Dado é indício de apropriação ilegal de terras, conhecida como grilagem. Problema é tão comum em RO, MS e GO que soma dos registros supera superfície dos próprios Estados.
(Folha de São Paulo)
Um em cada quatro municípios brasileiros tem mais propriedades rurais cadastradas do que a sua própria superfície territorial, indício da apropriação ilegal de terras, conhecida como grilagem.
Dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) obtidos pela Folha com base na Lei de Acesso à Informação mostram que a situação ocorre em 1.355 das 5.566 cidades brasileiras (24,3%).
"Sabíamos que em alguns municípios esse problema ocorria, mas é uma grande surpresa serem tantos assim, no Brasil inteiro", afirmou Girolamo Treccani, professor de direito agrário da Universidade Federal do Pará (UFPA).
Em Rondônia, Mato Grosso do Sul e Goiás, esse problema fundiário é tão frequente que a soma dos registros de terra supera a superfície dos próprios Estados.
Em um hipotético município onde todos os registros de terra são regulares, a soma dessas áreas jamais atingirá 100% da superfície apontada pelo IBGE, já que toda a zona urbana, por exemplo, fica fora dessa conta.
O especialista da UFPA considera que os dados são "prova inquestionável" da ocorrência de grilagens.
O Incra, porém, é mais cauteloso e afirma que o problema também pode ocorrer por erro dos servidores do órgão no momento de preencher um cadastro de imóvel rural.
Mas, além disso, existe a possibilidade de fraude no sistema do órgão, o que seria um tipo de grilagem virtual.
Para Evandro Cardoso, coordenador nacional do cadastro rural do Incra, a inconsistência na base de dados ocorre porque o proprietário do imóvel é o responsável pelos dados declarados.
Segundo ele, o órgão tem tomado medidas para checar os dados e corrigir o problema -fechou uma parceria com o Exército para tentar combater o que seus técnicos chamam de "inconsistências" na base de dados.
CONFLITOS
A sobreposição de terras (quando uma propriedade está registrada no mesmo local de outro imóvel) é um dos combustíveis dos conflitos agrários.
Das 144 mortes por disputas agrárias registradas nos últimos cinco anos pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), 45 (31%) ocorreram em cidades onde há mais registros do que terras.
O caso mais significativo é o do município Ladário (MS). A cidade tem 34 mil hectares, mas seus registros de terra chegam a 397 mil hectares (11 vezes a mais).
Procurados, assessores da prefeitura não responderam.