Entre os dias 14 e 17 de setembro deste ano, a Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), localizada em Guararema (SP), receberá o III Seminário Diversidade Sexual e de Gênero na Via Campesina Brasil. O evento, já consolidado como um espaço de debate e construção de conhecimento sobre questões relacionadas à diversidade sexual e de gênero, promete reunir mais de 80 participantes de diferentes movimentos que constituem a Via Campesina, abordando temas que vão desde direitos humanos até interseccionalidade de lutas.
Por Mário Manzi - Coletivo LGBTI da Via Campesina Brasil
Registro do II Seminário Diversidade Sexual e Identidade de Gênero na Via Campesina, em 2022. Foto: Emilly Firmino.
Ao considerar a evolução do seminário, torna-se evidente como essa terceira edição pavimenta a trajetória de aprendizado e engajamento que teve início nas edições anteriores. A Via Campesina, uma organização internacional que agrega povos do campo ao redor do globo, tem reconhecido a importância de incluir as pautas de diversidade sexual e de gênero em suas discussões. Esta edição em particular reforça a continuidade deste compromisso, abordando questões que impactam diretamente as vidas de pessoas LGBTI+.
O aspecto internacional do seminário traz à tona a compreensão de que a luta pelo respeito às diversidades sexual e de gênero transcende fronteiras geográficas e culturais. Ao promover intercâmbio de experiências e aprendizados entre diferentes contextos, o evento contribui para a formação de uma rede global de solidariedade e resistência. Afinal, as batalhas por igualdade e justiça para a comunidade LGBTI+ são universais, e a Via Campesina se firma como um espaço onde essas lutas podem ser conectadas e fortalecidas.
Os temas que serão abordados durante o seminário refletem a complexidade das questões em discussão e compreendem desde a dimensão dos direitos humanos LGBTQIA+ no contexto das políticas públicas do governo federal até a interseccionalidade entre luta de classes, superação do capitalismo, racismo e patriarcado, os debates prometem ser profundos e transformadores. O reconhecimento da existência e resistência das pessoas LGBTI+ indígenas em sua defesa pelo território sublinha a importância de reconhecer a pluralidade de identidades presentes nos movimentos do campo.
Registro do II Seminário Diversidade Sexual e Identidade de Gênero na Via Campesina, em 2022. Foto: Emilly Firmino.
O encontro também propõe explorar as contribuições do feminismo camponês e popular para a discussão sobre diversidade sexual e identidade de gênero. Ao trazer a perspectiva das mulheres para o centro do debate, o seminário desafia visões tradicionais e patriarcais que muitas vezes permeiam a luta LGBTI+.
O seminário, portanto, não é apenas um espaço de discussão, mas também uma oportunidade para vivências e trocas entre pessoas que compartilham lutas semelhantes. A importância deste aspecto reside na possibilidade de fortalecer a luta das pessoas LGBTI+ nos diversos movimentos que compõem a Via Campesina. Afinal, as vivências e aprendizados proporcionados pelo evento não apenas enriquecem o conhecimento individual, mas também fortalecem os laços de solidariedade que sustentam as lutas coletivas.
Segundo Luana Oliveira, que faz parte do Coletivo LGBTI+ da Via Campesina Brasil, "o Seminário é, sem dúvidas, um dos espaços formativos que a via Campesina proporciona às pessoas LGBTI no intuito de fazer formação política, fortalecer a pauta da diversidade sexual na luta dos povos, e na luta pelo território, intercambiar experiências com a luta dos povos de países da América Latina, e demais continentes do mundo, contribuindo na auto-organização, e na construção de um projeto popular e de soberania alimentar. Não há emancipação humana se os sujeitos que constroem a lutas estiverem baseados na cultura do machismo, LGBTI+fobia, racismo e individualismo. É necessário superar de maneira coletiva toda e qualquer forma de violência e o seminário, assim como a campanha permanente contra a LGBTI+fobia no campo, são espaços e processos fundamentais para novas relações humanas e o combate às violências."
As estatísticas fornecidas pelo Centro de Comunicação Dom Tomás Balduino (Cedoc-CPT) evidenciam a urgência dessa articulação e do diálogo que o seminário busca promover. Entre 2020 e 2022, foram registrados 10 casos de violência contra pessoas LGBTs no campo. Dentre esses casos, 3 pessoas enfrentaram ameaças de morte, 4 passaram por humilhação ou intimidação (sendo que uma delas foi preso), 1 sofreu tortura e 2 foram tragicamente assassinadaas. É perturbador notar que as violências foram perpetradas por uma variedade de agentes, incluindo grileiros de terras, fazendeiros, empresários, polícia militar e até mesmo líderes religiosos.
