Na comunidade de Yvu Vera, onde vivem indígenas Guarani Kaiowá e Terena, cinco ações de reintegração de posse podem ser executadas nos próximos dias. Outros dois territórios estão ameaçados.
(Fonte: Instituto Socioambiental | Imagem: Agência Brasil)
Na cidade de Dourados, sul de Mato Grosso do Sul, uma comunidade dos povos Guarani Kaiowá e Terena vive na iminência de um despejo judicial. Fica no perímetro urbano do município e é uma das seis comunidades que retomaram áreas que fazem parte da Reserva Indígena de Dourados – criada há exatos 100 anos pelo Serviço de Proteção ao Índio para confinar os povos da região e liberar terras para a colonização.
As decisões que determinam a execução de cinco mandados de reintegração de posse contra os indígenas foram publicadas nesta quarta-feira (11/1/2017) pela 2ª Vara da Justiça Federal de Dourados, mas datam de 14 dezembro de 2016, quando foi firmado um prazo de 20 dias para que a Funai cumprisse a ordem de reintegração. O prazo venceu ontem e agora a responsabilidade passou à Polícia Federal, que pode executar os mandados a qualquer momento.
Já na semana passada as lideranças indígenas haviam sido comunicadas do andamento dos processos pela Funai e a Polícia Federal propôs que eles se retirassem voluntariamente da área, mas os Guarani Kaiowá e Terena não aceitaram: “A comunidade decidiu que não vai sair, que vai permanecer firme. Têm pessoas com problemas de saúde, de idade, pessoas conhecedoras da história. A terra tem que ser demarcada”, afirma Russi da Silva Martins, do povo Terena.
Yvu Vera, com cerca de 20 hectares, foi retomada em fevereiro de 2016 e concentra uma população de 200 pessoas, vivendo em cerca de 70 barracos às margens do anel viário da cidade. Ela é uma das quatro áreas de retomada próximas de Dourados; eram seis no ano passado, mas duas, Ita Poty e Unati Pokee Huvera, foram despejadas.
Panela de pressão
Já em março, logo após a retomada, sitiantes e proprietários começavam a ajuizar ações de reintegração. Os cinco que obtiveram decisões favoráveis agora reivindicam a posse do Sítio Bom Futuro, Fazenda Bom Futuro e Sítio São Luiz, mas os indígenas afirmam que eles não detêm títulos desses imóveis.
A área faz parte de um Grupo de Trabalho de identificação dos Territórios Indígenas da Bacia Dourado, que ainda não foram concluídos pela Funai. O órgão indigenista entrou com recurso, mas aguarda julgamento e os indígenas temem serem surpreendidos pelas forças policiais como tem sido praxe em outros casos.
Em Caarapó (MS), mais ao sul, outros dois territórios tradicionais também estão ameaçados de reintegração, Jeroky Guasu e Ñamoy Guavira'y, que fazem parte da TI Dourados Amambaipeguá I, identificada pela Funai ano passado.
A Reserva Indígena de Dourados, com 3.475 hectares, é conhecida por ostentar alguns dos mais altos índices de violência e densidade demográfica em Terras Indígenas. A área supera em muito a população das demais reservas criadas pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) no começo do século XX: em 2010, os indígenas da reserva representavam 6,22% da população de Dourados, a segunda maior cidade de Mato Grosso do Sul; em 2014, chegaram a 15.023 pessoas, segundo dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Veja no gráfico abaixo, a evolução da população na Reserva de Dourados.
Para o antropólogo Diógenes Cariaga, que estuda a reserva, as retomadas estão diretamente ligadas à grande pressão demográfica no interior da área e à situação de vulnerabilidade gerada pelo processo histórico de confinamento.
“A partir do momento que eles vão para as retomadas, rompem com o sistema da reserva, regido pela tensão entre grupos familiares. Essa multiplicação de retomadas tem a ver diretamente com o adensamento populacional”, explica. Segundo ele, os indígenas têm clareza de que os processos de demarcação, e seus direitos territoriais, podem ser atravancados pela crise política no país. “Permanecer na terra é uma forma de fazer pressão”.
