Liderança de uma comunidade atingida pela Usina Belo Monte, Ednaldo foi morto por dois homens em uma moto. Seu enterro aconteceu no mesmo dia que completam 20 anos da morte de Dorothy Stang, que também lutava pela terra no município vizinho de Anapu
Por Coletivo Nacional de Comunicação do MAB
Ednaldo Palheta da Cunha, 45 anos, liderança de um acampamento de pequenos agricultores em Vitória do Xingu (PA), foi assassinado na noite da última terça-feira (11). Ele foi abordado por dois homens em uma moto na estrada do Ramal Água Boa, na zona rural do município, quando voltava para casa após o trabalho, por volta das 22h. Naldo estava com o filho de 11 anos, que testemunhou tudo.
Naldo era muito conhecido na região como Naldo Bucheiro e também como “Vovô do Ringue”, por ser lutador de artes marciais, e seu assassinato gerou grande comoção. Foi “nascido e criado em Vitória do Xingu”, como dizem seus amigos. Ele vendia churrasquinho no centro da cidade durante a noite. De acordo com o relato do filho à polícia, dois homens de capacete estavam na estrada de tocaia, e abordaram Naldo e falaram para ele parar. Ele tentou dar meia-volta, quando um dos homens atirou. Naldo ainda tentou correr para dentro do mato, mas foi atingido por mais três tiros. Ele morreu no local, antes da chegada do socorro.
Membro de uma comunidade atingida pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte e presidia a Associação dos Pequenos Agricultores do Km 40, entidade formada por 228 famílias que ocupam uma área no município. Segundo um dos agricultores, a comunidade vem sofrendo pressão de fazendeiros locais. De acordo com processo no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), a área ocupada pelas famílias é pública e pendente de titulação definitiva. No ano passado, Naldo e outros agricultores se aproximaram do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) em busca de apoio para a luta. O Movimento vem acompanhando a situação desde então.
Naldo Bucheiro, como era mais conhecido na região, era presidente da Associação dos Pequenos Agricultores do KM 40. Foto: Coletivo Nacional de Comunicação do MAB
“Nós não queremos plantar capim, não queremos criar gado, queremos só esse pedacinho de uma terra que não tem documento”, desabafou um dos agricultores, que não será identificado por questão de segurança. As famílias do km 40 produzem alimentos como arroz, feijão, maxixe, quiabo, inhame e seriguela.
Vitória do Xingu é o município sede da hidrelétrica de Belo Monte. Além de receber a maior fatia da Compensação Financeira pelo Uso dos Recursos Hídricos (CFUHR), ou “royalties” da usina, a economia local é dependente da pecuária extensiva. As famílias lideradas por Naldo se opunham a essa lógica: “nosso pensamento era trazer uma fruta, um legume para vender aqui na cidade de Vitória. Tudo vem de fora”, afirmou um dos agricultores. A região, que já é foco de conflitos pela terra há décadas, teve a situação fundiária agravada pela construção da hidrelétrica.
Manifestação dos atingidos da ocupação do Km 40 durante audiência pública para tratar da questão da terra em junho do ano passado. Naldo estava presente. Foto: Coletivo de Comunicação do MAB
O corpo de Naldo foi enterrado por volta de meio-dia nesta quarta-feira (12), dia em que se completam 20 anos do assassinato de outra liderança da luta pela terra na região do Xingu, no município vizinho de Anapu: a missionária Dorothy Stang.
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) lamenta profundamente esse assassinato, se solidariza com os familiares de Naldo e pede que o poder público dê celeridade ao processo de regularização da terra para as famílias.