Povos e comunidades tradicionais do Maranhão unificam pautas para viver a liberdade que nasce do chão
Por Cláudia Pereira - Articulação das Pastorais do Campo e Osnilda Lima - Comunicação 6ª SSB e Cepast - CNBB
Encontro da Teia dos Povos e das Comunidades Tradicionais do Maranhão. Foto: Fábio Costa/Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Povos e comunidades tradicionais do Maranhão mantêm, há mais de dez anos, organizada a luta coletiva em defesa de seus direitos. Juntos, defendem pautas para proteger o meio ambiente, que, além de garantir o sustento de milhares de famílias, preservam as diversas formas de vida. A sinergia entre os povos originários, quilombolas, pescadores e camponeses na defesa dos biomas que contempla o estado do Maranhão, inspira a luta dos povos pelo país. A Teia dos Povos e das Comunidades Tradicionais, que surgiu no estado do Maranhão, é formada por um tecido de ancestralidade, lutas, terra, água, floresta, homens e mulheres que entrelaçam a trama de sabedorias, conhecimento, transformação e esperança.
A palavra Teia vem do tear, entrelaçando fios para formar o tecido. No sentido de unir, a palavra se relaciona com a unidade e comunicação, portanto a Teia dos Povos é uma articulação de comunidades, territórios e organizações. Uma reunião que debate, defende as causas dos povos que construíram elos e formaram caminhos com o objetivo da autonomia coletiva. É a luta dos povos com o conhecimento de seus direitos e conscientes dos deveres e segmentos das representações do Estado, do que cerne os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Na mesma linha, a Teia dos Povos defende e vive a soberania e a segurança alimentar, o que vai além do significado de sobrevivência, é o verdadeiro sentido da Terra Livre.
Os povos têm a ancestralidade como fundamento, que são praticados de geração em geração, em respeito à natureza e à Mãe Terra. A forma e o cuidado às ações na natureza para plantar e colher, as sementes crioulas que são respeitadas e partilhadas para garantir o alimento, a farmácia viva que cuida e cura dos corpos e o respeito à água, que é fonte da vida.
Mulheres do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu na Teia dos Povos MA. Foto: Cláudia Pereira/Articulação das Pastorais do Campo.
Autonomia e protagonismo das mulheres para preservar o meio ambiente
A Teia dos Povos não é apenas dias de encontro entre os povos, é uma reunião contínua que envolve homens, mulheres, jovens e crianças que partilham experiências de cultivos, alimentos, direitos, educação e preservação da arte e cultura, sem desconectar do mundo atual. Terezinha de Jesus é quebradeira de coco babaçu e vive na região oeste do estado do Maranhão que integra o Bioma da Amazônia. Terezinha faz parte do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), um movimento que reúne os estados do Pará, Piauí, Maranhão e Tocantins, e organiza as quebradeiras de coco na promoção da autonomia.
Sentada em uma rede estendida entre duas árvores frondosas, Terezinha, que desde a infância vive a cultura do coco babaçu, sabe da importância de estar inserida na Teia dos Povos. Na época, refletia a conjuntura do ano de 2022, em que o povo retomava a luta pós pandemia da Covid-19 e enfrentava retrocessos e perdas de direitos. Ela conta que criou seus filhos com o fruto da palmeira do coco babaçu, e que participar do encontro da Teia é unificar a luta das mulheres. Em sua fala, Terezinha reivindica a preservação da palmeira e pede um basta da violência contra as mulheres.
“Participar do encontro da Teia é unificar a luta das mulheres”
Mulheres reunidas no encontro da Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais, no Maranhão. Foto: Cláudia Pereira/Articulação das Pastorais do Campo.
Ao lado de Terezinha, a jovem Rosalva Silva Gomes, de Cidelândia (MA), fia o tear de sua história de luta e defesa da palmeira do coco babaçu. Ela, que também é artesã, descreve com forte emoção o engajamento junto a outras mulheres no enfrentamento para preservar o meio ambiente e a luta de sua comunidade. Uma trajetória semelhante à de outras mulheres quebradeiras de coco da região. A luta começou desde cedo, ainda criança.
Rosalva presenciou, ainda menina, a luta da mãe para organizar e estruturar o coletivo de mulheres e, desta forma, foi aprendendo o significado de cada luta conquistada. Junto aos passos da mãe ela soube da importância da sindicalização, da associação e que a melhor forma de luta é o coletivo. Ela integra o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu há mais de dez anos. Rosalva pertence a uma região que sofre com os impactos do agronegócio e a monocultura da plantação do eucalipto. Presente em um dos encontros da Teia dos Povos do Maranhão, ela descreveu o fortalecimento dos quilombos.