Conhecido e tido como uma pessoa tranquila pelos moradores de Caarapó, cidade a 273 km de Campo Grande (MS), Alexander Claro Guarani e Kaiowá foi alvejado por dois tiros, na manhã do último dia 5, numa rua em que costuma trafegar diariamente. Diagnosticado com esquizofrenia, o indígena teria entrado em surto e dois policiais militares decidiram alvejá-lo para que pudessem imobilizá-lo.
(Por Renato Santana – Cimi)
Um disparo o atingiu na coxa, fraturando o fêmur, e o outro no quadril. "Vamos encaminhar a situação para a Corregedoria da Polícia Militar porque consideramos a ação abusiva", explica o coordenador regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Dourados, Vander Nishijima. Morador do tekoha – lugar onde se é – Tey Kue, o Guarani e Kaiowá, conforme dados do boletim de ocorrência, de vítima acabou virando o principal agressor.
O indígena é acusado de homicídio simples na forma tentada – em dois artigos do Código Penal – dano, resistência, desobediência e dano qualificado – aquele praticado contra o patrimônio público. Encaminhado ao Hospital da Vida, em Dourados, Alexander Claro precisou passar por cirurgia e segue internado. Está sob custódia da Polícia Militar, e deverá ser encaminhado ao presídio quando receber alta.
As autoridades públicas sabiam do transtorno psíquico do Guarani e Kaiowá, que trabalha como auxiliar de serviços gerais. Em 2011, Alexander cometeu um delito e foi preso. Durante o julgamento, o indígena foi diagnosticado pela primeira vez como esquizofrênico. A juíza do caso o encaminhou para tratamento. Em 2013 um novo laudo atestou o transtorno.
"Em novembro do ano passado houve uma nova determinação para que ele seguisse para tratamento. Então estamos traçando essa linha para mostrar que os policiais atiraram em alguém enfermo, de porte físico totalmente imobilizável", afirma Nishijima. Em entrevista ao portal de notícias Midiamax, o delegado do caso Ricardo Meirelles Bernardinelli considerou a possibilidade de excessos na abordagem policial.
Conforme o boletim de ocorrência, o Guarani e Kaiowá portava um pedaço de madeira e ameaçava transeuntes quando os policiais chegaram - chamados por um homem que teve o carro atingido pelo objeto. Ao tentar controlar o indígena, os policiais teriam sido atacados - momento em que o primeiro disparo atingiu o fêmur de Alexander. Sem o efeito desejado, os policiais atiraram contra o quadril. Então conseguiram imobilizá-lo.
"Vamos relatar o caso ao Ministério Público Federal (MPF). Muitas perguntas precisam ser respondidas. Como dois policiais só o conseguiram imobilizar depois de o atingirem com dois tiros? O indígena estava com um pedaço de madeira, não arma de fogo. A primeira saída deles foi a de atirar", enfatiza Nishijima. Sem um procurador disponível na Funai, o indigenista analisa formas de interceder judicialmente pelo Guarani e Kaiowá.
Numa ação miliciana, os atiradores fugiram deixando cair um pente carregado de munição.
(Fonte: Página do MST)
Mais um episódio de violência por parte do latifúndio tensiona a disputa em torno das terras da Usina Santa Helena, em Santa Helena de Goiás-GO. Na última quarta-feira, dois seguranças fardados da empresa ligada ao grupo Naoum efetuou disparos contra o acampamento Leonir Orbak, ameaçando e assustando as famílias que ali vivem.
Numa ação miliciana, os atiradores fugiram deixando cair um pente carregado de munição, que foi prontamente encaminhado à delegacia para denúncia. O tratamento recebido pelos acampados que tentaram efetuar a denúncia na delegacia evidencia o atrelamento entre Capital no campo, Polícia e Justiça/Ministério Público, no estado de Goiás.
Mesmo sendo vítimas de um atentado violento com arma de fogo, os agricultores foram hostilizados na delegacia de Santa Helena pelos policiais, que não lavraram a entrega do pente de munição e demonstraram claro descaso pelo ocorrido. É esse mesmo consórcio em favor do latifúndio que tem emcampado uma verdadeira caça às bruxas aos militantes do MST em Goiás, criminalizando a luta por Reforma Agrária.
