Por Leonardo Sakamoto | UOL
Foto: GEFM
Uma megaoperação com 222 ações de fiscalização em 131 municípios de 22 estados e no Distrito Federal resgatou 532 pessoas de condições análogas às de escravo. Desses, 441 são homens e 91 mulheres. Seis são crianças e adolescentes, e dez trabalhadoras domésticas — uma delas com 90 anos.
A Operação Resgate 3, realizada ao longo do mês de agosto, foi um esforço concentrado de auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego, procuradores do Ministério Público do Trabalho e do Ministério Público Federal, agentes da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal e defensores da Defensoria Pública da União.
A operação está sendo considerada a maior para o combate a esse crime na história do país, não pelo número de resgatados (em 2007, 1.064 foram libertados em uma só fazenda de cana e usina em Ulianópolis, no Pará), mas pela estrutura envolvida, a quantidade de ações fiscais simultâneas e a diversidade de atuação.
"Não é possível que a gente continue com empresas e pessoas físicas que coloquem um ser humano em trabalho análogo à escravidão. Precisamos dar um basta nisso, provocar a sociedade à indignação para dizer chega, basta, não é possível", afirmou o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, em coletiva à imprensa, na tarde desta terça (5). O evento contou com a presença dos representantes das instituições, como José de Lima Pereira, procurador-geral do Trabalho.
Marinho também destacou que a situação, além de custar caro ao povo brasileiro, também pode cobrar um preço alto de nossa balança comercial. "Uma atividade econômica que assume o risco dessa mancha coloca em risco a imagem dos nossos produtos", disse.
O cultivo de café foi a atividade com o maior número de resgatados, com 98 vítimas, quase empatada com o cultivo de alho (97). Na sequência, há o cultivo de cebola (84), a extração de carnaúba (54), a produção de ovos (23), a produção de cerâmica (22), a fabricação de álcool (20), a prestação de serviços a restaurantes e similares, a produção de carvão a partir de floresta plantada e o cultivo de laranja (17, cada), a criação de bovinos para corte (15), a confecção de vestuário (13), os serviços domésticos e a construção civil (10, cada), entre outros.
Desde 1995, quando o Brasil reconheceu diante das Nações Unidas a persistência de trabalho escravo, mais de 61,7 mil pessoas foram resgatadas por grupos de fiscalização com a participação dessas instituições. A diferença é que a Operação Resgate realiza um ataque ao crime de forma simultânea, tanto na área urbana quanto na rural.
Minas Gerais foi o estado com o maior número de resgatados na operação, com 204 vítimas. Na sequência, aparecem Goiás (126), São Paulo (54), Piauí e Maranhão (42, cada), Bahia (11), Rio de Janeiro (9), Paraná (8), Rio Grande do Sul, Tocantins e Acre (7, cada), Mato Grosso (6), Rondônia (5), Pernambuco e Espírito Santo (2, cada).
"A Operação Resgate 3 demonstra o compromisso do Estado em erradicar o trabalho escravo contemporâneo, com ações nas grandes cidades, mas também em locais remotos. E deixa clara a importância da cooperação entre entes públicos para atuar em problemas complexos. A operação é, na sua essência, fruto da cooperação interinstitucional", afirma o auditor fiscal Matheus Viana, chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo do MTE.
A avaliação é a mesma do procurador Italvar Medina, vice-coordenador da Conaete, área do MPT responsável pelo combate a esse crime. "A operação atingiu números expressivos de equipes e resgates, sendo a maior já realizada na história do país para combate ao trabalho escravo e tráfico de pessoas, o que demonstra a importância da integração entre os órgãos públicos", avalia.
Mulher de 90 anos foi resgatada do trabalho escravo doméstico no Rio
Uma trabalhadora doméstica negra de 90 anos foi encontrada pela Operação Resgate 3, no último dia 22, em uma residência no Grajaú, Zona Norte do Rio de Janeiro. Ela trabalhava para a mesma família há 50 anos e, como doméstica, há 16. Entre suas tarefas estava cuidar de uma mulher de mais de 100 anos, mãe de sua empregadora. Ela dormia em um sofá.
Foto: Operação Resgate
Ela foi a pessoa mais idosa resgatada desde que o Brasil implementou o seu sistema de combate à escravidão contemporânea em 1995.
