Próximo ao Dia Mundial da Água, especialistas alertam, mais uma vez, para a preservação, por exemplo, do bioma Cerrado, que ocupa grande parte do território brasileiro e é berço de importantes nascentes. Neste contexto, a Unesco também faz um alerta: Mantendo os atuais padrões de consumo, em 2030 o mundo enfrentará um déficit no abastecimento de água de 40%. Acesse também os dados referentes aos Conflitos pela Água no Brasil, registrados e divulgados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) nessa semana.
Estudo de uma equipe de pesquisadores do Instituto Ambiental de Estocolmo, na Suécia, consegue mostrar, em detalhes, informações sobre os locais de produção de commodities e seus consumidores.
(Por Stefano Wrobleski - Mapas e texto do Blog do Infoamazonia)
Apesar de ser o segundo maior consumidor global da soja produzida no Brasil, a União Europeia têm um impacto ambiental proporcionalmente maior que a China, o principal importador do grão brasileiro. A conclusão é de uma equipe de pesquisadores do Instituto Ambiental de Estocolmo, na Suécia, que desenvolveu um modelo que aumenta a precisão de informações sobre os locais de produção de commodities e seus consumidores.
“A principal inovação deste método é que, até hoje, todos os modelos criados para conectar produção e consumo basearam-se somente em informações de trocas em nível nacional. Então, ao invés de usar somente uma base de dados, a de intercâmbio de bens, estamos conectando também as informações de produção, alfândega e trocas para rastrear toda a cadeia produtiva – do produtor, até o consumidor final”, explica Javier Godar, um dos especialistas responsáveis pelo modelo.
“Se você olhar para o nosso método, consegue perceber que estamos, na verdade, consumindo soja, carne ou o que for de distintas regiões [dentro do mesmo país]. E essas regiões têm diferentes valores. Então, você pode consumir soja de uma área sem floresta ou de uma área que foi desmatada há 200 anos em São Paulo. Dessa maneira, quando você está calculando seu impacto ambiental, em termos de carbono, biodiversidade ou mudanças de uso da terra, as regiões dentro de cada país têm diferentes pegadas ambientais”, conclui.
Soja no Brasil
Em um estudo de caso para apresentar o método, Javier e sua equipe analisaram, em nível municipal, a produção de soja brasileira destinada ao consumo interno e para exportação entre 2001 e 2011. Os pesquisadores verificaram que, apesar de ter havido uma queda do consumo total europeu, o impacto ambiental da commodity comprada pela União Europeia é proporcionalmente maior que o chinês. Isso é explicado pela diversificação das áreas das quais os europeus compram, que abrangem regiões florestadas do Cerrado.
“Em termos de impactos ambientais, o consumo europeu se deslocou geograficamente de um foco inicial nas regiões agrícolas longamente estabelecidas do sul do Brasil, em 2001, para as áreas do sul e oeste do Cerrado [em 2006] e, então, em direção também às fronteiras agrícolas florestais no norte do Cerrado e leste da Amazônia em 2011”, diz o artigo. Já o consumo total, que era de 16,14 milhões de toneladas (Mt) em 2001, subiu para 18,86Mt em 2006 e declinou para 13,34Mt em 2011.
A migração da soja consumida é significativa porque o bloco é o principal consumidor externo de empresas que aderiram à moratória da soja. O acordo – firmado em 2006 entre grandes produtores e exportadores, ONGs e governo e válido até 2016 – determinou o fim do comércio de soja cultivada em áreas de desmatamento recente na Amazônia.
Mas, se a restrição ao bioma amazônico contribuiu para a redução do desmatamento na região, o fato de o acordo não ter contemplado o restante do Brasil pode ter contribuído para o avanço da soja em áreas preservadas do Cerrado – a savana com maior diversidade biológica do mundo. Ao fazer o recorte pelas regiões do Brasil, Javier explica que “uma mensagem que estamos enviando é que você não pode olhar somente para um bioma em particular, como a Amazônia, e fazer a moratória da soja negligenciar o resto do país”.
A China, por outro lado, manteve o seu “conjunto de regiões fornecedoras relativamente estável [ao longo dos anos], com uma expansão nas imediações das áreas de fornecimento originais no sul do Brasil, mas pouco avanço no norte e centro do bioma amazônico e moderada expansão ao norte do Cerrado”. Ainda assim, o consumo chinês da soja brasileira, quase duas vezes maior que o europeu, subiu mais de seis vezes, de 3,87Mt em 2001 para 24,69Mt em 2011.
