A Articulação das Pastorais do Campo, composta pelo Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Comissão Pastoral da Terra – CPT, Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP, Serviço Pastoral dos Migrantes - SPM, divide com os grupos e comunidades com as quais convivem suas angústias e apreensões, diante da violência institucional e do desmonte dos direitos conquistados em longo processo de lutas.
Após o Senado Federal ter afastado temporariamente, numa manobra claramente golpista, a presidenta Dilma Rousseff e empossado provisoriamente Michel Temer, estão sendo impostas, irresponsavelmente, medidas com caráter de mandato definitivo. Medidas que afetam diretamente os mais fracos e vulneráveis de nosso país, sobretudo os povos e comunidades do campo, das florestas e das águas.
Formou um novo ministério só de homens, e todos brancos. Nenhuma mulher, nenhum negro, ninguém alinhado às classes sociais desprotegidas. Nada menos que sete deles citados e denunciados na Operação Lava-Jato e em outros processos de corrupção. Dois, por conta de gravações divulgadas e que os incriminam, já tiveram que ser afastados.
Promoveu a extinção de ministérios, a fusão de outros, sobretudo os voltados para o campo social, como o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e a Secretaria dos Direitos Humanos, da Igualdade Racial e da Mulher, num processo em que está implícito o desmanche de direitos. Sucedem-se medidas anunciadas e revogadas num curto espaço de tempo. Caso exemplar é o da competência pela delimitação das terras quilombolas, que foi transferida do Incra para o Ministério da Educação, deste para o Ministério da Cultura e por fim acabou ficando, junto com o próprio Incra e outros órgãos voltados para o povo do campo, para a Casa Civil.
Seus ministros acenam que as medidas de reconhecimento de terras indígenas e territórios quilombolas tomadas pelo governo Dilma, nos meses anteriores a seu afastamento, poderão ser revogadas.
Há articulações para revogação do Decreto nº 8.750/2016, que instituiu o Conselho Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais, num claro desrespeito à identidade e direitos desses povos.
Na verdade, as questões que envolvem indígenas, camponeses, sem terra e comunidades tradicionais são uma batata quente nas mãos do governo interino com as quais não sabe tratar. A sensação que transparece é que procura um jeito de se ver livre delas.
O golpe contra o direito dos mais vulneráveis atinge em cheio também as comunidades urbanas. A primeira grande vítima do governo provisório foi o Direito à Moradia. O cancelamento dos contratos se voltou principalmente contra a modalidade ‘Entidades do Programa’, na qual os futuros moradores gerenciam o projeto e a obra, construindo casas maiores e melhores, com os mesmos custos das construções feitas por empreiteiras. Medida revogada nos últimos dias.
E se anunciam reformas na previdência, com aumento da idade mínima para aposentadoria, desvinculação do salário mínimo, atingindo mais de 30 milhões de pessoas. Também já está clara a revisão do programa Bolsa Família. O ministro da Saúde acenou para o fim da universalidade do SUS.
Quem está atrapalhando o novo governo é o povo. Este não cabe no orçamento, como se pode ver pelo plano econômico anunciado que propõe colocar um limite para despesas em saúde, educação e outras em setores essenciais à vida do povo.
Tudo isso deixa claro o que esteve por trás de todo o processo que levou ao afastamento provisório da presidenta Dilma Rousseff. Foi um escárnio à história e à inteligência do povo brasileiro. E um claro e transparente atentado contra a democracia. Na realidade o processo de Impedimento de Dilma não visava acabar com a corrupção ou punir os corruptos, mas justamente o oposto: proteger corruptos dando-lhes poder para garantirem seus privilégios e para bloquear investigações em curso. E limitar os ganhos sociais dos mais pobres.
De nada valeram, até agora, as mais variadas manifestações das igrejas, de pastorais sociais, de movimentos populares, de juristas, artistas e intelectuais que alertavam sobre a iminência da quebra da ordem democrática. De nada valeram também os argumentos de defesa da presidenta. O que se inferia de todo o procedimento adotado ficou claramente explícito na gravação, tornada pública no dia 23 de maio, do diálogo do senador Romero Jucá com o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Dilma tinha que ser afastada para se colocar um limite às investigações da Lava-Jato.
