Por Comunicação Raízes do Cajueiro
Senhor João Germano, seu Joca, resiste e reside no território há mais de 45 anos. Foto: Raízes do Cajueiro.
O juiz respondente pelas ações judiciais sobre o Cajueiro na Vara de Interesses Difusos e Coletivos da Capital, Marcelo Oka, teve que voltar atrás na decisão de despejo emitida por ele, em 06/12/2023, contra o senhor João Germano (seu Joca, 90 anos) na ação de desapropriação movida pela empresa TUP Porto São Luís S/A contra o pescador aposentado. Na decisão, o juiz havia autorizado “o uso de força policial e arrombamento” da casa do idoso, o que poderia ocorrer antes do Natal (processo n. 0834529-92.2019.8.10.0001).
A revogação ocorreu como efeito produzido por decisão em outro processo judicial, que questiona a validade do decreto de desapropriação (processo n. 0804674-97.2021.8.10.0001). O curioso é que o senhor João Germano é autor dessa ação e indicou a TUP Porto São Luís S.A como ré, numa inversão das partes em relação à desapropriação. Na ação movida por seu Joca, a 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Maranhão decidiu, por unanimidade, declarar a nulidade absoluta do decreto de desapropriação nº 002/2019, emitido indevidamente pelo então Secretário de Indústria, Comércio e Energia, Simplício Araújo, no governo Dino, para beneficiar a empresa portuária.
No acórdão publicado em 11/12/2023, o TJMA afirma que “não existe nenhum ato que delegue ao Secretário de Estado a competência para declarar a utilidade pública da área do distrito industrial e determinar a desapropriação de bens imóveis particulares”. Na decisão ainda consta que “devem ser declarados nulos todos os atos emanados do referido decreto”. Como o decreto é requisito indispensável para a desapropriação, a decisão de nulidade, após seu trânsito em julgado, extinguirá o processo de desapropriação. De imediato, o mandado de despejo dado por Oka naquela ação teve que ser revogado pelo juiz.
Com isso, o gigantesco grupo empresarial COSAN S/A - detentor atual de 100% das ações da TUP Porto São Luís – passou ao plano da igualdade jurídica com senhor João Germano da Silva e a família de seu irmão, Pedro Sírio, que era seu vizinho, mas faleceu pela Covid-19, aos 90 anos, em 2020.
:: Justiça anula o decreto de desapropriação da Comunidade do Cajueiro, no Maranhão
Por Lígia Appel (Comunicação Cimi Regional Norte I),
com informações da CPT da Prelazia de Itacoatiara
Edição: Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional)
Relatório produzido pela CPT da Prelazia de Itacoatiara (AM) revela a crescente escalada de ameaças, violações de direitos e insegurança que os indígenas estão sofrendo por conta da exploração de petróleo e gás natural pela empresa Eneva S.A. no Amazonas
Um dia após o fim da cúpula climática COP28, que apontou a necessidade da redução do uso de combustíveis fósseis diante de fontes sustentáveis, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) realizou na última quarta-feira (13) o que está sendo chamado o leilão “Fim do Mundo”, vendendo direitos de perfuração em 602 novas áreas de exploração de petróleo e gás em todo o país, incluindo 21 na bacia do rio Amazonas, mais da metade deles (12) localizada em áreas de impacto direto de, pelo menos, 20 terras indígenas.
O impacto destes empreendimentos sem consulta e aprovação das comunidades, é um dos focos do Relatório “Situação dos povos indígenas dos municípios de Itapiranga e Silves”, produzido pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) da Prelazia de Itacoatiara (link no fim do texto). O objetivo do documento é de atender a um pedido urgente das lideranças indígenas, ouvindo-as sobre a crescente escalada de ameaças, violações de direitos e insegurança que estão sofrendo, decorrente da exploração de petróleo e gás natural pela empresa Eneva S.A., que junto com a ATEM, foram as vencedoras do leilão na região da Bacia do Amazonas.
