A repercussão desse assassinato deu a impressão que a violência de crimes praticados por motivos idênticos, se não fosse eliminada, pelo menos diminuiria. Os fatos posteriores vêm provando o contrário.
(Por Jacques Távora Alfonsin*)
Camponesas e camponeses de Anapu, no sul do Pará, certamente vão se reunir neste 12 de fevereiro, para lembrar a morte da freira Dorothy Stang, uma fiel e dedicada companheira delas/es, religiosa conhecida por sua coragem e disposição, assassinada em razão de sua luta em favor do povo pobre daquela região, da reforma agrária, e contra o desmatamento crescente que lá se verificava, promovido por latifundiários interessados, como em outros lugares do país, na expansão do plantio de soja, na conquista de espaço para o gado, em mineração e em vender madeira.
A repercussão nacional e internacional desse assassinato deu a impressão, como já ocorrera com o massacre de Eldorado do Carajás, sintomaticamente acontecido no mesmo Estado do Pará, que a violência de crimes praticados por motivos idênticos ao que matou Dorothy, se não fosse eliminada, pelo menos diminuiria.
Os fatos posteriores vêm provando o contrário, chamando a atenção até de órgãos da imprensa estrangeira como é o caso do Financial Times. Na sua edição de 10 de dezembro passado, abriu matéria sob a seguinte manchete: “Terras sem lei ameaçam compromisso climático brasileiro”.
É que estava em andamento naquela semana a COP 21, em Paris, encontro no qual o Brasil se comprometeu, segundo a mesma notícia, a acabar com o desmatamento ilegal, aqui, até 2030... O jornal manifestava pouco acreditar nisso (mesmo um prazo dessa extensão não ser nada pequeno, levando-se em conta a gravidade do problema) diante de mais um assassinato ocorrido então na mesma Anapu. Winslei Gonçalves Barbosa, de 23 anos, fora emboscado e morto:
“Uma bala está alojada em seu capacete, que rolou para o lado. Mas a polícia ainda não chegou e muito menos começou a buscas pelos seus assassinos. É mais um sinal da ausência de lei e da violência que afligem grande parte da Amazônia brasileira – problemas que têm um peso direto nas discussões globais que estão perto de um desfecho em Paris nesta semana”.
Sobre o trabalho da Irmã Dorothy, a notícia refere: “Tomar partido dos sem-terras foi parte do trabalho de Stang, cuja memória é homenageada em Anapu por uma procissão anual comemorativa através da cidade empoeirada, junto com o Fusca branco dela, muito bem cuidado. Stang defendeu dois grandes “projetos de desenvolvimento sustentável” em terras governamentais que os pecuaristas ocuparam: Esperança, onde Gonçalves Barbosa foi assassinado, e Virola-Jatobá. A ideia de Stang era permitir que os sem-terras fossem assentados em troca da preservação de grande parte da floresta. Um grupo de fazendeiros comandado por Regivaldo Pereira Galvão, conhecido como “Taradão”, encomendou seu assassinato para barrar a execução dos projetos. Galvão foi condenado pelo crime a 30 anos de prisão, mas continua solto após apresentar recurso e aguarda o resultado”.
LEIA TAMBÉM: NOTA PÚBLICA - Somos ameaçados, estamos morrendo
NOTA PÚBLICA - Assassinatos, ameaças e agressões: o dia a dia de Anapu (PA)
Uma crítica procedente de um jornal estrangeiro pode ser colocada sob reserva, mas se ela for comparada com dados da própria CPT, recolhidos pelo site Agência Brasil no início de janeiro passado, tem-se de reconhecer como bem fundadas as desconfianças ali manifestadas sobre o nosso Estado de Direito:
“O número de assassinatos decorrentes de conflitos no campo em 2015 foi o maior dos últimos 12 anos no Brasil, com 49 mortes registradas, a maior parte na Região Norte”. “A CPT ressalva, no entanto, que os dados são ainda parciais e podem vir a aumentar à medida que sejam consolidadas as informações provenientes do trabalho in loco”. “O número de mortes decorrentes de conflitos no campo no ano passado foi o maior desde 2003, quando foram contabilizados 73 assassinatos”. “O Norte do país é um barril de pólvora”, disse o coordenador da CPT em Pernambuco, Plácido Júnior, responsável pela compilação dos dados nacionais: “Além do avanço do agronegócio tradicional, acreditamos que o aumento das tensões no campo em 2015 tenha relação com maiores disputas por recursos como madeira e água, o prosseguimento de grandes empreendimentos de mineração e energia e a diminuição no número de assentamentos e demarcações.” “Dados da entidade mostram que de 1.115 casos de homicídio decorrentes de conflitos no campo registrados entre 1985 e 2014, 12 foram julgados”.
