Pistoleiro condenado por assassinar o casal de extrativistas Zé Claudio e Maria fugiu da prisão, em Marabá. Em entrevista, a família denuncia ameaças. Indignação e revolta é pouco para definir o sentimento da família do casal de extrativistas José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, assassinado em maio de 2011, em Nova Ipixuna, sudeste do Pará, em uma covarde emboscada.
(Greenpeace / foto: Felipe Milanez)
Na semana passada, Lindonjonson Silva Rocha, pistoleiro condenado em 2013 a 42 anos de prisão pelo crime, fugiu da penitenciária Mariano Antunes, em Marabá, onde cumpria pena.
O casal de extrativistas lutava contra a grilagem e o roubo de madeira no assentamento em que vivia. Os movimentos sociais de Marabá divulgaram uma nota (leia aqui) condenando a fuga e classificando-a como um escândalo. Tudo indica que Lindonjonson teve a fuga facilitada: segundo a Justiça, ele só poderia progredir para o regime semiaberto em 2028, mas, mesmo assim, recebeu autorização da direção da penitenciária para frequentar a área do semiaberto, onde estava quando conseguiu fugir.
Na entrevista a seguir, Claudelice Santos, a irmã caçula de Zé Cláudio, que todos os anos organiza um ato de resistência em memória ao casal, condenou a fuga de Lindonson e disse que a família está ameaçada:
Greenpeace - O que você sentiu quando soube da fuga?
Claudelice Santos - Para mim e para a minha família foi como uma bomba. Fiquei sabendo por uma agente da CPT (Comissão Pastoral da Terra) que me mandou uma mensagem pedindo para ter calma, mas dizendo que havia a possibilidade de ele ter fugido. Isso foi mais ou menos duas horas depois que sentiram falta dele na penitenciária. Ela pediu para que eu acionasse toda a família para avisar para ter cuidado e ficarmos alertas. Logo em seguida tive que viajar e quando voltei, poucos dias depois, tive a confirmação de que ele realmente tinha fugido. Todo mundo ficou desesperado, o estado de saúde da minha mãe, diagnosticada com depressão por todo o trauma que ela passou, piorou, e nós simplesmente não sabemos o que vamos encontrar pela frente.
O sentimento é de impunidade total, de insegurança, de injustiça, muito medo. Parece que a Justiça quer que ele mate mais um de nós. Ele pode facilmente descobrir onde moramos, matar todo mundo e voltar para cadeia de novo, como se nada tivesse acontecido.
Greenpeace - Como você avalia os indícios de que a fuga tenha sido facilitada?
Claudelice Santos - É preciso punir os responsáveis que permitiram isso, afinal, como ele foi para um regime semiaberto sendo que não tinha esse direito? Com esse gesto colocaram a vida de muitas pessoas em risco. Por enquanto ele deve estar se escondendo, mas assim que sentir firmeza, vai começar a agir. Enquanto isso, nós não sabemos o que fazer e nem para onde ir, ele pode estar em qualquer lugar. Nossa situação é de desespero. Eu tenho certeza de que ele vai atrás da gente, vai querer se vingar. Ele dizia isso enquanto estava preso.
Greenpeace - Além da fuga do pistoleiro, o fazendeiro José Rodrigues, acusado de ser o mandante do crime, também está solto, apesar de ter a prisão decretada desde agosto de 2014*.
Claudelice Santos - Sim, enquanto um tem um mandado de prisão e a polícia não prende, o outro fugiu. Realmente não tem o que dizer. O mandante do crime não só continua solto, como continua circulando pelo assentamento, como se fosse normal, como se ele fosse um cidadão de bem. Foi decretado que ele deve aguardar o próximo julgamento preso, mas ele está na mesma terra onde expulsou as três famílias que moravam lá, onde queimou suas casas.