Registro do II Seminário Diversidade Sexual e Identidade de Gênero na Via Campesina, em 2022. Foto: Emilly Firmino.
Diante desse cenário, torna-se evidente que o seminário desempenha um papel vital na promoção da conscientização, resistência e busca por justiça para as pessoas LGBTI+ nas comunidades do campo, das águas e das florestas. Ao proporcionar um espaço para discussões profundas, troca de experiências e articulação internacional, o evento oferece uma plataforma poderosa para a construção de um movimento inclusivo e unificado que rejeita a violência e a opressão e busca um futuro de igualdade e dignidade para todos.
O III Seminário Diversidade Sexual e de Gênero na Via Campesina Brasil se apresenta como uma etapa crucial na caminhada rumo à igualdade e respeito às diversidades nas comunidades do campo, das águas e das florestas. Ao conectar a luta LGBTI+ com questões de território, justiça social e ambiental, o seminário amplia o horizonte das discussões e reforça a mensagem de que, verdadeiramente, não há revolução sem a inclusão e reconhecimento das existências e resistências LGBTI+.
Por Heloisa Sousa | CPT Nacional
Com informações da CPT CE
Fotos: CPT CE
Entre os dias 08 e 09 de setembro, a Comissão Pastoral da Terra Regional Ceará realizou a oficina "Registro de Conflitos no Campo", na Casa de Acolhida e Retiro das Imãs Josefinas, em Fortaleza (CE). Com o objetivo de conhecer e se apropriar dos instrumentos e metodologias de registro dos conflitos no campo, fortalecendo o acompanhamento das equipes regionais da CPT nesses conflitos, a formação contou com a facilitação de Flávio Marcos, do Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (Cedoc-CPT).
Nos dias de oficina foram realizadas apresentação de dados, debates e encaminhamentos para aperfeiçoamento dos registros dos conflitos envolvendo povos do campo, das florestas e das águas da região. "Foi um momento reafirmar que a documentação desempenha um papel fundamental na capacidade da CPT de cumprir sua missão de defender os direitos das comunidades rurais, promover a justiça social e lutar contra a violência no campo. A Comissão Pastoral da Terra ajuda a amplificar as vozes das comunidades rurais e a buscar soluções para os desafios que elas enfrentam", destaca Flávio Marcos.
Segundo Claudiano Sobral, agente da CPT-CE, o combate à violência no campo se torna cada dia mais complexo, mas as ferramentas e metodologias disponibilizadas pela CPT auxiliam na construção de melhores estratégias contra essa violência. "Nosso principal objetivo é a defesa da vida e este objetivo só é alcançado através do conhecimento, da parceria com organizações que apoiam essa pauta e da nossa inserção nos espaços de enfrentamento à violência no campo. Essa oficina é um primeiro passo para que possamos qualificar melhor a nossa ação para acompanhar com mais qualidade esses conflitos".
Estiveram presentes agentes de cinco equipes acompanhadas pela CPT Ceará: Fortaleza, Sobral, Itapipoca, Limoeiro do Norte e Iguatu, além do assessor da CPT Ceará, professor Francisco Amaro Gomes de Alencar.
Relatório anual da CPT teve lançamento regional no 5 de setembro, Dia da Amazônia, com foco nos dados de conflitos do Acre e do Sul do Amazonas
O lançamento contou com a presença de trabalhadoras e trabalhadores do campo, que dividiram espaço com representantes de movimentos e organizações sociais, órgãos do governo estadual e federal e do parlamento acreano. Foto: CPT Acre
Na manhã cinzenta do dia 05 de setembro, a Comissão Pastoral da Terra Regional Acre (CPT-AC) realizou o lançamento da publicação Conflitos no Campo Brasil 2022, em Rio Branco (AC). A névoa, característica desta época de queimadas na região, deu o tom do debate sobre conflitos, no simbólico Dia da Amazônia. O auditório do Instituto São José ficou apinhado de trabalhadoras e trabalhadores do campo, que dividiram espaço com representantes de movimentos e organizações sociais, órgãos do governo estadual e federal e do parlamento acreano.