O documento também reúne informações para compor a Ação Civil Pública que já tramita na 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da Seção Judiciária do Amazonas, movida pelas associações dos povos indígenas. As ameaças e intimidações que o povo Mura vem sofrendo acontecem há muito tempo, mas esse ano, com a Ação sendo acolhida pelo Ministério Público Federal (MPF), elas têm sido ainda mais frequentes.
Um jovem indígena, que por questões de segurança, não será identificado, afirma: “Eu estava caçando quando ouvi o barulho dos carros e fui olhar mais de perto para ver quem era. Foi quando vi dois carros parados a uns 100 metros do ramal, sentido pra quem sai da aldeia, e três homens saindo dos carros engatilhando dois revólveres e uma arma grande, com lupa, que parecia ser uma espingarda. Um deles falou para o outro: o nome do cacique é Jonas. É ele e mais aquela mulher e o marido, da outra comunidade. Vamos acabar com esse problema. Quero ver quem vai ter coragem pra falar alguma coisa”.
“Em agosto desse ano, ao chegar na aldeia Livramento para suas atividades, as lideranças informaram à equipe da CPT que uma caminhonete branca, modelo Amarok, com funcionários da Eneva, havia acabado de sair da localidade e que estavam à procura do cacique Jonas Mura, que inclusive teriam tirado foto da casa do cacique, do barracão da aldeia e de outros lugares”, relataram as lideranças à CPT, dizendo que “não era a primeira vez que pessoas supostamente ligadas à Eneva estariam rondando a aldeia”.
As ameaças fizeram o cacique precisar ficar distante da comunidade e ser incluído no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), construído por secretarias estaduais e federais.
A posição do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), enquanto órgão estadual, é de que não há indígenas na região de afetação do empreendimento de exploração do gás, o que demonstra a omissão do poder público local para com a situação.
O licenciamento não cumpriu as exigências e orientações legais, pois não houve sequer diálogo com os indígenas, quanto mais a Consulta Prévia, Livre e Informada da Convenção Organização Internacional do Trabalho – OIT 169, da qual o Brasil é signatário.
Os relatos da CPT dão conta de que outras cinco lideranças estão ameaçadas de morte. Para Jorge Barros, agente da CPT Prelazia de Itacoatiara, só o fato do Estado não reconhecer os povos indígenas e tradicionais que vivem na região é uma violência grave.
“É uma violação de direito muito grave contra esses povos e também ao meio ambiente. E não ocorre somente da parte da empresa. Está sendo cometida também pelo Estado, que não reconhece os povos originários daquela região, que não consulta e dá licença de maneira toda irregular para a operação e implementação desse projeto, que não fiscaliza. É um projeto que impacta, diretamente, o meio ambiente e também a cultura dos povos e a vida deles”, afirma.
Os indígenas identificados no documento são predominantemente dos povos Mura, Baré, Sateré-Mawé, Munduruku e um grupo de indígenas isolados pertencente os povos Pariquis, e estão espalhados em aldeias e comunidades da região urbana e rural de Silves e Itapiranga. O estudo também mostra que há famílias e comunidades nesses municípios que ainda não foram mapeadas, apenas informações sobre sua existência. As localidades encontram-se no limite geográfico dos municípios de Itacoatiara e Silves.
Os impactos dessa exploração comprometem de forma direta e irreversível o principal Aquífero do Norte do País, Aquífero Alter do Chão, considerado por toda a Academia como de importância mundial, que se estende desde a Amazônia Ocidental.
Outra pessoa indígena da região do Igarapé Açu Grande e Igarapé Açuzinho diz que, em uma região próxima à sua comunidade, as pessoas já estão tendo problemas de pele e diarreias. Emocionado, lamenta:
“Estão acabando com nosso chão, nosso ar, nossa floresta e contaminando nossas águas. Sem peixe, sem caça, sem ar limpo, como podemos viver? Não queremos dinheiro sujo, que vai custar a vida dos nossos parentes”.
Confira aqui na íntegra o relatório elaborado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).