Outras aplicações do modelo
O modelo criado pelos pesquisadores do Instituto Ambiental de Estocolmo deve agora ser aplicado a outras commodities e a outras regiões do planeta. A equipe vai trabalhar pelos próximos dois anos com um matemático, que deve reunir diferentes dados para construir análises como a feita no caso da soja brasileira e cruzar as informações com bases sobre outros impactos sociais e ambientais, como trabalho escravo e nível de educação dos municípios produtores.
“A ideia é ajudar todos na cadeia produtiva – produtores, consumidores e empresas – a entender como eles podem ajudar a melhorar as condições socioambientais. Assim, as pessoas vão conseguir entender o que está acontecendo. Para o bem e para o mal”, afirma Javier.
O artigo está disponível em inglês na edição de abril de 2015 da revista científica “Ecological Economics”. Além de Javier Godar, fazem parte da equipe os pesquisadores Jorge Tizadoc, Martin Persson e Patrick Meyfroidtd.
O avanço do agronegócio em Moçambique destrói a principal fonte de alimentos do povo moçambicano e a põe nas mãos das empresas estrangeiras. Confira entrevista com o pesquisador Devlin Kuyek:
Em Nota, a CPT Minas Gerais repudia as várias formas de expulsões das comunidades de seus territórios tradicionais e, consequentemente, a destruição de seus modos de vida e a violação de seus direitos. Confira o documento na íntegra:
Há décadas a Susano Papel e Celulose e outras empresas vêm explorando área de chapada (Cerrado) para plantio de eucalipto, tais áreas há centenas de anos já eram utilizadas por comunidades quilombolas do município de Virgem da Lapa, no Vale do Jequitinhonha (MG). Os empreendimentos capitalistas (monocultivos de eucalipto) chegam com sua concepção autoritária de desenvolvimento e tem se apropriado dos territórios das comunidades e, consequentemente, tomado suas terras, principalmente, as chapadas de uso comum, desestruturando as condições materiais e imateriais de existência das comunidades tradicionais e/ou reestruturando-as a partir de outros “valores” trazidos pelos empreendedores, que negam a identidade cultural destes povos. Em muitos casos, devido ao fato dessas populações não terem o título das terras que ocupam, estas foram griladas por fazendeiros e empresas.
Esta estratégia de tomar terras de uso comum das comunidades ainda persiste. Atualmente existe um processo na justiça, movido pelo fazendeiro Tarcísio Fernando Felix, contra comunidades tradicionais de Virgem da Lapa, pedindo a reintegração de posse de uma área que faz parte de território tradicional que há muitos anos é usado pelas comunidades para extrativismo e solta de gado. O latifundiário quer dobrar sua área, atualmente de 475 hectares para mais 800 hectares, justificando revisão territorial, e para isso está entrando no território das comunidades quilombolas Capim Puba e Almas. As Comunidades Quilombolas clamam por justiça e pela garantia de seus direitos territoriais.
No dia 24 de fevereiro, a CPT Minas Gerais se reuniu com representantes das comunidades quilombolas Onça de Cima e Capim Puba, a EMATER, a Secretaria Municipal de Agricultura e a vereadora Adriana, todos de Virgem da Lapa, para discutir sobre possíveis soluções para que as famílias tenham seus direitos territoriais respeitados.
Depois da reunião, a Comissão Pastoral da Terra, juntamente com representantes das comunidades Capim Puba e Almas (Mauro e Kerlane), visitaram as respectivas comunidades, para conhecer e entender melhor as ameaças que vem sofrendo. A principal fonte de renda dessas famílias vem do extrativismo e de cultivo de culturas anuais. Com a expansão da monocultura do eucalipto, que já destruiu grande parte do bioma cerrado da região, muitas famílias foram obrigadas a migrar e as que resistiram estão ameaçadas.
Diante disso, a CPT Minas Gerais repudia as várias formas de expropriação dos territórios tradicionais das comunidades e, consequentemente, a destruição de seus modos de vida e a violação de seus direitos. Também denunciamos a destruição do Cerrado no Vale, que além de tirar o território das comunidades quilombolas, vem causando grandes impactos ambientais e diminuindo a biodiversidade regional.
“A ideologia mórbida do capitalismo rural detonou o bioma mais antigo no país - responsável por quase 20 mil nascentes - e isso impacta o Brasil inteiro”. Confira a matéria:
(Por Najar Tubino – Carta Maior)
O professor Altair Sales Barbosa, da PUC de Goiás, criador do Memorial do Cerrado, em Goiânia, nos últimos anos tem argumentado que o cerrado como bioma não existe mais, tamanha a destruição pelo avanço do agronegócio. Ele não é o único. Os mais otimistas consideram que em 2030 o cerrado não existirá mais, seguindo a média de extinção de dois milhões de hectares por ano. Ou seja, em 45 anos, contando do início da década de 1970 – O Programa de Desenvolvimento do Cerrado, chamado polo centro pelos militares, foi instituído em 1975-, a ideologia mórbida do capitalismo rural brasileiro detonou o bioma mais antigo no país, responsável por quase 20 mil nascentes, que abastecem oito das 12 regiões hidrográficas. As quatro mais importantes: do rio Paraná, do rio São Francisco e dos rios Araguaia e Tocantins.