Ao início do evento, seringueiras e seringueiros levaram à mesa diversos elementos representativos de suas culturas, como cacho de açaí, objetos artesanais de borracha, poronga, cacho de banana, farinha, ouriço de castanha, remo de canoa. A mesa de abertura foi composta por Ivanilda Santos, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi-AC); Edvaldo Magalhães, deputado estadual pelo PCdoB; Luis Henrique Corrêa Rolim, promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC); Cesário Campelo Braga, coordenador do escritório do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar no Acre (MDA); padre Anderson Marçal Dias, da Diocese de Rio Branco; Darlene Braga, da coordenação da CPT-AC.
As pessoas que constituíram a mesa de abertura acolheram os presentes e falaram sobre a importância do lançamento da publicação no estado. Dentre as falas, foi feita memória a Dom Moacyr Grechi, falecido no ano de 2019, que foi o primeiro presidente da CPT e bispo da Prelazia Acre e Purus, hoje Diocese de Rio Branco.
Após a mesa de abertura e acolhida, foi instalada a mesa para discussão dos dados de conflitos relativos ao Estado do Acre, bem como de escuta de lideranças de comunidades vítimas das violações de direitos. Compuseram a mesa Sara Braga, agente pastoral da CPT-AC; professor Dr. José Alves, da Universidade Federal do Acre (UFAC); Professor Dr. Afonso das Chagas, assessor jurídico da CPT; Maria Lucilene da Conceição, liderança do Seringal São Bernardo, Colocação Campo Verde; Paulo Sérgio Costa de Araújo, liderança da Comunidade Marielle Franco; Maria da Conceição Ramos de Almeida, liderança da Comunidade Lago Novo, Boca do Acre (AM).
“No ano de 2022 nos despedimos de um governo fascista, mas ainda sofremos as consequências, que estamos aqui para denunciar. O relatório é a nossa forma de expor, gritar e denunciar desde sua primeira edição em 1985”, iniciou Sara Braga como preâmbulo, para, em seguida, apresentar os dados gerais de conflitos do Acre. Ela também explicou sobre o contexto de violência da região sul do Estado do Amazonas, cuja questão agrária mantém vínculos com o contexto acreano, uma vez que as comunidades da região amazonense têm de recorrer às estruturas de estado do Acre, por conta da proximidade geográfica, como também por partilhar dos mesmos agentes causadores dos conflitos.
Maria Lucilene da Conceição emendou a fala, com um relato sobre a vivência em território tradicional sob conflito. “Hoje eu estou aqui para falar da situação que a gente vive, o seringal mais próximo de Rio Branco, que é o lugar mais abandonado do estado do Acre. Sou filha de seringueiro e agricultora. Para sair de lá precisa muito [esforço] e no inverno é só lama. A gente recebe muita ameaça do fazendeiro, ele diz que a gente é invasor. Como que a gente é invasor, se a gente vive a vida toda lá? [A gente] não pode fazer uma farinha, tirar castanha, não tem luz. Por isso a gente pede ajuda dos órgãos públicos, por uma questão de saúde também, não tem uma escola para os nossos filhos, a gente não pode viver deste jeito. Não é questão de ter uma vida boa, mas uma vida melhor. [Os políticos] só vão no ramal para pedir voto”.
Professor José Alves ressaltou, em seguida, a distância entre o conhecimento acadêmico e a realidade vivida pelas comunidades. Ele enfatizou a necessidade de estabelecer laços estreitos com as comunidades para que possam ser realizadas mudanças significativas no sentido de justiça social. Alves lamentou a ausência de representantes da Defensoria Pública e salientou a importância dos dados na busca por ações governamentais e políticas públicas. Além disso, alertou para a crise alimentar, a falta de refeições diárias que é a realidade de muitas famílias do campo, especialmente no contexto das lutas por terra e território.
No tocante ao eixo Terra, Alves identificou a nova frente do capitalismo como uma ameaça, com terras bloqueadas e tentativas de criminalização da luta pela terra. Ele recobrou à memória o "Dia do Fogo" e o desmantelamento das políticas de fiscalização e proteção ambiental, para apontar a omissão do poder público na defesa das comunidades e da terra como riqueza. Para ele, o trabalho escravo se tornou o "DNA" da agricultura moderna, contrastando com o discurso vazio do desenvolvimentismo.
