Por CPT Regional Araguaia-Tocantins
NOTA DE PESAR
“Me chamarão subversivo. E lhes direi: eu sou. Por meu povo em luta vivo. Com meu povo em marcha, vou.” – Pedro Casaldáliga
Foi com imensa dor e profunda indignação que recebemos nesta tarde, 03 de junho de 2024 a trágica notícia do brutal assassinato do nosso amigo e companheiro de luta Cícero Rodrigues de Lima, presidente da APC Rural, associação dos assentados do P.A Remansão, localizado em Nova Olinda, e liderança da Articulação Camponesa de Luta pela Terra e pela Defesa dos Territórios.
Cícero assumiu a luta ao lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, durante toda sua vida lutou por justiça para o povo do campo tocantinense, especialmente a comunidade do assentamento Remansão, criado em 2001, em Nova Olinda. Nos ensinou a ter esperança nas conquistas vindouras e, com o “pé no chão”, resistir contra todas as injustiças, teimando pela permanência dos camponeses e pela paz na terra, inclusive por meio do bonito projeto de vida digna que abraçou: A esperança que vem do cajueiro!
Cícero deixa a esposa e filhas. Neste momento de dor, nos solidarizamos com a sua família, seus amigos, todas as famílias do Remansão e com as lideranças da Articulação Camponesa. Temos certeza que Cícero sempre permanecerá sendo semente fecunda em nossas lutas.
Em tempos tortuosos, de muitos enfrentamentos e ameaças, Cícero se manteve forte e confiante no amanhecer de dias melhores. Infelizmente, mãos criminosas movidas por ódio e ganância ceifaram sua vida. Exigimos que os responsáveis sejam identificados e a justiça seja feita.
Seu espírito de liderança, sua fé e sua memória nos inspira a seguir lutando pela garantia dos direitos e políticas públicas dos camponeses e povos tradicionais.
Descanse em paz, companheiro Cícero! Pelos nossos mortos nenhum minuto de silêncio, mas toda uma vida de luta! Cícero presente, presente, presente!
❇️ 15 de outubro de 1966
✝️ 03 de junho de 2024
Por Dom José Ionilton | Presidente da CPT
“Se em alguma parte do mundo existe fome, nossa celebração Eucarística está de alguma maneira incompleta. Na Eucaristia recebemos Cristo que tem fome no mundo. Ele vem ao nosso encontro com os pobres, os oprimidos, os famintos da terra, que através dele nos olham esperando ajuda, justiça, amor expresso em ações”, Padre Pedro Arrupe.
A Eucaristia e Jesus
Marcos em seu evangelho escreve que enquanto comiam, Jesus tomou o pão, partiu-o e entregou aos discípulos dizendo: tomai, isto é o meu corpo (cf. 14, 22). E escreve, também, que Jesus tomou o cálice e entregou aos discípulos e todos beberam. E disse: isto é o meu sangue (cf. Mc 14, 24).
A Eucaristia, portanto, foi instituída por Jesus para ser comida e bebida. A adoração eucarística veio bem depois no desenvolvimento da história da Igreja.
A Eucaristia é “fonte e centro de toda a vida cristã” (Concílio Vaticano II, Lumen Gentium, 11). São João Paulo II disse que “A Igreja vive da Eucaristia” (Ecclesia Eucharistia, 1).
Por isto a Igreja ensina que a Eucaristia é única; não tem uma maior ou mais importante do que outra. A Eucaristia celebrada em uma Comunidade Ribeirinha na Amazônia, embaixo de uma árvore, é a mesma Eucaristia celebrada pelo Papa no Vaticano.
A Eucaristia é Jesus
Cremos que o pão e o vinho são transubstanciados a partir da consagração feita durante a celebração da Eucaristia. Já não é mais pão, embora pareça pão, é corpo de Cristo; já não é mais vinho, embora pareça vinho, é o sangue de Cristo. Ou seja, na Eucaristia está Jesus.
Com esta verdade de nossa fé, poderemos afirmar que Jesus pode curar e libertar qualquer pessoa que participa de uma celebração eucarística, em qualquer lugar do mundo, onde Ele quiser. Não existe celebração da Eucaristia onde Jesus age e outra onde Ele não age.
