Duas comunidades rurais de mais de 25 anos de existência foram surpreendidas, na manhã desta sexta-feira (01/12), por um grande aparato policial de reintegração de posse no município de Pinhão, no centro-sul do Paraná. Dezenas de famílias foram expulsas de suas casas devido a uma intervenção federal autorizada pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), atendendo pedido da indústria madeireira Zattar.
(Fonte: Júlio Carignano, no Porém.net / Foto: MST).
Segundo relatos dos moradores, a operação da PM do Paraná começou logo nas primeiras horas do dia. Os moradores foram expulsos de suas casas e na sequência as máquinas da empresa destruíram as residências, algumas delas de alvenaria. Escola, padaria comunitária e igreja também foram demolidas. A Prefeitura de Pinhão auxiliou no trabalho de remoção das famílias para outras localidades, porém a situação de moradia dos despejados segue indefinida.
Na semana passada, uma audiência pública foi realizada em Pinhão para tratar dos problemas fundiários que perduram por décadas na região e tem raiz nos conflitos entre posseiros e madeireiras. Segundo o secretário de Assuntos Fundiários do Estado do Paraná, Hamilton Serighelli, havia tratativas de negociação entre o proprietário e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) até o ano passado, porém com a mudança no governo federal, a situação estagnou.
Segundo Serighelli, o proprietário chegou a oferecer 10 mil alqueires para o Incra, porém a atual gestão do órgão rompeu as negociações. “Estivemos em Brasília com o Zattar para tratar dessa situação, ainda na época do Nilton Bezerra [ex-superintendente do Incra no Paraná]. Na oportunidade conseguimos barrar essa intervenção federal por duas vezes, abrindo negociações entre o Incra e o Zattar, porém isso parou com a mudança de governo”, comentou.
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A ameaça de despejos em Pinhão foi alertada na semana passada pelo prefeito de Pinhão, Odir Gotardi, que apontou que a questão agrária na região tinha dois caminhos a seguir: o do desenvolvimento social ou do caos social. “Se esses despejos forem cumpridos em Pinhão fatalmente teremos milhares de pessoas destelhadas. Será uma verdadeira tragédia. Estamos com essa espada sobre nossas cabeças”, disse o prefeito, em audiência pública no dia 27 de novembro.
Caso emblemático
A questão agrária em Pinhão é uma das mais emblemáticas da luta pela terra no Paraná, tendo seus primórdios ainda no início do século 20, no conflito entre posseiros e empresas particulares, em especial a madeireira Zattar, que chegou na região na década de 40. A ocupação da área pela empresa ocorreu em detrimento de famílias de pequenos agricultores que já habitavam as terras desde o Brasil imperial. Elas foram expulsas e assim a indústria constituiu um dos maiores complexos latifundiários do Paraná.
Estima-se que antes da chegada da empresa quase 2 mil famílias de posseiros viviam em comunidades tradicionais, conhecidas como faxinais. A madeireira chegou a ocupar 80 mil hectares na região centro-sul do estado. Já para os faxinalenses instalou-se uma luta desigual pela titularidade das terras. Atualmente são 12 acampamentos sem terra em uma área total de 60 mil hectares e aproximadamente dois mil acampados. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) classifica a região como o terceiro maior polo de reforma agrária no Estado.