Leia a denúncia do Movimento no Estado:
A direção do MST-GO denuncia o atentado praticado pela Usina Santa Helena contra o acampamento Leonir Orbak. Nesse último dia 04, no final da tarde, dois vigilantes fardados da Usina se aproximaram do acampamento e efetuaram vários disparos de pistola. Os tiros foram efetuados em direção de um grupo de famílias onde, inclusive, haviam crianças. Após mobilização dos acampados, os atiradores fugiram, mas deixaram cair um pente de munição.
Imediatamente ao ocorrido a direção do acampamento se articulou com o Núcleo de Direitos Humanos de Rio Verde e Região e se dirigiu à delegacia de Santa Helena para efetuar o Boletim de Ocorrência e cobrar providências. Houve claro descaso com a denuncia, não sendo lavrado a entrega do pente de municação e até o presente momento o delegado da região não deu qualquer informação, tampouco providenciou diligências para conseguir outras provas do atentado.
O conflito com a Usina Santa Helena, integrante do Grupo Naoum, devedor de 1,1 bilhão de reais aos trabalhadores e à União, vem ocorrendo desde 2015, quando mais de 4 mil famílias do MST ocuparam diversas áreas que foram arrecadadas pela União junto à Usina. O juiz da comarca, Thiago Boghi, e o Ministério Público Estadual da região já demonstraram seu total comprometimento com os interesses da usina, iniciando inclusive a perseguição aos militantes do MST na região, que resultou na prisão, no dia 14 de abril de 2016, de Luis Batista Borges, que continua preso e na prisão de José Valdir Misnerovicz, que ficou 143 dias preso, sendo solto via habeas corpus expedido pelo STJ. O mesmo processo também busca prender Natalino e Diessyka, exilados da luta pela reforma agrária.
Em denuncia contra a perseguição ao MST e reivindicando a desapropriação da Usina, as famílias sem terra ocuparam a fazenda Ouro Branco, próxima a área industrial da Usina, no dia 31 de julho de 2016 e lá permanecem graças a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás, que suspendeu a reintegração de posse emitida pelo juiz Thiago Boghi. Em homenagem ao lutador Sem Terra Leonir Orbak, tombado na luta no centro oeste do Paraná em 02 de abril deste ano, o acampamento recebeu seu nome, e já está produzindo grande variedade de alimentos agroecológicos.
Reafirmamos o nosso compromisso com a transformação do latifúndio da Usina Santa Helena em assentamento da Reforma Agrária e resistiremos a qualquer tentativa covarde de impedir nossa luta.
*Editado por Rafael Soriano
Cerca de 85 famílias remanescentes do Quilombo Rio dos Macacos, em Simões Filho, na divisa com Salvador, vivem em casas de barro cobertas com telhas de amianto, sem água encanada, energia elétrica e rede de esgoto. E, hoje, temem perder o único acesso que têm a água por conta de uma obra erguida pela Marinha.
(Fonte/Imagem: Portal UOL)
Mais de um ano depois de a União ter reconhecido como quilombola uma área de 301 hectares, por meio de portaria publicada em 18 de novembro de 2015, a comunidade ainda aguarda a titulação de posse da terra.
O quilombo está numa região que foi alvo de longa disputa judicial com a Marinha do Brasil, que se instalou no território na década de 1970. Com a demarcação das terras, os militares ficaram com a responsabilidade de gerir 196,2 hectares, incluindo a área do rio dos Macacos, de onde atualmente a comunidade retira água de maneira artesanal para sua subsistência.
A Marinha já começou a construção de um muro para restringir o acesso ao território que lhe pertence. Os quilombolas receberam 104,8 hectares.
Somente a regularização fundiária permitiria que o governo da Bahia executasse obras para a melhoria da qualidade de vida dos quilombolas. Orçadas em R$ 8 milhões, as intervenções são para levar serviços de habitação, acesso à água e inclusão produtiva.
A titulação de posse deverá ocorrer dentro de seis meses, conforme prevê a Secretaria da Presidência da República, à frente dos órgãos federais que cuidam da questão. A barragem Rio dos Macacos, que sedia a Base Naval de Aratu, considerada pelos militares como "equipamento estratégico à defesa nacional", ficou na área da Marinha, por isso a comunidade quilombola teme ficar sem água.
