O Bispo Dom Ladislau Biernaski, presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT), lamentou o assassinato do casal de seringueiros no Pará nesta terça-feira (24) e, em entrevista ao Portal Terra, fez uma avaliação da entidade sobre o Novo Código Florestal. Para ele, "certamente", a matéria aprovada pela Câmara fará crescer ainda mais o número de mortes geradas por conflitos agrários, caso vire lei. "Aldo Rebelo perdeu uma grande oportunidade de ajudar o País a sair da devastação, impunidade dos grileiros e pouco investimento nos pequenos agricultores. Ele perdeu uma grande oportunidade de fazer a diferença. Lamento por ele", afirma, crítico, o presidente da CPT.
Confira abaixo a entrevista:Terra Magazine - O Conselho Nacional dos Seringueiros responsabilizou o governo federal pelo assassinato do casal no Pará. O senhor concorda?
Dom Ladislau Biernaski - Pelo menos indiretamente, o governo tem responsabilidade, sim.
Como o senhor avalia o papel do Estado, então?
O Estado, infelizmente, não cumpre a sua função de fiscalização. Temos leis muito boas - como a da preservação da floresta, de terras quilombolas e indígenas -, mas que são constantemente invadidas porque não existe fiscalização. E a morte deste casal, Maria do Espírito Santo e José Cláudio Ribeiro, já estava anunciada. Eles avisaram que estavam sendo ameaçados. E o que eles faziam para serem perseguidos? Faziam algo importantíssimo para o País e, principalmente, para as pessoas que viviam lá na região deles. Eles denunciavam invasões, tinham uma grande coragem.
Pode-se dizer que esta é uma morte isolada?
Não! Pelo simples fato de não ser a primeira. Há pouco tempo lembramos o aniversário de tantas mortes, entre elas, a da irmã Doroty, que passou pelo mesmo caminho que este casal assassinado ontem. Se não houver fiscalização rigorosa, haverá muitas mortes mais no Brasil.
Quais medidas a CPT pretende tomar? O que é possível ser feito?
Não podemos fazer muito, a não ser manifestar apoio e ajudar essas pessoas a se organizarem.
O Congresso discute o Código Florestal. O que o senhor achou da aprovação dele nesta terça-feira na Câmara?
Infelizmente, hoje (quarta-feira, 25), temos que lamentar uma derrota, com a esperança de que talvez no Senado a situação possa melhorar um pouco. Mas, sobretudo, torcemos para que Dilma possa coibir, não aprovar, este atual Código, e pedir para que se faça outro.
O senhor acredita que este novo Código Florestal vai contribuir para o aumento da violência?
Certamente. Sem dúvida nenhuma, porque permite que responsáveis por graves crimes ambientais fiquem impunes. Isto não é possível! Eles serão perdoados por crimes contra a natureza. Isto, sem contar aqueles que expulsaram populações de suas terras, fizeram ameaças de morte, mataram... O lobby ruralista é muito forte.
Como o senhor vê o papel desempenhado pelo PCdoB, que se diz comunista?
Eu não posso afirmar nada pelo partido, porque um dos representantes não constitui a totalidade de uma agremiação. E nem sei se o PCdoB aprova a conduta de Aldo Rebelo. Acredito que não. Aldo perdeu uma grande oportunidade de ajudar o País a sair da devastação, de acabar com a impunidade dos grileiros e de melhorar o pouco investimento nos pequenos agricultores. Ele perdeu uma grande oportunidade de fazer a diferença. Lamento por ele.
Em 2010, segundo relatório da CPT, houve 34 assassinatos por conflitos agrários. Em 2009, foram 26. O número cresceu. A que se deve esse crescimento?
Se deve à disparidade da distribuição da terra. Quando 2% de proprietários possuem mais de 50% da terra, os outros que buscam essa terra não vão encontrar, nem terão acesso. O Brasil nunca pensou numa reforma agrária séria. A violência tem causa: falta de distribuição da terra.
O senhor acredita que a política de distribuição de renda atenuou essa realidade?
Crescemos na distribuição de renda. Mas isto atinge a região urbana. No campo também, mas poderia ser feito muito mais se houvesse uma distribuição igualitária daquilo que o governo proporciona. Ele dá quase R$ 100 bilhões ao agronegócio e apenas R$ 10 bilhões para os pequenos agricultores. É uma grande injustiça. E depois o governo alega falta de recurso para fazer a reforma agrária.
O que o senhor espera dessa estatística de assassinatos em 2011?
Espero que diminua, mas as perspectivas não são muito boas. Agora foi esse casal assassinado, esperamos que sejam os últimos. Mas da forma como as coisas caminham, dificilmente esse número vai cair. Ainda recebemos muita informação de pequenos agricultores sendo ameaçados.