Nós, representantes de organizações eclesiais e sociais dos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás, e do Distrito Federal, reunidos no Encontro de Articulação da Rede Eclesial Platina (REPLA), em Jales-SP, nos dias 8 e 9 de agosto de 2024, manifestamos nossa solidariedade aos povos Guarani e Kaiowá diante das violências que vem sofrendo de longa data, especialmente nestes últimos dias. Conforme o Conselho Indigenista Missionário, “após a Força Nacional se retirar de retomadas, jagunços atacam e deixam dez Guarani e Kaiowá gravemente feridos em Douradina (MS)”. Repudiamos mais essa violência e a omissão do Estado diante de tanta lentidão para a demarcação e homologação dos territórios indígenas no país.
A violência, também no mundo urbano, é sistemática e grave. Nestes dias, o Governo do Estado de São Paulo e a Prefeitura Municipal de São Paulo realizaram ação conjunta para despejar diversas famílias empobrecidas do centro de São Paulo. Hotéis, pensões, ferros-velhos e pequenos comércios foram lacrados e diversas famílias foram colocadas nas ruas. Sempre usando a desculpa de combate ao tráfico, o Governo do Estado e a Prefeitura, alinhados com os grandes meios de comunicação, são parceiros na criminalização da população pobre do centro. Nesta mesma ação, a comunidade da Favela do Moinho foi invadida por forças da segurança pública do Estado e do Município, cometendo várias ilegalidades. A nossa solidariedade às pessoas encontradas oprimidas nessas operações.
Exortamos as comunidades cristãs e a sociedade em geral a serem solidárias com os que sofrem e são perseguidos. O Evangelho mostra que os pobres e perseguidos por causa da justiça são centrais no Reino (cf. Mt 5,3-12) e os que oprimem serão destronados (cf. Lc 1,52). O Papa Francisco ainda alerta para que retiremos o poder do opressor (Fratelli Tutti 241). Por isso, são inaceitáveis as agressões, no campo e na cidade, contra os mais pobres, os povos indígenas, os sem terra e os sem teto.
Exigimos do Estado brasileiro a homologação dos territórios dos povos originários. E na realidade das periferias, exigimos a urgente implantação da política habitacional para atender a todos, como caminho para se combater a violência urbana diante do enorme déficit habitacional que vigora no país.
Participantes do Encontro de Articulação da Rede Eclesial Platina (REPLA),
realizado em Jales - SP, nos dias 8 e 9 de agosto de 2024
Por Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida / Terra de Direitos
Legislação que flexibiliza a regulamentação dos agrotóxicos viola direitos à saúde, meio ambiente e administração pública
A Lei 14.785/2023, conhecida como “Pacote do Veneno”, é objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) protocolada nesta quarta-feira (14) no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Rede Sustentabilidade, Partido dos Trabalhadores (PT), Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar). A iniciativa conta com o apoio técnico e jurídico de organizações sociais e movimentos populares.
Na ação, os autores destacam que a normativa viola princípios constitucionais norteadores da administração pública, tais como legalidade e eficiência, e direitos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, à saúde, dos povos indígenas, dos povos tradicionais, à vida digna, do consumidor, de crianças e adolescentes, entre outros. Dado o intenso impacto ambiental e à saúde, os autores da ADI requerem que seja concedida uma medida cautelar, isto é, a suspensão dos efeitos da Lei até análise de mérito sobre a inconstitucionalidade da norma. A iniciativa conta com o apoio de organizações sociais e movimentos populares.
Jakeline Pivato, da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, explica que a lei vai na contramão das reais necessidades de saúde e meio ambiente apontadas historicamente pela sociedade civil organizada.
