As dívidas trabalhistas individuais da usina vão de 25 mil a quase 80 mil reais. De acordo com dados do Ministério Público do Trabalho, estima-se que o usineiro deva em torno de R$ 1 bilhão com bancos, fisco, fornecedores e encargos trabalhistas.
(Site Outra Face)
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra de Mato Grosso do Sul (MST/MS), vem por meio desta nota pública, denunciar a situação em que se encontra a Usina Sucroenergética Agrisul Agrícola, unidade de Mato Grosso do Sul, mas conhecida como Fazenda Santa Olinda, do usineiro José Pessoa, no distrito de Quebra Coco, em Sidrolândia, cerca de 70 km de Campo Grande, capital do Estado.
Como é de conhecimento geral, no dia 10 de janeiro deste ano, o MST/MS ocupou o local e abriu um novo acampamento na área. Ressaltamos que ele foi montado em uma estrada vicinal, que dá acesso ao distrito de Quebra Coco e não em área de plantação ou preservação ambiental, como foi afirmado pela Usina.
De acordo com a Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, que dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências, em seu artigo 2°, inciso 1°, a propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias e esse não é o caso da área em questão.
No ano de 2009 o grupo que comandava a usina esteve na chamada “Lista Suja do Trabalho Escravo” do Ministério do Trabalho e Emprego, por sérios descumprimentos de acordo trabalhistas e por danos morais ao coletivo. Por muito tempo esse mesmo grupo recolheu valores referentes a tributos de prestadores de serviço, mas não os repassou ao poder público. Cerca de 700 funcionários, que foram demitidos, há praticamente três anos atrás, quando a empresa decretou falência, nunca receberam seus salários atrasados e muito menos direitos como o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
As dívidas trabalhistas individuais da usina vão de 25 mil a quase 80 mil reais. De acordo com dados do Ministério Público do Trabalho, estima-se que o usineiro deva em torno de R$ 1 bilhão com bancos, fisco, fornecedores e encargos trabalhistas.
A área também possui uma ação civil pública, impetrada pela Prefeitura Municipal de Sidrolândia, também em 2009, por danos causados ao meio ambiente. Outra questão que consta no Estatuto da Terra para que a terra seja de Reforma Agrária, já que todos os proprietários rurais devem, por obrigação, assegurar a conservação dos recursos naturais.
Estes são apenas alguns problemas que esta área apresenta e nós do MST/MS nos perguntamos: como a justiça não tomou providencias mais radicais em relação a essa situação e em apenas cinco dias expediu um mandato de reintegração de posse para o movimento, sem notificação oficial?
Sobre o despejo dos acampados
Nesta quinta-feira, 29 de fevereiro de 2015, vivenciamos perplexos, o Batalhão de choque da Companhia de Gerenciamento de Crises e Operações Especiais, grupo de elite da Polícia Militar, com armas de munição letal, com cães e utilizando de muita truculência, despejar as cento e quarenta famílias do MST, que estavam acampadas no local.
Para evitar os embates fundiários o Ministério do Desenvolvimento Agrário, através da Ouvidoria Agrária Nacional, editou um Manual de Diretrizes Nacionais para Execução de Mandatos Judiciais de Manutenção de Posse Coletiva, assinado pelos Governos Estaduais e Federais. As normas contidas neste documento devem ser usadas em ações de reintegração, como as da Usina do Quebra Coco.
O Manual deixa claro que na desocupação deve ficar garantido a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, a prevalência dos direitos humanos e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Durante a desocupação em questão a força policial descumpriu praticamente todos os pontos elencados acima, havendo vários momentos de truculência e ameaças, por muitas vezes os acampados ouviram palavras de baixo calão e foram claramente coagidos.
Outro ponto que o Manual deixa claro no ponto quatro é que as operações deverão ser documentadas por filmagens, o que deve ser permitido pela polícia a qualquer das entidades presentes ao ato. Na ocasião a assessoria de comunicação do MST/MS foi obrigada a sair do local, pela força policial, por estar documentando a ação.
O Ministério também ressalta que o responsável pelo fornecimento de apoio policial, com o intuito de melhor cumprir a ordem judicial, adotará as seguintes providências, com a participação dos demais envolvidos na solução do conflito: I – contactar os representantes dos ocupantes, para fins de esclarecimentos e prevenção de conflito; II – comunicar à Ouvidoria Agrária Regional do Incra para tentar viabilizar área provisória para a qual os acampados possam ser removidos e prédios para eventual guarda de bens.. Nenhum desses pontos foi cumprido.
Para finalizar, consideramos ainda pior, o fato que as ordens judiciais devem ser cumpridas nos dias úteis das 6 às 18 horas, podendo este horário ser ultrapassado para a conclusão da operação e no início da ação os policiais queriam tudo desmontado em 15 minutos, se não ameaçaram colocar “fogo” nos barracos, como fizeram em um acampamento de outro movimento, que ficava metros de distância do nosso. A autoridade policial também deveria ser responsável de comunicar o cumprimento da medida judicial aos trabalhadores, ao requerente e aos demais envolvidos com antecedência mínima de 48 horas, isso não aconteceu, o MST foi informados via imprensa do despejo, não tivemos tempo algum de nos preparar para dar o apoio que queríamos as nossas famílias acampadas. A comunicação da ação deveria conter: I – a comarca, o juízo e a identificação do processo em que foi determinada a medida; II – o número de famílias instaladas na área a ser desocupada; III – a data e a hora em que deverá ser realizada a desocupação; IV – a identificação das unidades policiais que atuarão no auxílio ao cumprimento da ordem judicial. Mais uma vez nenhuma dessas medidas foi cumprida como rege o documento.
Portanto seguimos indignados, mas nunca paralisados e ressaltamos que o MST/MS, diante das ações de truculência e grave violação dos direitos individuais, coletivos e humanos, já está tomando as medidas judiciais e de luta cabíveis, por isso trancamos três rodovias importantes do Estado, na manhã do dia 30 de fevereiro, sexta-feira, em solidariedade as famílias despejadas.
Além disso, estamos entrando com um pedido de intervenção federal no MS, com o intuito de coibir ações absurdas e incabíveis como essa e estamos preparando, coletivamente, com os outros movimentos de luta pela terra, que foram afetados pelo despejo, uma ação de indenização por danos morais e materiais as famílias acampadas.
Também continuaremos batalhando pela área em questão e iremos contestar a reintegração de posse, já que está mais do que claro que o usineiro infringiu claramente as Leis Trabalhistas e ambientais, pontos de suma importância para que a área seja considerada para Reforma Agrária.
A luta histórica por Reforma Agrária popular e democrática do MST, movimento que milita há 30 anos por soberania alimentar e dignidade para famílias que sonham com um pedaço de terra para produzir, continuará sua caminhada, reconstruindo seus barracos, cicatrizando as feridas da alma e continuando a batalha da vida.
MST Mato Grosso do Sul