A convivência com uma realidade de tamanha injustiça não pode continuar anestesiando a nação como se toda ela só dissesse respeito às vítimas dos seus trágicos efeitos. O passado tem-nos mostrado quantas pessoas “de fora” vêm para cá, escandalizadas com isso e por motivos bem diferentes das grandes empresas transnacionais. Oferecem as suas próprias vidas em defesa da nossa terra e da nossa gente, como fez a Irmã Dorothy e muitas/os missionárias/os.
O Frei Henri Burin des Roziers, advogado da CPT em Xinguara, também no Pará, andava acompanhado de seguranças, como outras pessoas do clero e fora dele, ameaçado de morte como está. Em uma entrevista concedida à uma revista, anos passados, quando essa segurança praticamente lhe foi imposta, tão grande era o temor de se repetir o acontecido com a Irmã Dorothy, ele disse tudo o que precisa ser dito, a respeito da segurança e da paz a que têm direito as/os camponesas/os brasileiras. Por rejeitar o privilégio a ele conferido, por ser quem é, preferiria viver sem escolta alguma, num Estado garante de segurança para todas/os, fruto de uma convivência fraterna sobre terra, na qual a reforma agrária tivesse alcançado reparti-la de forma justa, não usurpada por poucos, em favor da reprodução da pobreza e em prejuízo da maioria.
* Jacques Távora Alfonsin é procurador aposentado do estado do Rio Grande do Sul e membro da ONG Acesso, Cidadania e Direitos Humanos.
Confira artigo de Jacques Távora Alfonsin sobre os desafios de mais um Fórum Social Mundial, que teve início hoje (19), em Porto Alegre (RS). Leia na íntegra:
Por Jacques Távora Alfonsin*
Recomeça em Porto Alegre nesta terceira semana de janeiro de 2016, mais uma reunião do Fórum Social Mundial. Sem o número de participantes e sem a cobertura midiática das primeiras, o sucesso dessa iniciativa popular, sob todos os aspectos urgente e necessária, como um válido contraponto ao que predomina em Davos, vem sendo avaliado como declinante, assim medido, exatamente, só por aquele número e aquela publicidade.
Tanto por quem apoia, inspira e é inspirado por essa experiência mundial, estando desanimado por isso, como por quem dela debocha como retrógrada e avessa a todo o “progresso” patrocinado pelo capital e pelo mercado, comemorando o fato como prova do seu fracasso, esse diagnóstico parece bem equivocado.
Se o Fórum social perdeu grande parte da sua motivação e do entusiasmo com que foi inaugurado há quinze anos atrás, isso se deveu muito mais, salvo melhor juízo, a quatro das suas principais características que, em vez de serem reputadas como defeitos, são virtudes capazes de serem renovadas a cada uma dessas reuniões.
A primeira pode ser vista como um simples efeito dos limites humanos daquelas boas prestações de serviço que o Fórum desencadeia. Toda a continuada presença de gente militante, em favor de causas de defesa de direitos humanos, como debatidas e planejadas lá, é sabidamente trabalhosa, sofrida, entrecortada de algumas vitórias e grandes derrotas, consequência histórica do extraordinário e bem superior poder econômico à ela contrário. O conhecido “cafard” das trincheiras, essa melancolia resultante desse permanente combate, por vezes frustrante, vem minando a força dessa militância, aliás já envelhecida em grande parte. Isso não lhe retira o mérito, mas ela não é de ferro e precisa se renovar todos os dias pois, como se sabe, a injustiça social não tira férias. O Fórum serve de nova oportunidade para isso.
A segunda, paradoxalmente, resultou de algumas metas sociais exitosas, apoiadas em reuniões passadas do Fórum, quando o empoderamento de movimentos sociais, unido a muitas outras organizações de defesa de direitos, fazendo pressão sobre os poderes públicos de muitos países, conseguiu diminuir os índices de miséria e pobreza em grande parte do mundo. Impôs até derrotas às conhecidas investidas norte americanas como a Nafta e a Alca para, na América Latina por exemplo, proteger melhor as economias locais. O problema reside agora numa visível hesitação de como proceder diante de uma crise econômica planetária, para enfrentamento da qual não basta a conservação do já conquistado, mas urge repensar as formas de se estabelecer no mundo todo um dos principais objetivos dos Fóruns passados: a conquista de uma economia efetivamente solidária.