Nos cinco dias de atividades, foram discutidas estratégias de enfrentamento ao trabalho escravo no País e partilha das políticas e ações adotadas no Brasil
Por Fundación Libera
Edição de Heloisa Sousa | CPT Nacional
Momento de debate após exibição do filme "Pureza". Foto: Fundación Libera
Em uma iniciativa para comemorar o Dia Internacional dos Direitos Humanos, a Fundación Libera, em parceria com o Centro de Direitos Humanos da Universidade Diego Portales, promoveu, entre os dias 3 e 7 de dezembro, a semana de enfrentamento ao trabalho escravo no Chile. A jornada iniciou com a realização do "CineForo: Da Escuridão à Pureza - Comemorando os Direitos Humanos" em Santiago. Este evento, que entrelaçou cinema, direitos humanos e reflexão, visou construir pontes sólidas entre a sociedade civil e as instituições para abordar as questões cruciais do trabalho escravo e exploração laboral no país.
Um dos pontos culminantes da semana foi a exibição do filme brasileiro "Pureza", dirigido por Renato Barbieri, que foi seguida por um debate com participação de Xavier Plassat, da Campanha De Olho Aberto para não Virar Escravo, conduzida pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). Impactante também foi a participação de Yesenia Díaz, trabalhadora rural, membra da Survivor Alliance, e de Judith Schönsteiner, acadêmica da Faculdade de Direito da UDP, que compartilharam suas experiências. O evento, moderado por Carolina Rudnick, diretora da Libera, proporcionou uma análise profunda e perspicaz a respeito dos desafios que persistem nos respectivos países.
“Descobri uma expectativa muito grande por parte dos vários interlocutores encontrados, pois o Chile entrou nessa luta apenas há dez anos, depois do Protocolo de Palermo, e ficou naquela visão essencialmente criminal do tráfico, tentando flagrar o rastro do crime organizado internacional sem às vezes perceber a presença do trabalho escravo na esquina ao lado”, conta Xavier Plassat.
Xavier Plassat em encontro com organizações da sociedade civil na Central Única de Trabalhadores do Chile. Foto: Fundación Libera
O encontro não apenas marcou a celebração dos Direitos Humanos, mas também enfatizou a importância de o Estado Chileno buscar melhorias concretas no enfrentamento ao trabalho escravo. As atividades destacaram a necessidade urgente de promover diálogos, conscientização e ação para erradicar as práticas degradantes verificadas principalmente no setor agrícola chileno. Durante os cinco dias de evento, foi possível comunicar sobre o tema para acadêmicos, rádio, sindicalistas, inspeção do trabalho e ativistas.
“A visita de Xavier ocorre em um momento em que o Estado chileno preside a Aliança 8.7, uma aliança global liderada pela OIT para o cumprimento da Meta 8.7 dos ODS sobre a erradicação da escravidão moderna e do trabalho infantil. Além disso, o governo chileno anunciou a introdução de uma lei de devida diligência em direitos humanos, dois compromissos que permitem combater a invisibilidade do fenômeno e sua impunidade se forem traduzidos em ações efetivas e concretas que reúnam todos os atores e, especialmente, as vítimas”, destaca Marcia Guerra, diretora executiva da Fundación Libera.
Além de participar do debate suscitado pelo filme "Pureza”, Xavier também dedicou seu tempo a encontros estratégicos durante a semana com representantes de diversos ministérios e da Inspeção de Trabalho. Ele se reuniu com o embaixador brasileiro no Chile, Paulo Pacheco, além de contribuir em uma reunião com a sociedade civil na sede da CUT e um encontro com acadêmicos locais. As atividades proporcionaram espaço para diálogo e abriram perspectivas de cooperação na busca por soluções eficazes contra o trabalho escravo no Chile.
Xavier Plassat e diretoras da Fundación Libera, Marcia Guerra Capanema e Carolina Rudnick Vizcarra, em encontro com embaixador do Brasil no Chile, Paulo Roberto Soares Pacheco. Foto: Fundación Libera
Para Xavier, lembrar como o Brasil conquistou políticas contra o trabalho escravo por meio de uma mobilização de décadas é importante para avançar. “Como dar um passo avante na política chilena? É preciso conceituar o crime de trabalho escravo ‘em si’, não apenas como finalidade eventual do tráfico, seria um grande passo; empoderar e qualificar a inspeção do trabalho, um outro; e sobretudo aprendermos mutuamente das experiências respectivas, buscando centrar no que é típico da escravidão moderna: a negação da dignidade da pessoas, feita mero insumo produtivo”, explica.
