Legenda: O agricultor Magnandes Costa Cardoso conta que não foi informado sobre a contrapartida da Jari Celulose
Por Carolina Bataier | De Olho nos Ruralistas
Com edição de Carlos Henrique Silva | Comunicação CPT Nacional
Créditos das fotos: Harrison Lopes
Compartilhamos trechos desta reportagem publicada no portal De Olho nos Ruralistas, com autoria da jornalista Carolina Bataier, e apoio da CPT em Santarém (PA) nos diálogos com as lideranças das comunidades. Os projetos do mercado de carbono têm sido uma realidade que cresce na região amazônica, e têm impactado as comunidades.
Quando a proposta de participar de um projeto de créditos de carbono chegou até a comunidade Nova Vida, no município de Almeirim (PA), o agricultor Carlos Jorge Araújo Cruz foi o único a recusar. Ele e os vizinhos foram os primeiros a serem consultados sobre o interesse em fazer parte do Projeto Jari/Pará, uma parceria entre a Jari Celulose e a Biofílica Ambipar Environmental Investments, especializada em iniciativas de preservação ambiental. A primeira alega ser proprietária de 909 mil hectares. A segunda é responsável pela comercialização dos créditos de carbono no Brasil e no exterior.
Legenda: O casal Arlete e Carlos considerou o valor oferecido pouco vantajoso
O Jari/Pará é uma proposta de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal (REDD), conceito adotado pela Convenção de Clima da Organização das Nações Unidas (ONU) e se refere à remuneração de quem mantém suas florestas intactas, poupando-as do desmatamento e evitando a emissão de CO2 na atmosfera.
O projeto abrange 58 comunidades que vivem da agricultura camponesa e da venda de açaí e castanha do Pará. Na Nova Vida, são cerca de 30 famílias. Muitas delas enviaram representante para a reunião com a equipe da Jari, realizada na casa de um dos moradores. “Eles falavam: em quatro anos, vem um dinheiro”, lembra Carlos. Mas o pagamento nunca chegou até os agricultores.
Legenda: Casas foram abandonadas em Monte Dourado
As atividades do Jari/Pará estão suspensas desde 2023 e o projeto é alvo de ações da Procuradoria-Geral do Estado do Pará (PGE-PA) e do Ministério Público do Pará (MPPA), que questionam a autenticidade dos títulos de propriedade de parte das terras da Jari Celulose. O trabalho da PGE resultou na devolução para o Estado da Gleba Arraiolos, de 386 mil hectares, e apontou irregularidades nos documentos apresentados pela empresa para provar a propriedade da terra. A Jari Celulose contestou a decisão, e a disputa entre a empresa e o Estado segue até hoje na Justiça.
Mesmo com as irregularidades, o projeto teve resultados financeiros milionários para as empresas. E como nenhum dos moradores da Nova Vida ficou com cópia dos documentos assinados na primeira – e única – reunião com a empresa, não é possível confirmar o valor prometido ou a data do encontro.
A PGE move uma ação de indenização por danos materiais e morais pelo uso ilegal de terra pública contra a Jari Celulose. Embora vivam no território e tirem dali o seu sustento, as famílias do Braço, Nova Vida e Morada Nova não possuem títulos definitivos das terras. Nem os moradores mais antigos conseguiram o documento de posse da terra.
Na ação de indenização por danos materiais e morais pelo uso ilegal de terra pública movida pela PGE contra a Jari Celulose, o procurador Ibraim Rocha acusa a empresa de praticar grilagem de carbono. “No passado, o grileiro se aproveitava dos títulos registrados nos cartórios, nulos, mas que validavam e davam a aparência de propriedade e com isso podia vender para terceiros”, explica. “Hoje, em vez dos cartórios de imóveis, eles usam as certificadoras internacionais como grandes cartórios”.
Leia a matéria completa neste link.
LULA TEM RAZÃO!
O genocídio palestino e o holocausto euro-judeu são práticas condenáveis!