A terceira pode derivar de uma constante histórica presente nas rebeldias populares. Quando elas alcançam o poder, seja o privado seja o público, elas preferem o estabelecimento da ordem e a conservação desta, até pela força, à continuidade do espírito que as motivou e do movimento que lhes deu vida. As leis e as instituições dela garantes passam a ser o principal, e a realidade social sobre as quais elas dominam passam a ser o secundário. Como essa realidade é cambiante e varia independentemente da lei e das instituições, o estabelecimento das leis e das novas instituições esquecem que aquela foi, justamente, a fonte dos movimentos populares rebeldes postos em defesa de mudança da antiga ordem. Em nome da chamada “governabilidade”, então, a antiga ordem retoma o seu poder de dominação, como se fosse coisa nova, libertária, nos moldes desejados pelo movimento. A lei e as instituições, cheias de regras, formulismos, casuísmos, ritos e outros devidos processos, retomam – se é que perderam algum dia – o seu poder de opressão e repressão, particularmente contra o povo pobre, vítima do capital. Nisso, o Brasil é um triste e lamentável exemplo. É de se esperar que o Fórum deste janeiro não se envergonhe de pautar e discutir essa infidelidade ético-política, imposta, não só a um dos seus principais objetivos, como a toda a nação eleitora do governo atual.
A quarta é o cenário todo das três primeiras. Para renovação eficaz dos seus objetivos, o Fórum social mundial há de se prevenir outra vez, como certamente fará relativamente à lei e suas instituições, contra uma tentação típica do capital que, em nome da liberdade, dá preferência à sua própria segurança, sacrificando a primeira em defesa da segunda. Com poder superior ao do Estado, invade o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, fazendo deles o refém “legal”, escravo dos seus interesses e privilégios, como se esses e somente esses possam valer como existentes e legítimos. Enrola ideologicamente a lei e as instituições públicas, fazendo inclusive das exceções presentes em políticas compensatórias, a regra da sua superioridade. Até em relação a essas, como acontece com a reforma agrária e a proteção do meio ambiente, manipula acomodações, concessões e licenças variadas, sem hesitar em compra-las, frequentemente… Quando não se impõe pelo poder jurídico, ultrapassa-o pelo político.
O Fórum Social Mundial tem consciência crítica muito clara disso. Se não pela sua experiência popular de militância por um conselho imbatível do próprio Jesus Cristo: “Ninguém prega retalho de pano novo em roupa velha; do contrário, o remendo arranca o novo pedaço da veste usada e torna-se pior o rasgão. E ninguém põe vinho novo em odres velhos; se o fizer, o vinho os arrebentará e perder-se-á juntamente com os odres, mas, para vinho novo, odres novos.” (evangelho de São Marcos, capítulo 2, versículos 21 e 22).
Ou, como dizia um velho militante das comunidades eclesiais de base, assíduas leitoras dessa inspiração radicalmente corajosa: não adianta trocar de maquinista, se o trem vai continuar andando nos mesmos trilhos.
* Procurador do Estado do Rio Grande do Sul (Aposentado). Mestre em Direito pela Unisinos. Professor de Direito Civil da Unisinos. Advogado e assessor jurídico de movimentos populares como o MST e ONGs ligadas aos direitos humanos: catadores e sem-teto, que defendem alimentação, moradia e ambiente saudável para o povo pobre. É coordenador da ONG "Acesso – Cidadania e Direitos Humanos", em Porto Alegre e integrante da RENAP. Publicou vários estudos sobre função social da propriedade e da posse, reforma agrária e solo urbano, assessoria jurídica popular e direitos humanos. Autor dos livros: "Das Legalidades Injustas às (I)Legalidades Justas: Estudos Sobre Direitos Humanos, Sua Defesa por Assessoria Jurídica Popular em Favor de Vítimas do Descumprimento da Função Social da Propriedade" pela editora Armazém Digital; "O Acesso à Terra como Conteúdo de Direitos Humanos Fundamentais à Alimentação e à Moradia" (Sergio Fabris, 2003).
Confira artigo do advogado Pedrosa, conselheiro da OAB no Maranhão, sobre o conflito que provocou a morte do líder rural Antônio Izídio, em Vergel (MA) na véspera do Natal, e a visível inoperância do Estado diante de mais essa morte anunciada.
1. A MORTE ANUNCIADA DE LEIS
Antônio Izídio, o popular Leis, foi assassinado no final do ano passado. Seu corpo foi encontrado no dia 24 de dezembro, após cinco dias de sumiço inexplicável.