“Flexibilizar uma lei tornando-a incapaz de proteger o ser humano e o meio ambiente é incentivar a morte. Historicamente, os movimentos, organizações e a sociedade civil têm denunciado os impactos dos agrotóxicos no Brasil. A Lei do Pacote do Veneno traz, para uma realidade já trágica, produtos ainda mais perigosos. Além de limitar a capacidade de ação de nossos órgãos reguladores, como Anvisa e Ibama. Portanto, denunciamos que essa lei fere o direito à alimentação saudável, ao meio ambiente sustentável e a saúde da população brasileira. Nesse sentido, seguimos em luta afirmando sua inconstitucionalidade “, diz Pivato.
De autoria do ex-senador Blairo Maggi (PP-MT), conhecido como “rei da soja”, o projeto de lei contou com intensa lobby do agronegócio ao longo da tramitação e forte esforço da bancada vinculada ao agronegócio, a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA). Majoritária nas últimas legislaturas, a Frente aglutina hoje 47 senadores dos 81 assentos. Já na Câmara são 300 dos 513 deputados e deputadas.
Por meio de apensos à primeira versão do projeto de lei, o texto final aprovado pelas duas casas legislativas constitui uma mudança profunda na legislação anterior, a Lei 7.802/1989. O argumento central da bancada era a necessidade de atualização da normativa e que a legislação então vigente era impeditiva à aprovação de novos registros. No entanto, o Brasil teve nos últimos anos uma escala crescente de novas autorizações de agrotóxicos. No ano de aprovação do “Pacote do Veneno” foram 555 novos registros. O alto número não é muito diferente da média anual de média de 545 liberações durante o Governo Bolsonaro, com total recorde de 2.182 liberações entre 2019 e 2022.
“O Congresso, majoritariamente composto por representantes do agronegócio, legislou em benefício próprio. A expectativa da sociedade com o ajuizamento da ADI contra o Pacote do Veneno é que a legislação seja analisada pela Suprema Corte à luz de outros aspectos: proteção à saúde humana, respeito ao meio ambiente e à biodiversidade, todos fundamentais para o desenvolvimento do país”, destaca a assessora jurídica da Terra de Direitos, Camila Gomes.
Para fornecer subsídios e dados para contribuir na tomada de decisão pela Corte, a Terra de Direitos, Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Fian Brasil, Instituto Preservar e Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Maranhão (Fetaema) ingressaram com pedido de amicus curiae (amigos da corte).
Flexibilização legal
Uma das mudanças mais significativas da Lei 14.785 foi a centralização da agenda dentro do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), pasta sob forte influência do agronegócio. A legislação anterior previa um modelo tripartite, segundo o qual cabia ao Mapa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) a atribuição conjunta de avaliação, a partir de critérios técnicos e científicos, para a liberação ou veto de registros e fiscalização dos agrotóxicos. Pela nova lei, esta atribuição é tarefa exclusiva do Mapa. Aos demais órgãos cabe apenas a revisão complementar à análise do Ministério. Ou seja, a avaliação dos impactos para saúde e meio ambiente com a liberação de determinados agrotóxicos pode não ocorrer se não requerida pelo Mapa. A centralização das atribuições no Mapa foi vetada pelo presidente Lula, mas em maio deste ano o Congresso derrubou os vetos.
Ato realizado no Rio de Janeiro contra a aprovação do Pacote do Veneno
Além da centralização do processo de liberação de registro de agrotóxicos no Mapa e desconsideração do órgão ambiental e sanitário, a nova lei traz outros retrocessos quando comparada com a lei anterior, como: uma definição mais vaga do critério para veto à registros de agrotóxicos com maior grau de toxidade, a revogação de uma série de regras relativas à pagamento de taxas ambientais, a dispensa de registro de agrotóxicos para fins de exportação, entre outras medidas.
“[a Lei] vai na direção contrária à tendência mundial de limitação e proibição desse tipo de substância tóxica, aumenta o risco de contaminação ambiental e humana, eleva o perigo de incidência de câncer e outras doenças agudas e crônicas relacionadas à exposição da população brasileira aos agrotóxicos, contamina os ecossistemas nos diferentes biomas brasileiros e põe em risco sobretudo o trabalhador rural e contraria os princípios da prevenção, precaução, agroecologia e do desenvolvimento sustentável”, apontam os autores da ação.
