Desde o dia 22 cerca de 150 indígenas ocupam as principais vias que dão acesso aos canteiros de obras de Belo Monte, no Pará. “Não vamos mais sair só na promessa e no papel”, afirmam.
(Fonte: Xingu vivo Para Sempre)
O Ministério Público Federal recebeu denúncias de índios Xikrin que, no dia 25 de maio, foram recebidos com bombas e balas de borracha ao tentarem entrar no canteiro de Belo Monte para conversar com representantes da Norte Energia S.A, responsável pelas obras. De acordo com os relatos, cerca de 20 indígenas se dirigiram ao local pacificamente e desarmados, para cobrar o cumprimento das condicionantes indígenas.
Ao chegarem no local, segundo narram, foram recebidos com bombas por homens da Força Nacional de Segurança, que desferiram vários tiros de bala de borracha contra os índios. 4 pessoas ficaram feridas. “Avisamos que estávamos lá para conversar, tentamos conversar. Os policiais não perguntaram nada, disseram que não queria conversar e continuaram atirando”, relataram os indígenas. Diante disso, os indígenas voltaram para Altamira, onde denunciaram o ocorrido ao MPF.
O comandante da Força Nacional em Altamiras será ouvido pelo MPF. A Procuradoria Geral da República vai receber uma solicitação para que requisite, do Ministério da Justiça, informações sobre os limites, objetivos e justificativas para a presença da Força Nacional nos canteiros de obra da usina de Belo Monte. O MPF solicitou que Fundação Nacional do Índio (Funai) encaminhe as vítimas para exame de corpo de delito ainda hoje.
Esta não é a primeira denúncia de supostos abusos de homens da Força Nacional dentro dos canteiros de Belo Monte. O MPF já havia recebido relatos de trabalhadores e tinha um procedimento para investigar “a legitimidade da ação da Força Nacional em defesa do patrimônio da Norte Energia. S.A e do Consórcio Construtor de Belo Monte”. Com as agressões de hoje contra os índios, a investigação do MPF passou a ser criminal.
Há cinco dias, indígenas de várias etnias atingidos por Belo Monte estão fazendo um bloqueio na Rodovia Transamazônica para impedir a entrada de operários no canteiro da usina. Eles cobram o cumprimento das condicionantes indígenas do empreendimento que, três anos depois do início das obras, sequer começaram. Os Xikrin disseram ao MPF que foram na usina para discutir uma pauta de negociações. Segundo eles, até agora nenhum projeto de compensação ou mitigação pelos impactos de Belo Monte foi realizado e a Funai e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) nunca visitaram a aldeia para avaliar o cumprimento das condicionantes.
Ocupação dos acessos a Belo Monte, indígenas afirmam: “Não vamos mais sair só na promessa e no papel”
Desde quinta-feira (22), cerca de 150 indígenas ocupam as principais vias que dão acesso aos canteiros de obras de Belo Monte. Entre as pautas de reivindicações está o cumprimento do Plano Básico Ambiental – Componente Indígena (PBA-CI), o reassentamento de citadinos e ribeirinhos e a retirada dos madeireiros da TI indígena Cachoeira Seca.
Entre os manifestantes estão mulheres, crianças, lideranças, ribeirinhos e citadinos da etnia Parakanã, Assurini, Xipaya, Curuaia, Arara da Cachoeira Seca e Arara do Laranjal. Segundo os indígenas, a espera pela assinatura do termo de compromisso do Plano Básico Ambiental teria chegado ao limite. Previsto para ser redigido e assinado 35 dias após a licença de instalação, em janeiro de 2011, apenas na última quinta (23) – três anos depois, às portas fechadas e com metade das obras concluídas – foi divulgado na imprensa que a Norte Energia teria assinado o documento. “Um dos objetivos da ocupação era que a Norte Energia assinasse o termo de compromisso, que ela disse que já assinou, mas ainda não disse nada aqui pra gente”, afirma Ney Xipaya, uma das lideranças presentes no local.
Além do PBA, que prevê as ações que tentam compensar os danos causados por Belo Monte enquanto durar a concessão da usina (35 anos) contados a partir de 2010, os indígenas querem pressa nos compromissos firmados pela empresa em outras ocupações, principalmente em relação à construção de escolas, casas e pistas para o transporte de funcionários da saúde.
Segundo Ney Xipaya, dessa vez os indígenas não sairão da frente dos canteiros enquanto os acordos feitos com a Norte Energia forem cumprimos: “Nas outras ocupações a gente ia com a nossa pauta de reivindicação, a Norte Energia vinha com a Funai e marcava uma data para gente sentar e discutir. A Norte Energia ia e firmava compromissos que até hoje nunca foram feitos. Então agora a gente só vai sair daqui do canteiro na hora que a Norte Energia chegar com as empresas já contratadas, mostrar os donos das empresas, a loja que vai comprar material e que dia vai subir para as aldeias. Não vamos mais sair só na promessa e no papel, porque a gente sabe que com a Norte Energia isso não funciona”.
O motivo do atraso da assinatura do termo de compromisso, segundo os indígenas, é a tentativa de retirar os compromissos com educação e saúde do Plano Básico Ambiental através do chamado Plano Operativo. Em reunião em fevereiro deste ano, a Norte Energia afirmou que não assumiria a construção de escolas e postos de saúde, alegando que as obras são deveres do Ministério de Educação e Secretaria de Saúde Indígena. “ A Norte Energia pediu um prazo de 15 dias porque ela não concordou com algumas cláusulas do termo, principalmente em relação à saúde e educação. Ela disse que não assinaria porque não era obrigação dela, era competência do MEC e da SESAI, mas lá no PBA, quando o PBA foi escrito, eles assumiram isso”.
Na manhã de sexta (23) os indígenas entregaram uma carta à FUNAI exigindo a presença da presidenta da Fundação, Maria Augusta Assirati. “Por enquanto estamos em uma manifestação pacífica. Estamos deixando os carros passarem e bloqueando apenas a entrada dos veículos da empresa, mas se a gente não tiver um posicionamento, não podemos garantir mais nada”, conclui a liderança.
Ja na madrugada de sexta para sábado, um ônibus do Consórcio Construtor Belo Monte foi incendiado (ainda correm investigações sobre os autores), e houve atrito com militares da Força Nacional. Na manhã de sábado, um advogado da Norte Energia e um oficial de justiça foram ao local do bloqueio para entregar uma intimação para que os índios deixassem os ônibus da CCBM passar, mas não houve acordo. Segundo os indígenas, se as reivindicações não forem atendidas, outros ônibus podem ser queimados.