COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Indígenas da área em que Paulino Guajajara foi assassinado, em novembro do 2019, relatam casos de violência e abandono.

Texto e imagens por Yndara Vasques - Brasil de Fato

A aldeia Juçaral, na Terra Indígena (TI) Arariboia, no Maranhão, recebeu a visita de deputados e senadores da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas na última sexta-feira (10). Foram quatro horas de depoimentos denunciando casos de perseguição e violência e a falta de políticas públicas de acesso à saúde, ao transporte e à educação. Nesta área, foi assassinado Paulino Guajajara, em novembro do ano passado.

A TI Arariboia reúne cerca de 12 mil indígenas da etnia Guajajara em 149 aldeias. Durante a audiência, 15 caciques relataram à comitiva casos do que consideram ser a principal ameaça ao seu território: a invasão para a retirada de madeira.

A área de 415 mil hectares convive com invasões constantes. De acordo com o Instituto Socioambiental (ISA), desde setembro de 2018, foram contabilizados 4,8 mil alertas de exploração ilegal de madeira e a abertura de mais de 1,2 mil quilômetros de estradas – os ramais – dentro do território. 

“É importante garantir o nosso território. Sem essa garantia, não podemos expressar nossa cultura, nossos saberes”, afirmou o cacique Zezé Santos Guajajara, da aldeia Juçaral. Ele também expressou preocupação com a forma como o atual contexto político do país tem dificultado ainda mais a luta pelo território.

As mulheres Guajajara pediram aos parlamentares medidas em relação à segurança do território, como o apoio do Estado à atuação dos Guardiões da Floresta. Iraci Guajajara, mãe de um dos guardiões que sobreviveu ao ataque que matou Paulino Guajajara, destacou, durante audiência, a necessidade de retirada dos brancos do território indígena.

Já o representante dos Guardiões da Floresta e da Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão (Coapima), Silvio Guajajara, pediu aos parlamentares investimentos em equipamentos de segurança para ajudar o trabalho dos guardiões.

Criado em 2012 para proteção das Terras Indígenas contra as invasões, os Guardiões da Floresta reúnem 135 indígenas no estado do Maranhão. Até hoje, pelo menos três guardiões foram mortos em conflitos com madeireiros ilegais. O último deles – Paulino Guajajara – foi assassinado em novembro na TI Arariboia.

Criminalização

Os desdobramentos da investigação sobre o assassinato de Paulino também geraram revolta dos Guajajara que se expressaram durante a audiência. Os indígenas denunciaram o que consideram ser mais uma tentativa de criminalização da luta em defesa de seus territórios.

Eles se referiram ao inquérito finalizado pela Polícia Federal (PF), que afirmou que Paulino teria sido morto em uma troca de tiros após um suposto roubo de uma moto de não indígenas.

Segundo os Guajajara, ao descartar a versão do assassinato em uma emboscada armada por madeireiros, a PF desconsidera 40 anos de invasões e conflitos pelo território. Nessa segunda-feira (13), porém, o inquérito foi devolvido pelo Ministério Público Federal, que alegou que o documento estava incompleto.

No inquérito devolvido, a PF também havia indiciado o guardião Laércio Guajajara, um dos sobreviventes da ação que vitimou Paulino. Ele foi acusado de furto, porte ilegal de arma e pelo dano que os guardiões teriam causado às motocicletas que apreenderam durante o trabalho de vigilância.

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Duas pessoas foram esquartejadas na Terra Indígena Araribóia (MA)

Nota do Cimi sobre assassinatos de indígenas Guajajara, no Maranhão, e Tuiuca, no Amazonas

“Se for para morrer, eu vou morrer pela nossa mãe, pela nossa terra que os anciões deixaram, e nunca correr em momento algum”, asseverou a mãe de Laércio, Iraci Guajajara ao explicar aos visitantes “o sentimento que move os Guardiões da Floresta pela defesa do território”. Laércio Guajajara integra hoje o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos do governo federal.

Presente na audiência, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Maranhão, Rafael Silva, considerou que “todas as investigações policiais, realizadas pela Polícia Federal, em que os indígenas são vítimas, acabam por colocar os indígenas de alguma forma como criminosos”.

O defensor público da União Yuri Costa, que atua na defesa de Laércio, ressaltou que o caso não pode ser tratado como um crime comum, mas como a defesa do território pelos povos indígenas. “A autoridade policial deixou de levar em consideração aquilo que seria o principal: o conflito que envolve a cultura indígena. O assassinato é mais um capítulo desse conflito.”

Os guajajara denunciaram, ainda, que as investigações ouviram pessoas que não estavam no local do crime e que esses depoimentos teriam sido utilizados contra os indígenas.

“É necessário que seja realizada uma análise dos últimos cinco anos dos casos emblemáticos em que indígenas foram vítimas de violências e como foi realizada a investigação da Polícia Federal”, afirmou Gilderlan Rodrigues, coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no Maranhão. A proposta foi apresentada como encaminhamento para a frente parlamentar presente na reunião.

A posição dos parlamentares

A deputada federal e advogada Joênia Wapichana, primeira mulher indígena a ser eleita para a Câmara Deputados, salientou que a impunidade é um fator que incentiva a violência contra os povos e as comunidades tradicionais. “É necessário fortalecer os mecanismos de segurança junto ao povo Guajajara para que garantam seu território”, disse.

“Nosso objetivo é combater a impunidade. É inaceitável e inadmissível que os nossos parentes estejam sendo dizimados. Tão grave quanto isso é deixar os autores dessas barbaridades fiquem sem nenhuma punição”, complementou.

O deputado federal Nilto Tatto (PT-SP) informou que o relatório da diligência da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas será encaminhado para as comissões do Meio Ambiente e de Direitos Humanos e ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O objetivo é exigir a apuração dos assassinatos que ocorreram no território Guajajara. Ele comprometeu-se também em “aprimorar, do ponto de vista da legislação, mecanismos que assegurem os direitos expressos na Constituição Federal no que se refere ao povo indígena”.

Edição: Rodrigo Chagas

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