“O continuar não se dá fora do fazer, e para continuar o fazer, precisamos ver fazendo. Precisamos fazer juntos neste espaço coletivo e diverso”, afirma Rosalva, que ressalta que as mulheres quebradeiras vivem para além do ser, “é o bem viver na essência”. Ela diz, ainda, sobre a importância da palmeira do coco babaçu para o meio ambiente e a relação dos povos tradicionais com a planta que é pura vida, por esta razão as quebradeiras de coco a chamam de “mãe de leite”, ou seja, a palmeira é parte da vida de milhares de mulheres que vivem na região de transição amazônica e cerrado brasileiro.
“As mulheres quebradeiras vivem para além do ser, é o bem viver na essência”
Terezinha de Jesus (à direita) e a jovem Rosalva Silva Gomes (à esquerda) durante encontro da Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais, no Maranhão. Foto: Osnilda Lima/Comunicação 6ª SSB e Cepast – CNBB.
Com lenço colorido na cabeça, ela sorri com os olhos, na camiseta branca a frase estampada chama atenção: “+ Quebradeiras + Palmeiras = Floresta em pé”. Maria do Rosário Ferreira é pertencente ao território quilombola de Sesmarias do Jardim, localizada na região norte do estado do Maranhão. O rosto que expressa sempre a alegria é também um rosto que luta pela garantia de direitos à terra e pelo espaço das mulheres na participação social e política. Rosário conta que há dez anos caminha na luta de forma organizada, junto às mulheres quebradeiras de coco babaçu.
“Nós mulheres, por muitos anos trabalhamos na roça, quebramos coco, cuidamos da casa, dos filhos, mas não sabíamos que éramos as protagonistas desta luta. Hoje sabemos que a força e a luta são das mulheres e somos nós mulheres que enfrentamos os conflitos”, desabafa Maria do Rosário.
“Hoje sabemos que a força e a luta são das mulheres e somos nós mulheres que enfrentamos os conflitos”
A quilombola Maria do Rosário chama a atenção com a camiseta estampada: “+ Quebradeiras + Palmeiras = Floresta em pé”. Foto: Osnilda Lima/Comunicação 6ª SSB e Cepast – CNBB.
Rosário pertence ao movimento das quebradeiras de coco do estado do Maranhão e conta que a luta na busca do protagonismo e autonomia foi um processo difícil, sobretudo no enfrentamento ao patriarcado. Atualmente, as mulheres conquistaram espaço, mas ainda tem muito para ser conquistado.
Para ela, o auto reconhecimento como quilombolas e mulheres de luta, é importante para enfrentar a violência contra as mulheres e os conflitos nos territórios. Entre os enfrentamentos, Rosário cita o racismo e o latifúndio. Atualmente, o embate é pela titulação e regularização fundiária da comunidade que possui mais de 170 famílias. A comunidade Sesmarias do Jardim está na mesma situação de outras comunidades quilombolas do estado do Maranhão. A demora pela morosidade dos órgãos; Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Instituto de Colonização e Terras do Maranhão (ITERMA). Ambos são responsáveis também pelos encaminhamentos dos processos de acesso às terras dos povos e comunidades tradicionais do estado.
As comunidades tradicionais do Maranhão são as que mais têm sofrido violações nos últimos anos, sobretudo os povos indígenas. O estado está em 4º lugar no ranking de assassinatos de lideranças indígenas, como aponta o levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), apresentado no primeiro semestre de 2023. Os enfrentamentos às diversas violências nas comunidades quilombolas são diárias, como conta Rosário, que considera que a pior delas é o desmatamento ao meio ambiente.
Processo de descolonização e sentimento de pertença
A participação dos jovens nos movimentos dos povos e comunidades tradicionais é de compromisso com as causas, algo natural que nasce da inserção de cada realidade dos povos. É comum nos processos de formação e partilhas a presença de crianças, adolescentes e jovens acompanhando e participando junto aos familiares nas ações. No contexto desta realidade, o jovem Ranieri Roseira é um dos exemplos.
Ranieri é um dos articuladores da Teia dos Povos e agente da Comissão da Pastoral Terra (CPT – MA), pertence ao território das comunidades tradicionais do sul do estado do Maranhão. Com um turbante na cabeça, colares de miçangas no pescoço e nas mãos a arte da criação de uma mandala de fios coloridos e sementes, produzida por ele, está sempre alegre. Raniere é dinâmico e atento. Sua ancestralidade indígena e quilombola é a força do jovem, que vive a caminhada da teia. Raniere diz que os processos de construção da Teia dos Povos são de descolonização, não basta ser um povo organizado, é necessário tecer a consciência de suas origens de Povos e Comunidades Tradicionais.