Com isso, tirou o triste título de outra mulher de 84 anos, resgatada de condições análogas às de escravo após 72 anos trabalhando como empregada doméstica para três gerações de uma mesma família também no Rio em maio do ano passado. Nesse período, cuidou da casa e de seus moradores, todos os dias, sem receber salário, segundo a fiscalização. Essa foi a mais longa duração de exploração de uma pessoa em escravidão contemporânea desde 1995.
O Rio Grande do Sul contou com a maior quantidade de resgatadas do trabalho escravo doméstico (3), seguido por Pernambuco e Rio de Janeiro (2, cada), e Minas Gerais, Bahia e São Paulo (1, cada). As verbas rescisórias das trabalhadoras empregadas domésticas resgatadas totalizam quase R$ 1,8 milhão.
Além das seis crianças e adolescentes encontrados em situação análoga à de escravo, outros 26 foram retirados do trabalho infantil. As principais atividades em que estavam eram o cultivo de alho (6 vítimas), seguido de atividades realizadas após a colheita (5) e criação de bovinos para corte (4).
Dois dos resgatados são pessoas com deficiência, uma em Balsas (MA), outra em Buritis (RO).
A estimativa de verbas rescisórias e direitos já pagos pelos empregadores é de R$ 2,8 milhões frente a um valor total devido de R$ 6,1 milhões. Os trabalhadores também vão receber três parcelas de um salário mínimo do seguro-desemprego especial para resgatados da escravidão, criado em 2003. Estima-se que 1.325 autos de infração tenham sido aplicados pelos auditores fiscais do trabalho.
Soma-se a isso mais de R$ 2 milhões em indenizações por danos morais já pagas, negociadas pelo Ministério Público do Trabalho e pela Defensoria Pública da União. O valor deve aumentar porque outros acordos estão sendo negociados.
A operação tem o objetivo de fiscalizar o cumprimento da proteção ao trabalho, permitir a coleta de provas para responsabilizar, na esfera criminal, os envolvidos na exploração dos trabalhadores e assegurar a reparação dos danos individuais e coletivos causados aos resgatados.
Operação Resgate deste ano foi 58% maior que a de 2022
A Operação Resgate 1 foi realizada em janeiro de 2021, mês em que é celebrado o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo devido à memória dos quatro funcionários do Ministério do Trabalho mortos na Chacina de Unaí. Naquele momento, foram realizadas 128 fiscalizações em 22 unidades da federação e no Distrito Federal, que resgataram 136 pessoas.
Foto: GEFM
Em 2022, a Operação Resgate 2 escolheu julho. Nesse mês, é celebrado o Dia Mundial de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Foram 105 ações de fiscalização, envolvendo 50 equipes em pelo menos 65 municípios de 23 unidades da federação, resgatando 337 pessoas de condições análogas às de escravo em 15 estados.
Trabalho escravo contemporâneo no Brasil
A Lei Áurea aboliu a escravidão formal em maio de 1888, o que significou que o Estado brasileiro não mais reconhece que alguém seja dono de outra pessoa. Persistiram, contudo, situações que transformam pessoas em instrumentos descartáveis de trabalho, negando a elas sua liberdade e dignidade.
Desde a década de 1940, a legislação brasileira prevê a punição a esse crime. A essas formas dá-se o nome de trabalho escravo contemporâneo, escravidão contemporânea, condições análogas às de escravo.
De acordo com o artigo 149 do Código Penal, quatro elementos podem definir escravidão contemporânea por aqui: trabalho forçado (que envolve cerceamento do direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida) ou jornada exaustiva (levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida).
O grupo especial móvel de fiscalização, que completou 28 anos no mês de maio, e é composto pelos órgãos que participam da Operação Resgate, é a base no combate a esse crime no país.
Os mais de 61,7 mil trabalhadores resgatados estavam em fazendas de gado, soja, algodão, café, frutas, erva-mate, batatas, cebola, sisal, na derrubada de mata nativa, na produção de carvão para a siderurgia, na extração de caulim e de minérios, na construção civil, em oficinas de costura, em bordéis, entre outras atividades, como o trabalho doméstico.
A pecuária bovina é a principal atividade econômica flagrada desde 1995. Números detalhados sobre as ações de combate ao trabalho escravo podem ser encontrados no Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil.
Promovido pela Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais, o debate foi presidido pela deputada Célia Xakriabá (Psol-MG) e contou com depoimentos de vítimas de violência no campo, nas águas e nas florestas.
