COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

A caminhada que teve início em Bom Jesus da Lapa, no dia 4 de julho, logo após o encerramento da 33ª Romaria da Terra e das Águas, deve ser terminada ao final desta semana e não é a primeira experiência de peregrinação dos participantes. Formado há 25 anos, o grupo tem percorrido o Nordeste Brasileiro durante esses anos, visitando lugares que têm importância histórica ou religiosa para a região.

 


Durante uma semana, um grupo de 12 pessoas percorrerá a pé as barrancas do Velho Chico entre Bom Jesus da Lapa e Ibotirama, na Bahia. São 160 km de caminhada, sem a certeza de abrigo ou alimentação, contando apenas com a providência divina e a solidariedade das pessoas que encontrarem pelo caminho. Para muitos, isso é loucura, para o grupo de Peregrinos do Nordeste é um ato de fé, em Deus e na pessoa humana.

A caminhada que teve início em Bom Jesus da Lapa, no dia 4 de julho, logo após o encerramento da 33ª Romaria da Terra e das Águas, deve ser terminada ao final desta semana e não é a primeira experiência de peregrinação dos participantes. Formado há 25 anos, o grupo tem percorrido o Nordeste Brasileiro durante esses anos, visitando lugares que têm importância histórica ou religiosa para a região. Juazeiro do Norte no Ceará, Canudos na Bahia, reservas indígenas no Maranhão, entre outros, já estiveram presentes no roteiro. Esse ano o destino escolhido foi o rio São Francisco. “Queremos trazer à tona a vida e a sobrevivência do rio e também nos colocarmos contra a transposição”, explica Artur Peregrino, fundador do grupo.

A idéia do peregrino tem raízes profundas na história do Nordeste. Em meados do século XIX surgiu no sertão o Padre Ibiapina (1806-1883). Depois de ter sido advogado, juiz e deputado do Império, tornou-se padre. Crítico do comodismo da Igreja, centralizada no litoral, pôs-se a peregrinar pelo interior, evangelizando de lugar em lugar. Pregava a fé, a caridade e o trabalho, mas também se dedicava a obras que melhorassem a vida das pessoas, como as aguadas, as cisternas de água de chuva e as “casas de caridade” para acolhimento dos pobres. Precursor de uma Igreja que surgiria bem mais tarde, conjugava o religioso e o militante social. Logo passou a ser acompanhado de beatos e beatas, leigos que multiplicavam suas idéias, pregações e obras. O mais famoso deles foi Antonio Conselheiro. Padre Cícero também foi influenciado por Ibiapina.

A proposta dos peregrinos no São Francisco é fazer o percurso à beira do rio, para ter contato direto com o povo ribeirinho. “Queremos conhecer a história do povo, saber o que é contado por eles e também falarmos da nossa experiência”, conta Itamar Peregrino.

Formado por homens e mulheres, professores universitários, estudantes, educadores, borracheiros e de outras profissões, o grupo é ecumênico e tem ao todo 35 pessoas, de todos os estados nordestinos, com exceção do Maranhão. Para as peregrinações, nem sempre é possível a participação de todos os integrantes, devido a compromissos familiares e profissionais difíceis de serem conciliados com as caminhadas que sempre acontecem no mês de julho.

A opção por não carregar alimentos nem dinheiro e depender apenas do que recebem das pessoas encontradas pelo caminho tem uma razão simples. “O que queremos é viver uma experiência de Deus, no coração do Nordeste, junto ao povo sofrido”, explica Artur.

“Na verdade nós recebemos muito mais do que damos”, reflete Itamar. Ele cita como exemplo uma experiência vivida no Piauí. “Em meio ao nada encontramos um casebre e nele tinha uma mulher na frente da porta com 1 litro de leite para nos dar. Ela falou que tinha acabado de tirar o leite e estava apenas nos esperando”, conta. O leite alimentou o grupo de 17 pessoas na ocasião e mais que matar a fome marcou os participantes. “Quem menos tem é quem mais nos dá”, reflete Itamar.

Ao final da caminhada o grupo pretende divulgar para a sociedade uma carta-testamento contando a experiência e as situações encontradas. “A carta será um chamado para discutirmos o que devemos fazer em relação às pessoas que encontramos e em relação ao rio”, promete Artur.

 

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