Como diz o professor Altair Sales as águas que nascem no cerrado abastecem as grandes bacias do continente sul-americano, e todas elas nascem de aquíferos, sendo os três mais importantes o Guarani, o Bambuí e o Urucaia. O cerrado é conhecido pela pobreza de nutrientes no solo, embora tenha 12.365 espécies de plantas catalogadas, além do excesso de alumínio, o que aumenta o problema. Então são plantas que crescem retorcidas, as folhas parecem couro, a densidade é menor, embora o bioma em si tenha algumas divisões, desde regiões com gramíneas, arbustos até árvores de 30 metros.
Na rota da morbidez
Por ser o mais antigo e por ter problemas de nutrientes, também é, por ironia da história, o que mais limpa a atmosfera, porque as plantas captam mais gás carbônico. Porém, o cerrado é conhecido por ser uma floresta de cabeça para baixo, em função do intrincado de raízes e da profundidade que atingem. Justamente por isso, seguram a água da chuva, carregam o lençol freático e abastecem os aquíferos. Parece perfeito. Mas o cerrado entrou na rota da morbidez do agronegócio. Um detalhe importante: ele é plano na sua maioria, tinha um clima estável, com duas estações bem definidas – das águas e da seca. E o definitivo: suas terras eram desvalorizadas.
Hoje são mais de 50 milhões de hectares de pastagem, mais de 14 milhões de lavouras permanentes e milhares de carvoarias. Além da ocupação para produção de carne e grãos também queimaram o cerrado para abastecer os fornos das siderúrgicas de Minas, depois as guzeiras do Maranhão, da Bahia, do Pará. O Brasil é rico em ferro, mas ele precisa ser limpo das impurezas, então o ferro precisa ser queimado e transformado em ferro-gusa, que é o ingrediente do aço.
Oito das 12 regiões hidrográficas dependem do cerrado
Os escravos faziam isso na época do império, enterravam a madeira em covas e transformavam 100 toneladas em seis toneladas de carvão, fato descrito no livro de Warren Dean – A Ferro e a Fogo -, que conta a destruição da Mata Atlântica. Minas Gerais sempre centralizou a produção de ferro gusa no país, foi onde o cerrado sofreu o primeiro golpe. Dali para o Centro-Oeste, onde o boi já havia aberto o caminho foi um passo. Em seguida os pesquisadores descobriram as fórmulas para corrigir a acidez das terras e o resto a indústria química resolveu – fertilizantes e veneno.
Sem dúvida, o Brasil é o maior produtor de soja, o maior exportador e tem o maior rebanho comercial do mundo. Mais da metade disso é a contribuição do cerrado. Entretanto, a história não acaba aqui. Vejam o que informa o pesquisador da Embrapa, Jorge Inoch Werneck Lima:
“- O cerrado contribui para oito das 12 regiões hidrográficas do país, 70% da água que sai na foz do rio Tocantins-Araguaia vem do cerrado, 90% do que sai na foz do rio São Francisco também vem do cerrado e 50% do que sai na foz do rio Paraná, inclusive da água que chega a Itaipu. Mas 100% da água que abastece a represa de Três Marias (MG) são do cerrado, 90% da água que abastece a represa de Xingó e 70% da água que chega a Tucuruí são do cerrado”.
Cerrado transformado em carvão
A recarga dos aquíferos, que abastecem as bacias dos rios citados ocorre pelas bordas, nas áreas planas, onde a água pluvial infiltra e é absorvida cerca de 70% pelo sistema radicular da vegetação nativa, alimentando num primeiro momento o lençol freático e lentamente vai se armazenando nos lençóis mais subterrâneos, explica o pesquisador da Embrapa. Se não tem mato nativo, que foi transformado em carvão – a lenha do cerrado queima três dias dentro do forno - ou simplesmente queimou ao léu para dar lugar a pastagens africanas, a soja chinesa ou a cana europeia, o que acontecerá? Ora, dedução lógica, simples: não haverá água.