Por isto, não devemos acreditar em quem na nossa Igreja propaga as chamadas ‘missas de cura e libertação’. Elas não existem! Toda missa pode ser missa de cura e libertação, porque Jesus, o Curador, o Libertador, está presente em todas as celebrações da Eucaristia, independentemente do ministro que a presida e independentemente do lugar onde a celebração aconteça.
Eucaristia e merecimento
Na Exortação Apostólica “A alegria do Evangelho”, nº 47, o Papa Francisco nos faz a seguinte provocação: “A Eucaristia, embora constitua a plenitude da vida sacramental, não é um prêmio para os perfeitos, mas um remédio generoso e um alimento para os fracos”.
Portanto, a Eucaristia é para nós caminheiros, na busca da santidade, mas não ainda santos, santas. Devemos evitar a ideia de merecimento. Ninguém merece receber a Eucaristia. A Eucaristia é dom, é graça de Deus.
Os três evangelhos sinóticos e São Paulo transmitiram-nos a narração da instituição da Eucaristia (Mt 26, 26-29; Mc 14, 22-25; Lc 22, 14-20; 1Cor 11, 23-26). Nestes relatos aparecem, de forma clara, que a Eucaristia foi instituída por Jesus e entregue para nós: tomai e comei; tomai e bebei. Todos que estavam na última ceia receberam a Eucaristia das mãos de Jesus. Todos, até mesmo Judas, o traidor (cf. Jo 13, 26).
A Eucaristia é serviço
Na última ceia, antes de sua prisão e condenação, Jesus lava os pés dos Apóstolos, ensinando-nos o caminho do serviço e institui a Eucaristia, antecipando sacramentalmente o que Ele faria na Cruz no dia seguinte, doando a sua vida por nós, amando-nos até o fim, (cf. Jo 13, 1-17).
Eucaristia, acima de tudo, é isto: Vida de Jesus doada pela humanidade, como nos narra Lucas: “Isto é o meu corpo dado por vós… Este cálice é a nova aliança no meu sangue derramado por vós” (22, 19-20). Corpo dado e sangue derramado por nós.
Quem participa de uma celebração da Eucaristia e quem comunga com Jesus na Eucaristia, precisa continuar fazendo o que Ele fez e mandou que a gente fizesse: “Fazei isto em memória de mim” (Lc 22, 19) e “dei-vos o exemplo para fazerdes assim como eu fiz” (Jo 13, 15).
Neste sentido quero partilhar um ensinamento de São Justino Russolillo, fundador das Congregações Vocacionistas, sobre a Eucaristia: “Como mudaria nossa vida se compreendêssemos a vida Eucarística de Jesus”.
Santo Agostinho dizia: “Não somos nós que transformamos Jesus Cristo em nós, como fazemos com os outros alimentos que tomamos, mas é Jesus Cristo que nos transforma nele”.
Jesus na Eucaristia e Jesus nos Pobres
“O Cristo reconhecido na Eucaristia remete ao encontro e serviço aos pobres” (CNBB. Comunidade de Comunidades: uma nova Paróquia, n. 275).
“O compromisso social tem sua raiz na própria fé; deve ser manifesto por toda a comunidade cristã e não apenas por algum grupo ou pastoral social; uma comunidade insensível às necessidades dos irmãos e à luta para vencer as injustiças, celebra indignamente a liturgia” (DGAE da Igreja no Brasil 2008 a 2010, n. 178).
O que diz a CNBB está em sintonia com o que o apóstolo Paulo diz na primeira carta aos Coríntios, quando qualifica como «indigna» uma comunidade cristã que celebra a Ceia do Senhor em um clima de discórdia e de indiferença pelos pobres (cf. 1Cor 11, 17-22.27-34).
Portanto, “é necessário evitar a separação entre culto e misericórdia, liturgia e ética, celebração e serviço aos irmãos. (Documentos CNBB 100, n. 275 – Comunidade de Comunidades: uma nova paróquia).
