Carta Compromisso dos/as participantes do Seminário Laudato SÍ e Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam) realizado em Zé Doca, no Maranhão. Dioceses: Zé Doca, Coroatá, Pinheiros, Caxias do Maranhão, Brejo, Bacabal, Viana e arquidiocese de São Luís.
(Fonte: Diocese de Zé Doca)
Nós, representantes de diversos povos e comunidades, movimentos, dioceses e igreja presbiteriana, nos reunimos entre os dias 17 a 19 de fevereiro de 2017 na cidade de Zé Doca (MA), em seminário promovido pela Comissão Episcopal para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), e organizado pelo Regional Nordeste 5 CNBB no intuito de fortalecer essa Rede em defesa da vida dos povos da terra, da Casa Comum, o Planeta Terra e o nosso bioma amazônico.
Ouvimos relatos de violências sofridas, resistências e insurgências organizadas pelos povos tradicionais: a cobrança dos povos Gamela e Guajajara, secularmente expulsos de seus territórios; pescadores e ribeirinhos violentados pela implantação de parques eólicos; quilombolas e quebradeiras de coco despojados de seus lugares de vida, trabalho e produção; mulheres afetadas por tráfico humano e outras formas de violência; comunidades destruídas por projetos de mineração; jovens sem estudo e sem trabalho, sofrendo mortes prematuras tendo suas perspectivas de futuro prejudicados.
Nos debates, concluímos que o atual modelo de desenvolvimento implantado em nosso Estado, em nada beneficia a grande maioria da população. Tendo índices crescentes de seu Produto Interno Bruto (PIB), este “progresso” não resultou em melhorias de condições de vida para o povo. Continuamos vivendo num sistema colonial, onde as decisões sobre o nosso futuro são tomadas por empresas invasoras dos nossos territórios e com formas de exploração das riquezas naturais, que comprometem em pouco tempo a Amazônia Legal, sobretudo, atingido pelo Projeto MATOPIBA, programa federal que abrange os Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, ameaça destruir 73 milhões de hectares do bioma Cerrado. Vivemos num renovado sistema de escravidão por dívidas, em que o povo paga uma dívida pública que ele não contraiu.
Promovido pelo capitalismo, somos enganados e levados a um consumo de supérfluos e descartáveis, alienando-nos da nossa cultura do alimento saudável, da vida simples e das relações de solidariedade. Nos é imposto um modo de viver que não é nosso. Não queremos para a Amazônia um modelo de desenvolvimento que, em nome do progresso, mata e diminui a vida.
LEIA TAMBÉM: Equador: índios Shuar são expulsos para dar lugar a mina chinesa
Carta Compromisso: II Encontro da Igreja Católica na Amazônia Legal
Presidente do Cimi denuncia violações contra povos indígenas ao Papa Francisco
Fomos fortalecidos pelas palavras de ânimo, de incentivo à resistência e à ação do Papa Francisco na sua Carta Encíclica Laudato Sí. O Papa se dirige explicitamente para a nossa região Pan-Amazônica, quando nos alerta que ainda é tempo de reagir contra a espoliação danosa do nosso bioma. “Com efeito, há ‘propostas de internacionalização da Amazônia que só servem aos interesses econômicos das corporações internacionais’. É louvável a tarefa de organismos internacionais e organizações da sociedade civil que sensibilizam as populações e colaboram de forma crítica, inclusive utilizando legítimos mecanismos de pressão, para que cada governo cumpra o dever próprio e não delegável de preservar o meio ambiente e os recursos naturais de seu país, sem se vender a espúrios interesses locais ou internacionais” (LS 38).
Os governos não estão preocupados com os destinos dos povos que tradicionalmente habitam as terras maranhenses. Servir aos interesses exclusivos das empresas que vêm de fora, até de outros países, sem escutar e levar em consideração as justas reivindicações dos povos locais, parece estar na base da sua política desenvolvimentista e entreguista.
