O sentimento expresso pelos Guarani no segundo dia do IV Encontro Continental é uma constatação de que não há espaço para esse povo nos Estados Nacionais.
(CIMI Sul)
Os Estados os tratam como estrangeiros, desconsiderando sua territorialidade que é anterior às existências dos respectivos Estados, reconhecida nas leis nacionais e internacionais, mas não aplicada nas políticas públicas. O evento, que acontece no tekohaKa’akupe, município de Ruiz de Montoya, província de Missiones, na Argentina, reúne centenas de Guarani da Bolívia, Brasil, Paraguai e Argentina.
Essa constatação do não lugar para os Guarani nos Estados Nacionais se expressa nos inúmeros casos de assassinatos que estão ocorrendo, especialmente no Mato Grosso do Sul; no não reconhecimento das terras e na invasão de seus territórios por petroleiras, hidrelétricas, estradas e inúmeros outros projetos do chamado desenvolvimento.
O representante Guarani que vive na Bolívia, Celso Padilha, observou que a luta do povo Guarani é por terra, “porque sem a terra não há liberdade, sem a terra não há autonomia, sem a terra não há educação e sem a terra vamos morrer de fome”. Para esse representante, os governos dos diferentes Estados estão submissos aos fazendeiros, ao agronegócio, aos interesses das grandes corporações de petróleo e energia, não admitindo os direitos territoriais Guarani, as formas próprias do povo, considerando-os “rebeldes” por não se submeterem a esses setores, não se deixando converter em peões. Afirmou que “somos rebeldes porque somos livres, queremos garantir nossa Yvy Mara´ey, nossa Terra Sem Males, que é nosso território onde temos espaços para nossas atividades, onde sobrevivemos em sintonia com o meio ambiente, onde buscamos remédio para nossas doenças”.
Maurício Gonçalves, falou em nome dos Mbya que vivem no Brasil. Reforçou as palavras de Padilha ao observar que para o povo Guarani “não existe fronteira, não queremos nem cerca de fazendas nem cercas dos Estados, queremos a garantia de nossas terras e o livre trânsito por nosso território”.
O território Guarani, que se estende nas terras baixas do Cone Sul da América, desde Bolívia até o litoral brasileiro, foi dividido em pelo menos cinco Estados: Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai. As fronteiras foram criadas e recriadas por diferentes interesses dos impérios coloniais e posteriormente pelos estados independentes sem nunca ter sido considerada a presença e os direitos dos Guarani.
Breve histórico
O primeiro Encontro Continental foi organizado em 2006, em São Gabriel (RS), em memória da luta e resistência dos Guarani missioneiros que defenderam seu território enfrentando os exércitos de Espanha e Portugal, em meados do século XVIII.
Em 2007, focado na dimensão territorial, ocorreu o segundo encontro na cidade de Porto Alegre (RS).
Em 2010, ocorreu o terceiro encontro, na cidade de Assunção, capital do Paraguai, sob o tema da superação das fronteiras e organização política. Nesse encontro foi criado o Conselho Continental da Nação Guarani (CCNAgua), organização que pretende ser um elo de força e união desse povo nas diferentes regiões.