Pois justamente é essa a essência da morbidez do agronegócio: destruir para construir e depois, como diziam os colonizadores portugueses, azar de quem vem atrás. Uma citação do professor Altair Sales Barbosa:
“- Em média, 10 pequenos rios do cerrado desaparecem a cada ano. O rio que abastece a bacia vê seu volume diminuindo. Hoje, usa-se ainda a agricultura irrigada, porque há uma reserva nos aquíferos. Mas daqui a cinco anos não haverá mais essa pequena reserva. Estamos colhendo os frutos da ocupação desenfreada que o agronegócio impôs ao cerrado a partir dos anos 1970. Vai chegar um tempo, não muito distante, em que não haverá mais água para alimentar os rios. Então esses rios vão desaparecer. Por isso, falamos que o cerrado é um ambiente em extinção.”
O espectro da destruição continua
Claro, na década de 1970, os arautos da morbidez argumentavam dessa maneira, não tínhamos informação suficiente sobre a importância das matas ciliares, de preservar pelo menos 20% da vegetação nativa, como diz a lei, entre outras medidas simples e eficazes. Nada disso, basta ver as novas implicações do código florestal recentemente aprovado – restringir matas em córregos, afluentes, rios; diminuir áreas de preservação permanente ou compensar em outras regiões. Só para esclarecer: o cerrado tem apenas 2% em unidades de conservação e pouco mais de 2% de áreas indígenas.
Ainda não acabou. A fronteira agrícola chegou ao sul do Piauí e ao sul do Maranhão e ao oeste da Bahia, onde já tem mais de um milhão de hectares plantados com soja e algodão – no Piauí o número passa dos 600 mil hectares. Se somarmos as duas áreas de cerrado do Maranhão e Piauí são mais de 20 milhões de hectares. Os arautos da morbidez pretendem ocupar seis milhões. Qual a notícia no sul do Piauí? As carvoarias estão detonando as áreas de cerrado. Qual a informação mais atualizada sobre uso de carvão de mata nativa no Brasil? Pelo menos a metade da produção total é de mata nativa.
Um trecho do manifesto divulgado pela Associação da União das Aldeias Apinagés, do Tocantins, em dezembro de 2014:
“- Denunciamos a forma criminosa como as empresas estão chegando e avançando sobre as matas ciliares e nascentes, que correm dentro da terra Apinagé, com licenças ambientais liberadas pelo Instituto Natureza do Tocantins”.
Corrida por poços clandestinos
Última semana de fevereiro o IRPAA, de Juazeiro (BA) divulga um comunicado dizendo que algumas comunidades da região estão com problemas de falta de água para beber, que os caminhões pipa não estão atendendo a demanda. Juazeiro fica abaixo do lago de Sobradinho, o maior da América Latina e que está com pouco mais de 15% da sua capacidade. Água agora só para produção de energia elétrica.
E em São Paulo. O Aquífero Guarani abastece 80% dos municípios do estado. Com a realidade da crise hídrica, como dizem os arautos da morbidez urbana, fiz uma pesquisa sobre construção de poços artesianos. O Centro de Pesquisa de Águas Subterrâneas, da USP, dirigido pelo professor Reginaldo Bertolo realizou um levantamento entre as empresas construtoras, no final do ano passado. Diz ele:
“- A corrida para construção de poços profundos clandestinos é grave, tanto pela possibilidade de esgotamento dos aquíferos, quanto por causa dos riscos da qualidade da água extraída. Na região metropolitana foram 400 perfurações realizada pelas construtoras, o que aumenta em 43 milhões de litros/dia retirado dos aquíferos”.
Segundo o Departamento de Águas e Energia de São Paulo, que autoriza a construção de poços artesianos, são 27.312 cadastrados. Em Ribeirão Preto, por exemplo, já é proibido construir poço artesiano na área central da cidade, em consequência do rebaixamento do Aquífero Guarani. Consultei outra região – São José do Rio Preto -, também abastecida pelo aquífero. O Diário da WEB, jornal da cidade, apontava em dezembro passado que 88% dos poços da região são irregulares. Segundo a unidade do DAEE, de Rio Preto, dos 3,5 mil poços perfurados no município apenas 400 estão cadastrados.
No próximo dia 11 de setembro, o Dia Nacional do Cerrado decretado desde 2003, comprem velas, chorem e lamentem o fim do bioma mais antigo do país.