A denúncia já está feita, mas não adianta, a Justiça não está nem aí, é como se estivessem esperando que morresse mais gente. A situação é crítica, de extrema delicadeza, mas para as autoridades está tudo muito bom. A polícia diz que não encontra ele, mas, desde o ano passado nós denunciamos, com a CPT, a presença dele no assentamento, e ninguém faz nada. Ora dizem que não tem efetivo, ora dizem que não têm carro. Eu já cansei de avisar. Enquanto isso ele continua livre, e agora, com a fuga do pistoleiro, mais perigoso ainda.
*Em agosto de 2014, o Tribunal de Justiça de Belém anulou a decisão do Tribunal do Júri de Marabá, que havia absolvido o fazendeiro José Rodrigues, acusado de ser o mandante do assassinato de Zé Claudio e Maria. Na ocasião, foi decretada a prisão preventiva do réu, enquanto aguardava um novo julgamento, que deve ocorrer em 2016. A família exige que o novo julgamento ocorra em Belém (PA), para que não sofra influências externas, como aconteceu no julgamento de Marabá.
Greenpeace - A partir de agora, quais providências serão tomadas?
Claudelice Santos - A única coisa que nós podemos fazer para tentar nos proteger é continuar denunciando. Precisamos denunciar: tem mais um bandido solto e perigoso na sociedade. É um risco para a sociedade inteira, não só pra gente. Um pistoleiro perigoso como esse, solto, é capaz de qualquer coisa.
Direção da penitenciária autorizou o pistoleiro Lindonjonson a ir para área do semiaberto, porém ele só teria esse direito em 2028.
O pistoleiro Lindonjonson Silva Rocha, condenado a cumprir 42 anos de prisão em regime fechado, pelo assassinato do casal de extrativistas José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo Silva, fugiu da penitenciária Mariano Antunes de Marabá, onde cumprida a pena estabelecida em julgamento ocorrido em 5 de abril de 2013.
A fuga do pistoleiro é um escândalo! A direção da penitenciária, agindo de forma totalmente ilegal e irresponsável, autorizou o condenado a participar de atividades na ala reservada aos presos do regime semiaberto. Nessa ala, não há segurança reforçada e, no momento em que Lindonjonson empreendeu fuga, havia apenas um agente prisional, para fazer a segurança de vários detentos. Nenhum policial militar se encontrava no local.
O mais absurdo dessa história é que, meses antes, o juiz da 7ª Vara de Execução de Marabá, informou ao diretor da penitenciara, através de despacho assinado, que "não existia qualquer benefício a ser concedido ao preso", pois, ele só poderia progredir para o regime semiaberto em 2 de setembro de 2028. Mesmo assim, a direção do presídio autorizou o pistoleiro a ir à área do semiaberto, onde fugiu, no dia 15 do mês corrente.
Devido às constantes ameaças aos familiares do casal de extrativistas que ainda residem no interior do assentamento, meses atrás, o Ministério Público requereu ao juiz da Vara de Execução, que autorizasse a transferência de Lindonjonson para uma penitenciária de segurança máxima, localizada fora do Estado do Pará. Antes da decisão do Juiz, o pistoleiro fugiu.
O descaso da Segurança Pública do Estado do Pará em relação a esse caso é flagrante. José Rodrigues Moreira, acusado de ser o mandante do crime, está com prisão preventiva decretada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará, desde o dia 8 de agosto desse ano. José Rodrigues continua circulando regularmente pelo assentamento onde o casal foi assassinado, sem que, sua prisão seja cumprida pela Polícia Civil do Pará.
Não é a primeira vez que pistoleiros encontram facilidades para fugirem da penitenciária Maria Antunes. Em 14 de março de 2000, o pistoleiro Barreirito, condenado pelo assassinato do sindicalista Expedito Ribeiro, de Rio Maria, saiu pela porta a frente da penitenciária. Em 2010, o pistoleiro Valdir Vieira, que assassinou o sindicalista Soares da Costa filho, de Parauapebas, não teve dificuldades para fugir da mesma penitenciária, agora, foi a vez de Lindonjonson, condenado pelo assassinato dos ambientalistas José Claudio e Maria.