Estratégias de combate ao Trabalho Escravo no Brasil iluminam o caminho do Chile
No Chile, apenas o Tráfico de Pessoas foi tipificado sendo adotada a definição do Protocolo de Palermo para esse crime. Não há no ordenamento normativo chileno uma tipificação autônoma do crime de Trabalho Escravo como podemos encontrar no Art. 149 do Código Penal Brasileiro. Por outro lado, a nova legislação chilena sobre “delitos econômicos” trouxe uma importante inovação ao considerar o tráfico de pessoas com fim de trabalho forçado como uma causa de possível responsabilização penal da pessoa jurídica.
A estrutura da política pública chilena para combater o tráfico de pessoas é liderada pela Mesa Intersectorial sobre Trata de Pessoas (MITP), estabelecida em 2008. Essa comissão, de composição interministerial e intersetorial, coordena ações, planos e programas para prevenir, proteger, perseguir e punir o crime de tráfico de pessoas com fim de trabalho forçado. O cenário atual da política pública chilena evidencia um ethos centrado no combate ao crime organizado, deixando de abordar efetivamente o setor privado da economia (inclusive o setor formal) onde são identificadas mais de 80% das vítimas de trabalho forçado.
Divulgação do material da campanha "De Olho Aberto Para Não Virar Escravo" nas redes sociais da Fundación Libera
Em um cenário sem precedentes na América Latina, a experiência brasileira na prevenção e combate ao trabalho escravo destaca-se como referência para a região. O Brasil criminaliza de maneira autônoma o trabalho escravo, estabelecendo uma abordagem robusta e inovadora na linha da promoção dos direitos humanos, que ultrapassa uma atuação restrita à persecução penal.
O Brasil implementou práticas de vanguarda que se tornaram modelos de eficácia. Foram fundamentais nesse processo instrumentos como a "Lista Suja", a atribuição de ampla competência aos inspetores do trabalho no Grupo de Fiscalização Móvel, e a atuação abrangente do Ministério Público, aliados ao engajamento crucial de sindicatos, da CPT e outras organizações da sociedade civil.
Diante desse panorama, diversos atores do cenário chileno têm avaliado como poderão incorporar elementos dessa abordagem inovadora para fortalecer sua própria resposta ao trabalho escravo.
Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações e imagens da Agência Brasil e Brasil de Fato
Uma placa de identificação recém-instalada na entrada da Terra Indígena Apyterewa, no município de São Félix do Xingu (PA), foi atingida por tiros e arrancada no último dia 04, na mesma ocasião da emboscada que atingiu um servidor público ligado à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), baleado no tornozelo. Ele acompanhava agentes da Polícia Rodoviária Federal numa ação de desintrusão, para retirada de invasores da T.I. Dois veículos da PRF também foram atingidos pelos disparos.
Segundo a força-tarefa, estes atos são uma nítida tentativa de intimidação do processo que está em curso, que tem como propósito garantir o direito do povo Parakanã, ocupantes tradicionais desses territórios. Também foram destruídas 20 pontes na região, e as estradas obstruídas com árvores e pregos.
Dos nove mandatos de prisão determinados, três invasores foram presos preventivamente, envolvidos em crimes como: invasão e exploração econômica da terra indígena, associação criminosa, incitação a crimes inerentes à invasão, desobediência às ordens que determinaram a desintrusão da área, coação no curso do processo, roubo de gado e seu abate ilegal.
