A Fundação Right Livelihood e a Survival International expressaram séria preocupação com a segurança dos povos indígenas no Brasil em uma carta enviada ao ministro da Justiça e Segurança Pública do Brasil, Sérgio Moro, na quinta-feira (12). A carta foi assinada por 36 ganhadores do prêmio Right Livelihood, também conhecido como 'Prêmio Nobel Alternativo', incluindo Greta Thunberg (Suécia), Vandana Shiva (Índia), Nnimmo Bassey (Nigéria), David Suzuki (Canadá) e Erwin Kraütler, CPT e MST (Brasil).
Texto: RLA / Tradução: Mário Manzi / Foto: Amy Au
Na carta, a Fundação Right Livelihood e a Survival International condenam as violações flagrantes dos direitos humanos que continuam sem decréscimo contra os povos indígenas e expressam profunda preocupação com a direção tomada pelo governo do presidente brasileiro Jair Bolsonaro.
Fundação Right Livelihood Award emite Nota sobre as invasões à sede da CPT Acre
Em particular, a carta alerta para ameaças crescentes à vida dos líderes indígenas, especialmente o Laureado Davi Kopenawa Yanomami, vencedor do prêmio Right Livelihood Award 2019. As organizações também expressam preocupação com a nomeação de Ricardo Lopes Dias como chefe do departamento de tribos isoladas e recentemente contatadas pela FUNAI, cujas visões fundamentalistas representam uma grave ameaça à política histórica do Brasil de não forçar o contato com tribos isoladas.
Davi Kopenawa divide Nobel Alternativo com Greta Thunberg
"Sem a floresta, florestas protegidas, meu povo não pode sobreviver", disse Davi. “Nosso povo cuida da floresta, pessoas de outros países devem garantir a proteção do meio ambiente e do meu povo. Mas ainda para pessoas isoladas, vocês tem o poder de confrontar governos, usar esse poder para combater as pessoas que estão nos prejudicando. ”
Há 28 anos, MST e CPT ganhavam Prêmio Nobel Alternativo na Suécia
A carta, em inglês, pode ser acessada AQUI.
Leia a carta na íntegra:
À atenção do Ministro da Justiça e Segurança Pública do Brasil, Sérgio Moro
Honorável ministro da Justiça e Segurança Pública,
Nós, Right Livelihood Foundation e Survival International, em conjunto com os laureados do prêmio Right Livelihood Award, expressamos nossas profundas preocupações com a segurança dos povos indígenas no Brasil. Muitos eventos chegaram ao nosso conhecimento em relação a perseguições e violências enfrentadas por defensores dos direitos humanos e do meio ambiente no país.
Em novembro de 2019, voluntários no estado do Pará foram perseguidos politicamente, e em flagrante, por Polícia e Judiciário devido ao trabalho na proteção da floresta, contra incêndios criminais na região de Alter do Chão.
Ainda no Pará, uma líder Munduruku teve sua casa invadida e roubada após denunciar mineração ilegal e os impactos de barragens hidroelétricas no território Munduruku. No Maranhão, no final de 2019, o mais preocupante é que três líderes indígenas Guajajara foram cruelmente assassinados por nenhuma outra razão além de proteger suas terras de invasões, extração ilegal de madeira e desmatamento. As estatísticas mostram que 2019 foi o ano mais letal para os líderes indígenas em uma década.
Também observamos com alarme a nomeação de Ricardo Lopes Dias como chefe do departamento de tribos isoladas e recentemente contatadas pela Funai. Seu passado evangélico suscita sérias preocupações sobre a segurança de tribos isoladas contra interferências externas, além da derrubada da política histórica do Brasil de não forçar o contato com tribos isoladas.
Em 2019, o prêmio Right Livelihood Award foi concedido a Davi Kopenawa Yanomami e Hutukara Associação Yanomami "pela determinação corajosa em proteger as florestas e a biodiversidade da Amazônia, e as terras e a cultura de seus povos indígenas". Davi denuncia atividades ilegais de mineração no território Yanomami há décadas, no entanto, a situação que seu povo está enfrentando é mais terrível do que nunca.
