Um incêndio de origem criminosa colocou em cinzas uma casa sagrada do povo Pankará, na Serra do Arapuá, município de Carnaubeira da Penha, sertão de Pernambuco.
(Fonte: Cimi/Imagens: Povo Pankará)
Na noite do último domingo, 1º de maio, indivíduos não identificados atearam fogo na estrutura feita de barro e palha localizada na aldeia Marrapé. Os Pankará perceberam a movimentação, mas não conseguiram conter as chamas a tempo. Os criminosos conseguiram fugir do local. O episódio se soma ao acirramento da violência contra os povos indígenas no Brasil em pouco mais de 30 dias.
Lideranças indígenas do povo registraram a ocorrência na sede da Polícia Federal de Salgueiro, cidade vizinha à Terra Indígena Pankará da Serra do Arapuá. “Nossos rituais já vinham sendo atacados por pessoas familiares de quem já atacava nosso povo desde os antigos Pankará e que ainda estão dentro do território da gente”, explica a cacique Dorinha Pankará, que há alguns anos convive com ameaças.
O fogo queimou maracás, indumentárias, cachimbos e peças tradicionais do vasto acervo arqueológico do povo usadas nos rituais. “Acreditamos que o ataque envolve nossa demanda territorial. São famílias não-indígenas que não aceitam a demarcação e que nunca aceitaram que a gente é índio Pankará. Os velhos dessas famílias, antigamente, impediam nossos rituais”, diz a cacique.
Para os Pankará o incêndio guarda relação com os últimos ataques sofridos pelo povo; durante os rituais tradicionais, se tornou comum a ação de não-indígenas com pedradas nos pajés e a utilização de sons automotivos em alto volume para atrapalhar as práticas. “Dizem que é feitiçaria. Pra gente a história está se repetindo: querem nos impedir de ser o que somos”, afirma Dorinha.
Conforme as lideranças vêm defendendo nas reuniões internas do povo, apenas a demarcação da terra pode cessar tais ataques e as ameaças de morte sofridas pela cacique Dorinha. “Pedimos para o governo federal publicar o relatório circunstanciado da terra e fechar a demarcação. Hoje eu não posso andar com segurança pelo território e sair pra cidade. Os pajés estão sendo perseguidos. Nosso povo pede providências”, clama a cacique.
Venda de terras tradicionais
Como o relatório circunstanciado da Terra Indígena Pankará da Serra do Arapuá não foi publicado, travando a demarcação do território, os ocupantes não-indígenas passaram a ameaçar os indígenas dizendo que as famílias compram as terras que ocupam ou serão expulsas à força. “Então estão obrigando os Pankará a comprar terras que lhes pertencem. Famílias indígenas que nunca saíram da sua terra, mesmo na época em eram proibidos de se dizerem Pankará ou fazer os rituais, estão comprando as terras para que não sofram violências”, explica Dorinha.
São mais de 70 ocupantes não-indígenas no interior da Terra Indígena Pankará, prevista com 15 mil hectares pelo Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) da Terra Indígena Pankará da Serra do Arapuá (Portaria nº 413, de 24/03/2010) – entregue à Fundação Nacional do Índio (Funai) pelo Grupo de Trabalho em dezembro de 2014. Não é a primeira vez, entretanto, que as elites agrária e política atacam os Pankará, além das ameaças de morte sofridas sistematicamente pela cacique Dorinha.
No dia 17 de fevereiro de 2014, um projeto de mudança do nome da Unidade de Saúde Indígena Velho Anjucá, de responsabilidade do Ministério da Saúde, que atende ao povo Pankará da Serra do Arapuá, foi posto em votação pelo então presidente da Câmara de Vereadores de Carnaubeira da Penha, Jotanilton Cícero Bezerra (PSC), e aprovado por cinco votos a favor e quatro contra. Pela decisão dos vereadores municipais, a unidade de saúde Federal passaria a se chamar Nossa Senhora da Conceição.
Leia mais: Vereadores decidem mudar nome de Unidade de Saúde Indígena Pankará (PE)
“Percebemos que a tentativa é de atacar a nossa tradicionalidade, o que compõe o povo Pankará. Nunca aceitaram a nossa existência, mas os tempos mudaram e agora podemos nos dizer Pankará, temos direito à terra e de viver conforme nossas tradições, com nossa organização política própria. Nunca aceitaram isso. O tempo parece que não passou pra essas elites”, conclui a cacique Dorinha Pankará.