O professor Afonso das Chagas trouxe à luz a realidade da Zona de Desenvolvimento Sustentável (ZDS) Abunã-Madeira, uma região que não é apenas um projeto a ser implantado, mas um processo em curso. Compreendendo 32 municípios dos estados do Amazonas, Acre e Rondônia, a ZDS é um projeto piloto que se estende além de suas fronteiras geográficas, e deve, segundo sua explicação, ser exportado para outras áreas da Amazônia. Ele alertou para a tentativa de "Rondonização" da região, caracterizada pelo avanço da pecuária e da agricultura, que ameaça seriamente destruir a Amazônia, tratada como um espaço vazio pelos interesses econômicos. Chagas destacou o aumento da violência nos últimos anos na região, revelando uma conexão intrínseca entre a expansão da agropecuária e diferentes formas de violência.
Ele destacou que a violência precede a institucionalização da ZDS, e se ligam às práticas que ocorrem à medida que a fronteira agrícola avança. O professor apontou que a letalidade na região é alarmante e não se restringe apenas aos grandes produtores, mas também envolve a cumplicidade do Estado por meio de sua omissão em combater essas violações de direitos. Chagas enfatizou a insuficiência das ações até o momento e defendeu a necessidade de focar no enfrentamento da violência com base nas experiências das pessoas que vivem nos territórios afetados. Ele também se posicionou veementemente contra a "desamazonização" da região, destacando a importância de preservar a Amazônia e enfatizou o compromisso da CPT em trilhar o caminho histórico correto, mesmo diante das dificuldades.
Paulo Sérgio Costa de Araújo, liderança da Comunidade Marielle Franco, localizada em Boca do Acre (AM), expôs seu relato posteriormente à fala de Chagas. "Nossa comunidade sofre com ameaça e violência de fazendeiros, e com o tráfico de influências por conta da relação destes fazendeiros com policiais da região. [Os fazendeiros] possuem tudo à disposição deles, até registrar [violações] é dificultado. Também não somos recebidos pelo poder público. Já fui ameaçado várias vezes, fui inclusive alvejado. Os fazendeiros são organizados, eles dificultam que o agricultor consiga trabalho em outros lugares na mesma região. Durante uma denúncia [que fizemos], ele [os policiais] vazaram as informações [para os fazendeiros]. Em um dos casos meu amigo foi ameaçado com um tiro no pé, situação passada para a polícia federal, mas disseram que não são responsáveis por essa área. Teve uma matéria dizendo que o fazendeiro é criminoso, os fazendeiros jogam veneno na água que passa pela nossa mata. Nosso problema não são apenas os fazendeiros". Encerrou, Araújo.
Darlene Braga tomou a palavra para introduzir a fala de outra vítima da violência no campo e relembrou que quem mais sofre com as situações de violação de direitos são as mulheres e as crianças. Segundo ela, criou-se um sistema de criminalização contra as mulheres, e que são elas que estão segurando as organizações e movimentos sociais.
Conceição Ramos de Almeida, liderança da Comunidade Lago Novo, localizada no município de Boca do Acre, no sul do Amazonas, área acompanhada pela equipe de agentes da CPT-AC, agradeceu o apoio da pastoral. "A comunidade é um lugar de abrigo, de apoio quando precisa. Somos pequenos agricultores e temos dificuldade de sair, para jogar uma piçarra [material utilizado para melhorar o acesso aos ramais]. Só saímos do nosso ramal para pedir ajuda, pedir socorro. Não plantamos muito com medo de perder a produção, tiramos a verdura de canoa, é um trabalho pesado realizado por mulheres, num sobe e desce barranco", finalizou.
Após o encerramento da mesa, as pessoas presentes foram chamadas para participar e tecer perguntas às autoridades presentes. Ao fim, Sara Braga auspiciou que, no futuro, não haja mais conflitos. "A gente tem um sonho, que nos próximos anos não tenhamos que falar de conflito de terra", concluiu.
O lançamento contou com a presença de trabalhadoras e trabalhadores do campo, que dividiram espaço com representantes de movimentos e organizações sociais, órgãos do governo estadual e federal e do parlamento acreano. Foto: CPT Acre
Análise de dados alerta sobre conflitos no campo, no Estado do Acre, em 2022
Os números divulgados recentemente pelo Centro de Documentação Dom Tomás Balduino (Cedoc-CPT) revelaram dados alarmantes nos conflitos por terra na região da Amazônia Legal em 2022. A análise abrangente dessas informações revela um cenário preocupante de violações de direitos por terra e território no Brasil, exigindo uma ação imediata das autoridades e atenção da comunidade internacional especializada.