Impactos à saúde e meio ambiente
À época da aprovação do projeto de lei pelo Congresso Nacional, a Anvisa destacou em nota que a medida, caso fosse implementada, “põe vidas brasileiras em risco”. Já o Ibama classificou o projeto de lei como um “flagrante retrocesso socioambiental”.
Ao longo da tramitação legislativa a proposta foi amplamente repudiada e denunciada por Relatorias Especiais da ONU, Conselho Nacional de Direitos e Instituto Nacional do Câncer (Inca), além de diversos órgãos públicos, autoridades nacionais e internacionais, conselhos de direitos e controle social, órgãos do Sistema de Justiça .
Na ação os requerentes sublinham que o grave cenário de intoxicação por agrotóxicos no Brasil deve ser intensificado com a implementação da Lei 14.785. Desde 2011 o Brasil está no topo do ranking de países que mais usam agrotóxicos. Só em 2022, foram aplicados mais agrotóxicos no país do que a quantia somada dos Estados Unidos e China – ao todo, 800 mil toneladas, segundo a FAO/ONU.
Entre 2010 e 2019, o Ministério da Saúde registrou a intoxicação de 56.870 pessoas por agrotóxicos no país. “Considerando a expressiva subnotificação nesses casos da ordem de 1 para 50, o número é potencialmente bem maior, podendo chegar a 2.843 milhões de pessoas intoxicadas por agrotóxicos no país”, aponta a ação. O tratamento por intoxicação onera o Sistema de Saúde (SUS), apontam ainda. Cada dólar gasto em agrotóxicos no Brasil custa $1,08 para o SUS, no tratamento de intoxicações causadas por estas substâncias.
Os autores ainda destacam o alto risco de registros e uso de agrotóxicos com potencial cancerígeno.
Na ADI ainda se destaca o uso intenso de agrotóxicos voltado produção de commodities, como soja e milho, e não de alimentos como é presente no discurso do agronegócio. Outro destaque é o impacto ambiental. “Já é fartamente documentado que esse tipo de produção agropecuária gera desmatamento e, consequentemente, contribui para as emissões de GEE [gases de efeito-estufa]”, enfatizam.
Na ação destacam ainda que a “ausência de ação eficaz e preventiva do Poder Público para evitar a catástrofe humanitária e ambiental que assola diversas regiões e povos do país, viola frontalmente os princípios como os da legalidade e moralidade”, princípios da administração pública. Os autores sublinham que a decisão da ministra Carmen Lúcia no âmbito da ADPF 760, de retomada do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia, enfatiza o dever do Poder Público observar os princípios de prevenção e precaução em normas, como as leis, que tratam de questões ambientais.
Fortalecer a organização das mulheres no cerrado, promover troca de saberes e partilha das experiências destas mulheres em defesa de seus direitos, este foi o objetivo do encontro de mulheres do cerrado que aconteceu nos dias 10 e 11 de agosto na Casa João XXIII, Centro Diocesano de Floriano-PI
Por Teresinha Menezes | CPT Piauí
Fotos: Teresinha Menezes
Realizado pela Comissão Pastoral da Terra no Piauí com o apoio da Articulação do Cerrado e Misereor- KZE, o encontro contou com a presença de lideranças tradicionais indígenas, ribeirinhas, brejeiras, trabalhadoras rurais, e sindicalistas das dioceses de Bom Jesus e Floriano.
Durante o encontro foi feito o resgate ancestral das mulheres da região do cerrado, fazendo memória de suas lutas, elementos, desafios e conquistas alcançadas permitindo compreender as atuais lutas, desafios perspectivavas para a caminhada da vida das mulheres do campo.