Texto e Fotos: Nathalia Carvalho / Campanha Contra Violência no Campo
Na última quinta-feira (31/8), em meio ao julgamento do Supremo Tribunal Federal e às mobilizações ao redor do país contra a Tese do Marco Temporal e em favor dos direitos dos povos indígenas, a Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais promoveu um debate sobre a Campanha Contra Violência no Campo: pelos povos do campo, das águas e das florestas. Na ocasião, foram trazidos à memória casos emblemáticos de violência por território no país, depoimentos de vítimas desses conflitos e apresentação de dados atualizados sobre o tema.
“Hoje, essa audiência se trata, sobretudo, para escancarar e para dizer que as nossas vozes não podem ser ocultadas. Não queremos tornar estatística de violência, mas quem não conta nossos vivos, certamente não contará os nossos mortos”, destacou Célia Xakriabá, em fala de abertura.
Participaram da audiência: Dom Ionilton, presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e representante da Campanha Contra a Violência no Campo; Tales dos Santos Pinto representante do CPT Nacional; Luis Ventura, secretário adjunto do Conselho Indigenista Missionário (Cimi); Marta do Socorro Farias Barriga, representante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Ana Lúcia Rocha Souza, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag); Dinaman Tuxá, representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e Ana Luisa Zago, representante do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
“A Campanha Contra Violência no Campo nasceu como uma forma de mobilizar outras forças que também trabalham em defesa da vida e da proteção dos povos do campo, das águas e das florestas. A gente quer o fim da violência, para se poupar vidas e para se preservar a natureza, as águas e os territórios, por meio de ações e políticas de proteção aos povos e comunidades”, destacou Dom Ionilton, representante da Campanha e presidente da CPT.
A Campanha já é formada por mais de 60 organizações e movimentos sociais e pastorais que unem forças na busca por justiça, reconhecimento e visibilidade da pauta, com o objetivo de fortalecer as ações de enfrentamento à violência no campo.
A audiência pública também contou com a presença da deputada Erika Kokay (PT-DF), do deputado Chico Alencar (Psol-RJ) e de representantes de diferentes povos e comunidades indígenas, entre eles: Guarani Kaiowá, Xerente, Xakriabá, Terena, Kayapó, Pataxó e Kaxarari.
DADOS DE VIOLÊNCIA
Ao apresentar os dados do Caderno de Conflitos no Campo Brasil 2022, publicado pela CPT no início deste ano, Tales dos Santos chamou atenção para um crescimento de 10% nos registros de conflitos dentro dos eixos terra, água e trabalhista, em relação ao ano anterior, representando quase 1 milhão de pessoas envolvidas nesses conflitos.
“Nesses últimos quatro anos, nós percebemos uma média de 1.900 conflitos anuais, contrastando com os períodos anteriores. Isso se manifestou em uma série de violências específicas, principalmente nos casos de invasão de territórios, grilagem e pistolagem”, alertou Tales.
Segundo o relatório, entre 2013 e 2022, foram 7.537 ocorrências de violência por terra e pela água, afetando cerca de 2.227.008 famílias.
“As ameaças de morte podem se agravar ao longo do tempo, sobretudo, por não haver atuação coordenada do Estado no sentido de eliminar as causas que são geradoras de violência,” concluiu o representante do CPT.
O debate também trouxe luz aos dados do Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil 2022, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário. O estudo registrou, só no ano passado, 158 casos de conflitos por direitos territoriais e 416 casos de violência em terras indígenas.
Para Luis Ventura, a falta de providência quanto à demarcação e proteção das terras indígenas, a liberação de armas, o descumprimento do Estado a acordos internacionais e o uso da força policial para coagir e oprimir os povos indígenas são algumas das razões que determinam o aumento expressivo da violência em todas as categorias formuladas pelo relatório.
“O verdadeiro enfrentamento da violência contra os povos indígenas se dará quando o Estado compreender que os territórios indígenas não se vendem e que os direitos indígenas não se negociam”, concluiu Ventura.
Acerca dos dados registrados pelos relatórios sobre violência, o representante da Apib, Dinaman Tuxá, falou sobre o genocídio institucional que assola o país em forma de projeto político, enfraquecendo as instituições e gerando um aumento nos conflitos socioambientais e disputa por território.
“Quando o Estado brasileiro se omite e declara de forma clara que é contra os povos indígenas nós nos levantamos. É preciso identificar quem são os responsáveis por financiar essa política genocida”, concluiu.
