COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Carol

Gravação iniciada. Bom dia a todos e a todas, meu nome é Carol Brasileiro, eu sou doutoranda em Direito pela UFMG, sou pesquisadora da equipe Massacres no Campo, na Nova República, uma pesquisa em parceria entre o IPDMS com a CPT, e nós hoje estamos aqui para entrevistar José Batista Afonso, que é advogado da CPT.

 

Sarah

E meu nome é Sarah, gente, difícil ficar falando sozinha aqui. Eu sou mestre em Direito Agrário pela UFG, estudando massacres no campo, violência e criminalidade no campo. Sou pesquisadora também do meu povo, faço parte do coletivo dos estudos ciganos do Brasil e do Romani Gender Experts na Europa. E é isso, estamos aqui para caminhar para o final da nossa pesquisa e falar um pouco sobre Eldorado dos Carajás.

 

José Batista Afonso

Bom dia a todos e todas. Sou José Batista Afonso, sou advogado da CPT no Pará, mais precisamente na região sul e sudeste, moro em Marabá, no sudeste do Pará.

 

Carol

Certo, Batista. Muito obrigada por você ter aceitado o nosso convite, a gente fica muito honrada de tê-lo aqui hoje, para conversar conosco, porque a gente tem certeza que a sua experiência, sua história de vida, tem muito a agregar para os rumos da nossa pesquisa, né? E você que já tem contribuído desde o princípio. E principalmente para tratar de Eldorado dos Carajás, que é um marco na nossa história, tanto de violência, de recrudescimento da violência no campo no Brasil, quanto de avanços, né, que foram resultado da atuação do movimento social em reação a essa violência.

 

Então, a gente, primeiro, queria que você contasse um pouco da sua trajetória, né, e se descrevesse da forma como melhor preferir, enquanto cidadão, profissional, militante. Pode ficar à vontade.

 

José Batista Afonso

Então, primeiro, agradecer pelo convite para essa conversa, diria assim. Eu sei da importância desse trabalho que está sendo feito, dessa pesquisa sobre massacres no campo, tanto no sentido de resgate da memória, da história de todos esses e essas que tombaram nessa luta, mas é importante também o peso político de se propor fazer uma pesquisa dessa natureza. Então, eu considero isso de extrema importância e parabenizar todos pela iniciativa, todos e todas pela iniciativa.

 

Eu já estou na CPT de Marabá desde 1996. Eu vim para a CPT justamente no ano do massacre de Eldorado dos Carajás, mas minha origem não é aqui do Pará. Eu sou de origem mineira, nasci em Minas Gerais, mais precisamente na região do Vale do Jequitinhonha, uma cidadezinha com o nome de Turmalina. E minha família e dezenas de outras famílias daquela nossa região migraram para o estado do Pará na década de 1970 e migraram justamente motivados pela propaganda do Estado à época, dos militares, que nessa região da Amazônia teria terra para famílias que não tinham terra em outras regiões do Brasil devido às dificuldades que se enfrentavam naquela região de Minas, que é a região do Vale do Jequitinhonha, índice de pobreza muito alto, escassez de chuva também é bastante presente, além do descaso governamental de atendimento com políticas públicas para famílias mais pobres.

 

Então, minha família e praticamente quase todos os meus parentes decidiram migrar para essa região do Pará, mas a motivação principal foi a propaganda do Estado. E a migração se deu no contexto de deslocamento de milhares de outras famílias de diferentes regiões do Brasil, de outros estados, no sentido de, vamos dizer assim, buscar outras alternativas motivadas por uma propaganda que, naquele momento... meus pais achavam que era uma alternativa, mas, na verdade, quando chegamos no Pará, vimos que era uma propaganda enganosa.

 

A cidadezinha que nós migramos é Conceição do Araguaia, é a primeira cidade na divisa com Tocantins, na parte sul do Estado, onde meus familiares moram até hoje. E depois eu acabei... por algumas razões, entrando num seminário para tentar estudar e, naquelas circunstâncias, acabei aceitando fazer um curso de teologia com o objetivo de ser padre na Diocese de Conceição do Araguaia. Depois... acabei decidindo não ser padre, embora tenha concluído o curso de teologia, e decidi, então, ficar trabalhando nas pastorais sociais da Diocese de Conceição do Araguaia, que era a nossa diocese. E, em 1996, eu me encontrava numa cidade aqui, por nome de Xinguara, que fica a 240 quilômetros de Marabá e a 140 quilômetros da Curva do Oeste, onde aconteceu o massacre. E naquela época eu tinha um trabalho de voluntário na equipe da CPT de Xinguara, que tinha à frente um frade advogado muito conhecido aqui na região, que foi o Fréhenri de Rosier, um francês.