Nós, movimentos Sociais do Campo, Floresta e Águas, denominados Campo Unitário, viemos a público manifestar nosso apoio ao posicionamento do Presidente Lula acerca do genocídio contra o Povo Palestino na região de Gaza.
O presidente Lula foi na contramão do que defende as potências mundiais ao tratar a ofensiva de Israel contra o Povo Palestino como um genocídio e comparar com o holocausto da Alemanha nazista contra os judeus na Europa. Lula foi corajoso em condenar a prática de extermínio na qual mais de 12 mil crianças já foram cruelmente assassinadas.
O presidente Lula ao afirmar que “O que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu, quando Hitler resolveu matar os judeus”, rompe com o silêncio dos grades meios de comunicação, inclusive de nosso país, frente a tragédia que ocorre em Gaza. Mas também chama para si e seus pares a responsabilidade para impor limites a Israel. Assim, Lula reafirma sua posição como liderança do Sul Global e condena as potências imperialistas pela licença concedida ao Estado de Israel para promover o genocídio na Palestina.
Queremos, aqui, chancelar a declaração do presidente Lula, bem como defender essa posição junto às nossas bases sociais e a toda sociedade brasileira, uma vez que a parcialidade de nossos meios de comunicação não o fazem. Temos que nos indignar frente a qualquer forma de ataque a vida de homens, mulheres e sobretudo a vida de crianças inocentes. Os organismos internacionais que deveriam colocar fim ao genocídio, se mostram incapazes de parar os ataques militares de Netanyahu. A declaração de Lula escancara, portanto, o isolamento internacional de Israel expondo para o mundo suas práticas inconcebíveis.
Por fim, reafirmamos enquanto CAMPO UNITÁRIO nosso compromisso em defesa da PAZ entre os Povos, o direto do Povo Palestino existir e ter seu território reconhecido por todas as nações do mundo. LULA TEM RAZÃO quando diz que: “Ser humanista impõe igualmente o rechaço à resposta desproporcional de Israel, que vitimou quase 30 mil palestinos e palestinas em Gaza”.
Pelo Fim do Genocídio. Cessar Fogo Já!
Campo Unitário,
Brasília, 20 de fevereiro de 2024
Baixe a nota na íntegra e compartilhe!
Município de Ipê (RS) acolheu romeiras e romeiros inspirados pelo cuidado com a Mãe Terra e anúncios de um futuro sustentável, na manhã do dia 13/02
Por Heloisa Sousa | CPT Nacional
Com informações da CPT-RS
Imagens: Heloisa Sousa
Na manhã da terça-feira de Carnaval (13), o município de Ipê, no Rio Grande do Sul, recebeu a 46ª Romaria da Terra de RS. Cerca de 4 mil romeiras e romeiros se encontraram na comunidade Nossa Senhora de Lourdes, ponto de partida da romaria. No momento, os presentes puderam congregar em um café da manhã organizado pelas romeiras do município e marcado por cânticos e pela confecção de uma grande colcha composta por retalhos trazidos das comunidades.
Sob uma chuva fina, que deu trégua ao calor enfrentado no estado nos últimos dias, os fiéis caminharam rumo ao Seminário de Ipê, no centro do município, proclamando palavras de justiça social e proteção da Casa Comum. Levantando bandeiras da agroecologia, reforma agrária, memórias dos mártires, economia solidária, agricultura familiar e paz, os romeiros se inspiraram no lema ‘Escutar a Mãe Terra e com Maria cuidar da Vida’.
Andrei Thomaz, agente da CPT-RS, explicou que a romaria foi pensada com a representação de quatro cenários. Primeiro, centralizando em Nossa Senhora da Palestina e também em Nossa Senhora da Amazônia, com a produção agroecológica. Depois, a economia de Francisco e Clara, apresentando as cooperativas e caminhos de produções organizadas de alimentos e, por fim, a acolhida das mulheres de Ipê aos romeiros.