Resistência das gerações Pankará
O recente episódio envolvendo a violência contra o povo Pankará possui um desencadear histórico de subjugação dos povos indígenas no Sertão. O século XIX passou a ter uma documentação mais farta sobre a violência praticada contra os indígenas habitantes nas serras do Umã (povo Atikum) e Arapuá (povo Pankará). Período de crescente povoamento e da criação da Lei de Terras (Lei nº 601 de 18/09/1850), que legaliza o esbulho dos territórios indígenas para garantir a propriedade imobiliária. As terras do município de Floresta foram registradas, pela primeira vez, em 1858.
De acordo com mais de dez anos de pesquisa junto ao povo Pankará, a antropóloga Caroline Farias Mendonça Leal, professora da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), afirma que em janeiro de 1866 Manoel Ferraz de Souza requereu uma área chamada Sítio da Penha – os Ferraz até hoje representam uma família poderosa no contexto de Carnaubeira da Penha. O delegado de polícia de Floresta escreve ao chefe de polícia de Pernambuco solicitando mais policiais para a Vila e a criação de três distritos – Vila, Caissara e Penha – para facilitar a captura dos indígenas resistentes. Penha viria a se emancipar como Carnaubeira da Penha.
Ao descrever a proposta de limites de cada distrito, ainda conforme a pesquisa da antropóloga, o delegado informou acerca do Sítio da Penha: “o da Penha onde existe uma pequena Capela cabeça de uma aldeia de índios que não existem”. Quanto aos subdelegados indicados para cada distrito, destacam-se novamente, para ocupar esse cargo público de autoridade policial, membros das famílias Ferraz, Gomes de Sá, Menezes – cujos descendentes até os dias atuais são envolvidos com as polícias locais.
Entre os anos de 1949 e 1958, sucessivas correspondências de lideranças Pankará e Atikum-Umã pleiteando o direito de posse das terras situadas na Serra Umã e Arapuá à 4ª Inspetoria Regional (IR4) e ao Conselho Diretor do Serviço de Proteção ao Índio (SPI). Além de telegramas e ofícios, consta o Relatório de Viagem do antropólogo da Universidade de Berkeley Hohenthal Jr, produzido no ano de 1952 para o SPI, que dá grande ênfase às violências cometidas contra os índios, inclusive tendo-as presenciado (MI/SEDOC - Inspetorias Regionais, IR 4 Nordeste. Microfilme 152, fotogramas 1068-1069. RELATÓRIO, Recife, 21 jun. 1946).
O azedume dos fazendeiros e políticos da região com os indígenas doi constatado in loco por Hohenthal Jr.: “Nessa zona do interior do Nordeste, pelos menos, parece que não há justiça brasileira para os pobres; essa é um privilégio só para os ricos e granfinos. O que me desgosta é o seguinte: estes Neo-brasileiros que dizem ser “donos” das terras disputadas, permitem os índios fazer todo o trabalho inicial de lavrar e melhorar um sitio. Construindo casas, plantando arvores frutíferas, etc.; e depois, quando o sitio esta em boas condições o negam perante o índio, e dizem: ‘Agora, é nosso! Saia dahi, ou lhe matamos!’ E o índio sai, para começar de novo o seu trabalho penoso e triste” (MI/SEDOC - Inspetorias Regionais, IR 4 Nordeste. Microfilme 379, fotogramas 814-817. RELATÓRIO, California, 14 jul. 1952).
Para a antropóloga e professora da Unilab, esse período hostil e de violência é muito presente na memória dos mais velhos. São inúmeros os relatos sobre as proibições da prática do ritual, as “noites de fuga” para dançar o Toré escondido “dos brancos”, a violência física contra algumas lideranças. Entre as várias violências, há dois episódios que marcaram muito a memória dos Pankará: a proibição de acessar água e a queima da casa de Luiz Limeira. Os filhos de Luiz Limeira relataram, com muito constrangimento, o episódio em que os invasores da terra indígena os proibiram de ter acesso à água e seu pai viajou ao Recife em busca de solução junto ao SPI.