Em 31 de outubro, esgotou-se o prazo para a saída voluntária dos invasores, que incluem fazendeiros, madeireiros e garimpeiros ocupando as terras indígenas. Desde o fim deste prazo, pelo menos 14 órgãos estatais, incluindo forças de segurança e agentes ambientais, deram início à retirada de invasores, acirrando os conflitos numa região que já vivencia um contexto de violência há mais de uma década, de acordo com levantamento do Centro de Documentação Dom Tomás Balduino, da Comissão Pastoral da Terra (Cedoc/CPT).
A homologação dos 773 mil hectares da terra como área de preservação indígena ocorreu em 2007, mas em todos os anos seguintes, constam registros de conflitos provocados pelo desmatamento ilegal, criação de gado, grilagem, ameaças de expulsão e impedimentos de acesso por parte de fazendeiros e madeireiros. A TI teve recorde de desmatamento nos últimos quatro anos, perdendo uma área equivalente ao município de Fortaleza (CE).
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Kassio Nunes Marques, chegou a suspender o processo de reintegração a pedido de associações de agricultores. Mas no final de novembro, o também ministro Luís Roberto Barroso garantiu a continuidade da desintrusão. De acordo com o magistrado, a decisão de Nunes Marques não pode incidir sobre os planos de desintrusão já em curso.
A luta da comunidade não é apenas pela permanência em sua terra de origem, mas pela segurança neste período de retirada de invasores, e que seja vencida a omissão e conivência das instâncias governamentais em garantir a convivência tranquila do povo Parakanã com o seu território.
Na atividade, estratégias de fortalecimento da regional foram debatidas para o próximo ano
Por Heloisa Sousa
Com informações da CPT RJ/ES
Nos dias 9 e 10 de dezembro, foi realizado, em Bicanga (ES), o Encontro Regional da CPT Rio de Janeiro/Espírito Santo. Estiveram presentes agentes das equipes da Baixada Fluminense e Campos dos Goytacazes (RJ) e do Espírito Santo. No encontro, puderam avaliar as ações de 2023 e encaminhar articulações para o próximo ano.
“A reunião teve encaminhamentos muito importantes que irão definir a caminhada da regional, que no momento se encontra fragilizada, mas que acredita na luta e no esperançar dos nossos povos, que confiam no trabalho e parceria da CPT. Seguimos nos revigorando, pois Deus tem nos fortalecido muito e boas novas virão”, destaca Elaine Ferreira, coordenadora da CPT regional Rio de Janeiro.
O encontro foi marcado pela partilha dos relatos das equipes em relação aos desafios e conflitos que acometem as comunidades acompanhadas na região. Para 2024, foram traçadas estratégias para aprimorar o registro desses conflitos. Além disso, a comunicação tem sido foco da regional, que pretende formar um grupo de comunicadores, com representantes das três equipes.
“Foram dois dias de trocas de experiências, motivação e preparação para a assembleia eletiva que acontecerá em abril de 2024. Queremos ainda fortalecer nossa comunicação e dar visibilidade ao trabalho realizado pela regional”, conta Samira Santos de Oliveira, da equipe de Espírito Santo.
Desde 2021, o Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração publica anualmente o Mapa dos Conflitos da Mineração no Brasil e o Relatório dos Conflitos da Mineração, para monitorar as violações cometidas anualmente pelo setor da mineração.
O Mapa dos Conflitos da Mineração tem como objetivo denunciar o modelo mineral brasileiro, sobretudo no contexto atual de desregulamentação das políticas ambientais, de proposta de abertura de novas áreas para mineração e de incentivo ao garimpo de forma institucionalizada. O monitoramento permanente também tem o intuito de promover visibilidade às violações de direitos humanos e os crimes ambientais cometidas pelo setor mineral brasileiro, assim como as reações dos grupos sociais atingidos.
O Relatório dos Conflitos da Mineração 2022 apontou conflitos em 792 localidades e 932 ocorrências envolvendo ao menos 688.573 pessoas.
Em comparação com 2021 (acesse aqui o Relatório dos Conflitos da Mineração 2021), em 2022, houve um aumento de 22,9% das localidades envolvidas em conflitos em comparação a 2021 (644 localidades), e 5,6% em comparação com 2020 (750 localidades). O número de ocorrências também aumentou em comparação com 2021, de 840 ocorrências de conflito para 932 ocorrências em 2022.