A cada dia de atuação desse novo governo interino se confirma a subserviência do presidente Temer aos interesses financeiros dos conglomerados empresariais, de capital nacional e internacional, representados, sobretudo, pela bancada ruralista e por setores ligados a interesses minerários.
As Pastorais do Campo denunciam a violência em curso e somam suas vozes à de muitas igrejas cristãs e não cristãs, à dos movimentos sociais, à dos jovens que ocupam escolas na defesa dos direitos a condições melhores de educação, a milhares de famílias silenciosas que vêem suas parcas conquistas escorrerem de suas mãos, para que um estrondoso grito de justiça ecoe em todos os cantos deste imenso Brasil. É necessária e urgente uma profunda reforma política que garanta mecanismos de participação popular nos destinos da nação. É patente que o Executivo e o Legislativo não respondem à sociedade, não olham os interesses do povo. Obedecem unicamente aos ditames dos doadores de suas campanhas.
Brasília, 07 de junho de 2016.
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Conselho Indigenista Missionário - CIMI
Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP
Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM
Mais informações:
Cristiane Passos (assessoria de comunicação CPT) – (62) 4008-6406
Tiago Miotto (assessoria de comunicação CIMI) – (61) 2106-1651
Ingrid Campos (assessoria de comunicação CPP) – (61) 3536-2411
Encontro Brasileiro de Movimentos Populares em Dialogo com o Papa Francisco ocorreu entre os dias 1º e 4 de junho, em Mariana, Minas Gerais. Confira o documento final:
Nós, Movimentos Populares e Pastorais Sociais reunidos em Mariana, Minas Gerais, em resposta ao chamando do Papa Francisco para o diálogo com os que lutam por “terra, teto e trabalho”, aqui viemos nos solidarizar com as famílias atingidas pelo maior crime socioambiental provocado em 2015 pela mineração no Brasil e alimentar nossa esperança na construção de outro mundo possível.
Povos indígenas, quilombolas, pescadores, comunidades tradicionais, trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, agentes das pastorais sociais compartilhamos nossas experiências de lutas, dificuldades numa sociedade tão desigual. Debatemos a opressão das forças do capital, a fragmentação e criminalização dos movimentos sociais e as violências contra os pobres, negros, mulheres, jovens e LGBTs. Aprofundamos nossa reflexão e partilha das formas de resistência e luta, para enfrentar esses desafios.
Clamamos junto com a Mãe-Terra, que o uso intensivo de agrotóxicos provoca a morte de nossos povos e rios. Denunciamos que a concentração da propriedade e o estímulo ao agronegócio geram conflitos e violências no campo e na cidade, por isso se tornam urgentes e necessárias a Reforma Urbana e a Reforma Agrária.
Queremos o fim da especulação imobiliária. Apesar dos avanços na política de moradia popular, a carência por moradia cresce a cada ano. O avanço do capital nos territórios, com estímulo ao extrativismo mineral, deixa um rastro de destruição ambiental, do qual o crime na Bacia do Rio Doce, provocado pela Vale e BHP Billiton, por meio da Samarco, com a conivência do Estado, é um dos exemplos mais terríveis.
Neste momento de trevas no país, o encontro brasileiro surge com uma luz. Nos últimos anos, o modelo de desenvolvimentos adotado foi favorecido pelo contexto internacional, possibilitou avanços e garantias de direitos sociais, mas muito lucro para o capital. Com a crise do capitalismo mundial iniciada em 2008, este modelo se esgotou. As forças do capital querem garantir seus interesses, mas nosso povo vem resistindo. Tomaram o governo federal por meio de um golpe, com apoio do Congresso Nacional e do Judiciário brasileiro, impondo o modelo neoliberal derrotado por quatro vezes nas urnas.
Dizemos não às privatizações propostas pelo governo interino e golpista, não ao desemprego e à terceirização que ameaçam diretos dos trabalhadores e trabalhadoras. No Brasil, a democracia sempre foi resultado da organização e da luta do povo. Uma vez mais é preciso fortalecer a aliança das classes populares. Mais do que isto, estamos desafiados a construir um novo projeto para o país. Projeto que além de garantir terra, teto e trabalho para todos e todas, com justiça social, esteja em sintonia com a Mãe-Terra.
