei Xavier Plassat (da coordenação colegiada da Campanha De Olho Aberto para Não Virar Escravo) e Ludimila Carvalho (da Coordenação regional), destacando as realidades que as famílias no campo enfrentam e uma reflexão crítica sobre a situação da nossa casa comum.
A equipe compartilhou as realidades de três comunidades, dentre as dezenas acompanhadas no dia a dia do regional, nos municípios de Barra do Ouro, Filadélfia e Nova Olinda, comunidades marcadas pelos danos do avanço e a constante e violenta pressão do agronegócio, intensificado pelo o alinhamento do Estado, tanto através da truculência da Patrulha Rural quanto de forma institucional, como o PL 1199/23 que pretende transferir as terras da União para o Estado do Tocantins, bem como a tendenciosa Lei de Terras do Tocantins, ambos promovem o sucateamento da reforma agrária e a grilagem institucionalizada.
Há também a evasão das juventudes, pela carência de alternativas de vida, vulnerabilidades e migrações de risco propícias ao aliciamento e ao trabalho escravo. Mesmo nestes contextos, a Ecoprofecia são as formas de resistência que essas populações tradicionais opõem ao avanço da soja sobre elas, como a Articulação Camponesa, a força das mulheres construindo alternativas de vida digna e a permanência nos territórios.
Comunidade Tauá / Município de Barra do Ouro
As 20 famílias posseiras e 130 famílias acampadas têm a tradicionalidade comprovada através de Laudo antropológico elaborado do MPF. Ocupam parte de uma área da União, há décadas. Dos 20.000 ha, 30% foi indevidamente regularizada pelo GETAT. A comunidade sofre com os impactos do desmatamento, envenenamento, isolamento, destruição da cultura e insegurança na terra causada pelas insistentes tentativas de grilagem e avanço do agronegócio através dos monocultivos e pecuária, comandadas pelo grupo empresarial Binotto, usando inclusive a violência: pistolagem, ameaças contra as pessoas, agressões, destruição de roças, destruição de casas. Mas há uma força matriarcal presente na comunidade, personificada na emblemática dona Raimunda, que inspira e impulsiona as mulheres da comunidade na resistência e permanência no território, produzindo, denunciando as violências. A comunidade enfrenta o racismo estrutural e ambiental e firma sua identidade tradicional ligada às raízes afro-brasileiras no modo de vida, nas celebrações e ritos ancestrais.
Comunidade Grotão / município de Filadélfia
Com 21 famílias, a Comunidade Quilombola ocupa 40% do território reivindicado (830 ha dos 2.096 ha do território identificado e delimitado). Com a recente desapropriação de um dos lotes, houve um avanço na conquista da terra. A comunidade possui um sistema de produção bem consolidado e tradicional e vem resistindo às investidas do capital.
Assentamento Remansão / município de Nova Olinda
Criado em 2001, o assentamento hoje conta com cerca de 50 famílias, mas com alta rotatividade e migração para o trabalho fora da região. Pesquisa da CPT/RAICE identificou os problemas principais que elevam a migração temporária ou permanente das famílias, e a partir daí foi um trabalho de construção de alternativas de vida digna junto à comunidade, como o projeto "A esperança que vem do Cajueiro". Existe participação efetiva das mulheres, de forma organizada: pequenos projetos são realizados com apoio do fundo Casa para reforçar a renda a partir do corte e costura. No entanto, todos esses projetos foram interrompidos pela crescente violência no campo tocantinense, que vitimou o presidente da associação do assentamento (Cícero Rodrigues de Lima), assassinado no mês de junho, um crime até o momento sem respostas das investigações da Polícia Civil.
Durante o Encontro, também aconteceram outras mesas redondas com a participação de representantes da Amazônia como Mariana Melo (Pró-reitora da UniCatólica), Elisângela Soares (representante da Faculdade Católica do Amazonas) e Dom Pedro Brito Guimarães (vice-presidente da REPAM/Brasil), que ressaltaram a importância de debater sobre as mudanças climáticas e o desenvolvimento de atitudes que contribuam com o cuidado com da Casa Comum.
Nas temáticas Ecoprofecia e Ecopolítica, ministradas pelos professores Luís Cláudio, da CPT Mato Grosso, e Ricardo Castro, da Faculdade Católica do Amazonas, foi destacada a importância da dignidade da população que sofre, das problemáticas entre a agricultura familiar e agronegócio, e a necessidade de um futuro melhor para o nosso país, principalmente às comunidades que vivem e dependem do campo.