Um grande desafio atual das mulheres é a denúncia, o medo de expor a violência sofrida para a sociedade e ainda ser julgada por ela, fortalecer a confiança e a segurança das mulheres que denunciam é importante na garantia dos direitos e “...que nós, mulheres do cerrado, possamos entender através da participação dessas rodas de conversa quais são os nossos direitos … e que precisamos nos unir e apoiar umas as outras, não podemos nos calar diante das agressões que sofremos, ou que outras mulheres também sofrem. Denunciem!” reforça Diana Rodrigues, presidente do sindicato de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Nazaré do Piauí-PI .
Na construção de um compromisso com a luta na defesa dos direitos, de forma lúdica, as mulheres representaram seus sonhos no papel para concretizar tudo que foi discutido durante o encontro, também para que pudessem levar consigo uma referência do que aprenderam. Elas desenharam suas realidades e desejos individuais e coletivos.
O Encontro de Mulheres do Cerrado destacou a valorização das mulheres do campo, a troca de saberes e a partilha das experiências contribuíram para a formação de uma consciência coletiva, que contribuirá para impulsionar a criação e implementação de políticas públicas mais eficazes e a proteção dos direitos das mulheres no Cerrado.
Texto: Wilians Santana (FETAG-RO)
Revisão e Edição: CPT Regional Rondônia / Comunicação CPT Nacional
Fotos: FETAG-RO e CPT-RO
Na manhã da última sexta-feira (09), um ato público em memória das vítimas do massacre na fazenda Santa Elina, no município de Corumbiara/RO, marcou os 29 anos daquele dia cinzento, triste e sangrento, conhecido como “Massacre de Corumbiara”, o qual interrompeu o sonho de várias famílias que buscavam o seu pedacinho de chão.
O memorial construído está localizado na LH 02 do Assentamento Alzira Augusto Monteiro, antiga Fazenda Santa Elina, tendo sido inaugurado no ano passado, como homenagem do Conselho Regional de Psicologia da 24a. Região (CRP-24), a pedido das famílias do local (confira aqui a divulgação da inauguração).
O evento em memória das vítimas foi organizado pelo Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Corumbiara, em parceria com os demais sindicatos do Regional Cone Sul, bem como com as igrejas Católica e Adventista, Comissão Pastoral da Terra (CPT) e outras organizações civis, e contou com a participação de vários agricultores e agricultores familiares e lideranças locais para fazer memória de todas as vítimas que tombaram por terra naquela localidade. Participaram do ato: representantes dos STTRs de Corumbiara, Vilhena/Chupinguaia e Cerejeiras/Pimenteiras; membros da coordenação regional e agentes da CPT; o Bispo Diocesano de Guajará-Mirim, Dom Benedito Araújo; Padre Anilson Ferreira, da Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, e Teófilo Santana, diretor de meio ambiente da FETAGRO.
Relato do Massacre | Texto: João Ribeiro de Amorim, assistente administrativo e irmão do ex-vereador Nelinho
O cruel e sangrento Massacre de Santa Elina, também chamado de Massacre de Corumbiara, completa 29 anos neste 09 de agosto. O município era recém-emancipado, tinha apenas 03 anos de criação. Deixou cicatrizes profundas e tristes lembranças em toda a região do Cone Sul de Rondônia. Esse triste episódio é mais um subproduto da desigualdade social no Brasil, e que tem raízes históricas que remontam desde o colonialismo europeu, que consistia em invadir territórios alheios, escravizar pessoas e distribuir imensas áreas de terras aos chamados senhores de engenho. No Brasil, implantou-se as Capitanias Hereditárias, que eram grandes extensões de terras tomadas dos indígenas originários e distribuídas aos nobres de confiança do rei de Portugal.
De lá pra cá, ao longo dos séculos, pouca coisa mudou com a ocupação. A desigualdade na distribuição de terras continuou repetindo a mesma gênese de tantos outros massacres acontecidos contra os índios, camponeses e posseiros.