Podemos aprender da letra de um Canto que nos faz rezar assim: “Igualdade, fraternidade, nesta mesa nos ensinais. As lições que melhor educam, na Eucaristia é que nos dais! Se participamos da Eucaristia, é grande a alegria que Deus oferece. Porém, não podemos deixar esquecida a dor, nesta vida, que o pobre padece”.
Lembremos do que nos ensina São João Paulo II na Carta Apostólica para o Ano da Eucaristia (outubro 2004 a outubro de 2005): “A Eucaristia não é expressão de comunhão apenas na vida da Igreja; é também projeto de solidariedade em prol da humanidade inteira” (nº 27) e “não podemos nos iludir: do amor mútuo e, em particular, da solicitude por quem passa necessidade, seremos reconhecidos como verdadeiros discípulos de Cristo (cf. Jo 13,35; Mt 25,31-46). Com base neste critério, será comprovada a autenticidade das nossas celebrações eucarísticas”.
Diz-nos São João Crisóstomo (347-407): “Queres honrar o corpo de Cristo? Não o desprezes quando nu; não o honres com vestes de seda e abandones no frio e na nudez o aflito. Pois aquele que disse: ‘Isto é o meu corpo’ (Mt 26, 26) e confirmou com o ato a palavra, é o mesmo que falou: ‘Tu me viste faminto e não me alimentaste’ (Mt 25, 35) e ‘o que não fizeste a um destes pequeninos, não o fizeste a mim’ (Mt 25, 45). Este não tem necessidade de vestes, mas de corações puros, aquele, porém, precisa de grande cuidado… Que proveito haveria, se a mesa de Cristo está coberta de taças de ouro e ele próprio morre de fome? Sacia primeiro o faminto e depois, do que sobrar, adorna a sua mesa… Enquanto adornas a casa, não desprezes o irmão aflito, pois é mais precioso que o templo” (III volume da Liturgia das Horas, pp. 154-155).
O Papa Bento XVI disse: “Quem participa da Eucaristia, deve empenhar-se na edificação da paz, neste nosso mundo marcado por muitas violências e guerras, e hoje, de modo particular, pelo terrorismo, a corrupção econômica e a exploração sexual” (Exortação Apostólica pós- sinodal sobre a Eucaristia, nº 89b).
Na Carta de conclusão do XV Congresso Eucarístico Nacional, realizado em Florianópolis–SC, realizado de 18 a 21 de maio de 2006, está escrito que na Eucaristia:
1. Aprendemos a lutar por iniciativas e práticas solidárias;
2. Descobrimos nossa missão de construir uma sociedade de justiça e igualdade, onde os pobres, prediletos de Deus Pai e de Jesus de Nazaré, sejam postos no primeiro lugar;
3. Fortalecemos o cuidado com o meio ambiente.
Nove (9) anos depois, em 2015, na Encíclica Laudato Si’ o Papa Francisco nos ensina: “Eucaristia: fonte de luz e motivação para as nossas preocupações pelo meio ambiente e leva-nos a ser guardiões da criação inteira” (nº 236).
O Sínodo para a Amazônia constatou que “muitas comunidades eclesiais do território amazônico têm enormes dificuldades em ter acesso a Eucaristia. Às vezes, não apenas meses se passam, mas vários anos para um sacerdote visitar a comunidade e celebrar a Eucaristia” (DF 111).
O Papa Francisco na Querida Amazônia diz: “É urgente fazer com que os povos amazônicos não estejam privados do alimento de vida nova (Eucaristia) e do sacramento do perdão (Reconciliação)” (n. 89).
Por isto, o Papa nos pede, também, para “promover a oração pelas vocações sacerdotais” e a “rever a fundo a estrutura e o conteúdo da formação inicial e da formação permanente dos presbíteros” (n. 90), a fim de que possamos ter, na Amazônia, os ministros que presidem a celebração destes dois Sacramentos: Eucaristia e Reconciliação.
Conclusão
“A força da presença de Deus hoje no mundo é justamente à mesa, na Eucaristia com Jesus. Por isto peçamos que dê de comer a todos nós. Dar de comer aquele alimento espiritual que nos fortifica, à mesa, na Eucaristia, mas também dar de comer a todos, neste mundo onde o reino da fome é tão cruel” (Papa Francisco em entrevista na TV2000 dos bispos italianos, 22 de novembro de 2017).