Considerada a capital nacional da agroecologia, Ipê é cenário de resistência dos produtores familiares que enfrentam a expansão da agricultura focada na exploração dos bens naturais. “Esses agricultores que produzem agroecologicamente se vêem reduzidos ou forçados a abandonar a produção por causa do encurralamento da agricultura mecanizada e da pulverização de agrotóxicos, que é uma das maiores causas de conflito velado no campo no Sul do Brasil”, conta Thomaz.
No trajeto de aproximadamente 2,5 km, os romeiros puderam adquirir sementes crioulas que foram oferecidas por produtores da comunidade Capela, do município de Antônio Prado (RS). Unildo Longhi, um dos produtores, participou da romaria pela primeira vez, apresentando diversas mudas de mata nativa e frutíferas. “Tem sido uma experiência muito legal e importante. Aqui é a capital da agroecologia e se não temos ecologistas e as sementes crioulas, vai acabar tudo porque hoje em dia é tudo transgênico e aí não tem como sobreviver”, explicou.
Chegando ao Salão Paroquial da Comunidade São Luiz da França, em Ipê, local transferido do campo do Seminário por causa da chuva, a Celebração Eucarística foi presidida por Dom Sílvio e concelebrada por Dom Rodolfo Weber, arcebispo de Passo Fundo; Dom Neri José Tondello, bispo de Juína (MT); Dom Jaime Pedro Kohl, bispo de Osório (RS); Dom Carlos Romulo Gonçalves e Silva, bispo de Montenegro (RS); Dom Cleonir Dalbosco, bispo de Bagé (RS), e mais de uma centena de padres.
Na homilia, Dom Silvio trouxe para os romeiros palavras da Exortação Apostólica Laudate Deum do papa Francisco sobre a sensibilidade de Jesus com as criaturas de Deus. “É urgente contemplar o criado para redescobrir o sentido de cada criatura. A ausência de contemplação tem deixado margem para a exploração irresponsável e criminosa da terra”, alertou, chamando para a construção de alternativas sustentáveis e cooperativas como regras de vida.
Cultivo da esperança
Após quase um ano de mutirão para a organização da 46ª Romaria da Terra, Luiz Pasinato, coordenador da CPT-RS, conta que a celebração apresentou uma bela caminhada e, de modo especial, uma bonita homenagem a Dom Orlando. “Tivemos bastante chuva, mas a agricultura estava aguardando esse momento para molhar as plantas. Nós pudemos também prestar uma homenagem a tudo o que Dom Orlando representa para a CPT, para os movimentos e para as pastorais sociais”.
A tarde seguiu com almoço na feira agroecológica proporcionada pela romaria e animação com músicas de resistência interpretadas por artistas populares que estavam presentes na atividade. Ao final, as romeiras e romeiros puderam retornar aos seus lares abastecidos de sua espiritualidade, força para lutar e mudas de Ipê e outras árvores nativas do Sul do país. A carta das romeiras e romeiros para as comunidades também foi lançada, apresentando denúncias e anúncios. Confira aqui.
Para Celica Vebber, agricultora orgânica e membro do coletivo de mulheres de Ipê, a romaria representou o fortalecimento da esperança. “Assim como é importante o feijão, o arroz, também é importante cultivar a esperança de que a gente vai conseguir construir um amanhã melhor pros nossos filhos. A romaria tem esse significado, de fortalecer a esperança e dar uma vibração pra continuar essa luta por um mundo mais saudável e mais justo”, finalizou.
Eterno romeiro Dom Orlando Dotti
Na ocasião, Dom Orlando Octacílio Dotti, bispo emérito de Vacaria e presença marcante nas romarias, foi homenageado por representantes de diversos movimentos sociais e organizações. Dom Orlando, que foi presidente da CPT de 1993 a 1997, possui uma caminhada de importantes ensinamentos sobre o Ensino Social da Igreja, numa perspectiva missionária e transformadora, pela ação social de movimentos organizados.