Desde 2020, o Observatório já identificou 1.723 localidades em conflito, com 39,2% dos casos concentrados em Minas Gerais e 12,1% no Pará. 38,2% dos casos correspondem a conflitos com “mineradora internacional”, seguido de outras “mineradora” (27,4%) e garimpeiro” (20,1%). A extração ilegal, correspondente à soma de “garimpeiro” e “mineradora ilegal”, representa 27,9% das ocorrências em localidades em conflito nos últimos três anos. Enquanto, as categorias sociais de “atingidos” e mais afetados, desde 2020, são “trabalhadores” (11,7%), “indígenas” (10,9%) e “pequenos proprietários rurais” (10,9%).
O Bioma com o maior número de registros foi a Mata Atlântica, com 45,9%, seguido da Amazônia (30,8%), Caatinga (11,8%) e Cerrado (10,0%).
Em 2022, ao menos 155.983 indígenas estavam envolvidos em 141 ocorrências de conflitos, sendo 55,0% delas com garimpeiros. Os quilombolas sofreram em 35 conflitos e 40 ocorrências, englobando ao menos 49.268 pessoas.
Os grupos sociais mais afetados pela mineração foram: “Indígenas” (15,1%), “Trabalhadores” (12,1%); “População urbana” (9,7%) e “Pequenos proprietários rurais” (8,3%).
De 2020 a 2022, houve um crescimento de 29,6% das ocorrências nessa categoria, com destaque para o ano de 2021, quando os indígenas ocuparam a primeira posição, frente aos intensos ataques sofridos, especialmente, pelos indígenas Yanomamis ao longo do ano, conflitos que levaram à morte de ao menos 8 indígenas, entre elas duas crianças, além de conflitos que deram relatos de violência sexual e física.
As ocorrências envolvendo populações tradicionais somam 268, abrangendo ao menos 236.447 pessoas, sendo 155.983 Indígenas e 49.268 Quilombolas.
Ao menos 155.983 indígenas estavam envolvidos em 141 ocorrências de conflitos, sendo 55,0% deles com garimpeiros, 25,7% com “Mineradora Internacional”, com destaque para a Belo Sun Mining Ltda e a Potássio do Brasil.
Os quilombolas sofreram em 35 conflitos e 40 ocorrências, englobando ao menos 49.268 pessoas. As principais empresas envolvidas nos conflitos são Brazil Iron (25,0%), Hydro (15,0%) e Samarco/Vale/BHP (12,5%).
Em 2022 todos os 26 estados, mais o Distrito Federal tiveram ocorrências de conflitos. Os estados que mais concentraram localidades em conflito foram Minas Gerais (37,5%), Pará (12,0%) e Amazonas (7,4%). Novidade, em 2022, foi a presença do estado do Amazonas entre as três primeiras posições, principalmente devido ao aumento de ocorrências envolvendo comunidades indígenas, ribeirinhas e extrativistas, e operações de repressão ao garimpo ilegal por parte do Estado.
Em número de pessoas atingidas por estado, Minas Gerais aparece concentrando 51,8% do número total de pessoas atingidas, seguido do Pará (13,9%) e Alagoas (10,1%).
Dos 853 municípios de Minas Gerais, foram mapeados conflitos em 95 (11,1%), sendo Brumadinho o que mais concentrou conflitos, com 21 situações, totalizando 30 ocorrências, centrados, majoritariamente, na empresa Vale S.A., e no processo de reparação após o rompimento da barragem B1 da empresa em 25 de janeiro de 2019.
O número de manifestações públicas mapeadas em Brumadinho, seja através de protestos ou carta pública, foi de 12 durante o ano de 2022. Esse valor indica que ao menos um protesto por mês ocorreu no município, foram 9 envolvendo a empresa Vale S. A., um caso envolvendo a TÜV Süd (empresa de consultoria alemã, responsável por atestar a estabilidade da Barragem do Córrego do Feijão) e 2 casos relacionados à empresa Vallourec (francesa).