A distribuição desigual de terras e a grilagem na região de Corumbiara remonta ao período da ditadura militar nas décadas de 60/70/80, quando Rondônia ainda era Território Federal, através de Contrato de Alienação de Terras Públicas (CATPs), primeiro com a tomada de terra dos povos originários, dizimando suas aldeias, roubando suas madeiras e suas riquezas, como foram registrados os casos dos índios Omerê, Akuntsu e o Índio do Buraco, em Corumbiara, onde seus povos foram exterminados. As melhores terras foram entregues ao grande latifúndio. Aos pobres restou somente a ocupação que avançou palmo a palmo resultando nos assentamentos Verde Seringal, Vitória da União, Roncauto e Adriana, onde a maioria das vezes resultando em conflitos violentos.
O Massacre de Corumbiara foi um dia de tristeza e de agonia, que parecia uma eternidade para quem vivenciou aquele triste momento. A tragédia ficou gravada negativamente na história de Rondônia, e a notícia correu o mundo. O conflito envolvendo policiais militares, jagunços e centenas de famílias de sem-terra, resultou na morte e tortura de inúmeras pessoas. Notou-se o despreparo das forças de segurança no trato com a situação, pois, a função seria proteger e salvar vidas. Nos relatos consta que, por volta de 3h30 da madrugada, policiais militares e jagunços avançaram e cercaram o acampamento, grande parte deles usando máscaras ou com rostos pintados. O ataque iniciou na escuridão da madrugada com holofotes ligados, arremesso de bombas de gás lacrimogênio e rajadas de tiros que avançou até ao alvorecer do dia, e seguiu pela manhã. Depois de dominados, vários detidos passaram por sessões de espancamento e tortura. Na fuga pela mata, a pequenina e inocente Vanessa dos Santos, de apenas seis anos, quando fugia desesperadamente junto com sua família, teve o corpo trespassado nas costas por uma bala, jorrou seu sangue inocente pelo chão da Santa Elina.
Consta também nos relatos que as mulheres e crianças que não conseguiram fugir, sendo usadas como escudo humano pelos policiais e jagunços, e na sequência, várias execuções, e muitos posseiros fuzilados a queima roupa. Tombaram por terra os mártires: Nelci Ferreira, Enio Rocha Borges, José Marcondes da Silva, Ercílio Oliveira Campos, Odilon Feliciano, Ari Pinheiro Santos, Alcino Correia da Silva e Sérgio Rodrigues Gomes, que foi tirado vivo do local, executado depois, e seu corpo jogado no rio Tanaru, a 70 km do local. Além disso, vários desaparecidos jamais foram encontrados. É o caso do jovem Darli Martins, morador da linha 05, filho de pioneiros de Corumbiara, e seu corpo nunca mais localizado para um enterro digno.
Em janeiro de 2020, a Justiça de Rondônia finalmente declarou a morte presumida do mesmo. No confronto também morreram 02 policiais: Tenente Rubens Fidélis Miranda e Soldado Ronaldo de Souza. Em tratamento desumano, típico de campo de concentração, foram confinados no campinho de futebol do assentamento Adriana, depois de muitos espancamentos e hematomas pelo corpo, como animais, foram jogados em caminhões de carroceria. Cerca de 355 pessoas foram aprisionadas e levadas para o ginásio poliesportivo e delegacia de polícia de Colorado do Oeste, onde, sem se alimentar, sofreram as piores humilhações, fisicamente, moralmente e psicologicamente, tiveram que tirar as roupas e ficaram só de cueca.
Em função do conflito, alguns dias após, a região de Corumbiara voltou ao palco dos noticiários. Em dezembro daquele ano, foi assassinado covardemente o vereador Manoel Ribeiro, o Nelinho, que era muito querido por todos na região, e que apoiou moralmente os camponeses de Santa Elina. O massacre de Corumbiara levou Rondônia e o Brasil a responderem na Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA) por violação do direito à vida e dos direitos humanos.