“Para olhar um pouco mais profundamente aquilo que eu gostaria de dizer, eu fui ver lá na grande Romaria onde nós fomos pegos por uma chuva muito grande, a de 70 mil pessoas [8ª Romaria da Terra, realizada em 1985], para Dom Orlando poder fazer de fato a conversa ou a reflexão da celebração. No dia anterior ele se mexeu, foi ver um Acampamento Sem Terra de 91 famílias, para a partir dali poder falar. Não é de qualquer jeito, mas é na vida, na caminhada, no dia a dia. Por isso, se nós temos hoje alguém que está ali merecendo esta homenagem, Dom Orlando faz com muita justiça”, recordou, falando em nome da CPT, o padre Leonardo Luchs.
Também fizeram falas o Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), a Pastoral da Juventude, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Agricultura Ecológica e Guardiões das Sementes Crioulas, a Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do RS (Fetraf-RS), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB/RS), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi- Sul) e padre Cláudio Prescendo, pela Diocese de Vacaria.
Dom Orlando recebeu ainda das mãos de Dom Silvio e frei Nedio Pertilea o pré-lançamento da publicação impressa que está sendo elaborada sobre sua história de vida. “Dom Orlando Dotti tem um longo legado que é difícil resumir e nós queremos passar para a publicação esses dois volumes. É um legado extenso, abrangente e intenso. Esses dois volumes que nós organizamos, se comparam a uma janela de dois batentes: um é emoldurado pela vida, pela administração, pela gestão, pelas atividades, pelas situações e problemas resolvidos, e o segundo batente é constituído pelos discursos, pelas falas, ou seja, pela palavra”, declarou frei Nedio.
Momentos de celebração com músicas de resistência.
Com suas origens no campo, Dom Orlando aprendeu o valor da terra e do fruto desse trabalho desde cedo. “Eu posso dizer que fui, de certa maneira, arrastado pelos movimentos. Uma verdade que se disse aqui e que é muito forte na minha mente é: nós quisemos sempre que os movimentos sociais tivessem a sua autonomia, que não fossem arrastados pelo nariz, pelo bispo ou por quem quer que seja, mas que criassem a sua metodologia, os seus objetivos e, acima de tudo, lutassem por eles. Nós víamos nos movimentos, e também nas pastorais sociais, um caminho para a renovação da sociedade. A sociedade não se reforma por aquilo que vem de cima, mas por aquilo que vem da base”, declarou.
Ele destacou ainda os nomes de Maria José Guazzelli, fundadora dos movimentos agroecológicos em Ipê, e padre João Bosco Schio, que incentivou o associativismo e o cooperativismo no município de Antônio Prado, lutando pela transformação da região. “Nós, hoje, estamos colhendo os frutos daqueles que foram pioneiros dentro desse trabalho no qual nós também nos engajamos. Eu quero, nessa hora, prestar homenagem a essas pessoas citadas e a todos aqueles que acreditam no valor da terra e lutam por esse valor”, completou.
Estudos não consideram a presença de povos indígenas na região de exploração e MPF contesta
Por Mariana Castro | Brasil de Fato
Sob intimidações e ameaças, povos indígenas reivindicam a própria existência - Lucas Landau /350.org
Em maio de 2023 a empresa Eneva S.A., considerada a maior operadora privada de gás natural do país, retomou a garantia de licenciamento para as atividades de exploração de gás natural e petróleo no Campo de Azulão, localizado no município de Silves, no estado do Amazonas, liberadas com base em um Estudo de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) feito em 2013.
Naquele período, o licenciamento havia sido suspenso pela 7ª Vara da Justiça Federal em Manaus (AM), com base na argumentação de que caberia ao Ibama o licenciamento, e não ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), além da ausência de estudos de componente indígena.
Com dez anos de diferença entre o estudo e as operações, os planos da empresa e a realidade socioambiental foram alterados, mas um novo EIA-RIMA não foi apresentado, além de conter graves erros como, por exemplo, não considerar a presença de povos indígenas na região, conforme aponta o coletivo Resistência Amazônica, do qual a Comissão Pastoral da Terra (CPT) faz parte.
No início do mês de fevereiro deste ano, o Ministério Público Federal (MPF) ingressou com petição na Justiça Federal solicitando, com urgência, a suspensão imediata de todos os processos de licenciamento ambiental perante o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) que envolvam a empresa Eneva S.A. e suas subsidiárias.