A categoria “violadores – quem causou a ação”, no total das 932 ocorrências de conflito, “Mineradora Internacional” ocupa a primeira posição da categoria, com 38,1%, seguida por “Mineradora” (24,6%) e “Garimpeiro” (22,7%)
Foram mapeadas 124 empresas envolvidas em conflitos em 481 localidades. Entre as empresas, a Vale S.A. é a empresa que mais concentra ocorrências de conflitos (23,9%) (115 ocorrências), assim como em 2021, e acrescentando sua subsidiária Samarco/Vale/BHP (60 ocorrências), a Vale S.A. chega a 36,4% das ocorrências em 2022. Taquaril Mineração S. A. (32 ocorrências), Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) (22 ocorrências) são, na sequência, as empresas que mais produzem danos.
Das mineradoras estrangeiras, as australianas são as primeiras em violações seguidas por canadenses e inglesas. Dentre as maiores violadoras estão a BHP Billiton (australiana dona da Samarco com a Vale), com 72 ocorrências, a inglesa Brazil Iron (17 ocorrências), a sul-africana AngloGold Ashanti (16), a canadense Belo Sun Mining Ltda (14), Bahia Mineração (BAMIN) de Luxemburgo (10), a canadense Equinox Gold (10) e a francesa Vallourec (10).
As extrações ilegais de minérios, em particular os garimpos, provocaram 270 ocorrências em 235 localidades em 22 estados, representando 29,1% das ocorrências de 2022. Os estados que se destacaram foram, Pará (20,2%), Amazonas (19,9%), Minas Gerais (12,9%), Mato Grosso (12,5%) e Roraima (7,4%). Além disso, “Indígenas” foram o primeiro grupo social mais violado por essa atividade, representando 31,9% das ocorrências ligadas a extração ilegal.
Os conflitos envolvendo disputas por “Terra” e “Água” foram os que mais se destacaram, com 590 e 284 ocorrências, respectivamente.
Os grupos mais atingidos pelos conflitos foram os Ribeirinhos com 15.879 pessoas atingidas e Pescadores com 6.498, compondo um grupo que aglutina 52 ocorrências, abrangendo ao menos 22.377 pessoas.
Foram ainda mapeados os “Assentados”, “Camponeses de fundo de pasto”,” Extrativistas”, “Geraizeiros”, “Pecuaristas”, “Pequenos proprietários rurais”, “Posseiros” e “Sem-terra”, somando, em 2022, 146 ocorrências de conflito, incluindo 50.161 pessoas.
A divisão por grupo corresponde a “Pequenos proprietários rurais” (18.705 pessoas), “Sem-terra” (2.787 pessoas), “Posseiros” (3.091 pessoas), “Camponeses de fundo de pasto” (904 pessoas), “Assentados” (40.432 pessoas) e “Extrativistas” (4.241 pessoas).
Os conflitos urbanos, em 2022, ocorreram em 41 municípios e 10 estados. Dos 27 estados com registros, os que mais concentraram localidades em conflito foram Minas Gerais (37,5%), Pará (12,0%) e Amazonas (7,4%). Em número de pessoas atingidas por estado, Minas Gerais aparece concentrando 51,8% do número total de pessoas atingidas, seguido do Pará (13,9%) e Alagoas (10,1%). Enquanto as cidades que mais tiveram violações foram Itabira, com 12,3%, Belo Horizonte, com 11,3%, Maceió e Mário Campos empatados com 8,5% e Congonhas, com 6,6%.
Foram ainda mapeados que a “População urbana”, “Pequenos proprietários urbanos” e “População urbana e rural”, foram identificados em 94 casos, totalizando 106 ocorrências e 11,3% de todos os conflitos registrados.
Ao menos 154.295 pessoas estavam envolvidas em conflitos urbanos com a mineração no país e sofreram violações do setor.
Eles se relacionavam a 31 empresas, sendo as cinco primeiras Vale S.A., concentrando 24,5% das ocorrências de conflitos urbanos, Taquaril Mineração S.A, com 9,4%, seguido da Braskem, com 8,5%, Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) (7,5%) e AngloGold Ashanti (3,8%).