RETRATOS DA OMISSÃO
A audiência ocorreu após quase um mês do assassinato da Mãe Bernadete Pacífico, importante liderança quilombola e ialorixá, que lutava por justiça acerca do assassinato do filho Binho do Quilombo - também vítima de conflito no campo.
A representante do MPA, Marta Barriga, destacou a certeza da impunidade, o machismo e o patriarcado como ferramentas chave no aumento dos índices de violência no campo, nas águas e nas florestas.
“É desigual a luta em relação aos crimes ambientais, à grilagem de terras, e aos grandes projetos do capital. Então a gente precisa ter a esperança de que essas pessoas vão ser escutadas. Não é fácil você estar com a sua família na sua casa e pessoas travestidos de seguranças portando armamento pesado ingressarem nas suas casas”, destacou Marta.
O evento também contou com o depoimento de Ana Lúcia Rocha, representante da Contag e moradora de São Benedito de Rio Preto, no Maranhão. Ela relatou o histórico de ameaças e violência que a sua comunidade, Baixão dos Rochas, sofre desde 2015, quando duas empresas invadiram o seu território, impactando o sustento e a paz dos moradores locais.
“A gente já tinha procurado ajuda do sindicato, da prefeitura do município, mas ninguém nos apoiou. Nesse ano [2023] aconteceu o ataque mais cruel, porque destruíram as nossas casas, árvores e animais. Eles tentam nos intimidar, nos calar, porque eles sabem que a gente está lutando pelo que é nosso por direito”, destacou.
Para Jesus Gonçalves, representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Estado tem dado continuidade à violência contra os povos, a partir da ausência de uma Reforma Agrária, da falta de demarcação de terras indígenas e da não regularização de territórios quilombolas no país.
“Não existe exploração da floresta, porque ela não tem existido mais. No Pará, nós temos o maior índice de grilagem de terra, mais de 2 mil famílias na lista de despejo e mais de 100 defensores na lista de ameaçados. Se o ataque contra nós é sistêmico, organizado e coletivo nós também devemos nos organizar”, concluiu.
Assista a Audiência Pública na íntegra.
Por CPT NE2
Nessa segunda-feira, 04, organizações e movimentos sociais do campo em Pernambuco participaram de uma audiência realizada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). O objetivo foi discutir estratégias de combate à violência no campo que em 2022 atingiram mais de 30 mil famílias no estado, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). A audiência ocorreu na Sede do Incra, no Recife.
Compuseram a mesa de discussão: Marluce Melo, agente pastoral da CPT, Cícera Nunes, presidenta da Fetape, Ivanildo Costa de França, do Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST), Renato Carvalho, da Via Trabalho, Alexandre Conceição, assessor do MDA, Caetano de Carli, coordenador estadual do MDA, Rose Rodrigues, diretora Nacional de Desenvolvimento do Incra, e Givaldo Cavalcante, superintendente do Incra em Pernambuco. Também estiveram presentes na ocasião Claudia Maria Dadico, diretora do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Agrários do MDA, e André Luiz Bomfim Ferreira, coordenador Geral de Implantação do INCRA.
Durante a audiência, as organizações sociais expuseram a realidade de conflitos agrários no estado e cobraram medidas para o fim da violência no campo, com atenção especial para a Zona da Mata, responsável por concentrar 52,3% do total de ocorrências de conflitos em Pernambuco em 2022, de acordo com o levantamento da CPT. Na região, os conflitos se arrastam há anos e envolvem, de um lado, diversas comunidades posseiras que vivem na localidade a pelo menos 70 anos e, do outro, empresas do ramo da pecuária que arrendam ou adquirem a preços vis terras de usinas de cana-de-açúcar e detentoras de dívidas milionárias com os cofres públicos e com antigos/as trabalhadores rurais.
A CPT recebe frequentes relatos de agricultores e agricultoras da localidade sobre situações de intimidações, ameaças de morte e de remoção forçada, destruições e queimadas de lavouras, destruição de fontes d'água com agrotóxicos, perseguições, além de esbulho de suas posses. Apesar de os conflitos concentrarem-se naquela região geográfica, foi ressaltado a importância de o Incra tomar as rédeas para garantir vistorias e desapropriações em todo o estado. Na ocasião, representantes da autarquia anunciaram a realização de oito vistorias de imóveis nesta primeira etapa de diálogo, além de avanço nas tratativas e procedimentos que envolvem usinas como a Maravilha, a Frei Caneca e a Cruangi. Também ficou pactuado entre as organizações sociais e autoridades a realização de uma audiência pública sobre o tema, além da realização de reuniões mensais com o MDA e o Incra para monitorar o andamento das medidas de Reforma Agrária e de combate à violência no campo.