Em seu discurso ao receber o prêmio, Davi falou de como ele e seus colegas são gravemente ameaçados localmente em retaliação por seu admirável compromisso com os direitos dos povos indígenas. Tornou-se claro que a tensão está aumentando em seu estado natal, Roraima, alimentada pelos discursos anti-indígenas de políticos e pelas quadrilhas criminosas de mineração que operam no estado, em um ambiente de impunidade.
Instamos as autoridades brasileiras, em particular o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos e a Fundação Nacional do Índio (Funai), a cumprir urgentemente suas responsabilidades para garantir a devida proteção aos defensores dos direitos humanos e do meio ambiente, em relação para a boa aplicação da lei, antes que mais vidas inocentes sejam perdidas.
Em particular, solicitamos que usem seus bons escritórios para garantir que:
- O governo brasileiro tome todas as medidas institucionais necessárias para garantir a segurança total de Davi Kopenawa Yanomami, como líder indígena e defensor dos direitos humanos sob séria ameaça, bem como outros diretores e funcionários de Hutukara;
- As autoridades brasileiras ajam para remover e processar todos os garimpeiros ilegais e que protejam efetivamente o território Yanomami demarcado contra invasões, especialmente aquelas relacionadas à mineração e ao desmatamento ilegais, com o devido respeito à lei brasileira e à Constituição;
- Medidas urgentes sejam tomadas para proteger os Yanomami isolados, na região da Serra da Estrutura, dos garimpeiros que operam ilegalmente perto de sua comunidade, incluindo que seja reconstruído e equipado o posto de proteção da Funai, fechado em 2017;
- Os direitos dos povos indígenas, especialmente aqueles isolados, sejam respeitados pela demarcação de seus territórios consagrados na Constituição e que seja mantido o princípio do “não contato”.
Atenciosamente,
Ole von Uexkull,
Diretor Executivo - Right Livelihood Foundation
Stephen Corry
Diretor - Survival International
Signatários laureados Right Livelihood Award (RLA):
- Angie Zelter/Trident Ploughshares, Reino Unido, RLA 2001
- Juan Pablo Orrego, Chile, RLA 1998
- Paul F. Walker, EUA, RLA 2013
- Anwar Fazal, Malásia, RLA 1982
- Maude Barlow, Canadá, RLA 2005
- Sima Samar, Afeganistão, RLA 2012
- András Biró, Hungria, RLA 1995
- Theo van Boven, Países Baixos, RLA 1985
- Comissão Pastoral da Terra - CPT, Brasil, RLA 1991
- Dipal Barua/Grameen Shakti, Bangladesh, RLA 2007
- Erwin Kraütler, Brasil, RLA 2010
- Tony Rinaudo, Austrália, RLA 2018
- David Suzuki, Canadá, RLA 2009
- Helen Mack Chang, Guatemala, RLA 1992
- Swami Agnivesh, Índia, RLA Laureado 2004
- GRAIN, Internacional, RLA 2011
- Jacqueline Moudeina, Chade, RLA 2011
- Dr. Sudarshan Hanumappa, Índia, RLA 1994
- Dr. Ruchama Marton/Physicians for Human Rights-Israel, Israel, RLA 2010
- Aminatou Haidar, Saara Ocidental, RLA 2019
- Raúl Montenegro, Argentina, RLA 2004
- Festival Internacional de Poesía de Medellín, Colômbia, RLA 2006
- Bianca Jagger, Nicarágua, RLA 2004
- Walden Bello, Filipinas, RLA 2003
- International Baby Food Action Network (IBFAN), Internacional, RLA 1998
- Yetnebersh Nigussie, Etiópia, RLA 2017
- Nnimmo Bassey, Nigéria, RLA 2010
- Vandana Shiva, Índia, RLA 1993
- Seikatsu Club Consumers’ Cooperative, Japão, RLA 1989
- Colin Gonsalves, Índia, RLA 2017
- Suciwati (Legacy holder of Munir), Indonésia, RLA 2000
- Neshan Gunasekera (Legacy holder of Christopher Weeramantry), Sri Lanka, RLA 2007
- Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Brasil, RLA 1991
- Citizens’ Nuclear Information Center, Japão, RLA 1997
- Mona Lenzen Abouleish & Andreas Lenzen, SEKEM, Egito, RLA 2003
- Greta Thunberg, Suécia, RLA 2019