Aumento Expressivo no Número de Conflitos por Terra - Em 2022, o Brasil registrou 1.572 ocorrências de conflitos por terra, um aumento de 16,70% em relação ao ano anterior. O número de famílias afetadas por esses conflitos também aumentou em 4,61%, totalizando 181.304 famílias. O estado do Acre, por sua vez, registrou 60 conflitos por terra, afetando 8.380 famílias. No entanto, esses números são ainda maiores se considerarmos a região do sul do Amazonas, que sofre influência direta dos conflitos identificados no Estado.
Trabalho Escravo e Manifestações de Resistência - Além dos conflitos por terra, o Acre registrou 2 casos de trabalho escravo, envolvendo 49 pessoas. No total, foram registrados 62 conflitos no campo, afetando 33.569 pessoas em todo o estado. Houve também 8 ocorrências de manifestações de resistência que mobilizaram 1.400 pessoas no Acre.
Amazônia Legal: Um Foco de Tensões - A região da Amazônia Legal foi particularmente afetada pelos conflitos em 2022. Foram registrados 1.107 conflitos no campo, representando mais da metade de todos os conflitos no país (54,86%). O aumento em relação ao ano anterior foi de 25,80%, destacando-se os conflitos por terra.
Os conflitos por terra na Amazônia Legal aumentaram mais de 33% em comparação a 2021, chegando a 926 ocorrências em 2022. Isso representa uma preocupação significativa, uma vez que a região concentrou 59% de todos os conflitos desse tipo no país, um aumento em relação a 2021, quando a região respondeu por 51% das ocorrências.
Desafios Significativos e Omissão das Autoridades - A Amazônia Legal também enfrentou um alto número de assassinatos no campo, com 34 dos 47 registrados em todo o país ocorrendo na região, representando 72,35% do total. Esses números destacam desafios significativos em termos de segurança pública e proteção dos direitos humanos das comunidades da floresta, bem como uma preocupante omissão e conivência das autoridades diante dos conflitos.
Zona de Desenvolvimento Sustentável Abunã-Madeira (Amacro) - A região da Zona de Desenvolvimento Sustentável Abunã-Madeira, situada dentro da Amazônia Legal, engloba 32 municípios em três estados e abrange uma área de mais de 454 mil km². Em 2022, foram registrados 150 casos de conflitos por terra na região, o terceiro maior número dos últimos dez anos. Esses conflitos frequentemente envolvem disputas entre grandes empresas e comunidades tradicionais.
A ZDS apresenta índices alarmantes de violência contra a pessoa, incluindo prisões, ameaças de morte, tentativas de assassinato e assassinatos. Nos últimos dois anos, 20 pessoas perderam a vida na região, sendo oito delas em 2022.
Ação Urgente é Necessária - Esses dados alarmantes exigem ação imediata das autoridades brasileiras e atenção da comunidade internacional especializada em questões de violações de direitos por terra e território. É essencial que medidas eficazes sejam tomadas para proteger as comunidades afetadas e buscar soluções para os conflitos na Amazônia Legal.
Por Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações da CPT Amazonas e Agência Cenarium Amazônia
Foto: Marcelo Seabra - Agência Pará
Uma verdadeira vitória das comunidades ribeirinhas, quilombolas e indígenas do Pará. Assim se pode descrever a conquista da Estação Ecológica (Esec) Mamuru, ocorrida nesta terça-feira (05), a partir da assinatura do decreto pelo Governo do Estado, oficializando a 28ª Unidade de Conservação (UC) Estadual entre os municípios de Aveiro e Juruti, na região oeste paraense, divisa com o estado do Amazonas.
A Esec Mamuru é estratégica para garantir a proteção de espécies ameaçadas de extinção e a manutenção dos serviços ambientais. Com 126 mil hectares, a nova unidade de proteção integral do meio ambiente vai reforçar o mosaico de áreas protegidas da região, que incluem parques nacionais com uma variada biodiversidade e ecossistemas diversos.
Para a equipe da Comissão Pastoral da Terra da Diocese de Parintins, a oficialização da Estação Ecológica tem o sabor de realização de um sonho do saudoso coordenador Sérgio Muniz, falecido no último dia 24 de agosto. Também integrante da Comissão de Direitos Humanos de Parintins e Amazonas (CDDHPA), Sérgio lutou junto com as comunidades e fez muitas viagens junto com colegas de trabalho e militância, também, na CPT Amazonas e Arquidiocesana de Manaus.