O Padre Pedro Arrupe, Geral dos Jesuítas, disse: “Se em alguma parte do mundo existe fome, nossa celebração Eucarística está de alguma maneira incompleta. Na Eucaristia recebemos Cristo que tem fome no mundo. Ele vem ao nosso encontro com os pobres, os oprimidos, os famintos da terra, que através dele nos olham esperando ajuda, justiça, amor expresso em ações. Não podemos receber plenamente o pão da vida, se não damos, ao mesmo tempo, pão para a vida daqueles que se encontram em necessidade onde quer que estejam” (citado pelo Texto Base da Campanha da Fraternidade de 2023, nº 153).
“Não sejamos apenas crentes, mas acreditáveis” (Servo de Deus Helder Câmara).
Publicado originalmente em CNBB
Por Francisco Alan (CPT Pará)
Edição: Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional)
Imagens: Divulgação / CPT Pará
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) Regional Pará participou da 9a Romaria dos Mártires da Floresta, realizada entre os dias 31/05 em Marabá, e 01 a 02/06 em Nova Ipixuna/PA. Com o tema "Solidariedade ambiental e diversidade fraterna: caminhando com os mártires da floresta", a Romaria contou com a presença de diversos parceiros, universidade, pastorais e movimentos que, sob palavras de ordem, reflexões e muita animação, ecoaram o grito contra as violações de direitos que afetam as populações do campo, das águas, florestas das periferias.
A Romaria faz memória às lutas do casal de agricultores José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, ambos assassinados no dia 21 de maio de 2011 dentro do assentamento agroextrativista Praialta-Pinheira, em Nova Ipixuna. O casal foi morto a tiros em uma emboscada a oito quilômetros de casa. As suspeitas são de que o crime tenha sido encomendado por madeireiros incomodados com as constantes denúncias feitas por Zé Cláudio e Maria sobre a extração ilegal de madeira e a grilagem de terras públicas da região.
Com o passar do tempo, os grupos responsáveis pela organização dos atos de denúncia das violências e injustiças sentiram a necessidade de transformar a data em momento também de esperança. "Fazer memória de Zé Cláudio e Maria é continuar a missão de esperançar, é ousar a cada dia lutar pelos direitos, é ser um constante apoio à luta dos povos", afirma Claudelice Santos, irmã de Zé Cláudio e coordenadora do Instituto Zé Cláudio e Maria, que organiza a Romaria, junto com os movimentos locais.
A romaria saiu do local onde ocorreu o crime até a casa onde o casal vivia. O ato de dois dias é encerrado aos pés da “majestade” que permanece até hoje no lote. Majestade é o apelido dado às enormes castanheiras típicas da região amazônica e quase extintas no sudeste e sul do Pará.
Por Júlia Barbosa (Comunicação CPT Nacional)
Com informações e fotos da CPT de Xinguara/PA
Entre os dias 24 e 26 de maio, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Xinguara e a Associação de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Nova Vitória realizaram uma programação que marcou os 7 anos do episódio de extrema violência no campo ocorrido em 24 de maio de 2017, nacionalmente conhecido como Massacre de Pau D’arco. A atividade ocorreu na Ocupação Jane Júlia, Fazenda Santa Lúcia, no município de Pau D’arco/PA, e a programação contou com diversas atividades em memória às vítimas e em defesa dos direitos dos trabalhadores rurais e da reforma agrária.
24/05/2024 - O primeiro dia começou com uma celebração religiosa ecumênica, realizada na sede do Barracão da Associação Nova Vitória, localizada na Ocupação Jane Júlia. O objetivo principal foi celebrar a memória das dez vítimas do massacre e de outros mártires da terra. Durante a celebração, foram lidos os nomes das vítimas e as cruzes, que simbolizam cada um dos trabalhadores assassinados, foram dispostas em um círculo. Todos os presentes entoaram um grito de dor e esperança: JUSTIÇA POR PAU D’ARCO!.