“Os Limeira num bebem água nem no Gonçalo, nem em canto nenhum em cima da serra. Se quiser é no rio, vá beber água no rio São Francisco! Aí pronto, nós voltamos debaixo de patada, aí apareceram os parentes da minha mãe, e nós bebíamos água lá da aldeia Ladeira. Também o finado Filomeno disse: olhe, venham beber aqui na Taperinha. Só quem deu água foram os parentes de minha mãe e Cirano Menês. Quando pai foi para Recife, para resolver esse negócio dessa proibição, nós ficamos bebendo água só da Ladeira e da Taperinha. Foi quando pai chegou em Recife e contou a historia: “eu moro lá na Cacaria e estamos proibidos de beber água nos caldeirão, tinha uns caldeirão cheio d’água lá. Caldeirão de Roque, de Augusto, tudo cheio d’água, mas o branco empatou da gente beber água”. Lembro também que tinha um pé de água que meu pai fez e os brancos mandaram quebrar o pé de água pra escorrer a água pra gente não beber”, relatou Manoel Limeira para a dissertação de mestrado da antropóloga.
Luiz Limeira acabou banido da Serra do Arapuá e morreu no sertão da Bahia. Luiz Limeira é o avô da cacique Dorinha. Na década de 1970, descendentes de outras famílias Pankará se deslocaram para a Serra Umã, e outras famílias permaneceram na Serra do Arapuá sob a condição de rendeiros, meeiros e, em período mais recente, de pequenos proprietários de alguns lotes de terra, como é o caso dos Limeira, Caxiado e Rosa. Os Pankará deslocavam-se com frequência aos terreiros de Toré na Serra Umã, para junto com os Atikum “fazer a brincadeira” que só apenas em tais terreiros era permitido. Hoje são algumas das dezenas de histórias contadas pelos mais velhos e documentos oficiais.
O pajé Pedro Limeira, filho de Luiz Limeira e pai da cacique Dorinha, afirmou, durante mobilização dos povos indígenas no Palácio do Planalto, em Brasília (2013), que “os Pankará saíram de trás da pedra e pra lá não voltam mais não”.
Moradores da zona rural relatam episódios de agressão, saque e ameaças. Famílias têm deixado de enviar filhos à escola com medo de ataques.
(Fonte: G1 Ariquemes e Vale do Jamari/Imagem: Conselho Tutelar)
Moradores do assentamento Terra Prometida, zona rural de Ariquemes, na região do Vale do Jamari em Rondônia, relatam que um grupo de homens armados têm amedrontado produtores rurais da região realizando ataques frequentes, saqueando casas e agredindo as pessoas desde fevereiro deste ano. A situação vem se agravando, já que as famílias se recusam a enviar os filhos à escola desde que dois motoristas foram agredidos e o ônibus escolar invadido por homens armados. A Polícia Militar (PM) conta que há 35 fazendas em seis municípios do Vale do Jamari, todas em áreas de conflitos agrários.
Os agricultores dizem que há uma milícia atuando na região. Esses homens teriam sido contratados pelos próprios fazendeiros em 2015 para fazer a segurança das propriedades. Só que após os sem-terras terem sido expulsos da região, os vigilantes passaram a atacar os pequenos produtores.
Uma agricultora da região, que prefere não se identificar com medo de represálias, relembrou o ataque que sofreu. "Eu estava no curral quando avistei três pessoas com armas pulando a porteira. Gritei por minha filha e fui de encontro a eles, que perguntaram pelo meu marido. Já foram me empurrando com a espingarda e dando tiros para o chão para me assustar. Falei que não sabia do meu marido e eles me levaram junto com a minha filha para dentro de casa exigindo que fizesse comida para eles. Pensei que ia morrer naquele momento. Minha filha passou mal. Foi horrível".
A mulher conta ainda que outro grupo armado também atacou a propriedade vizinha e que a filha do casal entra em pânico e desmaia toda vez que vê um deles na estrada. "Ninguém pode fazer mais nada. Estamos reféns desses homens que estão ao nosso redor todos os dias", relata.