Marluce Melo, da CPT, ressalta a importância do encontro. “Foi uma audiência necessária, o reinício de um diálogo com o Incra e com o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para tratar do quadro de violência no campo no estado. A nossa expectativa é que seja reativado o quanto antes o setor de obtenção de terras do Incra e que seja ampliado o número de vistorias. As oito vistoriais anunciadas não são suficientes para amenizar os conflitos instaurados em Pernambuco”, destaca.
Por CPT Regional Acre,
com edição de Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional)
Reunião conjunta de órgãos governamentais e sociedade civil aborda violência e conflitos na Amazônia
Uma série de reuniões conjuntas entre a Comissão Pastoral da Terra Regional Acre (CPT-AC), a Articulação das CPTs da Amazônia e diversos órgãos governamentais aconteceu entre os dias 28 de agosto a 1º de setembro, com o propósito de discutir a crescente onda de violência em territórios do sul do Amazonas.
O epicentro desses conflitos ocorre no município de Boca do Acre (AM), a 950 km de Manaus e na divisa com o estado do Acre, que já recebeu o apelido de "Terra sem lei", onde a violência tornou-se uma constante, afetando severamente a vida de seus habitantes.
Estiveram presentes, além da Comissão Pastoral da Terra, Grupo de Trabalho Amazônico, secretarias estaduais (Segurança Pública, Justiça, Cidades e Territórios, Cidadania e Direitos Humanos), Defensoria Pública do Estado, Procuradoria-Geral do Estado, bem como a Secretaria do Patrimônio da União (SPU) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
O convite para a presença de representantes do poder público serviu para chamar a atenção das autoridades para os conflitos ativos nas regiões, e as violações de direitos humanos que atingem as famílias, lideranças e agentes pastorais.
A equipe contou com a assessoria jurídica do advogado e professor Afonso Chagas, da CPT Rondônia, que analisou a situação alarmante e crescente de criminalização que atinge as lideranças locais. Além disso, observaram um preocupante processo de expropriação de direitos, agravando ainda mais o cenário de tensão.
Durante os diálogos com o Incra, foram abordados: a situação do Seringal Macapá, que desde 2007 testemunha um ciclo de ocupações e despejos, deixando famílias expostas a condições adversas; a questão do Porto Central Seringal, cuja destinação não corresponde aos habitantes da área, segundo informações do Incra; o embate na comunidade Seringal Novo Natal, também conhecida como Mariele Franco/Fazenda Palotina. Cerca de 80 famílias ocuparam essa área em 2015, resultando em um conflito entre os posseiros e fazendeiros.
O encontro com a SPU tratou da urgência de abordar os conflitos em áreas de várzea e a retomada das atividades e entregas dos Termos de Autorização de Uso Sustentável (TAUS), datados de 2013 nos rios Acre e Purus.
Em conjunto com a Secretaria de Estado das Cidades e Territórios (SECTS), foi discutida a necessidade de atenção aos conflitos nas áreas do estado Seringal Entre Rios e Gleba Francisco Sevalhe.
Para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), foi feita a solicitação de investigação sobre multas aplicadas sem fundamento, impactando os povos e comunidades tradicionais das áreas em conflito.
No dia 29, uma audiência pública ocorreu em Manaus, reunindo 45 pessoas, com o objetivo de aprofundar a discussão e buscar soluções para os desafios enfrentados nas zonas afetadas. No mesmo dia, um encontro com a CPT Amazonas visou fortalecer parcerias e cooperação, abrangendo todas as áreas em conflito do sul do Amazonas.
O dia 30 reservou uma série de reuniões estratégicas, incluindo interações com o INCRA Amazonas para tratar das áreas conflituosas, bem como uma sessão na Universidade Federal do Amazonas (UFAM) para discutir cartografia e mapeamento das regiões habitadas por populações tradicionais.
Além disso, uma reunião com o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM) abordou multas e embargos associados às áreas.
No dia 31, uma reunião com a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) concentrou-se na situação das áreas em conflito sob responsabilidade do estado e no funcionamento das escolas em áreas em litígio, enquanto outro encontro ocorreu com a Secretaria de Estado das Cidades e Territórios (SECTS).
