Encerrou-se na última sexta-feira, 30 de março, na cidade de Hidrolândia (GO), a XXIV Assembleia Geral da Comissão Pastoral da Terra (CPT), inspirada no lema “Não mais terão fome ou sede”. A Assembleia Geral da CPT definiu as prioridades para o próximo triênio, fez um balanço da atuação da CPT, e ouviu os testemunhos de trabalhadoras e trabalhadores que estão na luta e na esperança de mudança das estruturas de injustiça que os povos da terra têm vivenciado. Confira a Carta Final da Assembleia:
Nova diretoria executiva nacional
No último dia de Assembleia foi realizada a eleição da nova diretoria executiva nacional da CPT, para o mandato de 2012 a 2015. Com dois delegados e um trabalhador por regional com poder de voto, foram escolhidas os seguintes nomes:
Para presidente, Dom Enemésio Lazzares, bispo de Balsas (MA), e vice-presidente da CPT entre os anos de 2009 e 2012. Dom Enemésio era o atual presidente da CPT em exercício, devido à morte de Dom Ladislau Biernaski, no dia 13 de fevereiro desse ano.
Para vice-presidente, Dom José Moreira Bastos Neto, bispo de Três Lagoas (MS).
Para a diretoria foram reeleitos Edmundo Rodrigues, da CPT Tocantins, Isolete Wichinieski, da CPT Goiás e Flávio Lazzarin, da CPT Maranhão, e foi eleita Jane Silva, da CPT Pará. Para suplentes da diretoria foram escolhidos Frei Luciano Bernardi, da CPT Bahia e Thiago Valentin, da CPT Ceará.
Carta Final da XXIV Assembleia Geral da CPT
Os 70 participantes da Assembleia Geral da CPT aprovaram, ao final do evento, uma Carta Final onde destacam a memória viva e profética dos mártires da luta pela terra no Brasil, a luta incansável dos povos indígenas pela sua sobrevivência e seu duro processo de resistência diante dos grandes projetos que se desenvolvem em detrimento dessas culturas. A Carta destaca, ainda, as investidas do capital contra o meio ambiente, num processo de exploração devastador. O documento lembrou, ainda, o assassinato de quatro trabalhadores nos últimos dias, vítimas de um processo de violência no campo cada vez mais latente em nosso país. Confira, abaixo, o documento na íntegra:
“Não mais terão fome e sede” (Ap 7,16)
Mensagem da XXIV Assembleia Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Reunidos em Hidrolândia, GO, nos dias de 28 a 30 de março de 2012, para celebrar a XXIV Assembleia Nacional da Comissão Pastoral da Terra, nós, representantes dos Regionais do Brasil, reafirmamos nossa missão evangélica a serviço dos povos da terra e das águas.
Em tempos de exílio e de sonhos de “bem viver”
Sentimos a força do Espírito na memória das testemunhas e mártires que se fazem presentes na história de nossa caminhada: João Pedro Teixeira (50 anos do assassinato), Oscar Romero, Irmã Dorothy, Manelão do Araguaia e Dom Ladislau Biernaski - o homem que “viveu e pensou a fé a partir dos pobres da terra” -, iluminaram nossa fé e nossa esperança nas reflexões de nossa Assembleia. Comovente e precioso, em tempos de exílio e de cativeiro, foi o relato de camponesas e camponeses que nos contaram e cantaram suas lutas e resistências, avanços e conquistas.
Companheiros do CIMI acompanharam e partilharam conosco, posturas e práticas corajosas junto aos povos indígenas: estes são um sinal de Deus que recria, através deles, todo dia e para toda a humanidade, a ética e a política do Bem Viver, na luta desigual da defesa e reconquista de seus territórios.
A presença lúcida e profética de dom Tomás Balduino, com seus 90 anos, nos dá sempre novo vigor. Trouxe-nos alegria a presença do Secretário Geral da CNBB, dom Leonardo Ulrich Steiner, do presidente da Comissão Episcopal de Pastoral do Serviço à Caridade, Justiça e Paz, Dom Guilherme Werlang, do assessor da Comissão oito da CNBB, padre Ari dos Reis, da representante da Cáritas Brasileira e de irmãos e irmã da Igreja Evangélica de Confissão Luterana, da Igreja Adventista do Sétimo Dia e da Igreja Batista.