As sucessivas fugas deixam claro que a penitenciária Mariano Antunes não oferece qualquer condição para que assassinos de crimes de mando cumpram pena ali, devido ao elevado nível de corrupção de muitos dos responsáveis por aquela instituição. Esse estado de impunidade e de corrupção tem sido uma das principais causas da continuidade da violência no campo no Pará, principalmente nas regiões sul e sudeste, onde, apenas em 2015 ocorreram 20 assassinatos de trabalhadores e outros 30 estão ameaçadas de morte.
Marabá, 22 de novembro de 2015.
Assinam,
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará - FETAGRI;
Comissão Pastoral da Terra - Diocese de Marabá;
Familiares de José Claudio e Maria do Espírito Santo;
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nova Ipixuna;
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST.
Desconsiderando a tensão causada aos povos indígenas do Mato Grosso do Sul pela própria Assembleia Legislativa com a instalação da CPI do Cimi, o 1º secretário da casa, o deputado ruralista Zé Teixeira (DEM), reagiu de forma truculenta ao anúncio dos indígenas de ocupação do parlamento sul-mato-grossense depois de protesto iniciado na manhã desta quarta-feira, 25, por cerca de 150 Terena e Guarani e Kaiowá.
(CIMI)
Zé Teixeira afirmou, durante reunião com as lideranças indígenas, que caso seja mantida a decisão pela ocupação, ele pessoalmente entraria em contato com a Secretaria de Segurança Pública solicitando contingentes policiais para uma retirada à força. De acordo com as lideranças indígenas, a ocupação seguirá até que as reivindicações do grupo sejam atendidas. A polícia já chegou à Assembleia.
Nos corredores da Assembleia Legislativa, ouvindo assessores parlamentares, a reportagem apurou que não é da intenção do presidente da Casa Legislativa, deputado Júnior Mochi (PMDB) a expulsão forçada dos indígenas. Além disso, dizem os assessores ouvidos, o deputado Zé Teixeira não teria poder para exigir e conseguir a retirada à força. De qualquer forma, um coronel da Polícia Militar foi encarregado de negociar com os indígenas pelo fim da ocupação.
Na pauta de reivindicações levada ao deputado Zé Teixeira, representante da Presidência da Assembleia Legislativa, está o fim da CPI do Cimi. Os indígenas alegam que a Comissão carece de fatos determinados e, depois de quase uma dezena de oitivas, nenhuma prova foi levantada atestando que a entidade incita retomadas de terras. As lideranças reiteraram que os povos indígenas lutam conforme os direitos a eles reservados.
Por outro lado, os indígenas acreditam que a CPI do Genocídio, que terá sua primeira oitiva nesta quinta-feira, 26, é o espaço onde de fato se poderá discutir com fatos determinados as problemáticas envolvendo a questão indígena no estado. Para as lideranças, o mundo inteiro sabe que o que está acontecendo no Mato Grosso do Sul é o genocídio contra os povos indígenas.
“São suicídios, assassinatos, inclusive entre os próprios índios por conta do confinamento nas reservas, falta de perspectiva e aí entra o álcool e as drogas, paralisação das demarcações para termos nossa terra tradicional. Esses são os problemas. Não o Cimi. Então é na CPI do Genocídio que está a possibilidade de nós indígenas termos alguma esperança”, declara Paulino Terena.
O que é bastante comum de se ouvir na ocupação iniciada na manhã de hoje é o sentimento de que os indígenas, mais uma vez, estão sendo criminalizados pelo Poder Legislativo sul-mato-grossense. “Vê aí como é que é: a gente tudo vem pra cá e num tem uma resposta boa. Só falam em polícia, em não pode, em vai tirar a gente. Branco tem muito medo, essa é a verdade”, disse uma mulher indígena para um grupo de jovens.
Marçal Tupay’i: presente!
Cerca de 150 indígenas do povo Terena e Guarani e Kaiowá iniciaram um protesto na manhã desta quarta-feira, dia 25, na Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul, na capital Campo Grande, em memória dos 32 anos do assassinato do líder Marçal de Souza Tupã'i. A liderança foi executada no mesmo tekoha - lugar onde se é - em que Semião Vilhalva foi morto no último dia 29 de agosto: o Ñanderú Marangatú.