Ao final do encontro aconteceram as partilhas das oficinas, avaliação geral do encontro e a benção de envio dada por Dom Pedro Brito Guimarães, vice-presidente da REPAM- Brasil.
A parceria entre as Pastorais do Campo e a Universidade Federal de Goiânia (UFG), realiza intercâmbio entre os conhecimentos acadêmicos e as realidades dos territórios enriquecendo a luta por direitos
Por Cláudia Pereira | APC
O Curso de Especialização em Direito Agrário, fruto da parceria entre a Articulação das Pastorais do Campo e a Universidade Federal de Goiás (UFG), tem sido um importante instrumento na luta pela reforma agrária e na defesa dos direitos dos povos do campo, florestas e das águas. O convênio firmado pela Faculdade de Direito e com o Programa de Pós-Graduação em Direito Agrário (PPGDA) da UFG e as Pastorais, iniciou em 2016 e já formou aproximadamente 100 agentes de pastorais.
A especialização, que é divida em módulos, está em sua terceira turma, formada por 40 agentes de pastorais, de várias regiões do país. Neste semestre os agentes estarão reunidos de 11 a 25 de setembro em Luziânia (GO), no Centro de Formação Vicente Cañas. É um momento de intercâmbio de conhecimentos acadêmicos e temáticas relacionadas às realidades dos territórios. Uma equipe pedagógica composta por representação da coordenação de cada pastoral acompanha a turma e colabora com as avaliações e diálogos entre a Universidade, professores e alunos.
Marline Dassoler, missionária do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), conta que desde a primeira turma o curso foi aperfeiçoando e fortalecendo os processos de formação. No primeiro intercâmbio a academia conheceu os enfrentamentos das bases e as necessidades de ferramentas para embasar a luta dos povos. “Na primeira e na segunda turma, não tínhamos muitos operadores do direito, não tinha muita assessoria, havia mais pessoas militantes e agentes da atuação. Nessa terceira turma, percebemos uma mudança de perfil, com mais jovens, mulheres com formação específica na área de direito”, analisa Marline que compõe a equipe pedagógica.
A especialização direciona os conhecimentos da base jurídica e os alunos apontam as realidades dos territórios. O intercâmbio amplia os conhecimentos sobre a Regularização Fundiária e as pautas transversais que envolvem temas da Amazônia legal, do Cerrado e as violações dos territórios indígenas e quilombolas. O cenário atual dos agentes desta terceira turma lidam com temas específicos, a exemplo dos campos de energia eólica, o assédio para o mercado de crédito de carbono, territórios pesqueiros enfrentando a especulação imobiliária e o agronegócio.
“O direito agrário é uma busca por ferramentas jurídicas que nos permite achar instrumentos de permanência, de instrumentos para viabilizar a permanência dos povos nas comunidades e nos territórios. O camponês tradicional é intrinsecamente ligado ao território, tem o sentimento de pertença daquele chão, por isso a importância dos instrumentos jurídicos”, enfatizou Dina da Silva Rodrigues, da Comissão Pastoral da Terra (CPT-TO) e aluna do curso de especialização.
A formação dos agentes das pastorais do campo reflete nas comunidades e territórios de forma positiva no campo do conhecimento e política. O processo seletivo, a metodologia e as disciplinas do curso são construídas com a equipe pedagógica e os professores da UFG. As pastorais e a universidade pensam juntos no desenvolvimento das habilidades dos alunos. O professor de Direito, Eduardo Rocha destaca que ao longo desse tempo de parceria da universidade e as pastorais, formaram dezenas de pessoas que atuam na luta por direitos e garantia de acesso à terra e para além da experiência político-pedagógica.
“Percebemos que a formação para os agentes é fundamental para empoderar as comunidades e os coletivos de luta. Cada um e cada uma que passa por esse processo se torna uma força política. Este é um projeto muito gratificante para Universidade Federal de Goiás e reconhece o significado e relevância desta parceria entre a academia e as pastorais do campo”, afirmou o professor Eduardo.
Documentário sobre o curso de Direito Agrário
Para marcar o processo deste caminho de parceria, a Articulação das Pastorais do Campo produziu um documentário que narra o processo e desafios para a formação das turmas até o momento. Com entrevistas de coordenadores, professores e alunos, o vídeo destaca a importância do curso de Especialização em Direito Agrário para fortalecer a luta pelos direitos e acesso à terra e territórios dos povos do campo, da floresta e das águas.
