A Amazônia perdeu 9.762 quilômetros quadrados entre 1º de agosto de 2018 e 31 de junho de 2019, uma área equivalente a 8 vezes à área da cidade do Rio de Janeiro. A cifra representa uma alta de 29,5% no desmatamento, em relação ao ano anterior, a maior alta desde 2008 e a terceira maior alta percentual da devastação na história, perdendo apenas para 1995 (95%) e 1998 (31%).
Por Cristiane Prizibisczki - O Eco
Imagem: Thomas Bauer / CPT Bahia
Os números foram anunciados pelo governo nesta segunda-feira (18), em coletiva de imprensa na sede do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), órgão responsável pela medição.
A taxa ficou ao menos 1.500 km² acima da tendência de aumento do desmatamento que vinha sendo observada desde 2012. Segundo pesquisadores do INPE, se a taxa seguisse a tendência dos últimos anos, de aumento de 11,4%, o número seria 8.278 km². No período de medição anterior, entre agosto de 2017 e junho de 2018, o corte raso da vegetação na Amazônia foi de 7.536 km².
Entre os estados que mais desmataram, estão: Pará, com 3.862 km² (39,56%), Mato Grosso, com 1.685 km² (17,26%), Amazonas, com 1.421 km² (14,56%), e Rondônia, com 1.245 km² (12,75%). Juntos, os quatro estados somaram 8.213 km² de desmatamento, o que representa cerca de 84% do total.
A partir de 2000, aumentos dessa grandeza foram registrados em apenas dois anos: em 2004 e 2008. Em ambas as ocasiões, o governo baixou medidas duras para conter o desmatamento, como a criação do Deter, desenvolvido como um sistema de alerta para dar suporte à fiscalização, e a criação do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), em 2004, e a restrição de crédito rural a municípios que mais desmatam, em 2008, por exemplo.
Os quatro estados que mais perderam floresta somaram, juntos, 8.213 km² de área desmatada, o que representa cerca de 84% do total.
Crédito gráfico: Reprodução / O Eco
Diferentemente do que aconteceu nesses anos de alta e em outros em que foi registrada elevação na taxa, os ministros presentes na coletiva de imprensa desta segunda-feira, Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e Marcos Pontes, de Ciência e Tecnologia, não apresentaram medidas a serem tomadas para reverter a situação. Segundo Salles, as ações serão discutidas na próxima quarta-feira (20), em reunião dos ministros com os nove governadores dos Estados Amazônicos, a ser realizada em Brasília.
A explosão dos números do desmatamento registrados pelo Deter a partir de junho deste ano fez o presidente Jair Bolsonaro chamar o Inpe de “mentiroso” e levou à demissão do então diretor do INPE, Ricardo Galvão. Quem assumiu foi o militar Darcton Damião, que atualmente comanda uma reestruturação no Instituto, a pedido do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTIC).
Prodes X Deter
O número anunciado nesta segunda-feira é uma estimativa do sistema Prodes, que uma vez por ano informa a taxa oficial do desmatamento (medida de agosto de um ano a julho do ano seguinte, meses em que a visibilidade na região é melhor). Em maio do ano que vem, ele será ajustado para dar a taxa final, que pode ser ainda maior que a estimativa.
Havia uma grande expectativa sobre o número divulgado hoje, já que o Deter havia indicado uma alta de quase 50% no desmatamento do período, na comparação com os 12 meses anteriores.
Desde maio deste ano, e mais marcadamente a partir de junho, o sistema Deter tem mostrado uma alta forte mês a mês. Os meses de julho, agosto e setembro tiveram altas recordes sucessivas – 278%, 233% e 95%, respectivamente. Neste período de 2019, todos os meses foram mais altos que toda a série história do atual Sistema Deter, iniciada em 2015: 2.255 km² (julho), 1.702 km² (agosto) e 1.447 km² (setembro).
Portanto, apesar do governo repetidamente atribuir a alta do desmatamento às políticas dos governos anteriores, a série 2019-2020, iniciada em agosto e que “pertence” integralmente ao governo atual, indica uma explosão nos números. Apenas entre agosto e outubro, o número de alertas do Deter soma 3.704,5 km², o que representa cerca de 50% de tudo que se perdeu em 12 meses da série 2017-2018.
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Desmatamento X Queimadas
Na última sexta-feira (15) uma análise publicada por cientistas brasileiros e britânicos no periódico Global Change Biology, que buscou explicar a crise das queimadas registradas no país este ano, já havia indicado que a taxa do desmatamento na Amazônia poderia ultrapassar os 10 mil km. Segundo Erika Berenguer, carioca filiada às universidades de Lancaster e Oxford e coautora do trabalho, esta diferença pode ser devido à cobertura de nuvens na região.
O grupo, liderado pelo ecólogo britânico Jos Barlow, da Universidade de Lancaster, fez uma análise das queimadas deste ano a fim de avaliar as alegações do governo de que o número de focos em 2019 era “normal” e estava “abaixo da média histórica”. A resposta é não: a quantidade de queimadas em agosto foi três vezes maior do que no ano anterior e a mais alta desde 2010.
“De janeiro a agosto deste ano a gente viu quase 47 mil focos de incêndio. A última vez que vimos isso foi em 2010, só que em 2010 houve uma seca extrema em grande parte da Amazônia, o que não é o caso em 2019”, explica a também ecóloga Erika Berenguer,
Como outras análises já haviam mostrado, o grupo de Barlow afirma que a quantidade incomum de queimadas está diretamente relacionada a uma elevação igualmente incomum na taxa de desmatamento em 2019. No mês seguinte, mostrou que esse desmatamento ocorria sobretudo em propriedades privadas – um sinal de que fazendeiros estão se sentindo à vontade para desmatar no governo Bolsonaro.