Embate entre Santo Antônio e Jirau sobre o aumento da cota continua e atingidos, que se mantém sem atendimentos, sofrem às margens das alegações. Várias comunidades ribeirinhas e distritos ao longo do Rio Madeira foram inundados.
(Fonte e imagens: MAB)
No último dia 13 de fevereiro foi decretado “estado de emergência” no município de Porto Velho devido às chuvas intensas e a grande cheia no rio Madeira. Com previsões de médias históricas, esta pode ser a maior enchente dos últimos 100 anos, de acordo com o prefeito, Mauro Nassif. O Serviço de Proteção da Amazônia (Sipam) trabalha na perspectiva de decretar estado de calamidade pública, caso o nível do Rio Madeira continue subindo.
Em Porto Velho, o barranco que era de 20 metros no período de seca se tornou um alagamento que ultrapassa de 150 metros de extensão desde a margem do rio. Dados da Defesa Civil apontam que o nível do rio Madeira está com 17,5 metros.
O porto Cai N'água foi interditado e a balsa que interliga Porto Velho à Humaitá (AM) e a balsa que dá acesso ao Acre estão com dificuldades de operação, sem local seguro para atracar. O tradicional Mercado do Produtor, além de prédio públicos, como o Tribunal Regional Eleitoral e Justiça Federal, estão ilhados e com atividades suspensas.
No bairro Triângulo, atingido pelo desbarrancamento das margens do rio em 2012 logo após inicio do funcionamento da usina de Santo Antônio, as casas foram invadidas pela água. Mais de sete bairros das regiões baixas também estão alagados. Já são mais de 1000 famílias atingidas em todo o município de Porto Velho, segundo informações da Defesa Civil Municipal.
Mais de 10 comunidades ribeirinhas e outros distritos de Porto Velho ao longo do rio Madeira estão inundados. Segundo a Agência Estadual de Vigilância em Saúde (Agevisa), enfermidades como diarréia, leptospirose, hepatite, febre tifóide e até mesmo cólera irão afetar a população que fica em contato com a água.
O Projeto de assentamento Joana Darc e os reassentamentos feitos pela empresa Santo Antônio Energia (Santa Rita, Morrinhos, Riacho Azul e São Domingos) estão com estradas obstruídas, com queda de pontes e com o solo encharcado, os atingidos estão perdendo a produção anual de macaxeira e outros produtos.
Na comunidade de São Carlos, localizada à jusante da usina de Santo Antônio, muitas famílias perderam seus bens do dia para a noite e estão sendo alojadas às pressas nas escolas e igrejas, sem previsão de retorno. As águas do Rio Madeira chegaram a se juntar às águas do rio Jamari, impedindo a passagem de ônibus e outros veículos às comunidades de São Carlos, Brasileira e Jamari.
Acima da barragem de Jirau, as águas estão próximas de alagar a ponte de Jaci Paraná, distrito que sofre com freqüentes inundações desde a implementação das hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau. A área do Parque Municipal de Jaci Paraná, construído pelo consórcio Santo Antônio Energia está debaixo d'água, local em que o marco da UHE Santo Antônio é de 74,7 metros.
Ruas alagadas e acesso impedido
A ponte de Guajará Mirim, que dá acesso à Bolívia, também está inundada, situação que impede o escoamento da produção e abastecimento de toda a região com alimentos, combustível, água, medicamentos e transporte de pessoas. O nível do Rio Araras, que desemboca no Rio Madeira, também subiu consideravelmente e causou a inundação de vários trechos da BR-425 e da ponte histórica da Estrada de Ferro em Nova Mamoré.
Moradores de Abunã, distrito localizado às margens do rio Madeira, acima da usina de Jirau, também sofrem com o alagamento das casas e aparecimento de animais perigosos e até hoje não tem informações se serão atingidos no aumento de cota das usinas de Jirau e Santo Antônio.