O Curso que está em sua terceira edição e formará mais uma turma no primeiro semestre de 2025, destaca maior participação, interação e proximidade dos territórios no campo do Direito. Com disciplinas que contemplam de forma mais abrangente as pautas das pastorais do campo, a exemplo das demandas que envolvem o campo das águas, gênero e a violência no campo.
A organização do curso é realizada pela Articulação das Pastorais do Campo (APC) que integram a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Serviço Pastoral do Migrante (SPM), Pastoral da Juventude Rural (PJR), Cáritas Brasileira e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Pastorais e organismos da igreja católica que mantém um vínculo estruturado e convivem com a mesma fé e compromisso, mantendo a luta junto aos povos para o cuidado com a casa comum.
O vídeo tem estreia nesta quinta-feira (12) às 20h no Youtube, através deste link.
Produção e reportagem: Cláudia Pereira | APC
Imagens: Cláudia Pereira
Edição e finalização: Lucas Braga
Reportagem de Nádia Pontes | Deutsche Welle*
Apesar da queda em mortes de defensores da natureza em 2023, país segue na vice-liderança mundial. América Latina é a região mais perigosa do planeta para ativistas ambientais, aponta Global Witness.
Foto: Mário Manzi / Arquivo CPT
Em 2023, pelo menos 196 ativistas foram assassinadas em todo o globo por defenderem o direito à terra e ao meio ambiente saudável. A Colômbia foi o país que registrou mais violência do tipo, com 79 mortes; e o Brasil aparece na sequência, com 25. O levantamento divulgado nesta terça-feira (10/09) é da ONG Global Witness, sediada no Reino Unido.
"O número real de assassinatos é provavelmente maior", afirma a organização. Desde que o acompanhamento começou a ser feito, em 2012, foram contabilizadas 2.106 mortes de ativistas defensores do meio ambiente e do uso coletivo dos recursos naturais.
A América Latina ainda é o lugar com mais assassinatos, com 85% de todos os casos documentados em 2023. Depois de Colômbia e Brasil, Honduras e México empataram na terceira colocação do ranking, com 18 crimes do tipo cada. "O assassinato continua sendo uma estratégia comum para silenciar defensores e é, sem dúvidas, a mais brutal", diz o relatório.
"Ataques letais geralmente ocorrem junto com retaliações mais amplas contra defensores que estão sendo alvos de governo, empresas e outros atores com violência, intimidação, campanhas de difamação e criminalização", aponta a ONG.
Em relação ao ano anterior, o número de assassinatos de ambientalistas no Brasil teve uma queda, de 34 para 25 vítimas em 2023. A principal fonte de dados usada para o levantamento da Global Witness é a Comissão Pastoral da Terra (CPT), que há décadas mapeia a violência no campo.
"Já faz anos que o Brasil se configura como uma das regiões mais perigosas para aqueles que fazem a defesa do meio ambiente e da luta pela terra. Não são apenas números, são nomes de pessoas que passaram por longo processo de difamação por fazerem a luta por seus direitos, por seus povos", afirma à DW Ronilson Costa, coordenador nacional da CPT.
Uma das causas para o cenário, avalia Costa, é a concentração fundiária no Brasil e a demora do reconhecimento dos territórios indígenas e quilombolas. "Essas terras estão em disputa seja pela expansão do agronegócio, da exploração madeireira, minérios, ou projetos de infraestrutura", justifica.
Dentre os casos emblemáticos que mais refletem essa situação, opina o representante da CPT, está o assassinato de Mãe Bernadete, liderança quilombola e religiosa na Bahia. Ela foi morta com 12 tiros em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador, e estava Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) do governo federal por já sofrer ameaças.
As mortes de indígenas do povo Guarani Kaiowá, em Mato Grosso do Sul, também foram contabilizadas pela Global Witness. Em 2023, os corpos Sebastiana Galton e Rufino Velasque foram encontrados carbonizados na casa onde viviam, na Terra Indígena Guasuti, em Aral Moreira.
"Quando o Estado não atende à demanda urgente, ele coloca uma comunidade inteira numa situação de vulnerabilidade", diz Costa.