Ameaças aos povos indígenas da região
Relatório publicado em agosto de 2023 pela CPT Prelazia de Itacoatiara identifica 7 aldeias em Silves, compreendendo as etnias Mura, Munduruku e Gavião. Em Itapiranga, a 50 quilômetros de distância, a Comissão aponta que pode haver indígenas isolados pertencentes ao povo Pariqui.
As atividades de exploração tiveram início sem consulta prévia (contrariando a Convenção 169 da OIT), e os povos indígenas denunciam impactos nos seus territórios e seus modos de vida. Desde então são alvos de ameaças, violações de direitos e insegurança, como é o caso do cacique Jonas Mura, da Terra Indígena Gavião Real, que junto à Associação de Silves Pela Preservação Ambiental (ASPAC) apresentou denúncia ao Ministério Público Federal (MPF).
Segundo o cacique Jonas Mura, cinco perfurações já foram feitas próximo às casas de indígenas / Arquivo/Jonas Mura
“O impacto ambiental que ela [Eneva] vem criando é grande, vem prejudicando na nossa caça, na nossa pesca, barulho de caminhões passando de um lado para outro da nossa reserva. E ela diz que já teve audiência pública com a gente, mas nós nunca fomos consultados por ela, nem por órgão nenhum que deu licenciamento para que essa empresa pudesse operar aqui. Inclusive, tem cinco perfurações próximo da nossa aldeia, feitas sem nossa autorização, sem nossa consulta”, denuncia Mura.
Mura explica ainda que na região os indígenas sobrevivem da caça e pesca, ameaçadas desde o início da exploração. Ele também aponta que contam com um polo de atendimento pela Secretaria de Saúde Indígena (SESAI), vinculada ao Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Manaus.
“Nós sobrevivemos da caça e da pesca, nós temos produção e coletamos da floresta, breu, copaíba, cumaru, castanha, andiroba, mas onde essa empresa passou para fazer esses buracos, nós não podemos mais passar lá, porque eles derrubaram tudo, devastaram tudo. E olha, se não existisse indígena aqui o governo nunca ia enviar investimento para cá, mas temos um polo base com médico, enfermeiro, dentista, tudo enviado pelo governo federal”.
A situação chega ao ponto de que, para comprovarem suas próprias existências e reivindicarem serem ouvidos, os indígenas recorrem ainda a dados públicos, a exemplo do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“A maior prova de que existe indígena aqui é o próprio IBGE, o último Censo apontou a presença de 1.066 indígenas somente no município de Silves e a gente precisa ser ouvido por essa empresa, por esses órgãos que estão licenciando a exploração aqui porque nós existimos e eles estão passando por cima da gente, não estão respeitando os nossos direitos”.
Novo pedido de suspensão de licenciamento está em fase de análise, sob liminar da Justiça Federal / Reprodução
Nova recomendação de suspensão do licenciamento
Com base nesse conflito, o Ministério Público Federal (MPF) ingressou com petição na Justiça Federal solicitando, com urgência, a suspensão imediata de todos os processos de licenciamento ambiental perante o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) que envolvam a empresa Eneva S.A.
No dia 9 de fevereiro, o juiz da 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da Seção Judiciária do Amazonas (SJAM), Rodrigo Melo, indeferiu liminarmente o pedido de suspensão emergencial e concedeu prazo de 15 dias para as partes se manifestarem no processo, especialmente quanto à inserção de novas informações agregadas, a exemplo de indícios da possível existência de indígenas isolados na área do empreendimento, conforme aponta relatório da CPT.
A CPT Prelazia de Itacoatiara segue acompanhando o caso e reivindica que seja feito um estudo atualizado, que aponte a real dimensão dos impactos na região, além da garantia de consulta livre, informada e prévia aos povos indígenas, conforme explica Jorge Barros.
“Não há estudos suficientes que esse projeto possa avançar nessa região sem causar morte e destruição, e estou falando dos impactos que vão além do estado do Amazonas, inclusive. Esperamos que a justiça federal possa acatar essa recomendação do MPF e que o Estado brasileiro cumpra seu papel, que é garantir a defesa e proteção da vida humana e da preservação da nossa casa comum”.