No início do mês de novembro de 2014, Leis foi entrevistado pelo Promotor Agrário, Haroldo Brito. O informe do referido promotor foi o seguinte:
"Comunico que na última quinta-feira, dia 6 do corrente, estive na Sede das Promotorias de Codó, onde tomei por termo o depoimento do Senhor ANTÔNIO IZÍDIO PEREIRA DA SILVA, que estava acompanhado do Padre JOSÉ WASENSTEINER, onde coloquei o serviço de proteção à testemunhas e vítimas do PROVITA à sua disposição. Orientei-lhe, ainda, a evitar andar só, e sair a noite."
No sábado anterior à sua morte, um dia antes do seu desaparecimento, Leis conversou com o pároco de Codó, José Wasensteiner, numa missa no interior do município. Ele falava de extração ilegítima de madeira, em Vergel.
Leis teria sido recentemente ameaçado de morte por pessoas conhecidas por "Diel", que é filho de Dário, pessoa envolvida na morte do trabalhador rural Raimundo Pereira da Silva, conhecido por "Raimundo Chagas", e pelo sogro de "Diel", conhecido por "Chico Vaqueiro". Esses registros se encontram em poder das autoridades de Codó, Maranhão. Além desses, Chico Corda e Dario também eram inimigos de Leis.
2. VERGEL, TERRITÓRIO DA MORTE
Vergel é um povoado no município maranhense de Codó, habitado por oito famílias. Convive com um conflito fundiário desde o início da década de 1980. O proprietário originário era Aristides, que morreu no ano de 1950, deixando onze herdeiros, todos trabalhadores rurais, que viviam da terra. Massaranduba, o filho mais velho de Aristides, ficou com os documentos da terra e se achou no direito de mandar no lugar.
O conflito teve início quando alguns desses herdeiros venderam partes das referidas terras, sem o consentimento dos outros irmãos. Pessoas abastadas que adquiriram tais parcelas das terras ingressaram no conflito, tentando expulsar os demais herdeiros, queimando roças, destruindo residências e ameaçando os moradores.
Várias vezes madeireiros, a mando de tais pessoas, entraram na terra clandestinamente e retiraram cargas de valiosa madeira, existente nas terras de Vergel, sem autorização dos moradores.
Em 1999, José Pereira da Silva também sumiu e ninguém encontrou seu corpo ou teve notícia dele, logo após negociar sua posse de terra e depois se arrepender.
Dos herdeiros que não concordavam com a venda da terra, cinco foram mortos. O último foi Leis. Alfredo Ribeiro, morto em 2007, em plena luz do dia, na porta de sua casa, e Raimundo Chagas, assassinado em 14 de janeiro de 2010, eram também líderes da comunidade.
Em 2007, antes da morte de Alfredo, Manuel Bireca foi vítima de um atentado escapando com vida. O júri, em outubro de 2013, absolveu, dentre os acusados, Chico Corda. Bireca faleceu em 2014 por sequelas provocadas pelos tiros. No mesmo dia do atentado, Dona Terezinha, esposa de Manuel foi atingida também no braço, durante o tiroteio.
Além de tantas mortes que houve no local, ainda tiveram cerca de quatro tentativas de homicídios, as vítimas escapando por pouco. Por medo, a maioria dos herdeiros e seus filhos deixaram Vergel. Tudo isso ocorrendo sem que os mecanismos formais de responsabilização adotassem providências.
Vergel, antes de ser palco de uma disputa sucessória, era local de moradia de várias famílias de trabalhadores rurais. Isso justificaria uma intervenção fundiária urgente, o que impediria a ação de agentes externos.
3. A BUSCA EM VÃO POR JUSTIÇA
Leis estava ameaçado de morte. Comunicou tal fato às autoridades. Seu nome constou nos relatórios dos defensores de direitos humanos ameaçados e nos registros de ocorrência da delegacia de Codó. Era, como se diz, em alguns lugares do nordeste, "um cabra marcado para morrer".
Em função das ameaças, Leis passou alguns meses escondido, longe de Vergel. Seus animais (uma porca e cabras) chegaram a aparecer com as orelhas cortadas, como sinal claro que o dia estava próximo. Ele não quis a proteção ofertada porque não queria sair de Vergel. Queria que os processos andassem e a terra fosse liberta definitivamente.
Dentro de Vergel também morava o perigo. Um morador, conhecido por "Diel" também era apontado como envolvido nas violências. Adonias Martins, servidor público federal do IBAMA, tem interesse na expulsão das famílias por ter adquirido um pedaço das terras de Antônio Massaranduba.
No dia 11 de janeiro de 2013, dias antes da celebração de uma missa pelas vítimas da violência, a Capela da comunidade foi incendiada.