Diante dessa realidade, cobramos:
>> Que sejam ouvidos os clamores dos povos que há séculos cultivam as terras, respeitando a biodiversidade e que mostram por suas práticas que há alternativas ao desenvolvimento sustentável;
>> Que sejam discutidos projetos de desenvolvimento com as populações afetadas, mostrando todas as informações e os relatórios de impactos socioambientais, mantidos frequentemente em segredo, apesar da Lei de acesso à Informação;
>> Que o governo escute o povo mais do que discursem sobre seus planos e projetos.
Nos propomos:
>> Fortalecer a Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), criando um comitê regional com representação das dioceses e articulação das pastorais sociais, com apoio do secretariado regional da CNBB Nordeste 5 (NE5);
>> Reconhecer e fortalecer as lutas locais nos territórios dos diferentes povos: indígenas, quilombolas, sertanejos, pescadores artesanais, geraizeiros, quebradeiras de coco, entre outros;
>> Participar das manifestações sociais em defesa dos direitos dos trabalhadores e povos;
>> Dar atenção especial às lutas e iniciativas de mulheres como suas manifestações, como por exemplo, no Dia Internacional da Mulher;
>> Apoiar as juventudes nas suas lutas e reivindicações por direitos e futuro digno e a Pastoral da Juventude na luta contra a reforma do Ensino Médio, a realização da Romaria Regional da Juventude que traz o tema “Juventude e Ecologia” e o repúdio ao Projeto MATOPIBA.
Zé Doca, 19 de fevereiro de 2017.
O VIII Fórum Social Pan Amazônico (FSPA) será realizado na cidade de Tarapoto, em plena Amazônia Peruana, entre os dias 28 de abril e 1º de maio. “Territorialidade e Povos Amazônicos – Andinos; Cuidado dos bens da natureza e propostas alternativas e processos de resistência ao modelo de desenvolvimento capitalista” é o tema desta edição do evento.
"CPT: Missão, Metodologia, e Espiritualidade” é o tema do encontro de formação que acontece nos dias 18 e 19 de fevereiro no Auditório do Pontifício Instituto das Missões Estrangeiras (PIME), em Macapá, capital do Amapá.
(Por Assessoria de Comunicação da CPT)
Promovida pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) Regional Amapá e Articulação das CPT’s da Amazônia, a atividade reunirá, ao longo desses dois dias, agentes pastorais, colaboradores, trabalhadores e trabalhadoras rurais do Amapá e também da região de Santarém, no Pará.
Ruben Siqueira, membro da coordenação executiva nacional da CPT, será responsável por assessorar esse momento de estudo.
LEIA TAMBÉM: Questão fundiária e agrícola no Brasil é tema de assessoria em curso para Cristãos Leigos e Leigas
CPT realiza primeiro módulo da Escola Camponesa em Tabuleiro do Norte – CE
Escola Nacional Florestan Fernandes completa 12 anos
A Articulação juntamente com os Regionais da CPT na Amazônia têm realizado encontros estaduais de formação. O evento em Macapá será o primeiro deste ano de 2017.
Na foto, os/as participantes da segunda etapa do Curso de Formação sobre Direito à Posse, que ocorreu no Acre no ano passado.
Dos 7.989 km² devastados no ano passado, 4.474 km² ocorreram em áreas de Cadastro Ambiental Rural.
(Fonte: Brasil de Fato | Imagem: Agência Brasil)
Mais da metade da área desmatada na Amazônia brasileira ocorreu em propriedades registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR). O mecanismo, criado pela reforma do Código Florestal em 2012, visava justamente para combater a devastação na região.
Dos 7.989 km² devastados no ano passado, 4.474 km² ocorreram em áreas de CAR. O número equivale a 56% do total.
O levantamento foi realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). A ONG analisou dados do CAR com base em informações do Projeto de Monitoramento do Desmatamento da Amazônia (Prodes), iniciativa vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. As informações foram divulgadas pela Folha de São Paulo.