Em Ñanderú, nesta quarta, a memória de Marçal também será lembrada em encontro de rezadores Guarani e Kaiowá, além de reunião da principal organização política do povo, a Aty Guasu.
"O que a gente quer mesmo é mostrar que o legado de Marçal é a luta pelas nossas terras. Exigimos a demarcação dos territórios, como prega a Constituição, e o fim da CPI do Cimi, que se tornou um palanque de calúnias e acusações sem provas para criminalizar nossa luta e os nossos apoiadores", afirma Paulino Terena.
Mais cedo, 390 cruzes foram colocadas na entrada principal da Assembleia Legislativa do MS. Elas representam cada um dos indígenas assassinados nos últimos 12 anos. Logo após as cruzes terem sido organizadas, uma tempestade repentina se formou. Chove forte sobre campo Grande.
Para as lideranças indígenas, a CPI não irá provar que o Cimi incentiva as retomadas porque essa é uma decisão dos povos do MS: retornar para os territórios tradicionais de onde foram expulsos na história recente.
"Chega a ser um absurdo pensar que a gente não toma decisões sozinhos, que não temos nas costas todos esses anos de dor e sofrimento longe da nossa terra. Pra CPI do Cimi é mais fácil achar um bode expiatório do que encarar a realidade", afirmou recentemente Lindomar Terena.
O Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos criado em 2004 não tem estrutura mínima, agravando o risco de vida de lideranças em áreas de conflito, afirma órgão.
O Diário Oficial da União publicou, nesta quarta-feira, 18, a Portaria 623, que declara como terras da comunidade remanescente do Quilombo Rio dos Macacos, em Simões Filho (Grande Salvador), uma área de 301 hectares, dos quais somente 104 hectares foram destinados para titulação de posse.
(Jornal A Tarde)
Embora considerem a declaração uma grande vitória, moradores da comunidade pleiteiam a integração do rio ao território demarcado, a construção de duas vias alternativas para não terem que passar pela Vila Naval, no subúrbio, além da anulação do processo de despejo impetrado pela Marinha do Brasil.
Por nota, a Marinha, via Comando do 2º Distrito Naval, informou que a área destinada à comunidade será de 104 dos 301 hectares demarcados. Os outros 196 hectares permanecerão sob administração da Marinha, por serem de "interesse estratégico à defesa nacional".
Quanto ao pleito dos quilombolas, que querem a construção de um novo acesso, a Marinha informou que será necessária a implantação de uma nova via de ligação à área destinada à comunidade, já que houve a delimitação definitiva.
A respeito de alegadas abordagens violentas aos moradores por parte dos militares, a Marinha diz repudiar e investigar tais atos por meio de inquéritos policiais militares. Ainda, reitera atuar com o Governo Federal para encontrar uma solução célere, pacífica e socialmente justa para a questão.
Regularização
O artigo 2º da portaria determina o "prosseguimento dos autos administrativos para fins de regularização fundiária de duas glebas descontínuas que totalizam 104,8787 ha (cento e quatro hectares, oitenta e sete ares e oitenta e sete centiares)".
As terras são descontínuas porque o quilombo foi dividido em dois territórios, com base no Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), elaborado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), órgãos federais, Fundação Palmares e governo do estado.
Com a demarcação das terras, uma parte das 67 famílias que residem no local está em uma área de 86 hectares ao norte da barragem da Base Naval de Aratu e outra está assentada em seis hectares ao sul da vila. Um terreno com 12 hectares de extensão cedido pelo governo do estado, ao lado do terreno da Marinha, completa o território.
Por meio de nota, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) informou que a publicação no Diário Oficial é parte do cumprimento de mais uma das etapas para a regularização fundiária do território.
Sem informar prazo, o instituto alega que a área de 104 hectares será destinada à futura emissão de título coletivo em nome da comunidade.