Em 2012, o Ministério Público Estadual formulou denúncia-crime contra Darlan Ferreira Guimarães, Francisco Silva Guimarães, vulgo "Chico Corda" e Francisco Sousa Silva, vulgo Chichico. Segundo a Instituição, os denunciados teriam assassinado a Raimundo Pereira da Silva, no dia, no dia 14 de janeiro de 2010. O filho de Raimundo, Carlos Daniel Pereira da Silva, o Dodô, presenciou o crime.
Em Vergel, quatro mortes já ocorreram nos últimos anos.
4. A INVESTIGAÇÃO
O corpo de Leis foi encontrado cerca de cinco dias após a morte. A polícia civil acredita que teria sido por alcoolismo, morte natural, portanto. Publicamos a foto para colocar em dúvida essa linha de investigação. Pedimos desculpas, mas não encontramos outra forma de fundamentar publicamente esse debate. (Devido à política de comunicação da CPT não iremos republicar a foto do corpo)
Olhar de leigo, mas nem tanto:
Leis não sairia para o mato vestido dessa forma e nem descalço. Seu rosto destruído revela intenção de dificultar a identificação do cadáver. A marca no pescoço revelando provável estrangulamento por laço, justificando a coloração enegrecida da cabeça.
A memória de Leis reclama ainda por justiça!
Confira artigo de Roberto Malvezzi, o Gogó, sobre a crise hídrica e o silêncio dos ruralistas e do setor patronal diante do progressivo acirramento dela com o modelo produtivo instalado pelo agronegócio brasileiro. Veja o artigo na íntegra:
Roberto Malvezzi*
Chama a atenção o silêncio tumular dos ruralistas diante da crise da água brasileira. Ela está vinculada ao desmatamento, a erosão da biodiversidade e a compactação dos solos. O ciclo das águas é uma teia de relações complexas que permite sua fluência e a existência da vida.
Havia um Código Florestal que defendia as áreas de florestas necessárias para preservar o ciclo das águas. Mas, ele não era obedecido. Como a desobediência dos ruralistas – e imobiliárias – eram crimes, então mudaram o código para que suas ações não fossem mais motivo de punição.
Hoje cientistas dizem que grande parte do ciclo das águas brasileiras tem origem na evapotranspiração da floresta Amazônica (Antônio Nobre), mas que depende do Cerrado para penetrar no solo e abastecer os aquíferos que sustentam grande parte da malha hídrica brasileira que se origina no Planalto Central (José Alves da UNIVASF e Altair Salles da PUC/Goiânia).
Ora, o setor ruralista está quebrando a dinâmica da floresta Amazônica e compactando o Cerrado pela força do desmatamento. O Cerrado não tem poder de regeneração.
Kátia Abreu disse que “desmatamos por uma das agriculturas mais produtivas” (UOL, 15/12/15). Portanto, assume que desmata, portanto, que quebra o ciclo de nossas águas.
Aqui no vale do São Francisco há uma guerra surda entre os vários setores da produção – principalmente irrigação e energia – pelo que resta de água no São Francisco. Entretanto, o São Francisco é um rio dependente do Cerrado. Sem os aquíferos do Cerrado, particularmente o Urucuia, não existe São Francisco.
Então, senadora, a equação não fecha. Sem água não há agricultura, mas sem vegetação não há água. O equilíbrio entre todos esses fatores que o agronegócio desconhece ou ignora. Mas, quem no mundo ruralista está disposto a pensar a atividade agrícola na sua complexidade de fatores e não de forma simplista em favor de uma economia imediatista?
Não há agricultura sustentável sem a permanência das florestas, sem a preservação dos solos e do ciclo das águas.
O silêncio ruralista sobre a crise da água não é casual.
*Assessor da CPT.
Em artigo, Jacques Távora Alfonsin, procurador aposentado do Rio Grande do Sul, aborda os conflitos no campo brasileiro – o número de pessoas assassinadas neste ano é o maior desde 2004, segundo a CPT - e a morosidade e falta de vontade por parte de órgãos governamentais, Executivo e Legislativo em resolver os conflitos. "Por que nunca se abre uma CPMI, por exemplo, para investigar quem esconde e conserva as causas estruturais desses crimes, sabidamente oriundas da péssima e muito injusta distribuição de terras do país [...]”, questiona Alfonsin. Confira:
Assim como quase acidentes anunciam a gravidade do porvir, desastres repetidos, como as barragens em Minas Gerais, revelam as farsas da tragédia. Vários acidentes graves nos últimos anos com mortes e destruição ambiental anunciaram o caso da Samarco/Vale/BHP, a maior catástrofe socioambiental deste tipo no Brasil e talvez do mundo.