Esses eventos ilustraram um esforço coordenado para lidar com os desafios complexos enfrentados pelas comunidades impactadas.
Por CPT NE2
O agricultor Antônio C., liderança da comunidade Barro Branco, Jaqueira (PE), relatou à CPT que ele e sua esposa foram ameaçados de morte na noite da sexta-feira, 01. Segundo informações, a esposa do agricultor foi abordada por um homem armado e encapuzado na estrada que dá acesso ao sítio da família. Com a arma apontada para a cabeça da mulher, o homem teria avisado que a liderança deveria sair "disso" e que havia "muita gente grande por trás disso".
A liderança ainda informou que no dia anterior, 31/08, foi seguido por homens em uma moto na área urbana de Jaqueira e que, ao entrar na estrada que dá acesso ao seu sítio, foi alertado por alguns trabalhadores que havia pessoas com comportamento suspeito paradas na estrada. Além da CPT, a família do camponês também acionou imediatamente o Programa Estadual de Proteção a Defensores e Defensoras de Direitos Humanos (PEPDDH), que já deu início aos procedimentos de proteção à vida do agricultor e família.
A ameaça acontece um dia após o encontro da IFPE, onde a liderança relatou ao Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvo Almeida, e à governadora de Pernambuco, Raquel Lyra, o cenário de conflitos agrários na região da Mata Sul, causados pelo avanço da pecuária extensiva sobre terras onde vivem comunidades posseiras há mais de 70 anos. No dia 01, o agricultor havia participado da Audiência convocada pelo MPE para tratar dos conflitos agrários em Jaqueira, sobretudo os ocorridos nas terras da Usina Frei Caneca, que atualmente encontram-se arrendadas para a empresa Agropecuária Mata Sul S/A. A liderança, além de outros agricultores, vinha sendo criminalizada em razão da defesa dos direitos da comunidade, tendo sido intimado para uma audiência no Fórum de Maraial, no dia 30.
A CPT e a FETAPE estão acompanhando o caso e prestando apoio e solidariedade à família do agricultor e à comunidade do Engenho Barro Branco. As organizações também acompanham a atuação das autoridades e exigem a imediata apuração do caso, a punição dos responsáveis e, sobretudo, a garantia do direito à vida de quem já sofre com consecutivas violações de direitos por lutar por justiça, terra e dignidade no campo.
Ato encerra semana intensa de ocupações, audiências, protocolo de pautas de reivindicação, promessas de reuniões e de formações. Trabalhadores devem se reunir com governador do MT, presidente nacional do Incra e com desembargadores do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1).
Por Comunicação 3ª Semana de Resistência Camponesa
Foto: Bruna Pinheiro/Formad
Com faixas, bandeiras, cruzes, estandartes e muita cantoria, mais de 350 camponeses e camponesas caminharam, em romaria, pelas principais ruas do Centro Político Administrativo (CPA), de Cuiabá (MT). A Romaria da Terra marcou, nesta sexta-feira, 1º, o encerramento da 3ª Semana de Resistência Camponesa, organizada pela Comissão Pastoral da Terra Regional Mato Grosso (CPT-MT) e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST-MT). O evento teve início na segunda, dia 28 de agosto.
A romaria partiu, às 08h30, da Superintendência Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), onde as famílias estavam acampadas em protesto, e, por mais de duas horas, fez paradas em órgãos estratégicos para as pautas do povo do campo, como o Palácio Paiaguás, sede do governo do estado; Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso (TJ-MT); Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema); Secretaria de Estado de Educação; além da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato). A Polícia Militar (PM) acompanhou todo o trajeto.
“Para nós da Comissão Pastoral da Terra estar em Romaria é o que mais representa a vida, luta e resistência do povo camponês, que é o povo de Deus. Apesar de toda a realidade cruel, acreditamos que é só com a luta que se constrói uma outra realidade, onde todas e todos tenham vida digna, terra, trabalho e alimento na mesa. A romaria é quando fortalecemos a nossa esperança para seguir lutando rumo à terra prometida”, explicou Baltazar Ferreira de Melo, da coordenação da CPT.
Neste sentido, a Romaria contou com o apoio e a participação de organizadores e organizadoras do Grito dos Excluídos e Excluídas em Mato Grosso, que neste ano questiona: “Você tem fome e sede de quê? Vida em primeiro lugar”. As mobilizações do Grito acontecerão, em todo o país, no feriado de 7 de setembro.