O grito por justiça ecoa os sete anos de impunidade que assombram as famílias, os amigos e a memória das vítimas. Passados sete anos das mortes, os mandantes do massacre não foram identificados, mesmo tendo sido objeto de investigação pela Polícia Federal. Os 17 policiais, entre civis e militares, acusados de serem os autores dos crimes, ainda respondem em liberdade, exercendo suas funções normalmente na região, enquanto se aguarda a realização do Tribunal do Júri, que deveria ocorrer em 2019, mas que segue na morosidade da justiça brasileira.
Ainda no primeiro dia, houve a leitura da Bíblia, que foi seguida por reflexões feitas por um pastor e um padre da comunidade local. Ao final, todos acenderam suas velas conjuntamente, estimulados a lembrar que se deve ser luz uns para os outros na caminhada e, em seguida, colocaram suas velas ao lado das cruzes.
25/05/2024 - No segundo dia, a programação seguiu com a Feira da Agricultura Familiar, promovida pelas famílias acampadas na área, realizada na quadra coberta da cidade de Pau D’arco/PA. Na feira, foram expostos e vendidos produtos produzidos pelas famílias, como cacau, arroz, mandioca, inhame, mamão, queijo, amendoim, abóbora e banana.
A comunidade local e representantes de diversas entidades, incluindo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), o Instituto Zé Cláudio e Maria (IZM) e o Governo Municipal, participaram do evento. As famílias doaram parte dos produtos à venda para a IZM, a fim de serem utilizados na 9ª Romaria dos Mártires da Floresta, que ocorrerá de 31 de maio a 02 de junho, em Nova Ipixuna, no Pará. Durante a feira, ainda houve um momento político de denúncia dos despejos, que ameaçam mais de 800 trabalhadores sem-terra no Sul do Pará, dentre estes, as famílias da ocupação Jane Júlia.
26/05/2024 - O terceiro e último dia se iniciou com o Café da Reforma Agrária, servido pela Associação, composto por muitos alimentos produzidos pelos trabalhadores/as da ocupação. Após o café, teve início o ato de caminhada até o memorial das vítimas, erguido no local onde os dez trabalhadores foram assassinados.
Estiveram presentes discentes da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) de Xinguara, sendo alunos dos cursos de História e Geografia, representantes da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (FETAGRI) do Pará, da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) do Pará, e pessoas de várias ocupações e cidades vizinhas. Também participaram representantes do INCRA, incluindo o superintendente de Marabá/PA, Andreik Maia Sobrinho, recém empossado no cargo. Importante ressaltar que foi a primeira vez nestes sete anos que um superintendente do INCRA esteve no local onde ocorreu a chacina, participando do ato em memória às vítimas e visitando a ocupação.
O ato também contou com a presença de membros da Comissão Nacional de Enfrentamento à Violência no Campo, como a ouvidoria agrária nacional Dra. Cláudia Dadico, bem como representantes do Ministério de Desenvolvimento Agrário, do Ministério das Mulheres e dos Povos Indígenas, além de representante da Defensoria Pública da União (DPU).
Pela manhã, todos presentes realizaram uma caminhada pelo percurso percorrido pelas vítimas do massacre, até o memorial erguido em sua memória. Durante a caminhada, houve resgates dos acontecimentos daquele dia trágico, em que dez trabalhadores rurais sem terra - nove homens e uma mulher - tiveram suas vidas brutalmente interrompidas pela violência no campo, em uma ação criminosa praticada por policiais militares e civis do estado do Pará.
No memorial, um momento ecumênico foi realizado, seguido pela apresentação dos dados de violência no campo, conforme o relatório "Conflitos no Campo Brasil 2023", da CPT. Segundo os dados, o Pará foi o segundo estado com mais registro de conflitos no campo em 2023, com 227 ocorrências, e com dois assassinatos resultados da violência no campo. Após as falas de diversos representantes no memorial, o grupo retornou ao Barracão da Associação Nova Vitória para um almoço comunitário servido pelas famílias.