Em 21 de agosto de 1998, proposto pelo então vereador Valdemar, popular Sapo (in memoriam) foi criada a Lei Municipal nº 137, que estabeleceu o dia 9 de agosto como feriado municipal em Corumbiara, onde o município para celebrar em memória às vítimas do Massacre de Corumbiara.
A luta e o sangue derramado não foi em vão. À custa de muito sangue derramado desses mártires, resultou em vários assentamentos, sendo em Corumbiara criado o Assentamento Guarajús, também denominado de Nova Vanessa, em memória a pequena Vanessa, e no município de Theobroma sendo criado os assentamentos Santa Catarina, Rio Branco e Lagoa Nova, e a consequente criação da Vila Palmares do Oeste.
Quinze anos após o massacre, houve novas ocupações, e com a tensão eminente, foi desapropriada parte da Fazenda Santa Elina, que compreende Água Viva e Maranatá, que foram subdivididas em denominações de vários assentamentos que levam o nome de Zé Bentão, Renato Natan, Alzira, etc, onde mais de 700 famílias de assentados produzem e alimentam seus filhos.
“Meu Senhor, pelos Santos Inocentes, quero Vos rogar hoje por todos aqueles que são injustiçados, sofrem ameaças, são marginalizados e incompreendidos. Olhai pelos pequeninos, abandonados e assassinados pela estrutura de morte de nossa sociedade. Que convosco eles alcancem dignidade e paz. Amém.”
Por: Setor de comunicação da CPT NE2
Imagem: Equipe CPT Mossoró-RN
Nos dias 9, 10 e 11 de agosto, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Apodi foi o local do Encontro da Juventude Camponesa do Rio Grande do Norte. Organizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), o encontro reuniu jovens de diversas comunidades apoiadas pela Pastoral no estado potiguar e contou também com a participação de meninos e meninas de comunidades camponesas da Paraíba.
Com o tema "Refletindo sobre a Identidade da Juventude do Campo", a atividade teve como objetivo promover a troca de experiências, aprofundar reflexões sobre o assunto e fortalecer a articulação entre os jovens que vivem e lutam no campo. Entre místicas, músicas e rodas de conversa, os(as) jovens dos dois estados compartilharam suas experiências e debateram o papel fundamental da juventude na valorização do campo como espaço de vida e resistência. A animação do encontro ficou por conta da banda Manégrafia, formada por lideranças comunitárias e agentes pastorais da CPT na Paraíba.
"Foi um encontro revigorante", destacou a jovem Poliana Mirtes, do Assentamento Terra de Esperança, situado em Governador Dix-Sept Rosado. "O exemplo da juventude da Paraíba mostrou que a articulação entre os(as) jovens não é apenas possível, mas também eficaz e capaz de gerar resultados. O estigma de que a juventude não se interessa por questões relevantes não condiz com a nossa realidade. Estamos engajados(as) e desejamos fazer a diferença."
Poliana ressaltou que o encontro serviu como motivação para a formação de grupos de jovens nas comunidades do Rio Grande do Norte e para ampliar as discussões sobre a luta e a valorização da identidade camponesa. "Ser jovem no campo é ser resistência e ter compromisso com a continuidade da soberania alimentar, da agroecologia e dos saberes da agricultura camponesa. A juventude representa o presente e o futuro. Precisamos ser valorizados(as) e apoiados(as), precisamos de incentivo para engajar outros(as) jovens na construção do sonho de uma sociedade justa e igualitária, que respeite e valorize os saberes dos povos do campo", completou.
A troca de experiências entre os(as) jovens do Rio Grande do Norte e da Paraíba não apenas fortaleceu os laços entre eles(as), mas também reafirmou a importância de uma juventude comprometida com as lutas travadas por suas famílias e comunidades. O encontro foi um passo importante na construção dessa articulação, e a expectativa é que as discussões e ações sejam expandidas, assim como a conexão e o apoio mútuo entre os(as) jovens de diferentes comunidades. A semente foi plantada, e a colheita pode ser um presente e futuro marcados pela justiça social e pelo respeito aos povos do campo.