Os estados campeões em desmatamento em áreas registradas no CAR são Pará (68%) e Mato Grosso (66%). Rondônia (48%), Amazonas (43%), Roraima (40%) e Acre (34%) aparecem a seguir na lista.
Críticas
O CAR foi criado a partir da reforma do Código Florestal, ocorrida em 2012, sendo uma plataforma digital no qual os donos de terras registram a composição de suas propriedades detalhando as áreas destinadas à preservação e as utilizadas em atividades econômicas. O instrumento, combinado à análise de imagens de satélite, deveria servir ao governo como forma de combate ao desmatamento ilegal.
“O governo poderia estar agindo com base nesse tipo de informação”, criticou Paulo Barreto, da Imazon, à Folha. Para Andrea Azevedo, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), a maior parte do desmatamento realizado em áreas de CAR é ilegal: “A quantidade de desmatamento legal agregado é mínimo. É coisa de 2% a 3% ao ano”.
Segundo Azevedo, o desmatamento ocorre por conta da impunidade. “De fato, há uma sensação de falta de punição. O CAR entrou em cena e não é usado ainda para o controle do desmatamento”, afirmou.
Em resposta à reportagem da Folha, Thelma Krug, diretora do departamento de políticas para o combate ao desmatamento do Ministério do Meio Ambiente, apontou que a devastação nas áreas registradas no CAR já havia sido identificada, e que a questão é de “altíssima prioridade dentro do governo”.
A cidade de Belém (PA) recebeu, nos dias 14 a 16 de novembro, o II Encontro da Igreja Católica na Amazônia Legal. A iniciativa teve como proposta discutir a realidade política, social, econômica, cultural e religiosa da região, além de fazer uma análise geral de como está sendo desenvolvido o trabalho missionário, atualmente, no local. Participaram do encontro bispos, padres, leigos e assessores.
(Por Darlene Braga, Articulação das CPT’s da Amazônia, com informações da CNBB)
No encontro, a análise de conjuntura contou com a presença de Felício Pontes, procurador da República, que fez uma análise social e política. Destacou o choque entre dois modelos antagônicos de desenvolvimento – o modelo socioambiental e o modelo predatório. Como características principais do modelo predatório, destaca a exploração da madeira, o incentivo à pecuária, à mineração e à prática da monocultura. Direcionado a empresários, visando a concentração de renda, gerando a grilagem de terras e que se opõe ao modelo socioambiental, cuja atividade principal é o agro-extrativismo, direcionado aos povos da floresta, visando a redistribuição de renda, onde predomina a forma coletiva de titularização da terra. Concluindo, chamou a atenção para a necessidade de reconstrução e fortalecimento dos movimentos sociais e de formação e apoio a novas lideranças sociais.
Também participaram do encontro o presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e bispo de Balsas (MA), dom Enemésio Lazzaris, e Darlene Braga, da Articulação das CPT’s da Amazônia. Na oportunidade, a representante da Articulação destacou a preocupação da CPT com o aumento da violência no campo. Apresentou dados e refletiu a respeito da violência contra os que lutam pela terra e pela água. Foram apresentados dados referentes a assassinados, ameaças de morte, trabalho escravo, destruição de casas, e prisões. Números que foram ilustrados com fotografias de reintegrações de posses, casas queimadas, de mortes – estado por estado na Amazônia legal. Darlene também mostrou o comparativo dos dados de janeiro a setembro de 2016 com o mesmo período de 2015.
Na Amazônia Legal os números de assassinatos já são 38. Destaca-se ainda as 46 tentativas de assassinatos, 103 ameaças de mortes e 87 prisões. Todos estes números são maiores que em 2015, no mesmo período. O número de famílias expulsas com ações de pistolagem aumentou em 110%, passando de 438 em 2015 para 920 em 2016. As vítimas detidas, criminalizadas em geral nas ações de despejo, são levadas para delegacia e enquadradas em formação de quadrilha e esbulho possessório, ou outras formas de violência.