“Teia é pertencimento, sentimento e a alegria também é nosso combustível para a luta”
Raniere resume o significado da Teia dos Povos que vivem o Esperançar, embora o latifúndio e o próprio Estado permaneçam cometendo perseguições e barbáries. O jovem quilombola desperta para reflexão do Bem Viver dos Povos e Comunidades Tradicionais. Muito além da luta pela conquista do direito à terra, os povos sempre souberam do pertencimento e cuidados a casa comum, a terra.
A Teia dos povos e Comunidades Tradicionais é uma luta política e vive o processo contínuo de manter suas riquezas culturais, espirituais e sobretudo a defesa e sentido da realidade de que o ser humano é parte do meio ambiente. É a simbiose que se fortalece. A terra, as florestas, as águas e todos os seres vivos não estão dissociados dos corpos dos povos tradicionais. Raniere enfatiza que, antes da luta política dos povos, o processo de descolonização é necessário e constante para o auto reconhecimento.
Povos originários tece a teia pelo direito à terra
“Nós, indígenas, estamos dizendo não ao marco temporal, essa é a nossa luta do momento”. Expressa Oscar Cotap Akroá Gamella, do território do Taquaritiua (MA), que complementa: “nós sempre estivemos aqui, se alguns de nós não está na terra é porque fomos expulsos pelos portugueses”. Cotap conta que a luta dos Povos Akraó-Gamella nos últimos anos tem sido o enfrentamento contra as violações socioambientais, inclusive do Estado com projetos de lei (PLs) sob autoria de deputados estaduais que resultou em ordens de despejos.
“Nós sempre estivemos aqui, se alguns de nós não está na terra é porque fomos expulsos pelos portugueses”
Povos e comunidades tradicionais em união durante encontro da Teia. Foto: Cláudia Pereira/Articulação das Pastorais do Campo
Os ataques dos grileiros também foram intensificados, mas os povos mantêm os processos de articulação e defesa do território com autonomia e sempre fortalecidos com os processos organizativos, a exemplo da Teia dos Povos. Catop diz que o povo sempre lutou pela educação, políticas públicas, demarcação das terras indígenas e pela preservação do meio ambiente. As pautas dos povos indígenas não diferem das pautas dos povos quilombolas, ribeirinhos e pescadores. Cada povo com suas especificidades, mas com uma pauta em comum, a defesa de todas as formas de vida.
“Nós, povos Akroá Gamella, brigamos por tudo. As políticas públicas só acontecerão quando tivermos o nosso território demarcado”, afirma Catop, que reforça a importância da demarcação das terras indígenas.
A soberania alimentar como garantia de direitos
A soberania alimentar na Teia dos Povos é vivenciada na prática, ao termo que foi definido no Fórum Mundial em 2001, em Cuba, sobre o direito à alimentação de qualidade. Os povos tradicionais defendem o direito ao acesso de alimentos saudáveis diariamente e de forma sustentável. Nos grandes encontros da Teia, a exemplo do 13º encontro realizado em 2022, praticamente 100% da alimentação servida foi produzida e preparada pelas comunidades tradicionais, sem interferência de alimentos processados ou com agrotóxicos. Um exemplo colocado em prática de autossuficiência, sustentabilidade e autonomia das comunidades.
Rosa Santos, pertencente ao quilombo Mucambo, que fica na região norte do estado do Maranhão, defende a agroecologia nas comunidades. Ela, que também é quebradeira de coco, conta que desde os primeiros encontros da Teia a alimentação é pauta importante, não somente para a garantia do alimento para o evento, mas para garantir a autonomia e a segurança alimentar das comunidades. Com essas ações é colocada em prática a economia solidária nos territórios. No cenário atual em que o Brasil voltou ao mapa da fome, e a Campanha da Fraternidade da Conferência dos Bispos do Brasil (CNBB), que pautou a temática da fome neste ano de 2023, percebe-se que a Teia dos Povos e Comunidades dos Povos vivencia e esclarece a relação do meio ambiente e o direito à alimentação saudável.
“Quando se trouxe a pauta sobre a soberania alimentar, percebemos a transversalidade do tema que abordou saúde, gênero e a autonomia dos povos”, diz Rosa Santos.
“Percebemos a transversalidade do tema que abordou saúde, gênero e a autonomia dos povos”
Mulheres preparam, em conjunto, uma das refeições do encontro da Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais. Foto: Cláudia Pereira/Articulação das Pastorais do Campo.