"Desde a chegada da Marinha, a gente parou no tempo. É como se ainda fôssemos escravos", desabafou o extrativista, trabalhador rural e pescador José Sousa, 51, ao comentar a iniciativa de proibir o acesso ao rio.
A água é um direito universal. Está na Constituição."José Sousa, extrativista
Apesar do controle de acesso por parte da Marinha, a reportagem do UOL esteve no quilombo, onde constatou que, antes mesmo de as obras chegarem ao limite do rio, uma placa alerta para a proibição de atividades como banho e pesca no corpo hídrico classificado como "área de risco".
"Como forma legítima de preservação do patrimônio da União, procedimento comumente adotado em imóveis dessa natureza. Importa ressaltar que, para realização das obras em comento, foi obtida autorização judicial junto ao Tribunal Regional Federal da Primeira Região", diz o comunicado da Marinha.
Conflitos
Uma das lideranças locais, Rosemeire Silva, 38, receia que a proibição do acesso ao rio inviabilize a permanência no território que abriga cinco gerações de quilombolas. A mulher assegura que os moradores continuarão a luta pela inclusão do rio na área demarcada.
"Não temos como sobreviver sem água numa comunidade quilombola, nem em nenhum lugar do mundo", avaliou a trabalhadora rural, pescadora e artesã. "A gente tira nosso sustento do rio. Eles [os militares] vão ter que matar a gente para impedir o uso da água", disse.
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Comunidade quilombola Rio dos Macacos tem área reconhecida
Quilombolas do Rio dos Macacos denunciam intimidação por encapuzados
Aos 96 anos, a aposentada Maria Oliveira --mãe de sete filhos nascidos no quilombo-- lembra que a convivência com os militares nunca foi pacífica.
"A Marinha sempre pelejou para nos expulsar daqui", apontou a idosa. "Nasci, me criei aqui e não saio. Para ficar com os cacos por aí na cabeça? Deus que me livre", afirmou a anciã.
O lavrador Orlando Oliveira, 65, lembra que a relação conflituosa desmembrou várias famílias. "Muita gente não aguentou a pressão. A gente aqui mal sabe assinar o nome, por que nem dava para ir a escola, nem temos escola aqui", lamentou.
Morosidade
Se, por um lado, os militares tiveram os trâmites acelerados para fazer intervenções na área deles, os quilombolas sequer podem fazer reformas estruturais nas casas onde moram, já que as tentativas anteriores resultaram em demolição por parte dos militares.
Sozinho numa casa feita com placas de metal, madeira compensada e lonas plásticas, o trabalhador rural José Isédio Dias, 86, pede socorro diante da situação dos quilombolas.
Alguma providência precisa ser tomada. O pequeno é quem sofre nessa vida."
A casa de Antônio dos Santos, 75, e Rosa Maria, 51, precisou ser escorada por toras de madeira para não ir ao chão. "Meu sonho é ter uma casa de bloco, com água encanada. Não precisa nem ter luz", afirmou a mulher.
O quadro atual dos quilombolas chegou a ser classificado como "subumano" pela então relatora especial da ONU (Organização das Nações Unidas) para o Direito à Moradia Adequada, Raquel Rolnik, quando visitou a comunidade, em 2014, ocasião em que constatou "várias violações de direitos".
Mudanças
A Marinha frisa que dar à comunidade o acesso às políticas públicas foi uma constante preocupação do governo federal. Entre as políticas a serem desenvolvidas, estão o cadastro no Bolsa Família, cestas de alimentos e assistência do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar.
A pedido dos quilombolas, atualmente, o Exército Brasileiro tem trabalhado na implantação de dois acessos à comunidade, para que não seja necessário passar pela portaria da Vila Naval. A via da gleba 1 tem 900 metros, enquanto a pista da gleba 2 tem 570 metros de extensão.
Com recursos de cerca de R$ 1,6 milhão do Ministério da Defesa, a conclusão da obra está prevista para o final de fevereiro de 2017. Além das vias, as obras incluem sinalização horizontal das pistas, implantação de seis bueiros tubulares de concreto, drenagem superficial e recomposição florestal.