Barros declara ainda preocupação em relação à vida dos indígenas que seguem sob ameaças.
“Eles são ameaçados por resistirem a esses projetos e o Estado precisa garantir políticas públicas que garantam a eles proteção e segurança alimentar, e somente após os devidos estudos técnicos de que não haveria prejuízos é que [as atividades da empresa] poderiam avançar”.
Empresa
Em nota enviada à nossa reportagem, a empresa Eneva S.A. informa que “as licenças ambientais no complexo de Azulão, no Amazonas, seguem vigentes, conforme decisão das instituições responsáveis”.
Aponta ainda que “não foram identificadas comunidades tradicionais indígenas e/ou quilombolas na área do Campo de Azulão, conforme as bases oficiais da FUNAI e INCRA, que regulamentam a definição no Brasil. Dessa forma, não há o que se falar de ausência de estudos indígenas ou quilombolas, pois não há previsão legal para tal”.
E “reitera que os procedimentos de licenciamento seguiram todas as etapas necessárias, incluindo a realização de audiências públicas e a expedição de licenças de instalação e operação conforme as exigências legais. Atualmente, o gás produzido na unidade de Silves abastece uma geradora de energia elétrica que substitui geração a óleo combustível e óleo diesel que atende mais de 50% de toda a energia consumida no estado de Roraima”.
Edição: Raquel Setz
Por Larissa Rodrigues Alves de Castro e Josep Iborra Plans (CPT Regional Rondônia)
Imagens: comunidade local
No dia 08 de fevereiro de 2024, um grupo de 80 famílias de pequenos agricultores foram surpreendidas em Porto Velho (RO) com viaturas da Polícia Militar e Polícia Ambiental de Rondônia, que foram até o Acampamento Terra Santa, localizada no Lote B40 do Seringal do Belmont em Porto Velho. Segundo as famílias, muitos policiais estavam encapuzados e ameaçaram de voltar com violência pela noite, se não saírem da área até as 18 horas. Um trator que estava reavivando as estradas existentes foi apreendido.
Famílias da ocupação Terra Santa são ameaçadas a luz do dia!
Segundo relatado para agentes da Comissão Pastoral da Terra, a violenta operação policial na ocupação Terra Santa, aconteceu depois das 14 horas, quando chegaram duas viaturas da PM Ambiental, e outras duas viaturas pretas da COE. Outras duas viaturas brancas descaracterizadas da PM Militar foram vistas nas proximidades. Sem presença de oficial de justiça, nem ordem judicial, os policiais estavam muitos deles encapuzados, sem identificação, negando-se a se identificar.
Segundo eles, agindo com ameaças e truculência, sem autorização dos moradores adentraram em todas as casas, revirando e jogando no chão todos os pertences e objetos no chão, que também foram pisados. Uma senhora teve sua bolsa com todos os seus pertences recolhida pelos policiais, que depois foi encontrada abandonada pelo caminho.
Durante a operação teriam sido recolhidas ferramentas de trabalho, como foices e facões, e uma espingarda de pressão. Ainda relataram que os policiais tomaram e apagaram os registros dos celulares, impedindo de gravar. Mesmo assim, algumas fotografias conseguiram registrar a operação.
Os moradores relataram também que durante a operação policial, uma equipe da Funasa chegou no local e uma assistente social da saúde foi impedida de entrar e dar assistência com remédios para crianças, sendo também impedidos de entregar mosquiteiros para as famílias,, alegando que até às 18 horas tinham que abandonar o local.
Também segundo os relatos, apenas com a chegada de um advogado dos acampados, os agentes desistiram de queimar um trator. Um galão de gasolina teria sido abandonado no local, sendo depois atribuído as famílias. O trator estava reavivando as estradas já existentes no local, que inclusive tem postes de energia. Este trabalho já tinha sido protocolado em ofício junto a Secretaria Municipal de Agricultura de Porto Velho (SEMAGRI). Assim mesmo, o trator foi levado pelos policiais.