Luta pela demarcação e defesa dos territórios
Dados do Caderno de Conflitos no Campo Brasil 2022, publicado no dia 17 de abril pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), apontam que o estado do Maranhão ocupa a terceira posição no país com maior índice de conflitos por terra. Em 2022, foram registrados mais de cem casos e sete mortes. Os primeiros meses de 2023 foram marcados pela violência e conflitos de terras nos territórios tradicionais. Comunidades quilombolas, territórios indígenas e camponeses enfrentam diariamente as ameaças de empresas do agronegócio que avança com plantio de soja e eucaliptos.
Não bastasse o avanço da monocultura, violência, acusações falsas de degradação ambiental e a cooptação dos moradores das comunidades, os povos tradicionais enfrentam o Estado e as grandes empresas com seus projetos “sustentáveis” que, de modo sustentável, tem somente a palavra dita e escrita. O grande latifúndio ameaça as comunidades tradicionais e avança a cada dia destruindo parte do bioma da Amazônia sem licença ambiental. Os donos da soja, os grandes empresários são também representantes legislativos do estado do Maranhão.
Pesquisas apontam que 80% da floresta amazônica do estado do Maranhão já foi destruída. Talvez nem precise necessariamente de dados dos órgãos pesquisadores ambientais, basta ouvir os povos que gritam todos os anos denunciando as diversas violações ambientais. A Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão lutam pela demarcação e defesa de seus territórios e, sobretudo, pela preservação das formas de vida, lutam para manter a floresta em pé. Os povos são resistência e guardiões da floresta.
No primeiro semestre de 2023, a Câmara dos Deputados aprovou o PL 490/2007, projeto que trata do marco temporal e a demarcação das terras indígenas. A proposição tramita, agora, no Senado Federal sob a numeração PL 2903/2023 – o projeto, além de afrontar a Constituição, é uma grande ameaça ambiental. A Teia dos Povos sabe que, para além dos termos “agro” e projetos “sustentáveis”, que esses fatores são associados aos poderes econômico e político que ignoram a diversidade, o grito dos povos e o verdadeiro sentido da vida.
“O projeto, além de afrontar a Constituição, é uma grande ameaça ambiental”
Centenas de indígenas manifestaram-se contra o PL 490 em frente ao Anexo 2 da Câmara no dia 23 de junho de 2021, quando proposta foi aprovada na CCJC. Foto: Andressa Zumpano/CPT Nacional.
“Eles querem nos enculturar, não é um processo fácil fazer com que nos reconheçam como pertencentes do território, que nos respeitem como verdadeiros cuidadores da terra”. Afirma Maria Edivane Souza de Oriximiná– (PA). O que Maria afirma também é a confirmação das ameaças e violências que mulheres e homens vivenciam e denunciam a omissão do Estado. Há tempo que Maria do Rosário, da comunidade quilombola Sesmarias do Jardim, luta junto a dezenas de comunidades do Maranhão pela regularização dos territórios. Eles denunciam, alertam e só pedem o que é de direito para todos os povos: Terra Livre, floresta em pé e vida para todos.
“O que nós queremos é um território livre, regularizado, um território que tenha vida para todos os povos”,
manifesta a quebradeira de coco e quilombola, Maria do Rosário.
A mensagem da teia dos povos
O antropólogo e sociólogo Igor Sousa, acompanha as comunidades tradicionais e o movimento das quebradeiras de coco babaçu do Maranhão e analisa as associações nos debates que envolvem o direito aos territórios e as discussões em torno do gênero e do meio ambiente. Igor compreende que os movimentos da Teia dos Povos propõem para além do ato de coragem: indicam possibilidades na construção de um mundo melhor.
A prática do bem viver já é uma realidade das comunidades tradicionais, embora sejam perseguidos e tenham seus direitos negados, mas a relação dos povos com a natureza e o sagrado é parte do existir e permanecer na terra. “A teia é uma experimentação política de organização de visibilizar as práticas comunitárias e de povos e comunidades tradicionais, que não à toa, sofrem violência porque elas oferecem possibilidades de um mundo possível que vem desse lugar de vida”, afirma Igor.
“A teia é uma experimentação política de organização de visibilizar as práticas comunitárias e de povos e comunidades tradicionais”
A teia dos povos vive a prática da liberdade em razão de suas pautas que nascem do chão e são de caráter de urgência. Nesse sentido, tecer as pautas de forma unificada é a forma para enfrentar as diversas violações que os povos e comunidades sofrem diariamente. Ao mesmo tempo, a Teia ensina os povos da cidade que as pautas são comuns e que a busca pelo território e vida digna é uma luta de todos que sofrem os desmontes de direitos, agressões do capital que avançam contra os mais pobres em todo o mundo.