Coordenador de políticas para povos e comunidades tradicionais da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado, Cláudio Rodrigues afirma que a pasta estadual, no papel de articulação junto aos demais órgãos do governo local, está "de mãos atadas".
Rodrigues frisa que a Secretaria da Presidência da República, que cuida da questão da titulação, estaria empenhada na resolução do conflito "até a mudança no comando do governo federal". "Até mesmo em torno do uso do rio pela comunidade, mas a conjuntura política mudou", afirmou.
Por meio de nota, a Secretaria da Presidência respondeu que "há um conjunto de procedimentos técnicos que envolvem diversos órgãos federais com prazos para emissão dos documentos". "Esses procedimentos já encontram-se em curso, inclusive com o início do desmembramento da matrícula e nova matrícula para as áreas que serão tituladas", diz a nota.
O comunicado reitera que, em face da permanência do litígio, há uma determinação judicial que quaisquer mudanças na área deverão ser objeto de autorização do desembargador responsável pelo processo.
"Mas isso não tem impedido que melhorias ocorram: além da titulação, que já se encontra em estágio avançado, há autorização para construção de acessos nas duas glebas, que estão em fase de execução", informa o texto da Secretaria.
Além disso, prossegue a nota, "já foi requerido ao desembargador autorização para construção de unidades habitacionais, poço de abastecimento de água bem como de unidades de beneficiamento de mandioca (casa de farinha) e de processamento de polpa de frutas".
Por fim, o comunicado informa que a comunidade vem recebendo assistência técnica do Incra (Instituto de Colonização e Reforma Agrária) e que a empresa de eletricidade da Bahia vem fazendo levantamentos para garantir energia aos moradores, por meio do Programa Luz Para Todos.
A Comissão Pastoral da Terra no Acre (CPT-AC) juntamente com as famílias de posseiros do Seringal Redenção, localizado na Gleba Nova Axioma Redenção, no município de Boca do Acre, no Amazonas, vêm a público denunciar as situações de abuso de poder, grilagem de terras e casos de violências promovidas no estado.
A Gleba possui área de aproximadamente 76 mil hectares, que, conforme informações do próprio INCRA e do Programa Terra Legal do Amazonas, pertencem a União. Posseiros ocupam parte dessa área desde a década de 1970. Também dentro da Gleba está localizada a Fazenda Santana, de propriedade da Agropecuária União.
Presentes na área há mais de 40 anos, as famílias de posseiros vivem da agricultura familiar e do extrativismo. Recentemente, nos anos de 2014 e 2015, esses antigos moradores assistiram mais famílias ocuparem a Gleba. Contudo, novos e antigos posseiros convivem pacificamente. Os conflitos na área têm sido causados é por grileiros e latifundiários, que tomam as terras desses pequenos agricultores.
Há tempos que tem se intensificado a prática dos fazendeiros de adquirirem e/ou grilarem as terras dessa localidade, depois conseguem até reintegrações de posse contra os posseiros. A Fazenda Santana, por exemplo, é constantemente vendida. E sempre que isso ocorre sua área tem sido expandida. Apesar do latifúndio também estar na Gleba, os posseiros não estão dentro de seus limites, como constatado por representantes do Programa Terra Legal e do INCRA. Mas se a terra é da União, por que uma reintegração de posse em nome da Fazenda Santana?
Essa é a pergunta que as famílias da “Ocupação São Mateus II – Ramal do Garrafa”, também localizada na Gleba, se fazem após reintegração de posse realizada no dia 19 de dezembro de 2016. Durante essa ação, a polícia derrubou aproximadamente 11 casas e 20 barracos dos trabalhadores.
Diante disso, a CPT denuncia as violentas ações das Polícias Civil e Militar de Boca do Acre, que, constantemente, mesmo sem mandado de reintegração de posse, vão até os seringais presentes na Gleba, prendem pessoas, ameaçam, queimam barracos, destroem casas, e intimidam moradores. A Justiça não acontece, e essas violências ficam impunes.
“Estamos cansados de sermos tratados como invasores. Somos homens e mulheres que plantam para colocar comida na mesa da população”, afirma Lázaro Jordão da Silva, um dos ocupantes da área.