Nós em diálogo com o Papa Francisco, reafirmamos o que está na Encíclica Laudato Si’: “Não há duas crises separadas: uma ambiental e outra social; mas uma única e complexa crise socioambiental. A solução requer uma abordagem integral para combater a pobreza, devolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cuidar da natureza.”
Quem não luta, está morto! Quem luta, educa.
Com nossa fé revolucionária, fortalecemos nossa esperança na caminhada e a certeza na chegada. É preciso lutar para derrotar o golpe no Brasil, por isso nos comprometemos a ampliar as mobilizações, fortalecendo e diversificando os trabalhos de base, o diálogo entre os movimentos e ocupando as ruas. A luta imediata deve ser fermento no processo de construção de um projeto popular de país.
Encerramos o encontro no subdistrito de Paracatu de Baixo, com nossos pés na terra devastada pela ganância do capital, e em diálogo com os atingidos reforçamos nossa solidariedade e compromisso com a luta pela justiça, reparação e empoderamento do povo da Bacia do Rio Doce.
Após estarmos reunidos em Roma (2014), na Bolívia (em 2015), queremos convidá-lo a promover em terras brasileiras o 3º Encontro Mundial dos Movimentos Populares em Diálogo com o Papa Francisco, em outubro de 2017, em Minas Gerais. O convite é para manter viva a memória e o nosso compromisso de “cuidar bem da nossa Mãe-Terra, como Casa Comum de todos.
Ao som dos sinos de Mariana, ecoando a dor dos Atingidos e atingidas, clamamos por Justiça!
Mariana, Minas Gerais , Brasil, 4 de junho de 2016.
Uma mesa de abertura, na manhã dessa quinta-feira (2), composta por Padre Geraldo Barbosa, da Arquidiocese de Mariana; João Paulo Paranhos, secretário de Mariana; o deputado federal Padre João; Nilmário Miranda, secretário Estadual de Direitos Humanos; o Vereador Cristiano Vilas Boas, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara; Marcelo Villarrica, do Movimiento dos Trabajadores Excluídos da Argentina e Beatriz Cerqueira, coordenadora-geral do Sind-UTE/MG, saudou os quase 300 participantes do evento.
(Cristiane Passos - CPT Nacional*)
Todos destacaram em suas falas o crime ocorrido em Mariana e a conjuntura política do Brasil neste momento. Beatriz encerrou a mesa com uma homenagem a cada um dos mortos pela lama da barragem de Fundão.
Em seguida João Pedro Stedile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e Daniel Seidel, professor da Universidade de Brasília (UnB) e membro da Comissão Brasileira Justiça e Paz (CBJP), fizeram uma análise de conjuntura e discutiram a reforma política. O ponto forte da discussão foi o esgotamento do atual modelo econômico e a necessidade de se criar um novo projeto de Brasil. “Esse capitalismo está em crise porque é dominado hoje por apenas 1% de milionários que são donos dos bancos e das grandes corporações, no Brasil isso representa apenas 76 mil pessoas milionárias”, explicou Stedile. Já o professor da UnB lembrou que essa democracia formal, que está hoje em decadência, nasceu junto com o capitalismo.
Stedile destacou, ainda, os projetos de sobrevivência do neoliberalismo, ainda tratado como saída econômica para o Brasil, mas que também está em crise. “Nós vivemos uma crise política grave porque a democracia está em crise em todo o mundo. Aqui no Brasil em especial foi sequestrada pelas grandes empresas. Os setores da burguesia não discutem projetos, eles discutem como vão aumentar seus lucros. O neoliberalismo não é um projeto de nação. Ao invés de tirar o país da crise, provavelmente vai afundar ainda mais o Brasil. Mas é esse projeto que levou o Temer, através de um golpe, à presidência”.
Encontro debate a questão da terra no Brasil
A primeira Mesa do Encontro debateu os temas relacionados à terra e as lutas pela garantia do acesso a ela.
Thiago Valentim, da coordenação nacional da CPT, destacou as falas do Papa e a importância da iniciativa que ele teve em dialogar com as organizações sociais. “O Papa não propõe somente um diálogo, mas uma ampla aliança entre os setores sociais, entre as igrejas”, destacou.
“O problema agrário no Brasil se agrava quando percebemos claramente a opção dos governos pelo capital no campo, a partir do modelo do agronegócio”, analisou Thiago. Além dessa opção, os governos também não realizaram a reforma agrária e não garantiram terra aos povos e comunidades tradicionais. “Garantir o acesso à terra é garantir a identidade dos povos”, enfatizou o coordenador da CPT.
