Audiência Pública realizada em Limoeiro do Norte, Ceará, discute questões referentes ao homicídio do ambientalista José Maria Filho (Zé Maria), o uso de agrotóxicos e os impactos das grandes obras na região Jaguaribana
A 14ª Audiência Pública da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, realizada no Município de Limoeiro – Ceará no dia 03 de dezembro de 2010, na Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (FAFIDAM), discute questões referentes à apuração do assassinato do ambientalista e presidente da Associação de Trabalhadores Rurais Sem Terra da Chapada do Apodi, José Maria Filho, conhecido por Zé Maria do Tomé. Zé Maria foi assassinado no dia 21 de abril de 2010, com 25 tiros, quando retornava pra casa, na localidade de Tomé, que está situada entre os municípios de Limoeiro e Quixeré. A audiência foi convocada pelo Desembargador Gercino José da Silva Filho, Ouvidor Agrário Nacional e Presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo. Além deste, estiveram presentes Aílson Silveira Machado, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Cláudio Rodrigues Braga, da presidência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e o delegado de Polícia Civil Agrária do Ceará, Jocel Dantas.A audiência, apesar de sua importância, não trouxe muito ânimo para os presentes, principalmente para a viúva e outros familiares da vítima e militantes dos movimentos e pastorais sociais, pois apesar de já terem se passado quase oito meses do crime, o processo não teve progresso. Indignou a muitos participantes da audiência o fato de nem mesmo o exame de balística ter sido realizado por conta do microscópio estar danificado. O fato da convocação ter sido feita praticamente às vésperas da audiência impediu a presença de muitas pessoas ligadas ao caso, o que foi motivo de sérias críticas dos militantes às autoridades responsáveis.
Foi unânime entre os representantes de pastorais e movimentos sociais a reinvindicação de que a Polícia Federal assuma a investigação do crime. Após o assassinato de Zé Maria, cerca de 30 pessoas foram ouvidas, realizadas quebras de sigilos fiscal, bancário e telefônico, mas não se conseguiu chegar aos autores do crime. Os familiares do ambientalista, moradores da comunidade de Tomé e militantes sociais da região que tem acompanhado o caso de perto sentem medo, mas não deixam de denunciar as injustiças que sofrem as comunidades da região e expressam, apesar da esperança, a preocupação de que este crime não seja desvendado, os criminosos não sejam devidamente punidos e outras vítimas sejam feitas.
A morte de Zé Maria está ligada diretamente ao uso de agrotóxicos na região por empresas do agronegócio do ramo da fruticultura, dos monocultivos da banana, do melão e do abacaxi. Zé Maria denunciava constantemente a pulverização área feita pela empresa Del Monte, ação irresponsável que, além de produzir alimentos envenenados, contamina a terra, as águas e as comunidades do entorno, já que o vento leva os resíduos dos venenos para as comunidades. Pesquisa realizada pelo Núcleo Tramas (Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a Sustentabilidade), do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC) apresenta detalhadamente os impactos ao meio ambiente e à saúde humana do modelo predatório e assassino do agronegócio, que lança mão da utilização de agrotóxicos em detrimento da vida das populações locais e do equilíbrio ambiental. O aquífero Jandaíra, o segundo maior do Nordeste, já está contaminado e a população consome água contaminada. Outra reinvindicação (já antiga!) dos presentes foi a construção de uma nova adutora para as comunidades.
Uma lei proibindo a pulverização aérea foi promulgada pelos vereadores no dia 20 de novembro de 2009, mas as empresas nunca obedeceram a determinação. Após a morte de Zé Maria, a Câmara Municipal de Limoeiro do Norte derrubou a lei que proibia a pulverização aérea no perímetro-irrigado Jaguaribe-Apodi. Este fato intensificou a luta na região contra os agrotóxicos e o agronegócio instalado como um verme na região.
Os militantes presentes ainda denunciaram a responsabilidade do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) e da Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Estado do Ceará (SEMACE), órgão responsável pelo licenciamento ambiental no Estado, pelos conflitos no campo na região jaguaribana e reivindicaram do ouvidor agrário nacional a convocação de uma reunião para discutir somente a responsabilidade destes e outros órgãos públicos em todos estes conflitos. O ouvidor, portanto, prometeu convocar estas duas reuniões, uma para discutir os impactos das grandes obra e outra para dar encaminhamento ao inquérito de investigação da morte de Zé Maria. Emocionados, os militantes gritavam: “Zé Maria, presente, presente, presente!”