Um córrego e várias cachoeiras cortam a gruta; atravessam a comunidade. Morros em formação circular desenham um buraco gigante. Janeiro empresta sua cor nesta época do ano e à paisagem fica coberta de verde. Quando chegar o outono a colina vai virar castanho ou alaranjado, o que deixara descoberta as rochas cinza, a mesma cor dos atalhos de pedregulhos que comunicam as casas dos moradores. A paisagem, embora, não poderia ficar perfeita sem uma cor que é mais perene e que diz respeito de liberdade e dignidade.
Texto e foto: CPT Mato Grosso do Sul
A cor dos descendentes de escravos negros da Comunidade Furnas do Dionísio flameja como herança de luta e resistência por território e direito em Mato Grosso do Sul, como outras 20 comunidades quilombolas existente no Estado.
Com pau-a-pique, sapê, muita argila, e até esterco de vaca, em 1890, seu Dionísio Antônio Vieira e família, vindo de Minas Gerais, levantam as primeiras casas. “Ele chegou de Minas, gostou do lugar, voltou para buscar sua família e retorna para ficar. Então, Furnas existem desde que o Dionísio chegou aqui”, narra Maria Aparecida Martins, a Cida, presidenta da Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Furnas do Dionísio. São 94 famílias no meio de uma beleza natural exuberante, que perante conquistas recentes de reconhecimento de territórios, e ainda aguardando a titulação de suas terras, desejam avançar em organização, formação e capacitação, para ter autonomia e poder comunitário de gestão sobre os direitos e heranças garantidos. “Hoje temos outras necessidades, a luta maior por muito tempo foi pela sobrevivência. Nestes tempos precisamos aprender sobre organização” disse dona Cida.
“Reparações e cotas raciais”
Luciene Prado, vice-presidente da Associação é uma das poucas jovens que voltou a sua comunidade depois de estudar e se formar na universidade. O objetivo dela é contribuir para o melhoramento das condições de vida de sua gente. Preocupada com a juventude quilombola, sobre tudo pela crise de identidade existente, fala de propostas e reivindicações concretas. Apontou que de um modo geral a luta dos quilombolas no Estado é pela titulação imediata de todas as terras quilombolas, sem burocracia. Também que o governo garanta condições para o desenvolvimento sustentável das comunidades quilombolas, indígenas e camponesas, além de emprego com salários dignos para a juventude negra. Indicou que é necessário acabar com a intolerância religiosa e garantir a liberdade de expressão cultural e da cultura afro-brasileira. “Queremos saúde e educação 100% estatal e pública e a aplicação da lei 10.639 e os 10% do PIB para educação”, salientou.
Encontro do TPT em Furnas do Dionísio
O Tribunal Popular da Terra, junto ao movimento das Comunidades Negras Rurais Quilombolas de MS-CONERQ e a Associação dos Pequenos Produtores Rurais de Furnas do Dionísio realizarão na comunidade, em 23 e 24 de fevereiro, um encontro quilombola, com participação de lideranças indígenas e camponesas, do movimento universitário, entidades e movimentos sociais. Representantes da Coordenadora Ecumênica de Serviço (CESE) também vão estar presentes no encontro. A atividade faz parte de uma das propostas do Tribunal Popular da Terra, como coletivo democrático-popular de entidades, organizações e movimentos de luta por terra e território em Mato Grosso do Sul. Mais um momento de encontro entre os Povos da Terra para trocar idéias e experiências no processo de construção de unidade e o avanço para um calendário de lutas unificadas a meio e longo prazo, tendo como eixo a temática terra e territorialidade. A atividade conta inicialmente com o apoio da NMZ (Centro da Missão luterana da Alemanha) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT). Outras parcerias para arcar com os custos do encontro serão procuradas, indicaram os organizadores.
Fonte: Tribunal Popular da Terra/MS