A integrante da CPT ressaltou ainda que a não concretização da reforma agrária aliada com a impunidade são fatores determinantes para a continuação da violência no campo na Amazônia e no Brasil.
Francisco Loebens, representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), apresentou dados atuais sobre a questão indígena, destacando os desafios relativos ao desmatamento, à mineração nas Terras Indígenas, ao impacto dos grandes projetos, especialmente sobre os povos isolados. Chamou a atenção sobre o risco para os povos indígenas que representa o Projeto de Lei que regulamenta a mineração em suas terras, já aprovado pelo Senado Federal. Ressaltou ainda as importantes conquistas na demarcação das Terras Indígenas. Todavia ainda falta muito a demarcar.
Loebens apresentou dados sobre a violência contra os povos indígenas, relativos à mortalidade infantil e ao suicídio – crescente em diversos povos indígenas. Fez considerações a respeito das ameaças que a PEC 215 representa para os direitos constitucionais dos indígenas.
Na ocasião, os/as participantes divulgaram uma Carta Compromisso com o objetivo de encorajar e dar ânimo aos representantes das dioceses e prelazias daquela região. No texto, eles afirmam que refletiram sobre a realidade social e eclesial atual, e que diante dessa perspectiva constataram que o processo de mudança deve ser constante.
“É possível, urgente e vital participarmos ativa e responsavelmente da nova época que está surgindo para o planeta terra, para a humanidade inteira e também para a Amazônia. Somos semeadores de fé, esperança e amor. O semeador nunca desiste de semear, mesmo quando não sabe se verá os frutos maduros das sementes do bem e da Justiça plantadas no chão e regadas com lágrimas, fadigas, corajosa perseverança e paciência evangélica”, diz um trecho da carta.
Na Carta, os participantes manifestam ainda total apoio aos povos indígenas e aos que vivem dos frutos do campo, da floresta e dos rios. Eles denunciam como “imorais” as manobras legislativas que ameaçam os direitos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais. “Sentimos a necessidade de uma maior presença da Igreja junto às comunidades espalhadas nesta imensa Amazônia”, destaca a nota.
Os/as participantes enfatizam, ainda, a importância da renovação dos ministérios ordenados e laicais, confiando na variedade dos carismas e na força da unidade e da comunhão. Eles também reconhecem a missão própria dos leigos, pois “são a Igreja presente no coração da sociedade, sal da terra, luz do mundo, sinais do Reino que cresce na história humana”.
No final da carta, os/as participantes do encontro agradecem ao papa Francisco pelo empenho, dedicação e documentos sobre a ecologia integral. Também proferem palavras de carinho à Igreja de Belém pela acolhida.
Levantamento feito pelo De Olho nos Ruralistas mostra que candidatos à prefeitura já estiveram envolvidos em algumas das principais investigações já feitas sobre extração ilegal de madeira.
(Por Alceu Luís Castilho – De Olho nos Ruralistas | Imagem: MMA)
Dono de um patrimônio de R$ 24 milhões (R$ 5 milhões em dinheiro), o candidato à reeleição na prefeitura de Marcelândia (MT), Arnóbio Vieira de Andrade (PSD), declarou à Justiça Eleitoral uma empresa chamada Ava Desmatamento e Pecuária. O nome não é à toa: as atividades estão bem interligadas na Amazônia Legal. Pecuarista, ele registrou também na Justiça Eleitoral a propriedade de duas motosserras à gasolina, profissionais, modelo 381 – destinada a corte de árvores de médio porte.
Mas sejamos justos: não encontramos nenhuma denúncia de crime ambiental contra o prefeito. O mesmo não se pode dizer de outros candidatos no Arco do Desmatamento. Várias operações – mais ou menos famosas – de combate à exploração ilegal de madeira na Amazônia tiveram a presença de políticos candidatos em 2016. Entre 52 dos municípios que mais desmatam no Brasil, 18 madeireiros tentam ser prefeitos. E a maior parte deles já esteve envolvida em alguma denúncia relativa à extração proibida ou outro tipo de crime ambiental relacionado à madeira.