O Corpo de Bombeiros, junto com a Defesa Civil e o Exército, continuam com trabalho intenso de retirada das famílias em áreas de risco. Porém, durante reunião sobre a situação da cheia do Rio Madeira, na quarta-feira (12), entre representantes de órgãos de segurança de Porto Velho, o gerente de operação e manutenção do consórcio Santo Antônio Energia, Amauri Alvarez, negou responsabilidade dos consórcios, afirmando que: "não há como comprovar construção da usina de Santo Antônio com a cheia do Rio Madeira".
A acumulação de água nos reservatórios e o aumento da vazão dos vertedouros das usinas de Santo Antônio e Jirau potencializam os alagamentos naturais do período e mais áreas, que antes não sofriam alagamento, são atingidas.
Além disso, a velocidade e amplitude das inundações estão muito maiores, alegam moradores de todas as comunidades. "A cheia do Madeira era previsível, as datas em que a cheia atingia seu máximo eram conhecidas. Hoje, de um dia pra outro, a água está dentro de casa", conta Márcio, morador da comunidade de São Carlos e militante do MAB.
O consórcio construtor da usina de Jirau, Energia Sustentável do Brasil, enviou uma notificação à Agência Nacional de Águas (ANA), ao Ibama, à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) afirmando que a hidrelétrica de Santo Antônio está desrespeitando o limite de acúmulo de água em seu reservatório estabelecido pelo seu projeto. A altura máxima suportada por Jirau é de 74,8 metros em relação ao reservatório da usina de Santo Antônio. Porém, a UHE Santo Antônio estaria operando com um reservatório que, no início de fevereiro, teria ultrapassado a cota de 75 metros, atingindo o limite que garante a segurança e estabilidade do empreendimento, alega a ESBR.
Fato preocupante é que no documento a solicitação do imediato esvaziamento de excedente das águas acumuladas do reservatório da UHE Santo Antônio para que a obra de Jirau volte ao seu andamento normal e que as estruturas construídas não sejam danificadas.
Esta situação traz à tona a briga entre os dois consórcios na ANEEL, em que ambos exigem o aumento da cota de seus reservatórios e o que garante, para um ou para outro, uma receita extra estimada em R$ 3 bilhões ao longo de suas concessões. Porém, o aumento da cota da UHE de Santo Antônio diminuiria a geração de energia da usina de Jirau.
Na primeira semana de fevereiro, o MPF abriu inquérito civil para investigar três aspectos que envolvem a usina Santo Antônio: (1) descumprimento das condicionantes da licença de operação; (2) a falta de consulta popular sobre a elevação no nível do reservatório da hidrelétrica - aumento da área alagada; e para (3) apurar se os impactos socioambientais foram estimados abaixo do real.
Para o procurador da República, Raphael Bevilaqua, estas situações precisam ser esclarecidas a fim de que a população de Rondônia não tenha prejuízos com eventuais danos ambientais e sociais. Está em vigor a decisão liminar, obtida no dia 3 de fevereiro, que impede o IBAMA de autorizar a elevação da cota do rio Madeira, o que resultaria no aumento da área alagada.
Para o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), essa situação estava prevista para acontecer. As usinas sempre negaram o número de atingidos e a área real a ser atingida pelo lago e, com as chuvas e os reservatórios cheios, as nossas afirmações apenas se confirmam: mais comunidades alagadas e mais famílias atingidas.
Portanto, com as usinas operando no limite e enquanto os consórcios construtores disputam as possibilidades de gerar mais lucro, as comunidades e população que vivem à margem de todo o rio Madeira continuarão sofrendo com a maior enchente dos últimos cem anos da região, causada e pontecializada pelas obras das hidrelétricas do rio Madeira.
Por isso, exigimos:
Soluções imediatas para as famílias atingidas!
Investigação e punição das irregularidades cometidas pelos consórcios construtores das barragens de Santo Antônio e Jirau e que reparem perdas da população com as cheias!