O total de assassinatos registrados na Colômbia no ano passado, 79, foi o maior já contabilizado em um único país desde que a Global Witness começou a fazer esse levantamento em 2012. Na última década, pelo menos 461 defensores colombianos do meio ambiente foram silenciados
"Muitas famílias foram afetadas de forma desproporcional por disputas territoriais e violações dos direitos humanos exacerbadas por mais de meio século de conflito armado", pontua o relatório, que aponta o plantio de coca e o narcotráfico como catalisadores da violência.
No México, confrontos em torno da indústria da mineração aparecem como pano de fundo da maioria das mortes. Dos 18 assassinatos, 70% foram de indígenas que eram contrários à expansão de atividades mineradoras, afirma a Global Witness.
Empatada no terceiro lugar, Honduras, que tem 10 milhões de habitantes, é o país com a maior taxa per capita de assassinatos de ambientalistas. Segundo o levantamento, a pressão sobre a floresta tropical causada principalmente pela expansão de atividades que vão do agronegócio ao narcotráfico tem agravado a situação.
"Por pouco mais de uma década, os defensores desta região sofreram mais ataques per capita do que em qualquer outro lugar do mundo, com 97% deles registrados nos mesmos três países: Honduras, Guatemala e Nicarágua", avalia o relatório.
Uma das recomendações para reverter o quadro violento é a documentação dos ataques e represálias sofridas pelos defensores do meio ambiente. Para especialistas, os governos só conseguirão aprimorar os programas de proteção de direitos humanos e das vítimas quando forem capazes de identificar as causas por trás dos ataques.
Uma tentativa foi feita pelo Acordo de Escazú, o primeiro tratado ambiental da América Latina e do Caribe, assinado em 2018 para promover os direitos de acesso à informação, à participação e à justiça em questões ambientais. Embora o Brasil tenha assinado o acordo no ano de sua criação, o país ainda não o ratificou.
Na avaliação da Global Witness, a falha do tratado não deve apenas à lentidão dos governos. "Empresas que atuam na região também precisam ser responsabilizadas pela violência e criminalização que os defensores ambientais enfrentam", afirma no relatório.
Para a CPT, as denúncias feitas à comunidade internacional são importantes para expor o perigo que ativistas dos direitos humanos e da terra vivenciam no país. "Temos expectativa que cobranças para o Brasil sejam feitas no sentido de garantir maior monitoramento para empresas que financiam negócios no país que atuam em áreas de conflito e que promovem violência no campo", diz Ronilson Costa.
Um bom exemplo recente citado por Costa vem da Europa. No início de setembro, o conselho de ética do Fundo Global do Governo da Noruega (GPFG) recomendou que o fundo exclua os investimentos na Prosegur, empresa espanhola que atua na área de segurança. No Brasil, a empresa mantém a subsidiária Segurpro, que presta serviços para a Vale e Agropalma, e está envolvida em casos de agressões e mortes contra indígenas no Pará.
Em nota, a Prosegur negou as acusações e afirmou que não recebeu nenhuma comunicação do Fundo de Pensões Global da Noruega sobre qualquer decisão de desinvestimento relacionada a essas questões.
"Após o incidente, a SegurPro, empresa do Grupo Prosegur especializada em vigilância patrimonial e prestadora de serviços da empresa citada no Brasil, reforçou os seus protocolos e programas de formação, garantindo que os seus colaboradores estivessem mais bem preparados para lidar com situações complexas", afirmou a empresa.
*Reportagem produzida por Nádia Pontes, publicada originalmente na Deutsche Welle
**A reportagem foi alterada para incluir a posição da Prosegur.
Na retomada da luta, a vida floresce e o bem viver acontece do jeito que a gente quer
Nós, povos e comunidades de territórios quilombolas, indígenas, de quebradeiras de coco babaçu, pescadores/as artesanais, sertanejos/as e camponeses/as, estivemos reunidos, entre os dias 25 e 30 de agosto de 2024, na comunidade Alegria, território Alegria, município de Timbiras, para o XV Encontrão da Teia de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão. Nestes seis dias de intensas trocas e articulações, fizemos uma leitura tanto das forças que ameaçam a nossa existência, quanto da nossa potência de resistir, criar e lutar pelo nosso bem viver.