É o caso do candidato à reeleição em Feliz Natal (MT), Toni Dubiella. Ele já presidiu o Sindicato das Madeireiras do município. Declarou R$ 14,8 milhões em bens este ano (bem mais que os R$ 3,7 milhões de 2012), entre eles a Madeireira Vinícius Ltda, onde trabalham 120 pessoas. O próprio site da prefeitura traz um Dubiella sorridente, se promovendo, e contando que, quando jovem, deixou a pequena empresa de seu pai em busca de seus sonhos: “tornar-se um empresário madeireiro”.
O Ibama de Sinop registrou em 2013 um auto de infração contra a empresa. Em 2015, teve a pena prescrita por um crime ambiental denunciado em 2008: a venda de 68 mil metros quadrados de madeira serrada sem licença. Não foi um caso isolado. Segundo o Ministério Público, ele dificultou a ação dos fiscais do Ibama durante uma inspeção em 2010. Estavam armazenados sem licença pedaços serrados de madeira itaúba, champagne, cupiúba, cambará, cedrinho, sucupira preta, angelim e cambará-rosa. Todos apreendidos. O Tribunal de Justiça do Mato Grosso acolheu no ano passado a denúncia.
Outro caso emblemático é o de Eudes Aguiar (DEM), prefeito de Brasnorte (MT) candidato à reeleição em uma coligação chamada É Pra Frente que se Anda – com PP, PT e PMDB, entre outros. Dono da madeireira Imperatriz, ele foi preso em 2005 numa das maiores operações já feitas contra o desmatamento, a Curupira. A ofensiva da Polícia Federal e do Ministério Público Federal ocorreu em 16 municípios de oito Unidades da Federação. Com 95 acusados de integrar o que foi chamado, então, de “maior quadrilha” a praticar crimes ambientais no país. A madeira retirada ilegalmente encheria 66 mil caminhões.
Em 2010, Aguiar foi flagrado em Jaraguari (MS) transportando galos de rinha em uma caminhonete. Mas é mesmo pela madeira que ele costuma ser investigado. Ele e a madeireira são réus em ação civil pública movida pelo Ministério Público mato-grossense. E a punição em relação à Operação Curupira ainda se arrasta, mais de dez anos depois: ele e mais cinco pessoas são acusados pelo Ministério Público Federal em pedido de prisão temporária. E tudo isto em relação a um esquema que mobilizou 450 policiais, em 2005, e teria rendido R$ 890 milhões à quadrilha – nos valores da época.
Outros se lembrarão da Operação Arco de Fogo – mais um nome pelo qual é conhecido o Arco do Desmatamento. Em Rondônia, em 2008, um dos que estiveram na mira da Polícia Federal foi o prefeito de Nova Mamoré (RO), Laerte Queiroz (PMDB), candidato à reeleição em coligação que inclui o PT, o PPS e o PV. A declaração de bens de 2012 registra a participação na empresa S.F. Madeiras, ao lado de Salete Queiroz. Ambos foram denunciados em 2014 por “fraude para legalizar madeira clandestina”, em 2007 e 2008, segundo o Ministério Público do Estado de Rondônia. As guias florestais tinham informações falsas. O TJ-RO aceitou este ano a denúncia por falsidade ideológica.