Na força das retomadas tecemos a nossa união
A reportagem especial é ressonância do encontro realizado em setembro de 2022. Povos do campo, das águas, das florestas e das cidades teceram lutas para fortalecer as resistências na defesa da vida e dos territórios. Centenas de pessoas acolhidas pelas comunidades quilombolas de Santa Helena (MA) refletiram o tema “Na força das retomadas tecemos a nossa união”.
O momento de reencontro pós-período crítico da pandemia da Covid-19, proporcionou vivências únicas e partilhas que comungam com a proposta do bem viver dos povos. Do alimento fornecido aos participantes à roda de tambor no centro do terreiro, foi debatido sobre descolonização, igualdade de gênero, segurança alimentar e a violência no campo. Discussões pertinentes, práticas de libertação que ajudam a pensar sobre o conceito de terra livre.
Encontro da Teia dos Povos e das Comunidades Tradicionais do Maranhão. Foto: Cláudia Pereira/Articulação das Pastorais do Campo.
Com informações da CPT Pernambuco
Na próxima segunda-feira, 24, a Comissão Pastoral da Terra em Pernambuco realizará o lançamento estadual da publicação “Conflitos no Campo Brasil 2022”. A atividade ocorrerá a partir das 9h30 no auditório do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no Recife. Na ocasião, serão apresentados e analisados os dados da violência no campo e dos conflitos agrários que ocorreram no estado de Pernambuco em 2022.
Por trás dos números apresentados, está o martírio de famílias, povos e comunidades que vivem uma rotina de ataques contra suas vidas e contra suas terras e territórios. De acordo com o levantamento feito pela CPT, em 2022, os conflitos no campo em Pernambuco atingiram 31.056 camponeses/as, pescadores/as, trabalhadores/as rurais, sem-terra, indígenas, quilombolas e outras identidades camponesas. O levantamento contém ainda uma série de detalhamentos sobre os diferentes tipos de violências sofridas por essas populações, o que traz à tona o cenário de negação de direitos, injustiça e desigualdade no qual se encontram.
Esta é a 37ª edição da publicação Conflitos no Campo Brasil, elaborada pela CPT por meio do seu Centro de Documentação Dom Tomás Balduino. Editada pela primeira em 1985, a publicação se tornou referência nacional e internacional e instrumento fundamental de denúncia das violências cometidas cotidianamente contra os povos do campo, das águas e das florestas no Brasil. Na publicação, é possível encontrar dados sobre conflitos por terra, conflitos pela água, conflitos trabalhistas, trabalho escravo, tipos de violência contra a ocupação e a posse e tipos de violência contra a pessoa, como os assassinatos e as ameaças de morte. Também estão disponíveis na publicação diversos artigos e análises dos dados levantados.
Serviço
Data: 24 de julho (segunda-feira), às 9h30
Local: Auditório do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)
Endereço: Av. Conselheiro Rosa e Silva, 950 - Aflitos, Recife - PE
Representantes de comunidades de todo o Brasil se reúnem para refletir sobre a realidade social e eclesial do país e da América Latina
Por Assessoria de comunicação da 15º Intereclesial
Foto: Comunica15
Tem início hoje, 18, em Rondonópolis (MT), o 15° Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). O Encontro vai reunir cerca 1,5 mil pessoas, entre leigas e leigos, religiosas e religiosas e bispos, representantes dos regionais das CEBs do Brasil, dos povos indígenas, de comunidades quilombolas e convidados de outras Igrejas cristãs, além de um número expressivo de voluntários que irão compor as dez equipes de serviço.
Neste 15º Encontro, o tema será “CEBs: Igreja em saída na busca da vida plena para todos e todas”; e o lema, “Vejam! Eu vou criar novo céu e uma nova terra” (Is 65).
O Intereclesial é um espaço de escuta das comunidades e que busca, à luz da Palavra de Deus e do Magistério da Igreja, olhar para a realidade social e eclesial, e assumir compromissos que transformem e atualizem a vitalidade da missão da Igreja nas comunidades rurais, nas cidades, nos centros urbanos e nas periferias.
Foto: Comunica15
Deste modo, o encontro utilizará o método ver-julgar-agir, consagrado na dinâmica das CEBs e da Igreja na América Latina e Caribe, que tem como ponto de partida a experiência das comunidades. Toda organização, reflexões e grupos de trabalho serão divididos em cinco plenárias temáticas: CEBs, Sinodalidade e Poder na Igreja; CEBs e Dimensão Político-social; CEBs e Economia de Francisco e Clara; CEBs e Ecologia Integral; CEBs e Educação.
