A cerimônia de lançamento do Atlas de Conflitos Socioterritoriais Pan-Amazônico apresentou a versão impressa da publicação a organizações e sociedade civil, o resultado do mapeamento de conflitos em quatro dos nove países que formam a Pan-Amazônia, cobrindo 86% do território, com dados de 2017 e 2018.
(texto e fotos: Mário Manzi - Assessoria de Comunicação da CPT Nacional)
A apresentação da edição ocorreu no Museu Sacaca, em Macapá, nesta quarta-feira (26). Participaram da mesa de lançamento Maria Darlene Braga Martins, da coordenação da articulação das CPTs da Amazônia; Higor Pereira, da CPT Regional Amapá; Andréia Silvério, da coordenação nacional da CPT; Sâmia Picanço, liderança comunitária do Quilombo do Ambé; Júlia Lordelo, da Defensoria Pública do Estado do Amapá; e a prof. Dra. Patrícia Rocha Chaves, do Grupo de Pesquisa e Extensão sobre terra e território na Amazônia - Gruter/Unifap.
Organizado pela Articulação das CPTs da Amazônia, a publicação reúne textos analíticos voltados à conjuntura de Bolívia, Brasil, Colômbia e Peru, casos emblemáticos de violação de direitos dos povos da região pan-amazônica e por um compêndio de mapas, com os dados dos conflitos trabalhados.
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Em nome da CPT Regional Amapá, Higor Pereira agradeceu a presença de todas e todos, e relembrou, em fala inicial, a morte das mais de 600 mil pessoas, em decorrência da pandemia de Covid-19. Ele ressaltou, dentre as participações, a presença de representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). "A gente está aqui denunciando, resistindo, lutando, sempre com a esperança de que um mundo melhor, um outro mundo, nós podemos construir", encerrou.
Maria Darlene Braga Martins sucedeu a fala e explicou o processo de articulação internacional e entre os nove estados da Amazônia, que foi viabilizado pelos encontros ocorridos na esteira do Fórum Social Panamazônico (Fospa). Braga destacou o papel da Universidade Federal do Amapá, em especial os estudantes e professores do Grupo de Pesquisa e Extensão sobre terra e território na Amazônia, no processo de sistematização dos dados e na construção cartográfica, em conjunto com o Centro de Documentação da CPT - Dom Tomás Balduino (Cedoc-CPT). Segundo ela, "[o atlas] tem um objetivo único, de denunciar o latifúndio. Nós estamos aqui, porque o amanhã da Amazônia é agora."
Andréia Silvério evidenciou o papel de luta das comunidades afetadas, e incluiu a publicação como um dos instrumentos desse movimento. "Nosso papel na divulgação e elaboração do atlas é não apenas de denunciar todas essas violações, mas também de enaltecer a resistência que essas comunidades fazem diariamente, tanto no Brasil quanto em outros países."
Seguindo a fala, Sâmia Picanço, liderança comunitária do Quilombo do Ambé, fez uma análise de como a situação de conflito, que parecia distante, acabou tornando-se uma constância em sua vivência."Eu achava que isso era tão longe de mim, que isso não iria fazer parte da minha vida. Me vi enganada. Me deparei com um conflito monstruoso", completou. "A gente luta. Eu não tenho mais medo. Eu agradeço à CPT por tudo o que conquistei, junto com meu marido, nessa luta árdua e justa, que nos jogou para o abismo. Lutar contra quem tem dinheiro e contra quem tem seus padrinhos dentro do Estado do Amapá, todos fortes, apoiando o agronegócio, é muito difícil. O agronegócio para mim, hoje, representa a morte, não só do povo da floresta, mas também a morte das pessoas que moram na cidade, porque o agronegócio envenena as matas, os rios, acaba com o sustento das pessoas."
Júlia Lordelo, Defensora Pública do Estado do Amapá, falou em seguida. Ela lembrou a teórica Bell Hooks ao dizer que a CPT tem papel fundamental no "ensino da transgressão, da resistência, da pedagogia da resistência em busca da realização do projeto de vida". Lordelo analisou a morosidade das condenações em cortes internacionais, relacionadas a violações contra comunidades tradicionais. Apesar do alongamento de tempo, as condenações nas cortes internacionais são evidências de como o Brasil tem falhado com seus povos.
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Encerrando a mesa, a prof. Dra. Patrícia Rocha Chaves, explicou sobre o envolvimento da academia com os movimentos sociais, e diretamente na produção do Atlas. Ela analisou a questão conceitual ao qual o grupo de pesquisa se debruçou, no trabalho de construção de conceitos e, sobretudo, o processo social ao qual se procura entender, como causa - não como objeto -, citando o teórico Francisco de Oliveira. "A gente sempre vem defender a ciência, por trás dela, há paixões. Nesse sentido eu quero agradecer a todos os estudantes que colaboraram para que esse Atlas fosse apresentado hoje para vocês." Ela emendou "esse é o caminho da justiça social, é produzir ciência, uma ciência que tenha autonomia e que seja engajada politicamente".
Após a mesa, representantes de comunidades e movimentos sociais tomaram espontaneamente a fala, em um encadeamento de escuta popular. Raniere Roseira, da CPT Regional Maranhão, finalizou entoando um canto de luta e relembrando que o lançamento do Atlas é um momento de encontro para fortalecimento interno.
O evento foi transmitido pela página da CPT Nacional no Facebook em parceria com a Pascom-AP e a Arquidiocese de Macapá.
O vídeo está disponível em: https://www.facebook.com/CPTNacional/videos/2270008876475487/