“A não reforma agrária não causa conflito apenas do não acesso à terra, mas vai ocasionando outros conflitos, como os conflitos ambientais por exemplo. A dinâmica do capital vai avançando de um território a outro. Em um ano os conflitos podem atingir mais os assentados e sem terras, e no outro mais os povos e comunidades tradicionais”, finalizou Valentim.
Rosângela Piovezani, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), lembrou que 51% dos estabelecimentos rurais são, hoje, do agronegócio e apenas 11% da reforma agrária, “são os camponeses do país que mantém mais de 70% da produção de alimentos do Brasil e convivemos com uma ameaça real ao nosso território, além disso, somente 3% das unidades de pequena produção está no nome das mulheres”.
* Com informações do Brasil de Fato MG
Na tarde de ontem (31) um dos dirigentes nacionais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), com atuação em Goiás, José Valdir Misnerovicz, foi preso no Rio Grande do Sul, numa operação conjunta das Polícias Civil dos estados de Goiás e Rio Grande do Sul. Duas viaturas da Polícia Civil de Goiás estavam no Rio Grande do Sul e estão transferindo Valdir para Goiás.
Também ontem se completaram 47 dias da prisão do militante do MST Luiz Batista Borges, do acampamento Padre Josimo, em Santa Helena Goiás. Ele está encarcerado no município de Rio Verde.
Diante disto, as organizações que assinam a presente Nota, indignadas diante da parcialidade da Justiça, expõem à opinião pública nacional, o contexto e as motivações destas prisões.
O mandado de prisão
No dia 14 de abril de 2016, um colegiado de três juízes, tendo a presidência cabeça o juiz da Comarca de Santa Helena de Goiás (GO), expediu mandado de prisão contra os pequenos agricultores Luiz Batista Borges, Diessyka Santana e Natalino de Jesus, integrantes do acampamento Padre Josimo, e contra José Valdir Misnerovicz, conhecido nacional e internacionalmente como militante e defensor da Reforma Agrária.
Luiz foi preso ao atender convite para prestar esclarecimentos na delegacia local.
O absurdo que salta aos olhos neste processo é que o MST, pela primeira vez, foi enquadrado na Lei nº 12.850/2013, que tipifica as organizações criminosas.
A decisão judicial, ao que tudo indica, foi articulada com o governo estadual. Dois dias antes, em 12 de abril, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de Goiás havia baixado a portaria n. 446, que impunha às polícias Civil e Militar estado de “prontidão”, por dois meses, para suposta “proteção da ordem pública e da paz social”, para acompanhar “possíveis delitos em conflitos urbanos e rurais”. A Secretaria de Segurança antevia violentas manifestações no caso da prisão de dirigentes do movimento.
O que está por trás desta decisão?
A decisão judicial refere-se à ocupação por mais de 1.500 famílias ligadas ao MST de uma pequena parte da Usina Santa Helena, em recuperação judicial. A usina faz parte do grupo econômico NAOUM, que está sendo processado pela prática de diversos crimes, entre os quais o de ocultação de documentos e equipamentos de informática com a finalidade de apagar as provas das fraudes e o de descumprimento das obrigações trabalhistas. Há mais de duas mil ações trabalhistas em curso contra o grupo, o que coloca seus ex-funcionários na absoluta marginalidade, privados das necessidades básicas de sobrevivência. Os trabalhadores desempregados têm feito constantes manifestações contra a usina.
Não bastasse isso, os antigos administradores, Srs. Monir Naoum, Willian Naoum e Georges Naoum, foram condenados pela prática do crime de apropriação indébita de contribuições sociais, pois descontavam dos funcionários as contribuições devidas e não as repassavam aos cofres públicos[1].
Além disso, o grupo tem descumprido sistematicamente suas obrigações tributárias. Após a decretação da recuperação judicial, calculou-se que a dívida do grupo com o erário público chegava a R$ 1.257.829.201,07.
Diante disso, a União entrou com processo de execução fiscal contra a Usina na Vara Federal de Anápolis. Esta decidiu que os imóveis da Usina Santa Helena fossem adjudicados, quer dizer, fossem transferidos para o domínio da União para quitar uma pequena parte da dívida com a Fazenda Pública Federal. E esta manifestou interesse em destinar o imóvel ao INCRA para Reforma Agrária.