Participaram do evento jovens de diversas comunidades, como: assentamento Professor Maurício de Oliveira, em Assu; assentamento Tabuleiro Grande, em Apodi; assentamentos Terra de Esperança e Chico Rego, em Governador Dix-Sept Rosado; assentamento Monte Alegre, em Upanema; além de comunidades situadas no município de Caraúbas e de municípios paraibanos, como Cajazeiras.
Setor de Comunicação da CPT Nacional
Fernando Araújo dos Santos foi assassinado na noite de 26 de janeiro de 2021, com um tiro na nuca e sem chance de defesa, no momento em que arrumava seus pertences para se mudar daquele local.
Ele residia na mesma área onde havia presenciado a execução covarde e cruel de 10 trabalhadores rurais (nove homens e uma mulher), por policiais civis e militares do Estado do Pará. Este violento episódio ficou nacionalmente conhecido como Massacre de Pau D’arco, ocorrido em 24 de maio de 2017.
Fernando era a principal testemunha desta chacina. Ele narrava com riqueza de detalhes a execução de seus companheiros e de seu namorado pelos policiais. Para sobreviver naquele terrível dia, Fernando ficou embaixo de um dos corpos de seus companheiros, com sangue por todo o corpo, enquanto, com medo, ele escutava e presenciava a ação violenta da polícia.
Em 20 de setembro de 2020, Fernando foi vítima de uma tentativa de assassinato, tornando-se, assim, duas vezes sobrebrivente, e mais uma vez, vítima da violência contra os trabalhadores rurais do Sul do Pará.
Após onze meses de seu assassinato, as investigações foram encerradas, tendo sido identificado pela Polícia Civil apenas o executor do crime, Oziel Ferreira dos Santos, denunciado pelo Ministério Público em dezembro de 2021.
Oziel, acusado de ser o executor do crime foi levado a júri popular na comarca de Redenção/PA, nesta quinta-feira, dia 08 de agosto de 2024. A sessão do Tribunal do Júri foi presidida pelo doutor Bruno Carrijo, juiz criminal, e teve duração de cerca de 07 horas, contando com a participação na plateia de amigos e familiares de Fernando.
Atuaram como assistentes da acusação os advogados/as Marco Apolo Leão, da SDDH, e Rogério Silva e Jamyla Carvalho, da CPT/PA. Estes, desde o início, acompanham o caso como representantes da família de Fernando e também das entidades defensoras de direitos humanos.
Após acalorados debates entre defesa e acusação, por maioria de votos, os jurados reconheceram Oziel Ferreira dos Santos como autor do crime de homicídio qualificado contra a vítima Fernando dos Santos. Oziel foi condenado a 14 anos de prisão, que devem ser cumpridos inicialmente em regime fechado.
Ocorre que, mesmo identificado e condenado o autor do assassinato de Fernando, a Policia Civil do Estado do Pará, ainda não foi capaz de responder as seguintes perguntas: quem mandou matar Fernando? Qual o motivo?
No início de 2022, a requerimento da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), um novo procedimento para tentar sanar estas dúvidas foi reaberto pela Polícia Civil do Estado a pedido do Ministério Público Estadual. Este procedimento corre há cerca de dois anos na Delegacia de Homicídios da Capital, e apesar do transcorrer do tempo, ainda não foi concluído, deixando em aberto os questionamentos mencionados.
Os advogados e a advogada que atuaram na sessão de ontem, assim como as entidades que estes representam, e que acompanham desde inicio o caso, esclarecem que a condenação de Oziel pelo assassinato de Fernando não coloca fim a estes questionamentos, e por isso, a busca por tais resposta deve continuar, afirmando o compromisso da CPT e da SDDH com a verdade, a memória e a Justiça por Fernando.
Aos nossos mortos, nenhum minuto de silêncio, mas toda uma vida de luta!
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