Em resumo, as famílias narram ter vivido uma operação militar aterrorizante, colocando em risco a integridade das famílias, ameaçavam atirar, até quando tentaram se aproximar com presença de uma advogado. Duranta a mesma foram ameaçados de serem atacados com violência pela noite se não se retirarem antes das 18 horas. Ainda, diversas mães teriam sido ameaçadas de terem as crianças recolhidas pelo Conselho Tutelar.
Uma denúncia foi encaminhada ao Ministério Público no mesmo dia, para que as denúncias sejam apuradas e fossem adotadas medidas protetivas em relação às famílias.
Há também informações de que no dia 09 de fevereiro, às 09 horas, às famílias avistaram um drone sobrevoando a área e a presença de mais outras seis viaturas de policiais percorrendo o entorno da área onde moram as famílias. Uma missão de Direitos Humanos visitou a área na tarde do dia 10 de fevereiro recolhendo informações.
O Seringal Belmont
O Lote B40 do Seringal do Belmont é uma área de terra pública da União que forma parte da Gleba Belmont, localizada atrás do Parque Natural de Porto Velho, a poucos quilômetros do núcleo urbano. O mesmo forma parte da área das Famílias de Posseiros do Seringal Belmont, que conseguiram cancelar pelo INCRA um georeferenciamento irregular da área, inclusive com duas sentenças favoráveis ao retorno às suas antigas posses, das quais tinham sido despejadas em 2020, em plena pandemia. Uma ação discriminatória do INCRA está em processo na Justiça Federal há anos. Atualmente uma decisão monocrática impedindo os antigos posseiros de retornar, deve ser revisada pelo plenário do Tribunal de Justiça de Rondônia.
Basta de violência no campo!
Casos de abusos de autoridade de agentes públicos em conflitos no campo têm sido comuns e recorrentes. Atualmente, há uma intensificação no Brasil de ações organizadas de milícias rurais contra a população do campo e das florestas, como os grupos intitulados “Invasão Zero”, responsável pelo ataque ocorrido contra o povo indígena Pataxó hã-hã-hã, no sul da Bahia. Também em Rondônia grupos similares tem agido impunemente e em conjunto com forças policiais. O nível de insegurança só aumenta para quem reivindica o direito à reforma agrária e denuncia a grilagem e concentração fundiária, também no estado de Rondônia.
Campanha Contra a Violência no Campo
Por este motivo, a nível nacional foi lançada, ainda em 2023, a Campanha Contra a Violência no Campo, organizada por entidades da sociedade civil, movimentos populares e pastorais sociais, desde 2022, e tem o apoio de mais de 60 organizações sociais parceiras.
A campanha lançou um novo cartaz em janeiro, com os rostos de Fernando dos Santos, Edvaldo Pereira e Mãe Bernadete Pacífico, algumas das lideranças do campo assassinadas em 2021, 2022 e 2023, potencializando a denúncia e enfrentamento a violência aos povos do campo, das águas e das florestas, dialogando e sensibilizando a sociedade, opinião pública e internacional aos casos de violência e impunidade, como os acima relatados.
Por CPT João Pessoa
Fotos: Ruggeron Reis | Justiça Global
O Estado brasileiro negou responsabilidade no desaparecimento forçado do trabalhador rural Almir Muniz, durante julgamento na Corte Interamericana de Direitos Humanos, nesta sexta-feira (9), em San José, na Costa Rica.
Apesar de, em suas alegações finais, pedir desculpas aos familiares da vítima e reconhecer em parte violações de direitos relacionados ao caso, o Estado afirmou, de forma controversa, não reconhecer o desaparecimento forçado porque não houve investigação à época do crime, em 2002, no município de Itabaiana (PB).
"O que é lamentável e triste nessa questão é que o Estado reconhece que não investigou, mas ele diz que não pode reconhecer o caso do desaparecimento forçado porque não teve uma investigação que cabia a ele mesmo fazer", destaca Noaldo Meireles, assessor jurídico da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de João Pessoa.