A lista dos madeireiros
Entre 308 candidatos em 52 dos municípios que mais desmatam no Brasil, são 18 os madeireiros. Fora os simpatizantes. E a maioria não quer ser vice, não. Apenas três deles tentam ser vice-prefeitos. Os demais tentam a reeleição, como Andrade, ou chegar pela primeira vez à prefeitura, comandando secretarias como a da Agricultura e Pecuária ou a do Meio Ambiente. O levantamento foi feito nas últimas semanas pelo De Olho nos Ruralistas, na reportagem especial Eleições 2016 – O Arco Político do Desmatamento. PSDB e PMDB são os partidos com mais candidatos madeireiros:
A lista acima exclui candidatos que não declararam nenhuma empresa do setor, mas são diretamente ligados a madeireiros. Caso da ex-deputada estadual Luciane Bezerra (PSB), candidata em Luara (MT). Ela é nora do madeireiro Orivaldo Bezerra, investigado pela Polícia Federal por retirada de madeira de terras indígenas. Ou do prefeito de Lábrea (AM), Gean Barros (PMDB), genro de Oscar Gadelha, dono de uma micro empresa destinada à “extração de madeira em florestas plantadas”. Barros e Gadelha foram flagrados utilizando trabalho escravo em propriedade reivindicada pelo prefeito, em plena Reserva Extrativista do Médio Purus, na beira do Rio Umari.
Candidato à reeleição, Gean Barros tentou impedir fiscalizações de crimes ambientais nas reservas, no sul do Amazonas. Ao lado do deputado estadual Adjuto Afonso (PDT) e do ex-diretor-presidente do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas, Graco Fregapani, ele mobilizou a população para expulsar fiscais do Instituto Chico Mendes (ICMBio) do município. Eles tinham ido checar a denúncia de que a unidade de conservação estava sendo utilizada para a extração de madeira. O nome de Gadelha aparece desde os anos 90 em denúncias de venda ilegal de toras.
Outro candidato à reeleição, Antonio Rufatto (PSDB), já presidiu o Sindicato dos Madeireiros de Paranaíta, no Mato Grosso. Em 2016, não declarou nenhuma madeireira, só fazendas. Seu irmão, Lir Rufatto, também filiado ao PSDB de Paranaíta, é madeireiro no Mato Grosso e no sul do Amazonas. Está na lista suja do trabalho escravo, por exploração no km 180 da Rodovia Transamazônica, no distrito de Santo Antônio do Matupi, em Manicoré (AM). É um local – que deveria ser um assentamento do Incra – conhecido como o “180”, pivô dos conflitos com os Tenharim, da terra indígena vizinha.
Lir Rufatto – conhecido na família como Moreira – responde a vários processos criminais pelo país. Pertence a uma família de madeireiros: uma das empresas está no nome de sua mulher, Vitória. Antonio Rufatto, o irmão candidato à reeleição, já foi absolvido num processo que apontava sua madeireira, a Perimetral, como beneficiária do furto de autorizações do Ibama para transporte de madeira. O caso ocorreu em 2005 e foi arquivado em maio deste ano. Segundo o desembargador que relatou o caso, o juiz não deveria ter acolhido a denúncia, pois Rufatto já era prefeito.
Tucanos e madeireiros
Poucas madeireiras foram declaradas pelos candidatos por valores acima de R$ 100 mil. Uma exceção é a empresa do tucano João Rogério de Souza, que tenta voltar à prefeitura de Nova Bandeirantes (MT). Ela vale R$ 500 mil. Pouco em relação ao total de bens do político, R$ 7,6 milhões – sete vezes mais que em 2008. A madeireira J.R. de Souza, ou União, já foi alvo de auto de infração do Ibama em outro município do Mato Grosso, Sinop, em 2008. Com apreensão de madeira.
A madeireira do candidato Milton Amorim (PSDB) em Colniza (MT), a Santa Clara, foi declarada por apenas R$ 25 mil. O município ficou conhecido em 2015 como “o município que mais desmata no Brasil”. Entre agosto e dezembro, respondeu por 19% de todo o desmatamento no Mato Grosso. O pecuarista Miltinho, presidente do Sindicato Rural do município, assinou no ano passado um termo de ajustamento proposto pelo Ministério Público do Estado por causa dos danos ambientais causados pelos resíduos de sua serraria, “casca, cavaco, costaneira, pó de serra, maravalha e aparas”.