No clima árido da escassez de profecia, padre Virgílio Uchoa nos ajudou a fazer a memória das raízes da pastoralidade e da espiritualidade, que animam até hoje a CPT. Lembramos um dos luminares da CPT, dom Pedro Casaldáliga. Fomos visitados e reanimados por João XXIII, dom Helder Câmara, dom Aloisio Lorscheider, dom Luciano Mendes, dom Antonio Fragoso e padre José Comblin. Respiramos novamente o ar fresco do Concilio Ecumênico Vaticano II e das assembleias latinoamericanas de Medellín e de Puebla. O rosto de milhares de leigas e leigos das CEB’s iluminou os ideais de uma Igreja libertadora, a serviço do Reino de Jesus e da sua Justiça, Reino dos pobres e empobrecidos, como os preferidos do Pai.
Durante a Assembleia, chegou a noticia – que nos entristeceu e indignou - de mais quatro assassinatos de lideranças camponesas: Antônio Tiningo, coordenador do acampamento Açucena, dia 23 de março, em Jataúba - PE; Valdir Dias Ferreira, 40; e do casal Milton Santos Nunes da Silva, 52, Clestina Leonor Sales Nunes, 48, da Coordenação Estadual do MLST de Minhas Gerais, executados no município de Uberlândia, MG, no dia 24 de março, na presença de um neto do casal, de cinco anos.
Povos e comunidades gritam e lutam para defender territórios e preservar a terra
Preocupam-nos os impactos socioambientais, cada vez mais violentos e acelerados, que atingem diretamente toda a sociedade. Não há limites para a voracidade do capital. O Estado brasileiro é o seu incentivador, via PAC, e financiador, via BNDES. Aposta-se, delirantemente, no crescimento neo-colonialista predador, concentrador de riquezas, em troca de meros projetos assistencialistas.
Isso se expressa claramente nos projetos em discussão no Congresso Nacional:
1. As mudanças aprovadas do Código Florestal que, sob o discurso de defender os pequenos produtores rurais, querem legitimar a depredação dos recursos naturais.
2. A tentativa de retirar do Executivo a prerrogativa de definir e aprovar o reconhecimento dos territórios indígenas e de comunidades quilombolas, com a aprovação da PEC 215, por Comissão da Câmara dos Deputados.
3. Os inúmeros projetos que visam minar os direitos dos mais pobres.
A aprovação de concessão de lavras minerárias que depredam a natureza, invadem áreas de preservação ambiental e territórios de povos indígenas, de comunidades camponesas e de assentamentos da reforma agrária, escancaram o modelo implantado em nosso país.
Vítimas deste processo são os povos indígenas - de modo especial os Guarani Kaiowá de Mato Grosso do Sul, totalmente espoliados de seus territórios e de sua dignidade - quilombolas, posseiros, pescadores, ribeirinhos, extrativistas, acampados e assentados de uma reforma agrária abandonada, assalariados e escravizados, sempre jogados à margem de nossa sociedade.
Anima-nos, porém, a coragem e a resistência dos povos atingidos e impactados pelos projetos que os marginalizam, mas teimosamente apontam novos caminhos de organização e de relacionamentos com a natureza e na sociedade.
Percebemos o risco que corre a democracia, no mundo inteiro, pelos persistentes rearranjos do poder econômico-financeiro nacional e transnacional. Despontam os riscos sobre o futuro do Estado de Direito, na medida em que crescem, nas instituições e na sociedade, mentalidade e comportamentos que impedem a participação das maiorias nas decisões.
A CPT se une a todos os irmãos e irmãs de boa vontade, “pequeno resto” que luta por novos tempos, quando “não haverá mais fome e sede” e “todos terão vida, e vida em abundância” (Jo 10,10). Neste horizonte desafiador, nos sentimos animados pela sabedoria dos povos nativos, quando nos ensinam a vivenciar e a cantar com eles:
“Pisa ligeiro, pisa ligeiro:
quem não pode com a formiga,
não assanha o formigueiro”
ASSEMBLEIA GERAL DA COMISSÃO PASTORAL DA TERRA
Hidrolândia GO, 30 de março de 2012.
Maiores informações:
Cristiane Passos (Assessoria de Comunicação CPT Nacional) – (62) 4008-6406 / 8111-2890
@cptnacional