As plenárias acontecerão de forma simultânea em sete paróquias da Diocese de Rondonópolis-Guiratinga e contarão com a ajuda de assessores e assessoras que, atentos à voz do povo, farão ecoar essas vozes e discussões em seus momentos de falas, com o objetivo de lançar provocações para que se avance na reflexão. Os locais das plenárias receberam nome de biomas do Brasil: Cerrado, Pantanal, Amazônia, Mata Atlântica, Pampa, Caatinga. Na paróquia onde acontecerão as grandes plenárias, o nome dado foi “Casa Comum”.
Os participantes do 15º Intereclesial terão acesso a toda programação e também os organizadores oferecem atividades abertas para a população de Rondonópolis e região. Na quinta-feira, 20, no bairro Vila Aurora, vão ocorrer dois eventos: a Feira Solidária, a partir das 9h; e a Noite Cultural, com início às 19h, que será animada pelos artistas locais e pela participação do cantor e poeta nordestino Zé Vicente. Já na sexta, 21, está programada a Romaria dos Mártires e Defensores da Vida, a partir das 17h, com concentração na Praça dos Carreiros, no Centro de Rondonópolis.
Foto: Comunica15
O que são as CEBs?
As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) surgiram no Brasil como um meio de evangelização para responder aos desafios de uma prática libertadora no contexto sociopolítico dos anos da ditadura militar e, ao mesmo tempo, como uma forma de adequar as estruturas da Igreja às resoluções pastorais do Concílio Vaticano II, realizado de 1962 a 1965, com a intenção de atualizar a Igreja e adaptá-la ao mundo atual. Elas estão na raiz de vários movimentos sociais e têm contribuído para a formação de muitas lideranças no campo social e político. São responsáveis também pela formação de lideranças leigas no interior da Igreja, que assumem o jeito de viver e celebrar a fé de uma maneira nova.
(Cf. A identidade das CEBs. Por Pe. Nelito Dornelas. Revista Pastoral: https://www.vidapastoral.com.br/artigos/eclesiologia/a-identidade-das-cebs/)
Celebração de Envio para o 15º Intereclesial (16/07). Foto: Comunica15
Mais informações: Conceição de Góis: WhatsApp (66) 99611-6951 | Caline Maria: WhatsApp (66) 99647-4897
Calos Henrique Silva | Comunicação CPT Nacional
A Comissão Pastoral da Terra - Regional Amazonas (CPT/AM), junto com a Pastoral da Terra Arquidiocesana, promovem o lançamento do Caderno Conflitos do Campo 2022 e da Campanha Contra a Violência no Campo, no próximo dia 25 de julho, a partir das 08:30. O evento, que marca o Dia do Agricultor e da Agricultora, acontece no Centro de Formação da Arquidiocese de Manaus, localizado no centro da cidade.
Dentre os destaques que serão apresentados, estão os registros de violações de direitos humanos ocasionados por conflitos por terra, água e território. Segundo os dados do Centro de Documentação Dom Tomás Balduino (Cedoc), da CPT, responsável pela elaboração do caderno há 40 anos, foram notificados 152 conflitos de terra no Amazonas em 2022, contra 69 em 2021, o que significa um aumento de mais de 120%. O estado ficou em 2o lugar na região Norte, atrás apenas do Pará, e é o 4o no país em número de conflitos. Ao todo, 29.653 famílias foram atingidas por estes conflitos.
A região Norte ocupa o primeiro lugar em conflitos no país (4.855), o que representa quase 40% de todos os conflitos do país registrados no período (12.975). Nos casos de violência contra a ocupação e a posse, o Amazonas lidera os registros de ameaças de despejo em todo o país (13.361), roças e bens destruídos (1.564 e 1.588) e invasões (20.151), além do alto índice de ocorrências de pistolagem (6.551).
Os conflitos são entendidos como ações de resistência e enfrentamento pela posse, uso e propriedade da terra e pelo acesso aos recursos naturais pelo extrativismo, como os seringais, babaçuais ou castanhais, ou quando envolvem posseiros, assentados, quilombolas, indígenas, pequenos arrendatários, sem terra, seringueiros etc. Nos conflitos por água, o Amazonas está em segundo lugar na região Norte e em terceiro no país, com 25 conflitos, contra 7 no ano anterior.
No caso das violências contra a pessoa no campo, mesmo registrando um total de 4 pessoas mortas em 2022, o Amazonas lidera o ranking nacional de tentativas de assassinatos (38) e pessoas ameaçadas de morte (24). A região do município de Atalaia do Norte, no extremo-oeste do estado, foi uma das mais conflituosas e violentas, com destaque para o entorno da Terra Indígena Vale do Javari, a segunda maior do Brasil. Esta localidade ficou marcada em 2022 pelos assassinatos do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips.