Ao compartilharmos nossas aflições, percebemos que todas as comunidades e povos tradicionais do Maranhão estão sendo brutalizados de forma muito semelhante pelo capital e pelo Estado. Nossos inimigos estão famintos por nossos territórios, expressando sua voracidade na grilagem de terras, criminalização e assassinatos de lideranças; nas queimadas; na expansão das boiadas e monoculturas (soja, eucalipto, milho, etc) do MATOPIBA; na guerra química que pulveriza veneno sobre nossos corpos, como arma de higienização, sobre nossas famílias, animais e roças; na derrubada e cercamento dos babaçuais e dos campos naturais; na tentativa de implantação de megaprojetos de infraestrutura, como linhões, portos e ferrovias (a exemplo do projeto Grão Pará Maranhão); no projeto de exploração de gás xisto; no roubo de madeira e no sequestro ou destruição dos nossos rios; na pistolagem, no trabalho escravo; na invasão dos nossos territórios e dos nossos sonhos com promessas enganosas, como faz o programa Maranhão Verde, de créditos de carbono, ou a CONAFER, que despeja dinheiro nas comunidades para adormecer resistências, ao mesmo tempo em que preside o Conselho do MATOPIBA; e nos projetos de transação energética, que tomam nossas praias e maretórios com seus dragões de vento, e nos ameaçam com sua sanha mineradora.
Ao mesmo tempo, o Estado, que devia nos proteger, não apenas é omisso e inoperante diante dos inúmeros ataques aos nossos territórios e comunidades, como muitas vezes é conivente, parceiro ou perpetrador das violações. Adota um explicito colonialismo interno, nos olhando com desdém, como se fosse natural que sejamos sempre nós os que devem ser sacrificados em prol do “desenvolvimento da nação”. Quando somos atacados ou assassinados, no lugar de acolhimento e proteção, o Estado oferece mediação com os inimigos. Nunca os pune, ao contrário, os financia e promove. Fecha os olhos para a barbaridade do Marco Temporal; licencia obras que nos atropelam; financia as monoculturas e a infraestrutura para exportação; ou desenvolve programas de falsas soluções climáticas, que depois nos enfia goela abaixo. Nem o direito de sermos ouvidos sobre o que nos ameaça, garantido pela Convenção 169 da OIT, o Estado tem respeitado.
Então, anunciamos que seremos a Teia das Retomadas. Vamos retomar nossas existências, nossa dignidade e nossas soberanias e Bem Viver. Vamos continuar vivos e mais fortes através das nossas culturas, espiritualidades e ancestralidades. Declaramos guerra à escassez crônica, ao quase nada, à fome, e vamos lutar pela plenitude da soberania alimentar e dos territórios livres e protegidos. Vamos intensificar o compartilhamento de saberes, sementes e tecnologias sociais. Vamos intensificar a formação política dos nossos desde o chão da vida. Vamos enredar na Teia os nossos jovens e as nossas crianças, para os quais os mais velhos são esteios, e vamos acolher e dar vazão às suas rebeldias e curiosidades. Vamos acolher nossas diversidades, e vamos à luta para defende-las. Acima de tudo, vamos nos proteger entre nós, vamos nos acudir quando preciso, e com a força da nossa solidariedade e espiritualidade, seremos uma potente rede de cuidados.
Sabemos o que rejeitamos e temos certeza do que defendemos. Somos a Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão em marcha pelo Bem Viver e Territórios Livres!
Território Alegria, Timbiras-MA, 06 de setembro de 2024.
Em coletiva de imprensa, a coordenação nacional do Grito dos Excluídos e Excluídas, reforça as vozes de denúncia dos povos da cidade, do campo, das florestas e das águas.
Por Cláudia Pereira – Cepast-CNBB
Com o lema “Todas as formas de vida importam. Mas quem se importa?”, a 30ª edição do Grito dos Excluídos e Excluídas, concedeu uma coletiva nacional de imprensa (03) em formato virtual com a participação de representações das cinco regiões do país para abrir de forma oficial as ações e celebrar os 30 anos de existência. O Grito nasceu na 2ª Semana Social Brasileira da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e durante estas três décadas tem atuado para a articulação popular, denunciando as desigualdades históricas e defendendo a vida em primeiro lugar.
“O nosso grito deve sair alto, mas não a partir da arquibancada, não a partir do palanque, mas a partir do chão do nosso povo, a partir do chão daqueles que sofrem e que exige de nós o nosso testemunho e o nosso compromisso”, manifestou dom José Valdeci Santos Mendes, presidente da Comissão Episcopal para a Ação Sociotransformadora - CNBB, durante a coletiva de imprensa. Dom Valdeci destacou os 30 anos do Grito que significam resistência, denúncia e anúncio.