Nosso sentimento é que Boca do Acre está esquecida. Uma “terra sem lei” devido à ausência do Estado em cumprir o seu papel e em realizar a tão sonhada reforma agrária. O que presenciamos cotidianamente é o descaso dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, ameaças e o aumento da violência no campo.
Acreditamos na Justiça e por isso pedimos providências para que o município de Boca do Acre se torne um espaço de vida e não de violência como estamos vivenciando nestes últimos anos.
Comissão Pastoral da Terra – Regional Acre (CPT) e Famílias de Posseiros da Gleba Nova Axioma Redenção
Laboratório da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) de Mato Grosso atestou que o corpo encontrado no lago da barragem é de Nicinha.
(Fonte: Amazônia Real | Imagem: MAB)
A pedido da família, a Secretaria de Segurança Pública de Rondônia vai liberar o corpo da ativista Nilce de Souza Magalhães, a Nicinha, defensora das populações atingidas pelas barragens das hidrelétricas do rio Madeira, para o sepultamento nesta próxima quarta-feira (21) no Cemitério Municipal de Santo Antônio, em Porto Velho. Ela ficou desaparecida por cinco meses. Sua família esperou mais seis meses pelo resultado do reconhecimento oficial do corpo por um exame de DNA. O governo dizia que não tinha recursos e estrutura para fazer o teste em Rondônia.
Filha de Nicinha, a advogada Divanilce Andrade disse à Amazônia Real que os parentes que moram em outros estados irão participar da cerimônia fúnebre. O Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB) organiza uma homenagem para a defensora na Igrejinha de Santo Antônio às 10 horas (12h em Brasília). “Nós já esperamos até agora, por isso optamos por esperar mais uns dias para o enterro”, disse Divanilce sobre o pedido que a família fez para que o corpo permaneça no Instituto Médico Legal até o dia do sepultamento.
Nilce de Souza Magalhães, de 50 anos, foi brutalmente assassinada no dia 7 de janeiro deste ano. No dia 24 de junho o corpo foi encontrado com marca de um tiro e mãos e pés amarrados em pedras no lago da barragem da usina hidrelétrica de Jirau, no distrito de Nova Mutum-Paraná, em Porto Velho.
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), do qual Nicinha era a maior liderança em Rondônia, suspeitou que morte da ativista estivesse relacionada à sua militância contra as barragens do rio Madeira feitas a partir da construção das usinas de Jirau e Sano Antônio. A Polícia Civil, no entanto, descartou essa suspeita.
O principal acusado pelo assassinato de Nicinha, segundo a Polícia Civil, é o pescador Edione Pessoa da Silva, que é réu confesso. Conforme a investigação, o pescador disse que a motivação seria uma acusação por furto que ela o fez. A polícia diz também que ajudaram na ocultação do corpo da ativista Oziel Pessoa Figueiredo, 18 anos, e Leonardo Batista da Silva, 39 anos. Oziel já foi julgado e cumpre pena em liberdade. Os outros dois aguardam o julgamento pelo Tribunal do Júri e estão presos no presídio Ursa Panda, em Porto Velho.
Familiares de Nicinha reconheceram um corpo no Instituto Médico Legal (IML) como sendo o da ativista assassinada ainda em junho. Mas a Superintendência de Polícia Técnico-Científica (Politec) de Rondônia não tinha recursos para fazer o teste de DNA. Apenas no mês de setembro a Secretaria de Estado de Segurança, Defesa e Cidadania (Sesdec) encontrou a solução para o reconhecimento oficial da morte da ativista enviando o material do teste para o Mato Grosso.
No dia 13 de dezembro, a secretaria anunciou que um exame de DNA realizado pelo Laboratório da Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) da Secretaria de Segurança do Mato Grosso atestou que o corpo encontrado no lago da barragem é de Nicinha.
O chefe da Superintendência Estadual da Polícia Técnica Científica (Politec) de Rondônia, Girley Veloso, justificou a demora para a elaboração do exame de DNA com uma informação macabra.
“Foi devido à falta de estrutura da Politec de Rondônia. Outros 400 cadáveres aguardam exames de DNA no estado”, disse o superintendente à Amazônia Real. “O órgão está sendo estruturado e deverá ficar pronto para funcionar a partir de fevereiro do próximo ano”, revelou Veloso.