Vitória
Foi com surpresa que a pescadora Rosimeire Silva, 37, recebeu a notícia sobre o sucesso da demarcação, antes mesmo de saber sobre a publicação no Diário Oficial. Agora, com a posse das terras, a quilombola vislumbra um futuro melhor para as 67 famílias da comunidade afrodescendente.
"Se a área oficial for desse tamanho mesmo, é uma grande vitória para a gente", emocionou-se, incrédula, ao ser informada por telefone, por volta das 8h30. "Principalmente para os mais velhos, dentre os quais muitos morreram na luta pela terra", acrescentou.
Desde 1970, quando a Marinha construiu a barragem para manutenção da Base Naval de Aratu, conta Rosimeire, a comunidade parou no tempo. A maior parte das casas é de barro com telhas de amianto, não há água encanada, energia elétrica ou esgotamento sanitário.
Semialfabetizada (apenas escreve o próprio nome), a mulher espera que o destino dela não se repita com os semelhantes, tanto no acesso à educação quanto à saúde. "A gente vive até hoje como escravo, sem direito de ir e vir. Toda vez que saímos, temos conflitos para entrar", desabafou.
A liberdade dos quilombolas depende da construção de vias independentes da Vila Naval, para que possam ter acesso ao mundo exterior. "Foi uma promessa feita pelo governo federal, em 2013. Já estamos quase no fim de 2015 e ainda esperamos", concluiu.
Conflitos com a Marinha tiveram início em 1970
Segundo o Incra, os conflitos começaram em 1970. A Marinha adquiriu terras com a desapropriação das fazendas Aratu e Meireles e com a doação da fazenda Macacos, pela prefeitura de Salvador, e deu início à construção de uma Base Naval no local.
Vivem no local 67 famílias descendentes de escravos, que permaneceram lá após a desativação de fazendas produtoras de cana-de-açúcar, há mais de 100 anos.
Em 2009, a Advocacia Geral da União (AGU) pediu a desocupação do local para atender às necessidades futuras da Marinha e, em 2012, a Defensoria Pública da União na Bahia (DPU-BA) pediu suspensão do processo.
No mesmo ano, os quilombolas, em parceria com organizações de defesa dos direitos humanos, produziram relatório com violações provocadas pela Marinha e enviaram à ONU.
No documento, eles afirmam que 50 famílias foram expulsas para construção da Vila Naval; práticas religiosas de matriz africana foram proibidas; e a mobilidade foi prejudicada. A Marinha nega as acusações.
Ataque ocorrido em 2007 resultou no assassinato do trabalhador rural Keno e no ferimento de outros três camponeses. Condenação da Syngenta é bem vista por movimentos sociais, em razão da dificuldade de responsabilizar empresas pelas violações de direitos que cometem.
(Terra de Direitos)
Empresa suíça produtora de transgênicos e agrotóxicos, a Syngenta Seeds foi judicialmente responsabilizada pelo assassinato do trabalhador rural Valmir Mota de Oliveira (conhecido como Ken), e pela tentativa de assassinato de Isabel do Nascimento de Souza. Os dois eram integrantes da Via Campesina e foram vítimas do ataque de milícia armada a mando da transnacional, em 2007.
A decisão – proferida no último dia 27 de outubro pelo juiz de direito Pedro Ivo Moreiro, da 1ª Vara Cível da Comarca de Cascavel – determina que a empresa indenize os familiares de Keno e a vítima Isabel pelos danos morais e materiais que causou.
A ação foi ajuizada no ano de 2010, como tentativa de obter respostas do Estado quanto à responsabilidade da Syngenta pelo ataque realizado por uma milícia armada privada ao acampamento Terra Livre, em Santa Tereza do Oeste (PR), em 2007. Na ocasião, cerca de 200 integrantes da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) o campo de experimento de transgênicos da transnacional, em protesto a realização de experimentos ilegais.
A decisão é comemorada por movimentos sociais, uma vez que a responsabilização de empresas por violações de direitos humanos é um desafio de ordem global. A exemplo disso, a Organização das Nações Unidas (ONU) debate o estabelecimento de um tratado internacional, que crie mecanismos de prevenção, reparação e responsabilização no tema de empresas e direitos humanos.