Foi então que os trabalhadores sem terra ocuparam parte do imóvel com a finalidade de pressionar os gestores públicos para que se acelerasse o processo de transferência do mesmo para o INCRA.
Ocupação consumada, foram movidas duas ações de reintegração de posse contra os ocupantes, em processos distintos. Nas duas ações foi determinado o despejo forçado das mais de 1.500 famílias acampadas, todas já produzindo alimentos na área.
Todavia, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que a decisão da Vara Federal de Anápolis era da competência do juízo da Comarca de Santa Helena de Goiás[2]. Este concluiu pela nulidade da ação julgada em Anápolis e decidiu que “o imóvel deve ser destinado à atividade agroindustrial da cana de açúcar e que sem terras dificilmente tocariam tal atividade com êxito, causando danos imensuráveis ao município de Santa Helena”. É de frisar que na área ocupada não há plantação de cana e sim de soja.
Quem é o criminoso?
Diante do exposto é de se perguntar, qual é a organização criminosa? Quem é mais danoso à sociedade? Os sem terra que lutam pela reforma agrária, princípio consagrado pela Constituição da República, ou a Usina Santa Helena que deixa milhares de trabalhadores à beira da miséria pelo não cumprimento de suas obrigações trabalhistas, além de não honrar seus débitos com seus fornecedores e com a União?
Enquadrar o MST como organização criminosa é a forma mais inconsequente de combater os movimentos sociais. Já há farta jurisprudência do STJ, do STF e de Tribunais de Justiça afirmando que a luta dos sem terra é um exercício de cidadania e que não há, portanto, que se confundir com crime. Em todo o estado de Goiás nunca houve condenação judicial de qualquer ocupação de terra feita pelo MST.
No contexto da crise política que o Brasil hoje vive, a portaria da Secretaria de Segurança de Goiás, colocando suas polícias de prontidão, nada mais é do que a tentativa de transformar o estado num laboratório de repressão aos movimentos sociais. Ainda é no contexto desta crise que as forças reacionárias do latifúndio e do agronegócio encontram respaldo para suas ações violentas. Em 2015, de acordo com o relatório Conflitos no Campo Brasil, da CPT, foram assassinados 50 trabalhadores em conflitos no campo, número mais elevado desde 2004. E nestes primeiros cinco meses de 2016 já são 23 trabalhadores assassinados. Entre eles se destaca a execução de dois militantes do MST no Paraná.
A Justiça, quase que num monótono canto, coloca a defesa do direito à propriedade, mesmo não cumprindo sua função social, acima da defesa dos mais elementares direitos do cidadão. É do conhecimento de todos que a Reforma Agrária gera mais empregos diretos e faz circular riquezas dentro do próprio município, diferentemente dos grandes empreendimentos agropecuários. Exemplo disso é o próprio município de Santa Helena de Goiás, pródigo no uso de agrotóxicos e completamente incapaz de produzir seu próprio alimento.
A prisão do senhor Luiz Batista Borges e de Valdir Misnerovicz é a demonstração cabal de que lado se coloca a Justiça brasileira. Quando os pequenos se levantam na busca e defesa dos seus direitos são vistos como malfeitores e perigosos à tranquilidade social. Já o esbulho dos direitos dos pequenos é visto como processo normal e é o preço a ser pago ao desenvolvimento do país. E diante disto se curvam os poderes constituídos.
Quando é que veremos brotar a Justiça em nossa nação?
Goiânia, 1º de junho de 2016
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST Goiás
Cajueiro – Centro de Formação, Assessoria e Pesquisa em Juventude
Centro de Desenvolvimento Agroecológico do Cerrado Dom Tomás Balduino – CEDAC
Central de Movimentos Populares – CMP-GO
Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil
Comissão Pastoral da Terra – CPT Goiás
Comissão Pastoral da Terra – CPT Nacional
Comissão Brasileira de Justiça e Paz da CNBB
Conferência dos Religiosos do Brasil – CRB Regional Goiás
Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais na Agricultura Familiar no Estado de Goiás – Fetaeg
Grupo de Pesquisas sobre Trabalho, Território e Políticas Públicas - TRAPPU / UFG
GWATÁ Núcleo de Agroecologia e Educação do Campo – UEG
Movimento Terra Trabalho e Liberdade – Democrático e Indpendente (MTL-DI)
Movimento Camponês Popular – MCP
Mais Informações:
Gilvan Rodrigues – MST Goiás: (62) 9 9991-8836
Secretaria MST Goiás: (62) 3877-7647
Antônio Canuto – CPT Nacional: (62) 4008-6412
__________
[1] TRF 1ª Região Processo nº 1999.35.00.0001046-0/GO.