Durante o dia, a Comissão Nacional de Enfrentamento à Violência no Campo (CNEVC) aproveitou a oportunidade e, a pedido da CPT, realizou a escuta ativa de movimentos sociais da região do Sul do Pará e comunidades locais. A programação se encerrou com uma roda de conversa, coordenada pela representante da CPT de Xinguara, Jamyla Carvalho. Neste momento, representantes do INCRA, da CNEVC e o advogado da Associação discutiram a situação das famílias da ocupação e os próximos passos a serem dados, a fim de garantir sua permanência na área e a solução deste conflito que se arrasta há tantos anos e a tantas perdas.
Ainda durante a roda, as famílias também realizaram um agradecimento especial à Comissão, entregando uma cesta de produtos e frutos da terra para os seus membros. Ao final, elas receberam a notícia de que o registro pelo INCRA para inserção no cadastro de beneficiários da reforma agrária se iniciaria no dia seguinte. A informação foi recebida com alegria pelos presentes, que lutam pelo direito à terra e vida digna, reacendendo a esperança de que a Justiça por Pau D’arco seja enfim concretizada.
Por Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida
Em sessão conjunta do Senado Federal e Câmara dos Deputados, o Congresso Nacional rejeitou nesta terça-feira (28) os 8 vetos restantes dados pelo presidente Lula à Lei nº 14.785/2023, conhecida como “Pacote do Veneno”. A Frente Parlamentar da Agropecuária se movimentou pela derrubada dos vetos, com o objetivo de favorecer ainda mais a indústria agroquímica e o agronegócio em detrimento da segurança socioambiental, climática e de proteção à saúde, agravando um contexto de crescentes conflitos no campo pela contaminação por venenos.
Além de reduzir as atribuições do Ibama e da Anvisa na reavaliação de agrotóxicos, a lei também libera a produção, em território nacional, de agrotóxicos banidos no Brasil, caso se destinem à exportação. Ou seja, além de recebermos agrotóxicos banidos pela União Europeia, agora podemos fazer o mesmo exportando para países que possuem legislação ainda mais frágil.
“Moramos na margem da rodovia Santarém/Curuá-Una (PA-370), e desde abril tivemos que fechar as casas porque estavam borrifando o veneno na soja e no milho. Eles já desmataram tudo, e sofremos com a saúde, porque resseca a garganta, os lábios, dá tontura. Esse avanço da soja é um perigo para a vida. É a agricultura familiar que está sendo pisoteada, massacrada. Eu peço para que o presidente e os parlamentares que atuam e dizem nos defender, que olhassem mais para a Amazônia.”
A fala desta agricultora do município de Mojuí dos Campos/PA é o reflexo de uma realidade presente em todo o país, revelada principalmente com o balanço do ano de 2023, que trouxe os maiores números de conflitos no campo registrados pela CPT ao longo de quase 40 anos.
A contaminação por agrotóxicos presente nos Conflitos no Campo 2023
Terra – Nos conflitos pela ocupação e a posse da terra, 27 deles tiveram ligação com a contaminação por agrotóxicos, sendo 18 cometidos por fazendeiros e 6 por empresários. O estado de São Paulo lidera com 6 ocorrências, seguido do Pará e Mato Grosso do Sul (com 3 cada), Pernambuco e Rondônia com 2 registros cada. Os conflitos afetam principalmente localidades com assentados (9), posseiros (7) e indígenas (4).
Água – Foram registrados 26 conflitos pela água ligados à contaminação por agrotóxicos, a maior parte foi causada por fazendeiros (18) e empresários (6), atingindo com destaque os estados do Pará (5), Tocantins (5), Maranhão (3), São Paulo (3), Mato Grosso (2) e Goiás (2). A metade destes conflitos (13) aconteceu na região da Amazônia Legal, atingindo um total de 1.539 famílias. O destaque é para os estados do Tocantins (812 famílias) e do Pará (381 famílias).
Alguns dos destaques ocorreram na Terra Indígena Xerente, em Tocantínia (TO), onde 673 famílias ficaram sem acesso à água potável e sem poder pescar devido à contaminação da água do rio Gorgulho por agrotóxico da produção do agronegócio no estado. Já na Reserva Extrativista do Rio Ituxi, em Lábrea (AM), a contaminação ameaçou a existência de 123 famílias ribeirinhas.
