A Comissão Pastoral da Terra regional do Piauí (CPT-PI) com o apoio da Diocese de Picos, a Paróquia São Simão, o Coletivo Antônio Flor e os Movimentos Sociais, realizou de 17 a 19 de agosto, a "Missão das comunidades em defesa da vida", com as famílias atingidas pelos projetos da Mineração e Ferrovia Transnordestina nos municípios de Curral Novo, Simões e Paulistana, no Piauí.
(Fonte/Imagens: Diocese de Picos)
Durante os três dias, cerca de 30 missionários visitaram mais de 200 famílias em 19 comunidades dos três municípios vendo de perto os seus anseios, preocupações e apelos. O bispo diocesano de Picos, Dom Plínio José Luz da Silva, o pároco da Paróquia São Simão, Pe. Miguel Feitosa Pereira, o Diácono, Marcos Roberto e várias Religiosas também acompanharam a missão.
Os municípios de que fazem parte as comunidades estão localizados na mesorregião sudoeste piauiense, microrregião do alto-médio Canindé, Território da Cidadania Vale do Guaribas, situados no semiárido piauiense, a 480 km ao sul de Teresina, capital do Piauí.
É uma região que vivência aspecto religioso muito forte, destacando o festejo, a vivência da fé, as celebrações, as pastorais e movimentos religiosos, tendo como base fé em Deus, amor ao próximo, e luta e resistência pelos seus direitos.
No aspecto produtivo, há forte presença da criação de animais de pequeno porte. A maioria das famílias sobrevive da criação de caprinos e ovinos. O carinho que cada família tem com os mesmos, em especial os (enjeitados), demostra o porquê de tanto sofrimento quando se fala em ter que sair de suas terras.
"O que mais me deixa triste é pensar se tivermos que vendermos o nosso criatório. A gente quer um bem tão grande a eles e eles também querem a nós. Aqui se chegar uma pessoa de fora eles fogem todos, mas se for nós, eles correm ao nosso encontro. Não sei o que será dá gente se tivermos que vivermos sem os nossos bichinhos", disse a moradora da comunidade Juá, Maria Luzinete de Carvalho.
Também se faz presente política da defesa civil, com açudes e poços feitos para atender a escassez de água, característico da região. Políticas de construção de cisternas, Brasil sem miséria, construção de açudes, poço artesianos que mesmo de água salgada servem para os animais e tarefas domésticas.
No entanto, apesar dos benefícios conquistados ao longo do tempo pelas comunidades, há ainda uma grande deficiência na implantação e manutenção de políticas públicas na região.
Nesse sentido, o transporte escolar precário, com transporte dos estudantes em veículos impróprios, como "pick-ups", sem nenhum tipo de cobertura e proteção; falta de professores e profissionais, ou ainda contratados de forma precária, gerando prejuízos, dentre outros.
Não obstante os problemas citados acima, de não assistência de políticas públicas, as comunidades, hoje, estão sendo palco de implantação de grandes projetos, que ao invés de trazer o desenvolvimento às famílias, estão trazendo o atraso e ameaças de expulsão dos locais que tradicionalmente vivem.
Durante as visitas, inúmeros foram os relatos feitos pelas famílias. Quanto a transnordestina, esta, que implanta a ferrovia para benefício da mineração na região, vem causando grandes prejuízos às comunidades dos entornos da ferrovia. Primeiro, as indenizações foram irrisórias, sendo objeto de contestação por parte quase todos atingidos. Além disso, a ferrovia "dividiu" as terras de várias pessoas em duas, deixando muitas vezes sua utilização prejudicada. Os acessos são escassos, distância de mais de 4 km uns dos outros, deixando grande parte dos produtores ilhados de suas próprias terras.
A moradora da comunidade São José, Francisca Macêdo Colho, disse: "Com a construção dessa ferrovia vivo uma vida de desgosto. Cortou minha terra, a maior parte ficou do outro lado, não temos mais como passar para lá e o que me deixou mais angustiada foi à situação que eles deixaram o meu barreiro. Antes a água era bem alvinha, hoje, não serve mais para nada. Os responsáveis pela empresa disseram que vinham arrumar, chegaram aqui e passaram um trator do lado deixando pior. A indenização que eles me ofereceram foi de R$ 700 (setecentos reais), o que não dar para fazer nenhuma feira para colocar dentro de casa. Num sei mais como resolver".
Apesar da realidade vivenciada pelas famílias com a construção da ferrovia e a possível exploração de minério de ferro, percebeu-se uma grande esperança no povo, sobretudo com a chegada da energia elétrica através do programa Luz para Todos. Segundo relato das famílias, a Empresa mineradora tem sido o principal obstáculo para a implementação do programa na região, já que não "permite" a entrada de postes nas terras já adquiridas pela mesma, mostrando assim sua disposição em dificultar a vida das comunidades.
Mediante aos problemas relatados, ao termino da Missão os missionários se reuniram com as comunidades para discutirem, juntos, os encaminhamentos a serem tomados. Na ocasião, foram encaminhadas as seguintes propostas:
Ao poder municipal:
1. Transporte coletivo de qualidade, com a imediata implantação de ônibus escolares;
2. Conserto da estrutura física e mobiliária das escolas;
3. Construção de prédios próprios para escola onde não houver;
4. Merenda escolar adequada;
5. Contratação regular de funcionários;
Ao poder Estadual e Federal:
1. Implementação do Programa Luz para todos;
2. Indenizações justas, no caso da Transnordestina;
3. Revisão dos critérios de indenização, incluindo a benfeitorias, e pessoas prejudicadas, mas que não foram indenizadas;
4. Fiscalização contra os abusos de poder exercido pelas empresas;
5. Construção de acessos na transnordestina, religando às comunidades e propriedades;
6. Revisão do licenciamento ambiental, com suspensão do licenciamento enquanto não for apurado as irregularidades
7. Realização de consulta às comunidades, nos moldes da Convenção 169 da OIT sobre a implantação dos empreendimentos, com informações fidedignas, direito a voz e a decisão livre sobre a implantação da mineração;
8. Realização de audiências públicas para à informação e participação dos procedimentos administrativos relativos a obras e decisões práticas que busquem evitar a violação de direitos humanos nas comunidades.
A Diocese de Picos, a Comissão Pastoral da Terra e demais pastorais e movimentos, têm mantido contato permanente com as comunidades. Em agosto de 2014, organizaram uma Romaria em apoio às famílias. "Após a presença da Igreja, passamos a termos mais sossego. Antes recebíamos pressões constantemente das empresas mineradoras querendo negociar as terras, até mesmo forçando a gente tomar uma decisão precipitada", disse a moradora da comunidade Lagoa do Ovo, Fabiana Araújo Nunes.
A "Missão das comunidades em defesa da vida" foi mais um apoio da CPT, da Diocese de Picos e demais Pastorais Sociais a essas famílias.