[2]136.584/GO
*Imagem: MST
Encontro da TEIA – Articulação de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão – ocorreu entre os dias 13 e 15 de maio, na comunidade sertaneja Forquilha, às margens dos Rios Parnaíba e Balsas, em Benedito Leite, no Maranhão. Confira a Carta Final do evento:
Convocados pela Memória dos nossos Ancestrais, das lutas de companheiros e companheiras que deram suas vidas pelas nossas causas; movidos pela força dos Encantados, dos Orixás, de Jesus de Nazaré e pela realidade que nos impulsiona a lutar, nós da TEIA – Articulação de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão – encontramo-nos, nos dias 13 a 15 de maio de 2016, na comunidade sertaneja Forquilha, às margens dos Rios Parnaíba e Balsas, em Benedito Leite/MA.
Somos povos originários (Krenyê, Gamela, Krikati, Krepym katejê) e Comunidades Tradicionais (quilombolas, sertanejos, geraizeiros, quebradeiras de coco, pescadores artesanais), irmãos, companheiros, parentes, vivendo experiências de diversas espiritualidades tecemos o caminho da rebeldia ao som dos tambores, atabaques, maracas, caixas do divino; cantamos, dançamos e rezamos na construção da autonomia nos nossos territórios, fortalecendo a luta rumo ao Bem Viver.
Nas terras Maranhenses, nossos projetos de vida estão ameaçados pelo latifúndio, pelas empresas capitalistas incentivadas e patrocinadas pelo Estado nas esferas do poder federal, estadual e municipal. Nos últimos anos a violência está sendo acirrada com a implementação do Plano de Desenvolvimento Agropecuário – MATOPIBA – e seus diversos projetos de infraestrutura, logística, tecnologias e produção de monoculturas como a soja e o eucalipto, imposto pelo Estado Brasileiro, sob a coordenação do Ministério da Agricultura e Pecuária, utilizando a falácia de (des)envolvimento para a região, a promessa enganosa de geração de emprego e renda, preservação do meio ambiente, melhoria da qualidade de vida e da infraestrutura para os municípios.
Já vimos este cenário: a expansão da fronteira agrícola para a Amazônia nos anos 1970 com a implantação do Programa Grande Carajás e a implementação do projeto PRODECER nas áreas de Cerrado do Centro-Oeste, na década de 80, tiveram como consequência a alta concentração da riqueza, devastação ambiental e extermínio de povos indígenas e comunidades tradicionais. Esse cenário se repete agora com o Plano MATOPIBA, região onde existe uma forte desigualdade social, onde 0,42% da população concentra 59% da renda.
Nossos territórios estão sendo invadidos; somos expulsos, roubam nossas terras; matam os animais, destroem as plantas nativas, cercam e envenenam as águas, causando a destruição da Casa Comum, prejudicando nossos modos de vida e violentando profundamente a Mãe Terra.
Denunciamos que a violência é a ferramenta principal deste projeto de morte. Em todo o Brasil, até maio de 2016, foram assassinadas 23 pessoas (indígenas, quilombolas, sem terra, posseiros, sindicalistas), desses, 09 apenas no Maranhão – 05 indígenas, 02 quilombola, 01 posseiro e 01 sindicalista – e até hoje continuamos sem resposta do Estado que não investigou e tampouco puniu os culpados. Pelo contrário, temos companheiros e companheiras injustamente presos por lutar e defender seus territórios.
Denunciamos a perda dos nossos territórios por reintegrações de posse concedidas pelo Poder Judiciário de forma arbitrária, parcial e injusta; bem como a regularização da grilagem das terras públicas pelo Programa Terra Legal.
Repudiamos a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário, da Secretaria de Mulheres, da Secretaria de Direitos Humanos e da Secretaria Igualdade Racial e o consequente retrocesso das políticas sociais e afirmativas.