Em sua decisão, o juiz reconheceu que a “má escolha na terceirização da segurança, assim como o financiamento indireto das atividades ilícitas, constitui fato gerador de responsabilidade civil”. Além disso, reprovou os métodos usados pela Syngenta, ao afirmar que “por mais reprovável e ilegítima que fosse a invasão da propriedade, não seria o caso de agir por conta própria, impondo pena de morte aos ocupantes, mas sim de procurar os meios legais de solução do conflito, afinal, o ordenamento jurídico considera crime o exercício arbitrário das próprias razões”.
O Poder Judiciário também reconheceu que não houve confronto entre milicianos e integrantes da Via Campesina. “Chamar o ocorrido de confronto é fechar os olhos para a realidade, pois […] não há duvida de que o ocorrido, em verdade, foi um massacre travestido de reintegração de posse”, indica a decisão.
Questionada sobre a decisão, Isabel Nascimento dos Santos disse estar feliz, muito além da indenização financeira. Gravemente ferida durante o ataque idealizado pela Syngenta em 2007, a agricultora destaca o reconhecimento, por parte da Justiça, da culpa da empresa no caso. “Agora é levantar a cabeça, tentando esquecer um pouco do sofrimento que tivemos”, explica. A luta acaba? “Jamais! Vamos em frente, dando continuidade também ao trabalho do Keno”.
Advogado popular da Terra de Direitos que acompanhou o caso, Fernando Prioste aponta a importância da decisão. “Atualmente as empresas transnacionais têm grande liberdade para atuação transnacional, mas não há normas e nem mecanismos transnacionais para obrigar as empresas a respeitar direitos humanos e para responsabilizá-las em casos de violação. A responsabilização da Syngenta neste caso é exceção à regra”, explica.
Sobre o caso
No dia 21 de outubro de 2007, cerca de 40 pistoleiros da empresa de proteção privada NF Segurança atacaram o acampamento da Via Campesina, no campo de experimento de transgênicos da transnacional Syngenta, em Santa Tereza do Oeste (PR). O local havia sido reocupado por cerca de 150 integrantes da Via Campesina e do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) pela manhã.
Os ocupantes denunciavam a realização de experimentos ilegais com milho transgênico em zona de amortecimento do Parque Nacional do Iguaçu, prática vedada pela Lei de Biossegurança.
Os integrantes da Via Campesina também buscavam denunciar as empresas de biotecnologia que atuam de forma a impor um modelo de agricultura que gera danos ambientais – transgênicos e agrotóxicos inviabilizam a produção de alimentos saudáveis pelos camponeses, povos indígenas e povos e comunidades tradicionais, assim como a privatização de sementes se apropria de um patrimônio desses povos.
Uma milícia fortemente armada da NF Segurança invadiu o local, disparando tiros em direção às pessoas que ocupavam o espaço. Segundo informações da Via Campesina, a ação teria sido promovida pela Syngenta que utilizava serviços da NF Segurança, em conjunto com a sociedade Rural da Região Oeste (SRO), e o Movimento dos Produtores Rurais (MPR), ligado ao agronegócio.
Indícios apontam que a empresa de segurança seria de fachada, e que contratava seguranças de forma ilegal para as operações de ataque. Além de Keno, os atiradores balearam e espancaram Isabel e feriram outros três agricultores.
Detentora de 19% do mercado de agroquímica e terceira empresa com maior lucro na comercialização de sementes no mundo, atrás apenas da Monsanto e da Dupont, a Syngenta, junto a outras transnacionais, agrava o cenário de violência no campo com a imposição de um modelo industrial de agricultura baseado na monocultura, na super exploração do trabalhador, na degradação ambiental, na utilização de agrotóxicos e na apropriação privada de recursos naturais e genéticos.
Na área em que ocorreram os fatos atualmente funciona o Centro de Pesquisas em Agroecologia Valmir Mota de Oliveira, o “Keno”.