O motorista de ônibus escolar agredido também relata os momentos de terror que viveu nas mãos dos criminosos.
"Eles foram de madrugada até minha casa, onde fica guardado o ônibus escolar. Um deles me deu uma coronhada na cabeça e mandou que eu fosse com o ônibus buscar bebidas para eles num bar. O que eu passei não desejo para ninguém. Foram quase 2h de terror. Dependo do meu trabalho, mas se continuar assim, eu renuncio do meu emprego para ter mais segurança”, disse.
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Por causa do ataque ao motorista, os pais temem mandar as crianças para escola. É o caso de uma agricultora que há mais de 20 dias deixou de mandar a filha para a escola por medo. "Certa vez entraram armados no ônibus com as crianças dentro. Eu, meus vizinhos e outros optaram por não mandar os filhos para escola até que a segurança seja garantida. Estamos vendo a hora em que a próxima vítima serão nossos filhos. Nunca imaginei presenciar isso", confessa.
O orientador da escola Padre Ângelo Spadari, Irineu José Junior, confirmou que cerca de 150 crianças que moram na região não estão indo ao colégio e diz também que dois motoristas escolares foram agredidos pelo grupo. "A única coisa que a gente pode fazer é tentar dar apoio a esses alunos", declara.
Conselho Tutelar
Devido às crianças não estarem frequentando a escola, o Conselho Tutelar de Ariquemes tem acompanhado o caso. Com a situação se agravando desde fevereiro, o conselheiro do município conta que foi feito um documento com relatos dos moradores e da direção da Escola Ângelo Spadari que foi encaminhado ao Ministério Público do Estado de Rondônia e órgãos de segurança para tomarem conhecimento.
Secretaria de Educação
Apesar dos relatos dos moradores, do conselho tutelar e do orientador da escola, a Secretaria Municipal de Educação (Semed) afirmou que os ônibus escolares estão circulando normalmente para fazer o transporte dos alunos na região. A Semed destacou também que não haverá alterações no calendário escolar já que, segundo a secretaria não houve interrupção de aulas.
Posição da PM
Em contato com a Polícia Militar (PM), o subcomandante do 7º Batalhão Capitão Faria informou que a polícia tem conhecimento de fatos isolados que teriam ocorrido na região e de um grupo armado que estaria extorquindo moradores naquela localidade. Para combater os crimes, a PM diz que realiza patrulhamento frequente nas linhas rurais, abordagens e já fez algumas prisões, recuperando produtos de roubo. O patrulhamento aéreo também começou a ser realizado no último fim de semana para auxiliar nos trabalhos.
Investigação
À reportagem, o delegado regional da Polícia Civil, Thiago Flores, informou que a polícia tem conhecimento dos fatos ocorridos no local e reiterou que é preciso medidas enérgicas e imediatas. "A Polícia Civil está com investigação em curso para identificar as pessoas que estão sendo agenciadas para cometer esses crimes. Temos informações de algumas características físicas e de nomes, o trabalho da investigação será aprofundado para poder imputar a cada um a sua responsabilidade”, explicou o delegado.
Relatos afirmam que os pistoleiros abriram fogo contra o acampamento e que as viaturas circulam como forma de aterrorizar as famílias.
(Fonte: Da Página do MST)
Na tarde desta terça-feira (3), o Acampamento Frei Henri (Fazenda Fazendinha) com 154 famílias acampadas há seis anos, localizado as margens da PA 275 no município de Curionópolis foi atacado por um grupo de pistoleiros acompanhados de duas viaturas da Polícia Militar
Toda ação tem a presença do Fazendeiro Darlan Lopes, conhecido como "Dão". As informações vêm das famílias que estão no local.
Relatos afirmam que os pistoleiros abriram fogo contra o acampamento e que as viaturas circulam como forma de aterrorizar as famílias.
Uma vala está sendo construída pelo fazendeiro às margens do acampamento como uma espécie de “barreira de contenção”, impedindo o acesso a água e aos plantios que as famílias têm no entorno do acampamento.
Este não é o primeiro ataque realizado contra o acampamento. Desde o ano passado são registradas ocorrências na Delegacia de Conflitos Agrários e nenhuma providência foi tomada como medida contra a ação do fazendeiro Darlam Lopes, o “Dão”.
