Acordo destinado à reparação dos danos da tragédia na bacia do Rio Doce foi tema de audiência na Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
(Fonte: MPF | Foto: João Américo/Secom-PGR)
O acordo firmado pela União e estados de Minas Gerais e do Espírito Santo com as empresas Samarco, Vale e BHP não contou com a participação dos atingidos pelo rompimento da Barragem de Fundão – ocorrido em Mariana (MG), em novembro de 2015. Por essa razão, o Ministério Público Federal (MPF) questionou, durante audiência pública realizada na quarta-feira, 25 de maio, pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, a homologação do acordo, feita no último dia 5 pelo Núcleo de Conciliação do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região.
Para o MPF, o acordo celebrado entre o poder público e as empresas não garante a reparação integral dos danos socioambientais, culturais e econômicos decorrentes do desastre. Além disso, o acordo prevê a criação de uma fundação de direito privado que acaba por estabelecer escalas de responsabilidade entre a Samarco e suas controladoras Vale e BHP, tendo em vista que são previstos aportes anuais a serem realizados primeiramente pela Samarco e, em caráter subsidiário, por suas controladoras. Os valores dos aportes anuais à fundação, segundo o MPF, não estão relacionados ao necessário para a plena restauração socioambiental e à indenização aos atingidos, tendo em vista que não foi realizado nenhum estudo pericial abrangente que tenha estabelecido a dimensão dos danos e os montantes necessários à sua reparação, compensação e mitigação.
“O acordo não observou os diretos à informação e de participação das populações atingidas e, com relação aos povos e comunidades tradicionais, o direito à consulta prévia, livre e informada – conforme preconiza a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT)”, destacou a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat.
Segundo a PFDC, não há acordos possíveis nos quais os vitimados não tenham voz e participação protagonista. “Nesse sentido, só é possível conceber esse acordo como o anúncio de uma plataforma mínima de ações, que deverão ser complementadas por novas medidas que visem assegurar a execução de programas e de aporte de recursos financeiros – sem se prestar a ser um mecanismo exaustivo, dificultador do acesso à justiça dos demais interessados e legitimados coletivos”, destacou a PFDC.
Durante a audiência, o procurador regional dos direitos do cidadão em Minas Gerais, Edmundo Dias, pontuou que “o acordo ignorou a condição dos atingidos como sujeitos de direitos e deixou de prever inúmeras medidas de reparação necessárias, justamente por, não tendo realizado um processo de escuta, ignorar ou desconsiderar suas exigências.” Edmundo Dias também mencionou que “a falta de participação nesse processo se mantém hoje na ausência de adequada informação aos atingidos – queixa comum feita durante as reuniões de que o MPF tem participado – e na própria impermeabilidade da fundação à esperada presença dos atingidos em seus foros de decisão.”
O MPF lembrou que no dia 2/05 ajuizou perante a Justiça Federal de Minas Gerais uma outra Ação Civil Pública, de abrangência muito maior do que aquela tratada na ação proposta pelos entes federativos. A ação da força-tarefa do MPF tem o propósito de assegurar a plena reparação dos danos humanos, socioambientais, econômicos e culturais, nas múltiplas dimensões do desastre do rompimento da barragem de Bento Rodrigues. A ação do MPF busca promover, inclusive, a responsabilização da União e estados de Minas Gerais e Espírito Santo, além de órgãos e entidades integrantes da administração pública.
Recurso – O MPF informou que a Procuradoria Regional da República na 1ª Região já apresentou recurso contra a homologação do acordo pelo Núcleo de Conciliação do TRF da 1ª Região, apontando, entre outras nulidades processuais, a impossibilidade de homologação, no âmbito de um agravo de instrumento – cuja abrangência é limitada –, de um acordo que diz respeito à totalidade da ação ajuizada pelos entes federativos, além da clara supressão da 1ª instância, uma vez que a 12ª Vara Federal de Belo Horizonte/MG não chegou a sequer apreciar a homologação postulada pelas partes que realizaram o acordo.
Além do Ministério Público Federal, a audiência contou com a participação de atingidos pelo desastre, do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), da Defensoria Pública da União (DPU), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), de representantes das empresas Samarco e BHP, e de parlamentares.