O lema deste ano, um questionamento crítico, convida à reflexão sobre o cenário socioeconômico atual que tem gerado conflitos, aumentando a desigualdade social extrema e que é responsável pela crise climática.
Desde 1995, o Grito dos Excluídos e Excluídas é realizado no dia 7 de setembro, com a proposta de superar um patriotismo passivo em vista de uma cidadania ativa e de participação na construção de uma nova sociedade que seja justa, solidária e fraterna. Nesta semana da pátria todos os gritos de injustiça dos povos da cidade, do campo, das florestas e das águas ressoaram pelo país. “Nós somos sociedade civil organizada e a nossa base, o nosso lugar é a organização popular. Não podemos perder essa dimensão da perspectiva dos desafios, o direito dos excluídos não se omite em fazer as denúncias, há também a colheita dessa caminhada. Portanto, para nós, defender todas as formas de Vida, importam”, disse Alessandra Miranda, assessora da Comissão Sociotransformadora e integrante da coordenação nacional do Grito.
“Somos contra o marco temporal, nossas vidas importam também, estamos resistindo há mais de 524 anos e os nossos direitos estão ameaçados”.
Frei Zeca, articulador do Grito que coordenou a coletiva, apresentou o vídeo com o hino deste ano que ilustrou a trajetória dos 30 anos. Letra e música estão disponíveis para cantar e gritar em todos os Brasil. Em seguida foi aberto espaço para ecoar os gritos das representações de movimentos, pastorais e organismos das cinco regiões do país. Entre as vozes ecoou o grito do indígena Eliomar Tukano da região norte, que denunciou a violência contra os povos indígenas e o avanço do agronegócio e garimpo nos territórios da região amazônica. “Somos contra o marco temporal, nossas vidas importam também, estamos resistindo há mais de 524 anos e os nossos direitos estão ameaçados”, disse Tukano.
Outro momento que marcou a coletiva foi o grito da Ilisiane Vida que representou as famílias atingidas pelas enchentes em Porto Alegre. Ela falou das consequências da tragedia que está apagada da grande mídia. “A minha maior indignação desta tragédia anunciada desde 2018, é a deficiência dos órgãos públicos. Atualmente, há 20 mil pessoas em abrigos, mais de 130 mil pessoas desalojadas, 300 pessoas feridas e mais de 150 morreram. O poder público comete falhas e injustiças com os mais pobres que sofreram nessa calamidade”, informou a representante da rede de apoio.
“A minha maior indignação desta tragédia anunciada desde 2018, é a deficiência dos órgãos públicos”.
Outras representações da cidade, do campo e das águas aproveitaram o espaço para denunciar as violações sofridas. Luciano Galeno do Conselho Pastoral dos Pescadores lembrou dos cinco anos do derramamento de óleo na costa brasileira até o momento sem reparação. Lenora Rodrigues do estado do Maranhão, representando a Comissão Pastoral da Terra (CPT-MA), denunciou o avanço do agronegócio e os projetos de morte que atingem os povos e comunidades tradicionais. Andreia, que representa o Movimento Mães do Cárcere, gritou sobre as lutas das mulheres periféricas, as injustiças e a violência urbana.
CPT se soma às pastorais e movimentos sociais no Grito dos Excluídos e Excluídas
Somando-se a organizações sociais, entre pastorais, Igrejas, movimentos, coletivos, associações, sindicatos e entidades que realizarão o 30º Grito dos Excluídos e Excluídas no dia 7 de setembro, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) também estará presente nas ruas de todo o país, lutando por justiça junto aos povos do campo, das águas e das florestas.
Goiânia (GO) - 08h: Concentração na Praça em frente ao Terminal Vera Cruz
Belém (PA) - 08h: Concentração na Boulevard Castilho França, chamando a atenção de autoridades e população sobre o tema e o lema que foram discutidos previamente no bairro do Benguí (Belém), no território quilombola do Abacatal e em Marituba, municípios da Região Metropolitana de Belém, comunidades impactadas pelos grandes empreendimentos ligados à realização da COP 30 em novembro de 2025.
Rio Branco (AC) - 08h: Encontro na Praça dos Tocos, em frente à Catedral, seguindo em caminhada curta às 09h até o Palácio Rio Branco.
São Luís (MA) - 17h: Missa na igreja São Judas Tadeu, no bairro João Paulo
Recife (PE) - 09h: Concentração no Parque Treze de Maio, seguindo em caminhada até o Pátio do Carmo, no centro da cidade.