A área já é comprovada como da União e espera uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) a favor dos trabalhadores para efetuar a reintegração de posse e construção do assentamento pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O processo está parado há mais de três anos.
Os dois irmãos Nivaldo Batista Cordeiro e Jesser Batista Cordeiro, membros do Acampamento 10 de Maio, de Alto Paraíso do Oeste, Rondônia, desapareceram no dia 24 de abril. Dois dias depois eles foram encontrados mortos no Rio Candeias.
(Fonte: CPT Rondônia)
Depois de ter localizado a moto deles nas proximidades do rio, no Km 25 da Linha C-50, os dois corpos foram encontrados com diversos disparos. O local faz parte do município de Buritis, Rondônia, que forma parte do chamado Vale do Jamari, uma das regiões que desde 2015 concentra o maior número de casos de violência por conflitos em disputas de terras públicas de todo o Brasil.
No dia 28 de abril a Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia e Amazônia Ocidental (LCP) divulgou Nota em que denuncia o assassinato dos dois irmãos, Nivaldo e Jesser, que, segundo a Liga, eram camponeses do Acampamento 10 de Maio. Nivaldo deixou a esposa e quatro filhos pequenos.
Conforme a Liga dos Camponeses, os irmãos foram covardemente assassinados no dia 24 de abril, e já haviam recebido ameaças de morte do fazendeiro Caubi Moreira Quito. O fazendeiro, que tinha posse da Fazenda Formosa, disputa com o Acampamento 10 de Maio, vinculado à LCP, o controle da área, que é terra pública grilada dentro da Gleba 06 de Julho/São Sebastião. No local, no início deste ano, a Justiça Federal suspendeu uma reintegração de posse contra os acampados (14/03/16) a pedido do Ministério Público Federal (MPF), pois a área ocupada pela fazenda é terra pública que já havia sido desapropriada pelo INCRA para reforma agrária.
Há alguns anos o local é palco de uma acirrada e violenta disputa. Após uma reintegração de posse da Justiça Estadual, sofrida pelos acampados em setembro de 2013, o fazendeiro denunciou ter sido atacado em seu carro. Mais tarde, um peão da fazenda teria sido atingido por disparos e a sede da fazenda, em outubro, foi totalmente destruída.
Em 25 de janeiro de 2015, após os acampados resistirem e conseguirem suspender uma nova reintegração de posse da Justiça Estadual, José Dória dos Santos, antigo integrante do acampamento, foi assassinado com vários disparos. Já em 11 de maio de 2015, duas pessoas mortas foram encontradas nas imediações do acampamento. Em abril deste ano, foi encontrada uma ossada humana (ainda não identificada) na mesma fazenda, que pode ser de Valdecy Padilha, camponês do Acampamento 10 de Maio desaparecido desde a manhã do dia 11 de novembro de 2015.
Por outro lado, a LCP acusa o fazendeiro de ter afirmado em várias ocasiões “que iria matar todos os sem terra antigos do Acampamento”. Ainda segundo a Liga, policiais militares de Buritis fizeram diversas tentativas de reintegração de posse na área do 10 de Maio sem ordem judicial. E consta, segundo a Liga, em depoimento do próprio Caubi Moreira Quito, realizado na Polícia Civil de Ariquemes em 29 de dezembro de 2014, que ele mesmo havia contratado 10 policiais militares para fazerem a segurança privada de sua fazenda em troca de terras.
Em relação à morte dos dois irmãos do Acampamento 10 de Maio, a Liga dos Camponeses Pobres (LCP), na Nota do dia 28 de abril, levanta pesadas acusações contra a Polícia Militar de Ji-Paraná, que estaria realizando patrulhas de carro nas estradas e de helicóptero na área do acampamento. “Esse crime tem todas as características dos crimes praticados por policiais. Os camponeses saíram de casa no domingo cedo, à luz do dia, em uma estrada muito movimentada. Foram assassinados em um lugar e seus corpos encontrados em outro. Pistoleiros não teriam como fazer tal operação sem chamar a atenção”, denuncia a Nota da LCP.
Em 2013, alunos, professores e funcionários de escola rural em Rio Verde, em Goiás, sofreram com os efeitos de pulverização aérea feita com agrotóxico proibido.