Pauta de reivindicação
“Durante essa semana, nós debatemos muitos assuntos com autoridades e com os trabalhadores rurais, como a questão da grilagem de terras, a violência no campo, as violações de direitos humanos e a criminalização das pessoas. Estamos cobrando que o estado de Mato Grosso tenha políticas públicas focadas nos direitos humanos e na população camponesas”, disse Inácio Werner, representante do Fórum de Direitos Humanos e da Terra de MT (FDHT).
Em frente ao Palácio Paiaguás, Jair, do acampamento Renascer, do município de Nova Guarita (MT), fez uma fala emocionante: “O povo, que está aqui para defender os seus direitos, garantidos na Constituição Federal, é abandonado e humilhado no campo. Quero denunciar também os abusos de parte do agronegócio e de grileiros, que grilam as nossas terras. Também temos tido problema com veneno, fazendeiros jogando agrotóxicos em nossas crianças. Queria que os funcionários públicos que nos nos ouvem pensem se fosse os seus filhos passando por essas situações, no acampamento e sofrendo com esses conflitos”.
Ocupação do Palácio Paiaguás, sede do Governo de Mato Grosso. Foto: Júlia Barbosa | CPT Nacional
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Reforma Agrária Já: Cuiabá se prepara para receber a 3ª Semana de Resistência Camponesa
Camponeses ocupam Palácio Paiaguás, sede do governo de MT
Camponeses acampados no Incra em Cuiabá (MT) irão se reunir com presidente do órgão
Educação
Outra pauta que permeou a Semana de Resistência Camponesa foi o acesso à educação, como um direito humano, garantido na Constituição Federal. As reivindicações sobre o acesso à educação no e do campo foi pautada em frente ao prédio da secretaria.
“O povo do campo não tem acesso a uma educação de qualidade. Nós precisamos de uma escola em nosso assentamento, pois os nossos filhos precisam percorrer, por dia, 100 quilômetros para estudar, isso sem estrutura nenhuma. Muitos acordam às 04h30 da manhã e chegam em casa às 19 horas. E no inverno isso piora. Eu preciso andar com o meu filho debaixo de chuva, com enxurrada nas estradas, já que os ônibus, em determinados lugares, não vão pegar os alunos”, relatou Mariles Alves, do Pré-Assentamento Boa Esperança, situado em Novo Mundo (MT).
De acordo com reportagem publicada no portal G1 Mato Grosso, em 10 anos, 179 escolas rurais foram fechadas no estado. Neste mesmo período, segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anízio Teixeira (Inep), outras 159 escolas foram abertas na zona urbana nesse mesmo período, o que representa uma política de extinção da educação no campo e a priorização da migração de alunos para os centros urbanos.
“Um estado com tantas riquezas como Mato Grosso e deixa as crianças assim para buscar o ensino. Esse estado rico não tem políticas públicas para a educação no campo. A política que existe é de fechamento das escolas no campo. Somos trabalhadores e temos os nossos direitos garantidos na Constituição Federal”, ressaltou a trabalhadora.
Júlio César, da coordenação estadual do MST, pontuou que o movimento luta pelo acesso a uma educação e pedagogia voltada para que a juventude possa permanecer, viver e crescer no campo. “A educação que queremos para o campo é uma educação libertadora, que faz o estudante pensar e lutar pelos seus direitos. E nós sabemos que a Seduc tem um projeto no estado de fechamento das escolas do campo, quando iniciou um processo de municipalização dos estudantes, colocando eles para pegarem ônibus e andar quilômetros de distância para fazer com que o nosso povo não tenha acesso no e do campo”, afirmou.
Foto: Bruna Pinheiro/Formad
Terceira edição
A 3ª Semana da Resistência Camponesa teve como objetivo chamar a atenção da sociedade e das autoridades para a importância e a necessidade urgente de reforma agrária em Mato Grosso, além de denunciar casos de grilagem de terras públicas e de judicialização dos processos das famílias camponesas.
A iniciativa contou com o apoio do Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad), do Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH) e da Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE).
Mais informações: Elvis Marques (assessoria de comunicação) 62 99113-8277; Kamila Picalho (Comissão Pastoral da Terra) 66 99662-2764; Devanir de Araújo (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) 65 99932-0803.
Acompanhe tudo o que ocorreu na 3ª Semana pelas redes sociais da @cptnacional, @formadmt e @movimentosemterra
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