Em decisão unânime, os Desembargadores confirmaram que a empresa deve indenizar as vítimas, pela poluição provocada no bairro. “Hoje mostramos para essa empresa que ela tem o dever de reparar todo o dano que vem provocando no nosso bairro”, afirmou um morador atingido pela empresa. Confira:
(Fonte: Justiça nos Trilhos)
O Tribunal de Justiça de São Luís julgou na segunda-feira (23) os processos judiciais movidos por 21 famílias do bairro Piquiá de Baixo, em Açailândia-MA. As famílias reivindicam indenização por danos morais e materiais provocados pela empresa siderúrgica Gusa Nordeste. Em decisão unânime, os Desembargadores confirmaram que a empresa deve indenizar as vítimas, pela poluição provocada no bairro.
Os moradores alegam que diariamente a fábrica expele poluentes que prejudicam os moradores do entorno. Os poluentes provocam "dores de cabeça, dores de garganta, sinusite, coceira no corpo, alergias e calor excessivo". Denunciam também que a siderúrgica frequentemente expele um gás pelas chaminés do forno, causando "tonturas, náuseas, ardência nos olhos e dores de cabeça".
As 21 famílias mais próximas à empresa Gusa Nordeste declararam que "tem passado diariamente por perturbações de saúde provocadas pelos gases, fumaça e poeira expelidos no ar pelas chaminés do forno”.
Em dezembro de 2013, o juiz da 2ª Vara Judicial de Açailândia, Dr. André Bógea dos Santos já tinha condenado a empresa por danos morais e materiais, no intuito de “punir a conduta e desestimulá-la a práticas lesivas e ilícitas”.
Uma carta da Igreja Católica do Maranhão, assinada pelo pároco de Piquiá e pelos bispos Dom Gilberto Pastana, presidente do Regional Nordeste 5 da CNBB, e Dom José Belisário da Silva, vice-presidente da CNBB, informou os desembargadores da preocupação da igreja quanto ao sofrimento dos mais de mil moradores do bairro Piquiá de Baixo.
A carta lembrou as diversas iniciativas realizadas em apoio a essa causa. Entre elas, a XI Romaria da Terra e das Águas, que reuniu no barro mais de dez mil pessoas, vindas das diversas comunidades católicas do Maranhão, em busca de um modelo de desenvolvimento mais respeitoso dos pobres e da criação.
A Igreja afirma que “uma decisão de condenação das atividades poluidoras, longe de comprometer o potencial produtivo do Maranhão, viria a incentivar um processo virtuoso de reconversão industrial conforme novos paradigmas de efetiva sustentabilidade, dignidade e modernidade do modelo econômico maranhense”.
A decisão judicial
O julgamento em segunda instância ocorrido na última segunda (23) foi conduzido pelos Desembargadores da 5ª Câmara Cível do TJ-MA, Ricardo Tadeu Bugarin Duailibe (Relator), Maria das Graças de Castro Mendes e Raimundo José Barros De Sousa. Moradores de Piquiá de Baixo, um representante da Igreja Católica do Maranhão e a rede Justiça nos Trilhos acompanharam o debate e os votos dos desembargadores.
Ao anunciar o voto, o Desembargador Relator valorizou a perícia judicial realizada pelo biólogo Dr. Ulisses Brigatto Albino em 2007, considerando que as provas apresentadas durante o processo foram suficientes para comprovar a poluição do local e os danos aos moradores.
“A tese do Desembargador, confirmada pelos dois colegas, baseou-se no conceito de responsabilidade objetiva da siderúrgica. A atividade desempenhada por uma empresa desse tipo implica, por si, riscos tanto ao meio ambiente como a terceiros. Quando houver um fato danoso, nesse caso a poluição, há o dever de reparar, sem necessidade de se comprovar a culpa. O princípio do ‘poluidor-pagador’, por outro lado, define que todo dano decorrente de poluição, mesmo se dentro dos parâmetros tolerados pelas regras ambientais, deve ser reparado”, explicou Danilo Chammas, advogado da rede Justiça nos Trilhos.
A decisão dos desembargadores confirmou a sentença do juiz de Açailândia e condenou a empresa ao pagamento de danos morais pelo valor de R$ 42.000,00 para cada família denunciante, no exato limite do que foi pedido por eles quando deram entrada na ação, em 2005. Esse valor deverá ser atualizado pela incidência de juros e correção monetária.
Quanto aos danos materiais, a decisão inicial indicava que a desvalorização do imóvel das famílias vítimas de poluição foi intensa a tal ponto que importou na perda da utilidade do bem. O Tribunal de Justiça manteve a posição da 2ª Vara de Açailândia, confirmando que esse valor deverá ser calculado e, também, indenizado para cada família.
Para o morador Welen Pereira, que presenciou o julgamento, essa foi uma data muito importante para a comunidade. “Hoje mostramos para essa empresa que ela tem o dever de reparar todo o dano que vem provocando no nosso bairro”, declarou Pereira.