No local, não será permitido nenhum tipo de atividade produtiva, sendo proibida a visitação pública, a não ser com objetivos educacionais, de acordo com o Plano de Manejo da unidade. Outro ponto é que as áreas de particulares dentro de seus limites devem ser desapropriadas, de acordo com o que dispõe a legislação que trata de unidades de conservação de proteção integral.
“Lá será admitida apenas a preservação, os estudos científicos e a atividade de educação ambiental. Essa unidade é feita para proteger o coração da Amazônia, para proteger a diversidade biológica que lá existe, que é fundamental para nós, para o país e para o mundo”, afirmou o presidente do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade (Ideflor-Bio), Nilson Pinto.
Estudos feitos pelo Instituto nos últimos anos analisaram o valor biológico das espécies e a necessidade de preservar a área da ação predatória. A região é bastante sensível e vítima do desmatamento, pela extração ilegal de madeira e de riscos à fauna e flora locais.
“Outros órgãos judiciais, ambientais, coletivos e instituições labutaram muito por esse dia, como o Grupo Natureza Viva (GRANAVE), Associação dos Assentados do PA Vila Amazônia, Coletivo em Defesa da Amazônia Rio Mamuru, a Rede Cidadã Parintinense; MTCA, Padres em Novas Dimensões, Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Parintins, Polícia Federal do Amazonas, Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União do Amazonas e Roraima (DPU/AM-RR), MPE/PA e demais entidades ambientais paraenses”, relembra o professor e Dr. Manuel do Carmo da Silva Campos, da CPT-AM e Arquidiocesana de Manaus.
“Malditas sejam todas as cercas!
Malditas todas as propriedades privadas que
nos privam de viver e de amar!
Malditas sejam todas as leis, amanhadas por
umas poucas mãos, para ampararem cercas e
bois e fazerem da terra escrava e escravos os
homens!”. Pedro Casaldáliga, bispo católico e poeta do Araguaia, cofundador da CPT.
Foto: Júlia Barbosa | CPT Nacional
"Reforma Agrária Já!" foi a frase que mais ecoou em Cuiabá (MT) durante a 3ª Semana de Resistência Camponesa, entre 28 de agosto e 1º de setembro de 2023. Com a participação de cerca de 350 camponesas e camponeses de todas as regiões do estado, as atividades ocorreram de forma tranquila e alcançaram os objetivos de ser um processo de formação para o povo do campo e de diálogo com a sociedade.
Durante a semana, os camponeses denunciaram a urgência da implementação da política pública de reforma agrária em Mato Grosso e a grilagem de terras, além de decisões do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que impedem que terras públicas sejam destinadas imediatamente ao assentamento de centenas de famílias no estado, muitas que vivem acampadas há mais de 15 anos.
Diversas atividades foram realizadas, como a audiência popular “Grilagem de Terras e Conflitos Fundiários em Mato Grosso”, com o objetivo de discutir a realidade da grilagem de terras no estado e suas consequências; seminários realizados pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH/MT) sobre “Violação de Direitos Humanos no Acesso e Permanência na Terra” e a “Construção de Políticas Públicas Agrária e Prevenção aos Despejos em Mato Grosso”; rodas de conversas sobre temas como violência contra a mulher, trabalho escravo, sementes crioulas, papel da Defensoria Pública na defesa do direito agrário, saúde popular, plantas medicinais, entre outrAs; feira Agroecológica e Cultural, com apresentações artísticas e comercialização de produtos da agricultura familiar; oficinas práticas de produção agroecológica e geração de renda. A semana se encerrou com a Romaria da Terra e Resistência Camponesa, onde o povo professou sua fé e esperança, para seguir lutando.
Com exceção do Governador do estado, Mauro Mendes, todos os demais órgãos se reuniram, durante a semana, com as lideranças das famílias e das instituições organizadoras do evento, Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Na Justiça Federal, o diretor do foro se comprometeu a enviar as pautas apresentadas ao TRF1; O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) enviou uma comissão de Brasília, e se comprometeu em providenciar a estrutura física para funcionamento do órgão ainda este mês, além do agendamento de reunião com o presidente nacional para o dia 18/09; na Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso, o compromisso foi de fortalecimento do Núcleo Agrário, que é o responsável em atender as famílias envolvidas em conflitos fundiários coletivos.
Com a certeza de que Lutar Não é Crime!, seguimos em marcha na luta pela construção de uma sociedade mais justa e fraterna, na qual todas e todos possam viver dignamente.
Cuiabá (MT), 6 de setembro de 2023.
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