(Fonte: MPF-GO)
O Ministério Público Federal em Rio Verde (MPF/GO) ajuizou ação civil pública (ACP) em desfavor das empresas Syngenta Proteção de Cultivos Ltda., produtora do agrotóxico EngeoTM, e Aerotex Aviação Agrícola Ltda. A ACP objetiva a condenação das empresas por danos morais coletivos suportados por toda a sociedade em razão de ilícito consistente na irregular pulverização com o agrotóxico EngeoTM, que contaminou cerca de 92 pessoas entre alunos, professores e funcionários da Escola Municipal Rural São José do Pontal, localizada no Projeto de Assentamento Pontal dos Buritis, no município de Rio Verde, em Goiás, em área de propriedade da União.
Segundo a ACP, em maio de 2013 o agrotóxico EngeoTM, de fabricação da Syngenta, foi aplicado pela Aerotex, por via aérea, sobre uma cultura de milho vizinha à escola. De acordo com as investigações, os princípios danosos que compõem o agrotóxico exigiriam tão somente aplicação terrestre para aquela cultura. Além disso, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) já havia proibido sua aplicação aérea em milharais desde julho de 2012, o que agrava a situação.
O caso, que ganhou repercussão nacional e causa grande comoção social até os dias de hoje, já havia sido objeto de ACP proposta pelo MPF/GO pelo procurador da república Wilson Rocha Assis com o objetivo de garantir atenção integral do poder público à saúde das vítimas contaminadas pela pulverização irregular feita com o agrotóxico EngeoTM.
Na ACP agora proposta, o procurador da República Lincoln Meneguim, que atualmente está à frente do caso, tem por objetivo maior compensar a sociedade pelo ilícito e punir as empresas pela irresponsabilidade no uso de produto inerentemente perigoso, pedindo que a Syngenta e Aerotex sejam condenadas a pagar indenização não inferior a R$ 10 mi a título de danos morais coletivos, que deverão ser aplicados em ações vinculadas à saúde da população dos municípios da região de Rio Verde.
Clique aqui e leia a íntegra da ACP.
Série de reportagens da Página do MST mostra como o uso excessivo de agrotóxicos em lavouras causa danos irreversíveis para comunidade de abelhas no estado. Confira:
(Por Catiana de Medeiros/Colaboração: Leandro Molina/Imagens: Da página do MST)
Que desde 2009 o Brasil lidera o ranking dos países que mais consomem veneno no mundo já é de conhecimento de grande parte da população brasileira. A média nacional é de 7,5 litros por habitante. No Rio Grande do Sul o consumo estimado é de 8,5 litros por pessoa.
Dados apontam que o uso sem controle de agrotóxicos em lavouras, principalmente aplicados pela pulverização aérea, causa enormes danos para as abelhas.
Contrário ao que muitos pensam, esses produtos químicos e nocivos à saúde humana e ao meio ambiente também comprometem de forma significativa a produção de mel e de outros alimentos. O resultado é que colmeias inteiras estão morrendo, e isso pode afetar toda a população na produção mundial de alimento.
A partir de hoje, publicaremos a série “Tem veneno no seu mel”, que contém três reportagens que mostram os efeitos dos agrotóxicos e da soja transgênica na região da Campanha do Rio Grande do Sul, onde dezenas de apicultores se veem sem alternativas para combater o avanço do agronegócio em áreas de assentamentos da reforma agrária. Para esta primeira reportagem, conversamos com alguns assentados produtores de mel, que contam quando e como começaram a ser vítimas dos problemas oriundos do modelo de produção do agronegócio.
“Em três horas as abelhas estavam todas mortas”
A morte repentina e em massa, de abelhas, tem preocupado apicultores assentados da reforma agrária da região da Campanha. A fatalidade, que se intensificou nos últimos três anos, mostra que há fortes indícios de estar relacionada ao monocultivo de soja transgênica e ao uso abusivo de agrotóxicos.
Assentado no município de Hulha Negra, seu João Carlos Camargo, 55 anos, trabalha com produção de mel há mais de três décadas. Ele conta que, com o passar dos anos, perdeu algumas abelhas por questões naturais e climáticas, mas nada comparado ao ocorrido nos últimos três anos, quando se intensificou o plantio de soja transgênica em toda a região.