 

E aí, na noite do dia 17 de abril, eu descia da minha casa para o colégio, da aula que eu estava trabalhando como professor na escola pública, e me deparei com as imagens do Massacre de Eldorado na TV. No dia seguinte, eu e Frei Henri viemos para a Curva do Oeste, chegamos ainda durante o dia, e acompanhamos todo o desenrolar do velório, o sepultamento dos 19 mortos ali na Curva do Oeste e logo depois recebi um convite da CPT de Marabá para me integrar à equipe da CPT aqui da diocese de Marabá. E acabei aceitando esse convite e em agosto de 1996 eu acabei me integrando à equipe da CPT de Marabá. Por incrível que pareça, continuo por aqui até hoje.

 

Sarah

Muito bom. Só contextualizando um pouco o porquê da gente estar aqui conversando com você de novo.

 

No início da pesquisa, tu teve um encontro com a gente, quando a gente estava em outra fase da pesquisa e ela mudou muito, o que o drama é toda pesquisa, né, se ela não mudar, não é pesquisa de verdade. Então, a gente chegou nesse lugar aqui, a gente faz parte de um grupo de trabalho, eu, a Carol, a Mara, que estuda o sul e o sudeste do Pará.

 

Nós ficamos com essa contextualização regional. E nosso caso principal é Pau D'Arco, que vai ser o referencial e vários outros estarão ali menos subsidiados, porque Pau D'Arco tem um referencial documental muito grande, que a maioria dos casos de massacre no campo no Brasil não tem e o início da pesquisa trabalhou com Eldorado dos Carajás, como esse principal caso de precipitação histórica anterior a Paul D'Arco.

Então a gente quis revisitar e não deixar de canto mesmo o que aconteceu em Eldorado dos Carajás, e a gente vai produzir um documento a partir desses estudos que a gente fez bem anteriormente, porque Paulo D'Arco mesmo gastou um ano para a gente estudar tudo praticamente. Então a gente está revisitando esse caso e a gente gostaria muito de contar com a sua experiência pessoal.

 

A gente fez um roteirinho de perguntas para aproveitar de fato o que você viveu, o que você passou mesmo da sua experiência pessoal e política ao mesmo tempo. E a gente vai estar fazendo essas perguntas para você se estiver tranquilo. Carol.

 

Carol

Então, podemos seguir, Batista? Então beleza. A gente queria entender melhor, Batista, qual que é, qual que foi a sua atuação especificamente no caso de Eldorado dos Carajás e também para você qual que seria a importância da CPT e da advocacia popular nos casos de massacres no campo também.

 

José Batista Afonso

Então, como advogado, eu não atuei inicialmente no processo de Eldorado dos Carajás. Eu ingressei na equipe da CPT de Marabá em agosto de 1996, o massacre tinha ocorrido em 17 de abril do mesmo ano. E a gente não tinha advogado nos quadros da equipe da CPT de Marabá, tinha advogado numa entidade parceira, que era a Sociedade Paraíso de Defesa dos Direitos Humanos.

 

Quando eu cheguei aqui em Marabá, em 96, eu fazia um curso de história pelo campus da Universidade Federal do Pará, aqui em Marabá. Fazia o curso intervalar neste período de recessos, porque eu era professor. E, quando cheguei aqui, me deparei com uma situação de conflito muito grande. Muitas ocupações de terras, o índice de assassinatos muito alto, muitas situações de violação de direitos humanos na região e eu entendi que havia uma carência grande de advogados que atuavam na região.

 

A CPT já acompanhava muitos outros casos, porque a CPT sempre atuou assim, pegando alguns casos considerados emblemáticos, para tentar, a partir daqueles casos, questionar não só a atuação da justiça, mas também fazer o enfrentamento político. Então, a CPT de Conceição do Araguaia, embora não tivesse advogado os seus quadros, mas tocava alguns processos considerados emblemáticos, o processo João Canuto, a liderança que foi assassinada em Rio Maria, o processo do Expedito Ribeiro, processos de outras lideranças mais conhecidas na região, mas sempre contava com a ajuda de advogados e advogadas de outras regiões do Brasil, advogados e advogadas populares, Márcio Tomás Bastos, Eduardo Greenhall, a freira Melri, esqueci o segundo nome dela, sempre atuaram na região em parceria com a CPT. Então a CPT elegia esses casos como casos de enfrentamento mesmo com a judiciário e com… vamos dizer assim, o enfrentamento político também na região. Então eu quando cheguei em Marabá eu entendi que, dado a situação de conflito aqui, era importante ter um advogado ou uma advogada que fosse atuar se morasse na região e foi minha decisão de abandonar o curso de direito, de história melhor dizendo, e optar pelo curso de direito. Então fiz o vestibular em 96 mesmo e ingressei no curso de Direito no mesmo ano. Então, nos primeiros anos da apuração do Massacre de Eldorado, da ação penal, eu atuei como estagiário, e o advogado principal que acompanhava era um advogado do MST que se chamava Carlos Guedes do Amaral Júnior, que até hoje faz parceria com a gente. Ele era o advogado principal do MST nesse processo. Então, eu era uma espécie de estagiário dele, que sempre acompanhava em todos os passos. Isso nos primeiros anos. Depois, na finalização da ação penal, veio o primeiro julgamento, aí tive uma participação um pouco mais direta e teve a anulação do primeiro julgamento.