Meireles ainda acrescenta que "há um princípio legal que estabelece que uma pessoa não pode se beneficiar de sua própria má conduta ou alegar seus próprios atos ilícitos como defesa em um processo judicial."
Almir Muniz desapareceu em 29 de junho de 2002, após trafegar com seu trator em uma estrada que levava à Fazenda Tanques, no município de Itabaiana (PB). Ele era uma liderança na luta pela terra e fazia parte de um grupo de famílias que reivindicava a criação de um assentamento na região.
Arquivado em 2009, o caso sequer foi levado a julgamento e o corpo do trabalhador nunca foi encontrado. O trator utilizado por Almir foi encontrado quase uma semana depois, no estado de Pernambuco, em meio a um canavial e coberto de lama, dando claros indícios de tentativa de ocultação de provas.
Antes do desaparecimento forçado da liderança, foram denunciadas por diversas vezes as violências sofridas pelas famílias das comunidades e as ameaças ao próprio Almir. Segundo relatos, havia agressões físicas e psicológicas por parte dos capangas da fazenda, que eram comandados pelo policial civil, Sérgio de Souza Azevedo.
O caso de Almir Muniz chegou à Corte de mobilização da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Justiça Global e Dignitatis. As peticionárias defendem que o Brasil tome medidas efetivas no combate à violência no campo em todo o território nacional e repare de forma material e imaterial as famílias das vítimas.
A sentença da Corte não tem uma data específica para ser anunciada, mas a expectativa é de que seja proferida em meados do início de 2025.
Caso Manoel Luiz
Na última quinta-feira (8), o Estado brasileiro admitiu que violou direitos e garantias na condução do processo penal relativo ao homicídio do trabalhador rural Manoel Luiz da Silva, durante julgamento também realizado na Corte Interamericana de Direitos Humanos, em San José, na Costa Rica.
Durante as alegações finais, representado pela Advocacia Geral da União (AGU), o Estado brasileiro pediu desculpas aos familiares da vítima. "O Estado brasileiro reconheceu a violação às garantias judiciais e à proteção judicial da vítima e seus familiares, visto que, embora o caso tenha ocorrido em 1997, o julgamento final dos dois acusados pelo assassinato somente se deu em novembro de 2013, tempo incompatível com uma duração razoável do processo", afirmou.
O depoimento de Manoel Adelino, filho de Manoel Luiz, expôs o sofrimento vivido pela família desde a data do crime, ocorrido em 19 de maio de 1997, no município de São Miguel de Taipu (PB).
"Esse gesto de reconhecimento da responsabilidade e pedido de desculpas é importante para o mundo inteiro saber o quão o Estado brasileiro foi negligente desde a investigação até a tramitação judicial do caso de Manoel Luiz. Foram 16 anos de sofrimento para a família, que sequer teve um desfecho no qual o mandante e o executor do assassinato fossem devidamente identificados e punidos", pondera Tânia Maria de Souza, coordenadora da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de João Pessoa, na Paraíba.
"Agora, vamos aguardar a decisão da Corte, mas desde já esperamos que o Estado brasileiro tome providências no combate à violência no campo e implemente melhorias em toda a política de Reforma Agrária no país", afirma Tânia.
Em nota, a Justiça Global, a Comissão Pastoral da Terra Nordeste 2 e a Dignitatis, representantes das vítimas no caso, lamentam que a formalização do reconhecimento da responsabilidade do Estado brasileiro "tenha ocorrido apenas diante de uma Corte Internacional, e que não tenha sido acompanhada de uma delimitação precisa sobre os efeitos e limites do reconhecimento".
O texto ainda acrescenta que "as organizações questionam a decisão do Estado brasileiro de reconhecer as violações apenas na audiência na Corte Interamericana, quando poderia tê-lo feito antes, impedindo que se abrisse um espaço de diálogo real com as vítimas e suas representantes quanto aos limites desse reconhecimento, bem como sobre as medidas de não repetição". Leia a nota, na íntegra.
Página 44 de 188