“Quando se trabalha com abelhas é normal ter alguma perda por ataques de insetos ou falta de alimentos, mas nos últimos anos tive perda total das colmeias e de forma diferente das outras situações, pois elas estavam em ótimas condições”, explica Camargo.
A primeira morte em massa das colmeias do assentado ocorreu em 2014, quando, em trabalho de monitoramento, percebeu que havia algo anormal com as abelhas. Naquele ano, ele perdeu suas 30 colmeias, o que correspondeu a cerca de 2 mil quilos de mel não colhidos.
“Estavam passando veneno aqui perto do lote, então fui até as colmeias e vi que as abelhas estavam morrendo. Em questão de duas ou três horas elas estavam todas mortas. E assim aconteceu em 2015, quando também tive perda total, não sobrou nada”, lamenta.
Seu João relata que na região, além de estar cercada pela soja transgênica, a aplicação de veneno de forma indiscriminada tem se tornado uma prática cada vez mais comum. “Não tenho dúvidas que a morte das colmeias é resultado do uso de coquetéis de veneno que aplicam sem critério algum em cima da terra, visando uma única cultura e acabando com a biodiversidade de abelhas, insetos, plantas e animais”, avalia.
Consequências do desaparecimento das abelhas
A polinização é o transporte de pólen de uma flor para outra. Este processo permite a que as flores sejam fecundadas, e a partir daí começa o desenvolvimento de frutos e sementes. Isso ocorre de várias formas, seja pelo vento, água ou borboletas, por exemplo. As abelhas têm uma grande capacidade de polinização. Este tipo de inseto é pequeno no tamanho, mas com uma eficiência e importância grande para a vida na Terra. Sem abelhas há prejuízo, não só na produção de mel, mas em toda a produção agrícola e vegetal, o que compromete de maneira grave a vida em geral.
Problema não é isolado
A mortandade de colmeias também atingiu o assentado Amarildo Zanovello, 48 anos, que tem na apicultura o carro-chefe de sua renda familiar. Ele também trabalha há mais de três décadas com a produção de mel, e hoje toca o cultivo junto a outras duas famílias do assentamento Roça Nova, no município de Candiota.
Ele lembra que em 1999, quando ainda não havia o avanço da soja transgênica na região, colhia em média 65 quilos de mel por colmeia, o que é considerado pelo assentado como altíssima produção. Segundo ele, a média de produção de cada colmeia no Brasil fica em torno de 25 quilos de mel.
“Não tínhamos problemas com venenos, os campos eram livres e tinham muita florada. Mas com a entrada da soja, a partir de 2008, o cenário mudou. Hoje, alcançamos a média de 40 quilos por colmeia, e ainda estamos acima da média nacional. Muitas abelhas acabam se contaminando com venenos quando saem para coletar néctar. Na maioria das vezes, ao voltar para as colmeias, elas contaminam e levam também à morte outras abelhas”, argumenta.
A primeira perda expressiva de abelhas do grupo de trabalho de Zanovello aconteceu entre 2012 e 2013, quando foram perdidas 50 colmeias, o equivalente a duas toneladas de mel. O prejuízo, à época, foi R$ 20 mil. “Fomos colher mel e as abelhas estavam todas mortas. Tenho certeza que foi por causa de veneno. Geralmente, quando acaba o ciclo de vida de uma abelha ela voa longe, não morre perto da colmeia. Tivemos que destruir tudo, pois não deu pra aproveitar o mel”, lembra.
O assentado Elio Francisco Anschau trabalha com produção de mel há mais de dez anos e também está na lista das vítimas dos venenos e da soja transgênica. Recentemente, ele perdeu dez caixas de abelhas. A produção perdida também servia para o consumo da família.
“As mortes são consequências do plantio da soja, que tem aumentado de forma alarmante nos últimos anos aqui na Campanha. As abelhas ainda convivem com os venenos contrabandeados, que são proibidos no Brasil, mas entram facilmente na região por estar localizada perto da fronteira. Por esses fatores, o cultivo de mel não é mais rentável e não dá mais retorno”, lamenta.
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