Em Maceió, onde a Braskem foi responsável pelo maior crime socioambiental da mineração em área urbana já visto no mundo e que afetou, ao todo, 55 mil pessoas, as reivindicações por justa indenização de moradores das áreas diretamente atingidas e as manifestações por realocação da população em situação de “ilhamento socioeconômico” permaneceram presentes em 2022.
Dada a limitada projeção nacional que esse conflito recebeu e a necessidade de ampla reflexão crítica sobre o setor mineral brasileiro, cabe destacar que o Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, no âmbito do Observatório dos Conflitos da Mineração no Brasil, lançou o relatório “Colapso mineral em Maceió: o desastre da Braskem e o apagamento das violações” também em 2023.
Das ocorrências em 2022, 221 abrangem esta categoria, tendo sido a categoria com mais ocorrências, sendo 107 conflitos estaduais, 81 federais e 33 municipais. Desses, 37,6% das ocorrências compreendem conflitos com garimpeiros e 26,7% com mineradoras ilegais. Isto é, 64,3% dos casos com o “Estado” como ator em disputa refere-se a ações de repressão à extração ilegal de minério e seus impactos.
Os principais tipos de conflito envolvendo a categoria “Estado” são “Minério”, com 66,5% e “Terra”, com 39,4%. As principais violências são “Extração ilegal”, com 67,4%, “Danos”, com 59,3%, “Não cumprimento de procedimentos legais” (15,8%) e “Omissão” (9,0%).
As ocorrências de violências extremas foram as seguintes: “Morte” (45 ocorrências); “Trabalho escravo” (19 ocorrências); “Assédio” (10 ocorrências); “Ameaça” (7 ocorrências); “Ameaça de morte” (5 ocorrências); “Violência física” (5 ocorrências); e “Trabalho infantil” (2 ocorrências).
Em 2022, foram mapeadas 132 reações diretas às violações, que envolveram manifestações, cartas públicas, bloqueio de via, ocupação, ações judiciais etc. Os estados que reuniram o maior número de conflitos foram Minas Gerais (46,2%), Pará (14,4), Espírito Santo (6,8), Rio de Janeiro (6,8) e Amazonas (5,3).
Belo Horizonte congregou 15 ocorrências relacionadas à reação, seguida por Brumadinho, com 11. Belo Horizonte ocupa a primeira posição pela resistência ao projeto da empresa Taquaril Mineração de realizar extração mineral na Serra do Curral. As reações não envolveram somente moradores da cidade e de movimentos da sociedade civil organizada, mas também de universidades, artistas, intelectuais e até blocos de carnaval.
Já as categorias que mais sofreram com a ação das empresas e dos garimpos, e realizaram ações de reação, foram: “População urbana” (18 ocorrências), “Trabalhadores” (18 ocorrências), “Sociedade civil” (17 ocorrências) e “Indígenas” (16 ocorrências).
O Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração é uma articulação da sociedade civil formada por mais de 100 organizações não governamentais, movimentos sociais, igrejas e pesquisadores, em atividade desde 2013. É uma das principais iniciativas nacionais que se organizam politicamente em defesa dos atingidos pela mineração e seus territórios.
O Mapa dos Conflitos tem o objetivo de visibilizar, sistematizar e monitorar as violações cometidas, sistematicamente, pelo setor mineral brasileiro nos meios urbano e rural. O mapeamento incluiu empresas mineradoras e de transformação mineral (nacionais e internacionais), assim como garimpos.
O Observatório organiza um banco de dados, atualizado anualmente, a partir do levantamento sistemático de dados secundários em fontes como registros de jornais de circulação nacional e regional, portais de notícias, redes sociais, mídia independente e material dos movimentos sociais, somadas às ocorrências tabuladas anualmente pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) para os conflitos da mineração no campo e do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Acesse Observatório dos Conflitos da Mineração no Brasil.
Acesse aqui o Relatório Conflitos da Mineração no Brasil 2022 em português.
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