Serviço:
Lançamento do Caderno Conflitos do Campo 2022 e da Campanha Contra a Violência no Campo da CPT - Regional Amazonas
Data: 25 de julho de 2023
Hora: 08:30h
Local: Centro de Formação da Arquidiocese de Manaus - Av. Joaquim Nabuco, 1032 - Centro
Contato: Irmã Maria Agostinha de Souza (Coordenação da CPT-AM / Arquidiocesana) - (92) 99409-8203
Por Paulo Oliveira | Meus Sertões
Arsenal apreendido em Correntina. Foto: Divulgação
Os pequenos criadores de animais e agricultores sofrem há pelo menos dez meses com tentativas de homicídios e destruição de patrimônio realizada por pistoleiros, em Correntina, no oeste baiano, conforme Meus Sertões vem denunciando. O recrudescimento da violência na região ocorreu após a recusa dos integrantes de comunidades de fecho de pasto não aceitarem ofertas pelas matas nativas que preservam há mais de um século e onde soltam o gado durante os períodos de estiagem. As terras são devolutas, ocupadas tradicionalmente pelos fecheiros, daí a intensificação da prática de grilagem.
Após sucessivos atentados, policiais civis realizaram operação na terça-feira que resultou na prisão de suspeitos de terem praticados os crimes contra os fecheiros. Em menos de 48 horas, no entanto, eles foram soltos por decisão do juiz Matheus Agenor Alves Santos, o mesmo que expediu mandado de busca e apreensão nas fazendas Santa Tereza e Bandeirantes, na zona rural da cidade.
Segundo agentes que participaram da operação, os mandados de busca e apreensão estavam relacionados com crimes cometidos contra integrantes da Associação Comunitária dos Pequenos Criadores do Fecho de Pasto de Cupim, Sumidor e Cabresto (ACPC). Supostos pistoleiros foram acusados de destruir a seda da ACPAC e uma ponte de acesso ao fecho de pasto.
Além de crimes contra o patrimônio, os criminosos ameaçaram e tentaram matar três fecheiros. Em um dos atentados, no dia 11 de abril, balearam três fecheiros (clique aqui para ler a matéria).
Meus Sertões conseguiu informações precisas sobre o que ocorreu na Fazenda Santa Tereza. No entanto, as informações sobre a ocorrência na outra propriedade não foram divulgadas porque o processo instaurado a partir de prisões e apreensões feitas lá estaria em segredo de justiça.
A ação policial foi deflagrada na terça-feira (11/7). Dela participaram pelo menos 11 inspetores de polícia de diferentes municípios. Eles chegaram na propriedade de 3.093 hectares, onde há plantação, criação de gado e silvicultura, às 9 horas. De acordo com o depoimento da investigadora Tamilles Frota, após abordarem o porteiro, os agentes foram à sede da fazenda, mas não encontraram os gerentes administrativos.
Iniciadas as buscas no escritório e nos quartos de Alexandre Yamaguti e de um funcionário chamado João, os policiais encontraram as primeiras armas e munições. No refeitório e no alojamento, foi a vez de acharem uma carabina 357 com mira a laser, colete à prova de bala, roupas camufladas e coldres. Também prenderam Elvis Eder Alves, 34 anos, residente em Luziânia (GO); Felipe Luiz Calori Coelho, 40, de Ribeirão Preto (SP); e Vanderlino do Nascimento, 36, único deles que declarou morar em Correntina.
Nos cômodos revistados foram encontradas 11 armas curtas e longas, incluindo um rifle calibre 22 – 7022 CBC e uma pistola Stogger STR9. O rifle, vendido pela internet por R$ 2.207, é semiautomático, com alta velocidade de disparo. Ele tem capacidade de dar 10 tiros em menos de dois segundos. Tem precisão, estampido baixo e recuo praticamente imperceptível.
Já a pistola, comercializada por R$ 7.700, é fabricada na Turquia e faz parte da holding Beretta. Ela dispara 17 tiros e tem ganho mercado sobre sua principal concorrente: a austríaca Glock, que custa o dobro. Além do armamento, foram apreendidas 362 cápsulas de calibres 9 mm, 357, 38 e 22, além de dois projéteis já disparados; quatro armas brancas (punhal, peixeira e canivete) e acessórios diversos.
Elvis Eder, Felipe Luiz e Vanderlino foram autuados por posse irregular de arma de fogo de uso permitido, porte ou posse de arma de fogo de uso restrito associação criminosa e por trazer consigo arma branca sem licença. As penas para estes crimes variam, respectivamente, de dois a quatro anos e multa; de três a seis anos e multa; reclusão de um a três anos; e prisão simples de 15 dias a seis meses.