A demora para a realização do exame de DNA no corpo de Nicinha revoltou a família. “Eles não têm a menor consideração com a família, que aguardou seis meses pela liberação do corpo da minha mãe”, desabafou.
Julgamento foi adiado
No último dia 7 de dezembro, a sessão de julgamento dos dois principais acusados pelo assassinato, Edione Pessoa da Silva e Leonardo Batista da Silva, foi adiado justamente pela falta do exame de DNA.
A juíza Kerley de Arruda Alcântara, da 1º Vara do Tribunal do Júri de Porto Velho, alegou “inconsistência de prova no exame tanatoscópico anexado ao processo e achou prudente” adiar o julgamento até que fosse apresentado o laudo do exame de DNA, o qual considerou “imprescindível” para o reconhecimento do corpo.
O exame tanatoscópico determina a causa da morte e dá outras informações sobre o cadáver analisado, mas não é definitivo para a sua identificação.
Na decisão, a juíza Kerley aceitou um pedido de adiamento do julgamento feito pela defesa dos réus. Os advogados alegaram que a inclusão do exame tanatoscópico no processo foi feito fora do prazo legal, que é de pelo menos três dias antes da sessão do júri, para que as duas partes envolvidas no caso tenham ciência do conteúdo dos processos.
Divalnice Andrade disse que o material para fazer exame de DNA foi enviado em setembro para a Politec de Mato Grosso, mas deixou de ser anexado ao processo “por negligência e falta de sensibilidade com a situação da família.” Os peritos assinaram o laudo em 21 de novembro, conforme cópia do documento que a reportagem teve acesso. O resultado só chegou a Porto Velho em 13 de dezembro.
As duas cópias do laudo do exame de DNA, emitido pelo Laboratório da Politec do Mato Grosso, foram destinadas uma para o Instituto Médico Legal, possibilitando a liberação do corpo para a família, e a outra para a Justiça Estadual, dando condições legais ao julgamento dos acusados pelo assassinato de Nicinha. Mas o julgamento já tinha sido adiado.
Divalnice Andrade disse que “alertou o delegado Francisco Borges sobre a falta do laudo do DNA no processo um dia antes da data marcada para o julgamento (em 7 de dezembro) e só então o documento teria sido encaminhado à Justiça”, disse.
À reportagem, o delegado da Especializada em Homicídios, Francisco Borges, explicou que estava aguardando o resultado do exame do DNA e o laudo, que chegaram a Porto Velho. “Quando chegou o laudo de DNA [no dia 13 de dezembro] eu mandei os dois exames [tanatoscópico] para a Justiça. Aí sim, tive a certeza sobre de quem era o corpo”, disse o delegado.
O adiamento do julgamento dos dois acusados pelo assassinato de Nicinha deixou a família abalada. Divanilce Andrade contou que sua avó, Maria de Lurdes de Souza Magalhães, de 87 anos, passou mal. “Ela ficou abalada e foi hospitalizada durante quatro dias quando soube do adiamento do julgamento. Estamos aguardando que ela se recupere para contar [sobre a liberação do corpo].”
A defesa de Nicinha solicitou uma nova data para o julgamento ainda para este ano, antes do recesso forense, mas não foi atendida.
A juíza Kerley de Arruda Alcântara, em seu despacho no dia do julgamento, ao proferir a decisão, alegou “que não havia tempo hábil para a convocação dos jurados”. Com isso, um novo julgamento só ocorrerá a partir de fevereiro de 2017.
A outra filha de Nicinha, Ivanilce Andrade, chorou ao receber a notícia de que não há uma nova data para o julgamento dos acusados.
“A gente se sente injustiçada por conta desta lei, por conta deste governo, que não é justo e quem acaba pagando é a gente. Saber do julgamento adiado e o enterro da minha mãe… Só prevalece a Justiça de Deus. Eu creio na Justiça de Deus acima de tudo”, disse Ivanilce.
De acordo com Divanilce Andrade, o terceiro envolvido no crime, Oziel Pessoa Figueiredo, “por ser menor de idade [tinha 17 anos ] à época do crime e réu primário, foi condenado a cumprir medidas socioeducativas durante dois anos, com prestação de serviço na Delegacia de Polícia de Jaci-Paraná, distrito de Porto Velho.”