Nas comunidades quilombolas de Guerreiro e Cocalinho, em Parnarama (MA), os conflitos de contaminação por agrotóxicos pela água atingiram 278 famílias: “É uma série de violências que chega junto com a soja e o projeto do Matopiba, e que incluem, além do alto índice de contaminação por agrotóxicos, o desmatamento, o uso de milícias e segurança armada, e tudo isso inviabiliza o plantio e a produção de alimentos saudáveis”, afirma Lenora Rodrigues, da coordenação da CPT Regional Maranhão.
Violência contra a Pessoa – Os danos dos agrotóxicos estiveram presentes em 21 registros de violência contra a pessoa, atingindo 336 vítimas. Os estados do Mato Grosso do Sul, Maranhão e São Paulo lideram com 5 ocorrências cada, seguidos do Pará (3), Mato Grosso (2) e Tocantins (1). Um dos destaques negativos foi para as 293 pessoas atingidas em uma comunidade de Belterra (PA), incluindo uma escola, vitimadas pela pulverização de agrotóxicos de uma lavoura de soja da vizinhança.
“Cabe destacar que em oposição ao Pacote do Veneno, a Campanha enfatiza a importância do imediato avanço em políticas públicas que assegurem uma alimentação saudável e sustentável, particularmente no momento em que os debates internacionais se intensificam sobre a crise climática. Adicionalmente, destaca a necessidade da implementação do Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (PRONARA)”, afirma a coordenação da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.
‘Amaldiçoados sejam aqueles que acumulam casas e campos’. Isaias 5,8.
Clique aqui e também acesse a Nota Pública em arquivo PDF.
A Comissão Pastoral da Terra – CPT, é um organismo ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, fundada em 1975, com a Missão “Ser Presença, Solidária e Profética junto aos pobres da terra, das águas e das florestas, levando a Prática de Jesus de Nazaré” e vem a público repudiar as ações truculentas da Polícia Militar de Mato Grosso, contra seus Agentes Pastorais, trabalhadores/as, acampados/as e Defensora Pública de Mato Grosso.
No dia 27 de maio 74 famílias, mais de 200 pessoas das quais 50 eram crianças, pessoas acampadas e cansadas da espera na beira da estrada, em situação desumana, sob lona e sol quente, na poeira e sem água, numa situação angustiante diante de um julgamento do Mandado de Segurança nº. 1023133-54.2021.4.01.000/TRF1 que não acontece, decidiram ocupar a área do PDS Novo Mundo, criado pelo INCRA em abril de 2024.
Durante essa ação de ocupação, daquilo que é terra pública, da União, com portaria do Incra criada e publicada, mesmo assim, em atitude coordenada, a empresa de segurança ‘Tática Serviços’ e seus pseudos seguranças, na verdade ‘jagunços’ da Fazenda, que por ironia diz na placa ‘Nossa Senhora da Abadia’ (aquela que traz a Luz ao Mundo), a mando do grileiro Clayton, atentaram mais uma vez contra a vida dessas famílias sem-terra empobrecidas, jogando um trator esteira contra dezenas de pessoas indefesas, que mesmo assim colocaram seus próprios corpos para defender seus familiares e fizeram a esteira recuar com incrível coragem. Demonstrando, desta forma, a velha e comum face violenta de vários fazendeiros do estado.
A Polícia Militar, Patrulha Rural, Força Tática, Policiais com escudos, bombas, armas de grosso calibre e spray de pimenta foram acionadas a mando do governador, segundo o próprio major que comandou a operação disse. Chegaram ao local com uma megaoperação de guerra, em 7 viaturas e trataram os trabalhadores, com suas crianças pequenas, como bandidas, como “gado” a ser abatido.
Seres humanos estes em condição de vulnerabilidade extrema e histórico estado de exceção pelos governos anteriores e pelo atual governo autoritário do estado, o qual tem a percepção distópica de marginalização de camponeses, trabalhadores, pobres e criminalização de suas lutas por terra, trabalho e direitos.