Outro tucano que assinou um Termo de Ajustamento de Conduta foi Altamir Kurten, candidato em Cláudia (MT) e dono da Kurten Madeiras do Norte. A promotora Luane Rodrigues Bonfim determinou em julho que ele não corte a mata nativa ou área de proteção permanente de sua propriedade, bem como não utilize “fogo para a limpeza de área”. Sob pena de levar uma multa diária de R$ 5 mil. A Kurten Madeiras foi declarada por R$ 95 mil apenas, mas o candidato registrou na Justiça Eleitoral um empréstimo de R$ 911 mil à madeireira.
Em defesa do setor
A madeireira mais valiosa entre as declaradas pelos candidatos no Arco do Desmatamento é a 3F Madeiras, do prefeito de Aripuanã (MT), Ednilson Faitta (PMDB). Ele declarou cotas no total de R$ 1,44 milhão, metade do capital da empresa. Ele preside desde 1999 a Associação das Indústrias Madeireiras de Aripuanã, mas abriu a serraria 3F em 2010. Seu vice, Junior Dalpiaz (PDT), já assinou documento cobrando do governo valorização do que chama de “setor florestal” – a exploração de madeira é a principal atividade econômica do município – e defendendo o manejo em terras indígenas.
Nem sempre é fácil localizar a madeireira do candidato. No caso de Valdinei Correa Pereira, o Valdinei do Posto (PMN), candidato a vice-prefeito em Pimenta Bueno (RO), localizamos uma de suas duas empresas, a Rondo Madeiras, esta de Espigão D’Oeste (RO), pelo CPF. A outra, a Madbel Madeiras, já estava mencionada em uma condenação feita pelo Tribunal de Justiça em 2015. Em 2009, Valdinei foi flagrado pela Polícia Rodoviária Federal transportando um reboque furtado. Em 2012, ele era procurado, como sócio da Rondo Madeiras, mas estava em “lugar incerto e não sabido”.
Memória
Em alguns casos, o político vai reconstruindo seu perfil rumo a algo mais amigável – e as notícias sobre exploração de madeira vão ficando distantes. O prefeito de São Félix do Xingu (PA), João Cleber de Sousa Torres (PMDB), era mencionado pelo Ministério Público Federal em 2003 como um dos principais mandantes de uma “máfia da grilagem” na região. Candidato à reeleição em município que ainda lidera o ranking de homicídios na Amazônia, ele era descrito pelos procuradores como dono das madeireiras Impanguaçu e Maginga. Em 2016, João Cleber declarou possuir um total de R$ 20 milhões em bens, oriundos principalmente de 15 mil cabeças de gado.
Quem também andou se beneficiando do esquecimento foi o ex-deputado estadual Paulo Jasper, o Macarrão (DEM), candidato em Tailândia (PA). Em 2008, era apontado como integrante de uma quadrilha da madeira que lucrava R$ 90 milhões com fraudes, segundo promotores paraenses. O município chegou a ser ocupado por tropa da Força Nacional. Áreas devastadas havia mais de 15 anos eram “esquentadas” a partir de papéis fraudulentos: duas fazendas existiam apenas em cartório, para justificarem o desmatamento. Quem denunciou o esquema foi um antigo sócio de Macarrão.
E tem mais. O tucano Paulo Pombo Tocantins, candidato à reeleição em Paragominas (PA), é dono do único cartório no município. Vejamos esta notícia de 2003, do Greenpeace: “Madeireiros destroem castanhais dentro da área proposta para a criação de reserva em Porto de Moz”. Os ativistas percorreram a estrada que ligava o plano de manejo, pertencente a Paulo Tocantins, e encontraram toras abandonadas, tocos e trilhas de arraste de toras por tratores. Segundo a organização, ele fornecia madeira para várias indústrias madeireiras: Eidai do Brasil, Intelnave e Tropical. Em 2004, o Greenpeace atualizou o caso: a madeira apreendida pelo Ibama tinha sumido.