Ao ser interrogado, Felipe Luiz Calori Coelho, admitiu ser dono do rifle 357 apreendido na fazenda. Ele disse que comprou o armamento em Ribeirão Preto. Declarou ser engenheiro eletricista e não ter conhecimento do arsenal existente na fazenda. Os outros dois permaneceram calados.
O promotor Victor César Meira Matias se manifestou pela decretação da prisão preventiva dos autuados. Ele destacou os seguintes pontos para justificar a medida:
1 – O auto de prisão em flagrante versa sobre associação criminosa, com recursos suficientes para aquisição de um “gigantesco arsenal de armamento, de alto dispêndio econômico”.
2- A contratação de funcionários de outros estados é pratica costumeira dos mandantes e serve para facilitar o “descarte” do grupo caso seja necessário.
3 – Existe a patente probabilidade de que, caso sejam soltos, os suspeitos empreendam fuga para tentar dissimular a participação no grupo armado.
4 – Há indícios suficientes de perigo a ser gerado pelo estado de liberdade dos autuados.
5- Existe receio concreto de reiteração delituosa.
Apesar da eloquente argumentação, o juiz Matheus Agenor Alves Santos mandou libertar os suspeitos, justificando que não há indicação de que os presos sejam líderes dessa empreitada criminosa. Além disso, prosseguiu, inexistem antecedentes em outras investigações ou ações criminosas, e o trio possui residência fixa e ocupações lícitas.
Como medidas restritivas, o magistrado proibiu que Elvis Eder, Felipe Luiz e Vanderlino mantenham contato com as vítimas e testemunhas; se aproximem das vítimas a menos de 300 metros de distância; se recolham por um ano das oito horas da noite às cinco horas da manhã; mantenham endereço e contatos atualizados; não deixem a comarca por mais de 10 dias sem autorização judicial; e compareçam bimestralmente ao cartório do juízo para justificarem suas atividades.
As prisões e apreensões nas fazendas resultaram nos processos 8000650-77.2023.8.05.0069 e 8000339-86.2023.8.05.0069
MMA reuniu pesquisadores e especialistas para identificar vetores do problema e propor soluções. Discussões vão subsidiar formulação do PPCerrado
Por Cristiane Prizibisczki | O Eco
O Cerrado e suas paisagens únicas sucumbem ao avanço do agronegócio. Foto: Rafael Oliveira /Agência Fapesp
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima realizou, durante toda esta terça-feira (11), o 1º Seminário Técnico-Científico de análise do desmatamento e queimadas no Cerrado. No total, foram apresentadas 12 palestras com especialistas na conservação do bioma. As informações vão subsidiar a formulação do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas no bioma (PPCerrado).
O desmatamento no Cerrado vem crescendo ao longo dos últimos anos, tendo chegado a 10.700 km² em 2022. Somente no primeiro semestre de 2023, foram gerados alertas para 4.407 km², 21% a mais do que o mesmo período do ano anterior e quase duas vezes mais do que o registrado para a Amazônia (2.649 km²).
Segundo dados apresentados durante o seminário, 86% do desmatamento registrado no Cerrado em 2022 aconteceu de forma ilegal.
Durante o evento desta terça-feira, os especialistas apresentaram os mais recentes dados sobre a dinâmica do desmatamento e das queimadas no bioma e as iniciativas já existentes de combate a tais problemas.
Também foram apresentadas propostas de ação, como o aprimoramento nos sistemas de Autorização de Supressão Vegetal (ASV) e aumento para 35% na área total das propriedades rurais que precisa ser preservada. Atualmente, essa porcentagem é de 20%.
“Esse seminário não é para o governo federal mostrar o que vai fazer. É para nós, juntos, identificarmos as oportunidades. Mesmo porque a gente [governo] pode estar pensando uma coisa e algumas pessoas aqui acharem que o caminho é outro. O seminário é para pensar soluções. Não existe uma coisa pronta, estamos no início do PPCerrado”, disse o secretário-executivo do MMA, João Paulo Capobianco.
A primeira fase do PPCerrado foi lançada em 2010 e executada até o ano seguinte. Nesse período, o desmatamento no bioma caiu 9%. A segunda e terceira fases aconteceram entre 2014 e 2019, tendo levado a uma queda de 42% na perda de vegetação nativa (de 10.900 km² em 2014 para 6.300 km² em 2019). No último ano, o plano foi paralisado por Bolsonaro. O que está sendo discutido agora é a 4ª fase da política.
Além do seminário técnico-científico, o MMA organiza para setembro uma audiência pública para discutir o problema com a sociedade.
A formatação final do novo PPCerrado está prevista para ser lançada em outubro próximo.
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