Campina Grande (PB) - 09h: Ato do Grito dos Excluídos e Excluídas na Praça Clementino Procópio, Centro.
Maceió (AL) - 09h: Concentração no CEEL - Parque da Lagoa, Bebedouro, com passeata pela comunidade dos Flexais e outras áreas atingidas pelo crime da Braskem.
Porto Alegre (RS) - 8h30 - Concentração e acolhida (Praça dos Navegantes, 12 – Igreja Nossa Senhora dos Navegantes), com caminhada até a Praça do Sesi, onde acontecerá a partilha de alimentos e o encerramento do ato.
Por CPT-RS
Em unidade com o tema do Congresso Nacional: CPT 50 ANOS: “Presença, Resistência e Profecia – Romper Cercas, Tecer Teias: A Terra a Deus pertence (Lv,25)”, ocorreu, nos dias 04 e 05 de setembro, no Centro de Espiritualidade Padre Arturo (Cepa), em São Leopoldo/RS, a 23ª Assembleia Regional da CPT-RS. A manhã de abertura contou com a assessoria do Frei Sérgio Gorgen, que apresentou uma análise de conjuntura eclesial, agrária e agrícola, no contexto da crise climática e das catástrofes vividas pelo estado. Ele falou sobre o plano de regeneração popular da sociobiodiversidade, através das ações dos movimentos sociais, em especial da emergente Missão Sementes da Solidariedade.
"A enchente de maio foi a maior tragédia de toda a história da região. E aí um conjunto de organizações, entre elas a Pastoral da Terra, a Cáritas, o Instituto Cultural Padre Josimo e o Movimento de Pequenos Agricultores, estamos fazendo a Missão Sementes de Solidariedade. A Missão visa visitar e atender cada agricultora e agricultor atingido pela enchente, prestar solidariedade e reunir um grupo na comunidade para entregar um kit de sementes e mudas para a construção de hortas", explica Maurício Queiroz, membro da coordenação colegiada da CPT-RS.
A análise de conjuntura apresentada por Frei Sérgio, que foi fundamentada nos Evangelhos e na vida, recordou também sua trajetória pessoal na atuação social pela questão agrária, a crise do capitalismo e como isso afeta nossas vidas. Foram lembrados ainda Dom Ivo Lorscheider, padre João Schio e dom Paulo Moretto. A questão geradora foi a busca por pistas e estratégias de ação, a partir das reflexões e partindo de avaliações coletivas.
Frei Sérgio tocou nos temas internacionais da crise civilizatória, analisando-a a partir de cinco dimensões da crise: energética; ecológico-ambiental; sanitária; agroalimentar; e geopolítica. O debate pautou ainda os grandes desafios deste momento histórico no campo das esquerdas, das lutas e das construções dos movimentos populares.
A tarde, realizou-se trabalho em grupo para a avaliação da caminhada da CPT nesses últimos três anos, a partir da leitura e diálogo das linhas prioritárias da Assembleia Nacional e atuação da CPT. Foram levantadas também ações e prioridades para o próximo triênio. A partir da mediação de Valéria Pereira, coordenadora nacional da CPT, e das prioridades estabelecidas na Assembleia Nacional da Pastoral, a CPT-RS foi desafiada a trabalhar em unidade diante da grande diversidade que forma a Pastoral a nível nacional e regional.
A seguir, trabalhou-se em grupo para a elaboração das diretrizes para o regional no triênio, que serão posteriormente trabalhadas pelas equipes. Houve elaboração das novas prioridades, que serão dialogadas e reestruturadas pela nova coordenação.
Na manhã do dia 5, tratou-se do tema das eleições, a partir do encontro com o estatuto, leitura e discernimento, com o diálogo entre as equipes, e encaminhamentos para a eleição da CPT.
Coordenação Colegiada: Luiz Antônio, Maurício Queiroz e Norma Knob;
Suplentes da Coordenação Colegiada: Inês Crestani, Wilson Dallagnol e Andrei Thomaz;
Conselho Fiscal: Oldi Helena, Adelar Zanetti e Arnildo Fritzen;
1ª Prioridade: terra e território, água, alimento, sociobiodiversidade
2ª Prioridade: Organização e articulação das Mulheres e Juventudes
3ª Prioridade: Formação para camponeses e camponesas, comunidades e agentes
4ª Prioridade: Fortalecimento Pastoral e Institucional
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