Somos milhões de Margaridas, mulheres lutadoras que fazem brotar nos campos, florestas e águas de todo o Brasil as formas de resistência, em defesa de um Brasil democrático, soberano e livre das opressões capitalistas, sexistas, racistas e de gênero.
Somos as que marcham, fazendo a luta feminista e agroecológica, em defesa de uma sociedade justa, livre de desigualdades e de todas as formas de violência. Luta que passa, necessariamente, pela construção de territórios sãos, onde a terra, a água, as sementes e a biodiversidade são consideradas bens comuns, não mercadorias concentradas nas mãos do agronegócio.
Marchamos em denúncia. Marchamos contra o golpe político e seus efeitos perversos – produzido e sustentado por setores do parlamento, judiciário e mídia –, decorrentes das medidas antidireitos e antipovo que o governo golpista tem colocado em curso. É sobre as nossas vidas e corpos que recaem estes pacotes de maldades e injustiças.
Está em curso no Brasil a implantação de um projeto neoliberal, que afeta nossa soberania nacional. Repudiamos e reagimos contra todas as negociações que visam entregar ao capital internacional importantes bens comuns do povo brasileiro, como o pré-sal, o aquífero Guarani e os nossos territórios. O ataque aos nossos direitos, que foram conquistados através da luta histórica das trabalhadoras e trabalhadores, é outro elemento central da agenda dos golpistas.
A todo custo tentam impedir o acesso da população à educação, saúde, moradia, direitos trabalhistas e previdenciários, utilizando-se de vários meios para isso. Mesmo diante de muita resistência das mulheres, nos dois últimos anos fomos lesadas com a aprovação da Emenda Constitucional 95/2016 (que congela os gastos públicos por 20 anos, o que inclui direitos sociais básicos) e da Contrarreforma Trabalhista (que precariza as condições de trabalho).
Além disso, tem se intensificado as investidas para a aprovação da Contrarreforma da Previdência, que atinge o conjunto da classe trabalhadora. Quanto às mudanças que afetam o acesso das agricultoras familiares à previdência, está a possibilidade da fixação de uma contribuição individual, para além dos descontos previdenciários já aplicados à produção agrícola familiar. Uma vez confirmada, esta medida inviabilizará o acesso das agricultoras familiares a este direito, dadas as dificuldades em arcar com os custos adicionais gerados pela contrarreforma.
Dentre as alterações pretendidas pelos golpistas está o aumento - para ambos os sexos - da idade de aposentadoria que, no caso das mulheres, se estende para os 62 anos. Este ponto demonstra o completo descompromisso com a construção das relações de gênero igualitárias, na medida em que não reconhece o peso que recai sobre nossas vidas das duplas e até triplas jornadas de trabalho que nós, mulheres, exercemos. Do ponto de vista das trabalhadoras assalariadas rurais, a versão original do texto da Contrarreforma da Previdência trazia retrocessos e injustiças ainda maiores, pois a referida ampliação da idade significava 7 anos a mais de espera para o acesso à aposentadoria - uma vez que atualmente se exige 55 anos para o requerimento do benefício. No entanto, após muita luta e resistência, na última versão apresentada pelo relator, essa questão que visava igualar a idade mínima para a aposentadoria das assalariadas e assalariados rurais com as urbanas e urbanos (em 62 anos para as mulheres e 65 para homens) foi suprimida da proposta.
Mas, diante disso, não podemos nos iludir e baixarmos a guarda. Esta contrarreforma não interessa ao povo brasileiro. Não nos interessa medidas que venham a aumentar as desigualdades sociais, as privatizações e o incremento do lucro dos bancos e empresas de previdência privada. Ante este conjunto de maldades, manifestamos nossa posição contrária à Contrarreforma da Previdência em tramitação no Congresso Nacional.
Seguiremos reforçando as mobilizações para dar um basta a mais esta tentativa de retirada de direitos. Este conjunto de ofensivas aprofunda a fome e a pobreza sobre territórios rurais e periferias urbanas, atingindo mais intensamente as mulheres, afinal, sobre nós incide o ônus da divisão sexual do trabalho, que nos faz acumular as atividades domésticas e de cuidados. Assim, quanto mais precarizado é o acesso aos direitos sociais, ao trabalho e à renda, maior é a sobrecarga de trabalho e responsabilidades a nós imputadas. Neste contexto, o crescimento do conservadorismo e o recrudescimento do ódio estão a serviço da criminalização das lutas do povo e dos movimentos sociais.
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São também as bases para a propagação da violência contra as mulheres e populações negras. O enfrentamento à violência contra as mulheres permanece como uma luta fundamental nesta conjuntura. As situações de violência, em suas diferentes formas, têm avançado com toda a sua crueldade sobre os nossos corpos e subjetividades, em particular o feminicídio, que alcançou índices ainda maiores no último período.
Numa conjuntura de crescimento do número de casos de violência contra as mulheres, vemos os poderes do Estado brasileiro atuarem na contramão da superação destas práticas sexistas e desumanas. A tramitação do texto substitutivo à PEC 181/2015 - que proíbe o aborto nos casos já previstos em lei (que se aplicam às mulheres vítimas de estupro, às grávidas de fetos anencéfalos e com risco de morte devido à gestação) – é a prova concreta desta perversidade, por basear-se na legitimação da violência contra as mulheres e na imposição de regras ainda mais duras às nossas vidas.
Por tudo isso, continuaremos lutando por um país democrático, onde os fascistas, machistas e racistas não passarão!!! A nossa marcha por direitos é, acima de tudo, uma marcha por democracia! Entendemos que o golpe político e os desmontes de direitos são duas faces de uma mesma moeda, que tem por base a precarização da vida e a entrega da nossa soberania ao capital nacional e internacional, agenda esta que vem se intensificando em toda a América Latina.
Nossa defesa pela democracia também reafirma a importância das eleições de 2018 como momento para construirmos candidaturas e elegermos mulheres comprometidas com o projeto popular e feminista. Nesta luta para o restabelecimento da democracia, precisamos desmascarar os candidatos inimigos do povo e das pautas políticas das mulheres. É diante dos desafios colocados por esta conjuntura que convocamos todas as companheiras e organizações de mulheres a construirmos juntas ações fortes e descentralizadas neste Dia Internacional de Luta das Mulheres – 08 de Março.
A partir do lema Margaridas na luta por democracia e garantia de direitos vamos construir um amplo diálogo com a sociedade, denunciando, por um lado, como os desmontes têm impactado negativamente sobre a vida das mulheres do campo, florestas e águas; e, por outro, anunciando o projeto de sociedade que queremos e a
As formas de resistência que temos colocado em marcha em todos os cantos deste País. O mês de março é, também, momento de conclamar as mulheres de todo o Brasil para darmos iní- cio ao processo de construção da Marcha das Margaridas 2019.
Juntas, faremos acontecer a Marcha em nossas comunidades, municípios e estados, levantando os caminhos que levarão as Margaridas até Brasília, em agosto de 2019, somando a coragem e a ousadia das mulheres do campo, florestas e águas à ousadia de todas as mulheres mobilizadas pelo mundo. É só por meio da luta e da ampla mobilização que conseguiremos barrar os retrocessos.
Que o mês de março seja um momento de renovarmos e unificarmos, ainda mais, as nossas forças em favor do bem comum.
Seguimos em Marcha por democracia com garantia de direitos e de participação popular:
Em defesa da previdência social, pública, universal e solidária;
Pela democracia e protagonismo das mulheres na política;
Pela vida das mulheres e contra todas as formas de violência;
Pela defesa do meio ambiente e bens comuns.
Brasília, 01 de março de 2018