Repudiamos com veemência a transferência da titulação dos territórios quilombolas para o Ministério da Educação e Cultura, sob o comando do DEM, partido inimigo das comunidades quilombolas.
Ainda o ataque das bancadas do Boi, da Bala e da Bíblia às leis que asseguram os Direitos Territoriais dos Povos e Comunidades Tradicionais, inviabilizando as demarcações de terras indígenas, titulação de terras quilombolas e a reforma agrária. Entre as ameaças destacamos a PEC 215/2000, o PL 1610/1996, e a PEC 65/2012, em tramitação no Congresso Nacional,
Os ataques aos Direitos dos Povos Indígenas, das Comunidades Tradicionais, das famílias sem-terra e sem-teto e da classe trabalhadora anunciados pelo governo ilegítimo de Michel Temer em seu Programa Ponte para o Futuro (de morte) somente reforça a prática racista e etnocida das elites que comandam o estado brasileiro.
Apesar de escuro…
Estamos de pé e não nos deixaremos deter e temer! Reafirmamos o caminho da insurgência dos povos pela nossa autonomia, pela garantia e cuidado com nossos territórios. Nosso compromisso é com os nossos modos de vida, com nossa forma de cantar, cultuar, dançar, relacionar.
Não ao MATOPIBA, em defesa da Amazônia, do Cerrado e das Águas.
Seguiremos cantando e agindo porque, “...TODO ARAME E PORTEIRA, MERECEM CORTE E FOGUEIRA, SÃO FRUTOS DA MALDIÇÃO!!”
Territórios Livres! Já!
Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais do MA
No dia 13 de maio de 2016, exatos 128 anos após a abolição formal e inconclusa da escravidão, o presidente em exercício Michel Temer, realizou mudança substancial na política de titulação dos territórios quilombolas. Conforme o texto da Medida Provisória nº 726/16, a atribuição para a realização da titulação dos territórios quilombolas passa a ser parte das competências do Ministério de Educação e Cultura, fato que pode retirar do INCRA a missão institucional de reconhecer os direitos à terra que a Constituição Federal de 1988 reconheceu aos quilombolas.
(Fonte: Terra de Direitos)
Segue, na íntegra, Nota Pública da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ:
Não bastasse o Brasil ter sido o último país das Américas a abolir o regime escravocrata, assim como a falsa ‘abolição’ que ‘deu’ a liberdade aos negros (as), mas não lhes garantiu direitos fundamentais, como acesso à terra, à moradia, educação, enfim, às condições necessárias que permitissem exercer uma cidadania de fato, em pleno 13 de maio de 2016, assistimos uma estratégia orquestrada entre a elite brasileira, Senado, Congresso e o Judiciário rasgando a CF de 88 diante dos nossos olhos e com chances reais de um retrocesso sem proporção aos direitos humanos, civis e sociais, quando as políticas públicas sociais são leiloadas pelo Presidente Interino Michel Temer no Brasil. Ainda sem entender quais acordos levaram o Presidente Interino a entregar a Pauta Quilombola para o Ministério da Cultura e Educação, que por sua vez tem a frente o Deputado Federal Mendonça Filho (DEM-PE), voltamos ao ano 2000 na era FHC que cometiam o ‘erro’ de uma visão equivocada da forma de existência e organização dos quilombos no país. Lamentamos e não aceitamos que fique sob a competência deste Ministério e deste senhor, delimitar e demarcar os territórios quilombolas no Brasil, pois com isso o INCRA perde a atribuição pela titulação.
A Pauta de demarcação de Territórios Quilombolas no MINC com o DEM é a certeza que nenhuma titulação irá avançar, nenhum território será titulado, pelo contrário tememos perder o pouco que conquistamos nesses longos anos de luta, pois, é sabido que o DEM juntamente com a Bancada Ruralista é contra os (as) quilombolas, pois defendem os seus interesses próprios e do Agronegócio, grandes latifúndios, grandes empresas e não a permanência nos Territórios dos (as) quilombolas.