Assim, a mando deste governo distópico e autoritário, sem nenhuma possibilidade de estabelecer um diálogo mínimo, a polícia militar com seus comandantes, um sargento local e um major, aos gritos começam a dar voz de prisão aleatórias contra todo aquele que se colocasse, discordasse, ou se aproximasse, para tentar entender a situação. Qualquer aproximação do efetivo policial, mesmo que por busca de alguma orientação, era respondido com voz de prisão imediata, sempre dada ou pelo sargento ou pelo major, caso ocorrido com o padre ao perguntar o que estava acontecendo com uma agente pastoral.
Uma atitude muito comum da polícia mato-grossense, a qual agride, humilha, destrói e mata os trabalhadores do campo que lutam legalmente por justiça, trabalho e alimento, atitude bem diferente com fazendeiros assassinos, pistoleiros, escravocratas contemporâneos, grileiros, etc.
A coordenadora da CPT MT, um agricultor voluntário da CPT, o Padre, assessor estadual da Pastoral e a Defensora Pública do Estado, que atende no município, estavam no local para assegurar a integridade física das famílias e mediar um iminente conflito trazido pelo Estado, devido a histórico conhecido de violências e desrespeito aos direitos dos trabalhadores por terra, também foram detidos.
Além de diversas prisões arbitrárias, a Polícia Militar de Mato Grosso demonstrou uma perceptiva relação com a empresa de segurança, que ajudou ativamente nesta ação truculenta, além de indicarem quem deveria ser preso. Os seguranças tomaram os celulares dos detidos e asseguraram a permanência deles nos ônibus escolares do Programa Caminhos da Escola.
Mesmo após as prisões e a saída das famílias da área do PDS Novo Mundo, a Polícia Militar, com apoio logístico da empresa de segurança, continuou com a sua operação, se estendendo ao lote pertencente ao Projeto de Desenvolvimento Sustentável Nova Conquista II. Ali, eles ameaçaram os assentados que, a uma certa distância, acompanhavam o que estava acontecendo, tomaram aparelhos celulares para apagar os registros, ameaçaram pessoas e agrediram um morador, que teve o braço fraturado durante a abordagem, prenderam uma senhora idosa e doente, que acabou hospitalizada.
Ainda, foram apreendidas ferramentas de trabalho, por eles relacionadas como prova material de armas. Cometeram perjúrio ao ter encontrado uma arma de fogo e munições fora do acampamento e tentar atribuir como pertencente a um trabalhador, no entanto, não pertencia aqueles trabalhadores envolvidos no movimento e sua origem e propriedade é desconhecida e duvidosa.
Outro fato que corrobora toda essa ação violenta da Polícia Militar de Mato Grosso foi a prisão da Defensora Pública, servidora do Estado, que estava acompanhando e documentando a situação a uma certa distância, segundo seu próprio relato, foi agredida e, num primeiro momento foi detida e teve seu celular tomado de sua mão e apreendido pelo comandante da Operação da Polícia Militar.
É notório que essas e muitas outras ações realizadas com participação da Patrulha Rural de Mato Grosso têm sido fortes e confirmam um Estado de violência e intolerância no campo instaurado pelo Governo do Estado, que sempre deixou evidenciada sua política de ‘tolerância zero’ com ocupações.
O tempo todo, o Comandante da operação declarava que estavam cumprindo ordens diretas do governador sem nenhum mandado judicial para isso.
Por fim, repudiamos as ações da Polícia Militar e a política do Governo do Estado do Mato Grosso, de criminalizar uma luta que é legítima pela Reforma Agrária, terra, teto e pão para todos. Exigimos que essa injusta situação de violência e as ações violentas do Estado contra aquelas pessoas, nossos agentes de pastoral e a defensora pública, sejam apurados e responsabilizados seus agentes públicos que atentaram contra os trabalhadores acampados, sem ordem judicial, no cumprimento de uma ordem injusta que descumpre a justiça e a Lei Constitucional do Estado Brasileiro que é soberana.
Reiteramos, ainda, que seja julgado o Mandado de Segurança nº. 1023133-54.2021.4.01.000/TRF1, de responsabilidade do Des. João Carlos Mayer Soares.
Cuiabá, 29 de maio de 2024.
Comissão Pastoral da Terra - Regional Mato Grosso
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