O atual Ministro e seu Partido, na época PFL, move uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, que se arrasta há mais de 12 anos no STF, em face do Decreto 4.887, de 20 de novembro de 2003, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação dos Territórios quilombolas que é objeto do art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988 e tememos que diante do cenário político atual, onde todo o direito do povo é ‘revisto’ é retirado para atender os interesses dos que sempre foram privilegiados, e na ‘agilidade’ do Congresso e Senado em votar pautas de seus interesses, recaia sobre nós quilombolas a conta desses acordos para a possível governabilidade do Presidente Interino Michel Temer.
É obrigação do Estado, agir positivamente para alcançar o resultado pretendido pela Constituição, ora por medidas legislativas, ora por políticas e programas implementados pelo Executivo são garantias dos direitos para nós quilombolas.
Está em curso um retrocesso inimaginável com um prejuízo histórico aos mais de 5 mil quilombos com aproximadamente 16 milhões de pessoas no Brasil, e convocamos todos (as) quilombolas, parceiros, apoiadores, lutadores (as) do povo, todos os irmãos e irmãs quilombolas das Américas, aos órgãos internacionais de defesa dos direitos humanos e da vida, a lutar conosco contra esse Golpe a Democracia brasileira, contra esse Golpe aos Direitos dos (as) quilombolas, contra esse Golpe que extinguiu SEPPIR, SPM, SDH, MDA e MDS, contra o Golpe arquitetado por políticos racista, ruralista, machista, homofóbicos, intolerantes que excluem e não respeitam os votos de mais de 54 milhões de brasileiros (as).
Somos detentores (as) da Ancestralidade, exigimos respeito pelo nosso templo sagrado que é nosso Território, com nossa fé, nossa cultura e nosso modo singular de viver.
Precisamos é de mais políticas públicas, de mais titulações de território quilombolas, de mais educação, saúde, moradia, saneamento, um meio ambiente saudável e sustentável, de respeito as nossas tradições e a história oral de um povo, precisamos é do bem viver em nossos quilombos e não voltar ao descaso, esquecimento, abandono e mazelas como sempre foi feito em governos anteriores e por isso exigimos:
- Que a Pauta Quilombola retorne imediatamente ser competência do INCRA, para titular os Territórios Quilombolas, dentro da nova fusão dos Ministérios Desenvolvimento Agrário e Desenvolvimento Social e Combate a Fome;
- Que fica sob a competência do MINC através da FCP a pauta sobre as Certificações dos Quilombos;
- O reconhecimento de nós quilombolas como Público da Reforma Agrária, conforme a Portaria nº 175 de 19 de abril de 2016, assim sendo não compete ao MINC tal função;
- Que a SEPPIR não seja desmantelada para que possa continuar executando o seu papel sendo a ponte entre os (as) quilombolas e o Governo Interino de Michel Temer, executando as políticas do Programa Brasil Quilombola, assim sendo não podem reduzir a SEPPIR numa simples ‘pasta’ no ‘novo’ Ministério da Justiça e Cidadania;
- Que o Estado Brasileiro cumpra e respeite as determinações do Decreto 4887 de 2003, foi uma conquista do Movimento Negro, ONGs e Quilombolas este Decreto que compões mais da metade da população no Brasil;
- Que o Brasil respeite os (as) negros (as), os (as) quilombolas, os (as) indígenas, os (as) Camponeses (as) e todos os povos que compõe a formação desta Pátria, que resistem e lutam, pois nunca estiveram adormecidos (as) ou não existiríamos mais;
- Que o Brasil respeite os Tratados, Convenções e Acordos Internacionais assinados, firmados para combater o Racismo, a violência no campo e na cidade, os conflitos agrários, os direitos humanos, a terra, a vida dos (as) brasileiros e brasileiras lutadores (as) desta Pátria.
Sabemos que a luta é árdua e nada para nós negros (as) neste país veio de graça, ou pela bondade como contam erroneamente as histórias nas escolas, suportamos e sobrevivemos as piores atrocidades cometidas com um ser humano, e aguerridos (as) pelo sangue de Dandara dos Palmares, Zumbi, Teresa de Benguela e tantos (as) guerreiros (as) que deram sua vida por uma sociedade mais justa, humana e igualitária, que dizemos NÃO VAMOS PERMITIR RETROCESSOS, não vamos dar nenhum passo atrás, não vamos permitir NENHUM DIREITO A MENOS.
Brasília – DF, 13 de maio de 2016.
CONAQ, 20 anos de Luta e Nenhum Direito a Menos!
Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombola – CONAQ