 

Aí vem as batalhas seguintes na tentativa de punição dos responsáveis pelos crimes. Mas a CPT sempre entendeu que o enfrentamento jurídico era uma estratégia, em relação a esses casos de assassinatos, principalmente os casos que reuniam condições mais objetivas de responsabilização e punição dos responsáveis pelos crimes, era uma estratégia importante para fazer o enfrentamento e fortalecer a luta dos movimentos sociais nessa região.

 

Carol

Ótimo, muito bom, muito obrigada. Batista, na sua fala, você a todo momento traz diferentes marcos históricos, né, da história recente do sul do Pará. E no seu trabalho de pesquisa, isso também aparece muito e a gente acredita que você pode contribuir muito com isso. Então, a gente queria que você, se você puder definir alguns desses marcos históricos principais da região, e que levam a esse contexto de violência muito grande.

 

José Batista Afonso

Assim, tem que... é uma questão bastante ampla, mas diria o seguinte, até a década de 50, a década de 60, essa região do sul e sudeste do Pará, era uma região ocupada basicamente por ribeirinhos, posseiros, extrativistas, populações indígenas, pequenos garimpeiros. Essa população, eles tinham, vamos dizer assim, a posse da terra, e era a posse principalmente da margem dos rios, os rios Tocantins e Araguaia.

 

Geralmente, as posses sequer tinham divisa com os confrontantes, era uma ocupação mais livre, mas essa população não tinha a propriedade garantida pelo Estado. Tinha a posse, mas não tinha propriedade, não tinha nenhum documento que garantisse a propriedade. Também não era naquele contexto a reivindicação dessas populações. O modo de vida era diferente. Da mesma forma, as populações indígenas não tinham seus territórios demarcados.

 

A situação começou a mudar... a partir da década de 1950, com a abertura da Belém-Brasília, que, embora não cortasse essa região do sul e sudeste do Pará, mas passou muito próximo, a uma distância, uma margem, mais ou menos, de 100 a 150 quilômetros, margeando essa região. E, com a abertura da Belém-Brasília, houve uma corrida dos grandes proprietários de terras, empresas para abrirem seus negócios nas margens da estrada e uma das atividades principais era a criação extensiva de gado. E essa região do Pará já passou a ser alvo da cobiça desses grandes grupos que passaram a ter interesse de comprar as terras do governo do Estado e, para isso, o Estado do Pará sempre favoreceu a venda de milhões de hectares de terra, sem nenhum critério objetivo. O critério era o interesse dos capitalistas, que queriam vir para a região. Não tinha limite de tamanho de área vendida e nem estabelecimento de critérios, tipo, por exemplo, a área ocupada por indígenas, a área ocupada por ribeirinhos, essas estão fora. Não existia nenhuma preocupação com isso.

 

E aí, pela década de 1950, mais ou menos, nessa região, essa micro região aqui de Marabá, que se chama Sudeste do Pará, a atividade econômica principal era a comercialização da castanha do Pará. Era a atividade econômica principal. E aqui tinha a chamada região dos polígonos dos castanhais, uma área de aproximadamente um milhão de hectares que predominava a floresta de castanhais. Então, esses castanhais, até no início da exploração, eram castanhais praticamente livres, que as populações poderiam ingressar, fazer a coleta e sair novamente, mas aí, com a expansão da economia da castanha, essas áreas passaram a ser controladas e apropriadas por grandes famílias, pelas principais famílias políticas da região aqui de Marabá.

 

Então, quando houve o golpe militar, em 1964, e aí tinha uma questão anterior, porque antes do golpe, depois do golpe, no final da década de 60, descobriu-se o foco de uma guerrilha rural aqui na região, a chamada Guerrilha do Araguaia. Então, vamos dizer assim, os militares, com a sua lógica de integrar a Amazônia ao Brasil, achando que o movimento guerrilheiros iam entrar pela Amazônia brasileira, e também de combater a guerrilha do Araguaia, que já tinha informações da sua existência nessa região, implantaram um modelo de desenvolvimento para essa micro região chamada Amazônia Oriental, que era centrado basicamente em três atividades econômicas, a exploração madeireira, a exploração minerária e a implantação da pecuária extensiva. Para isso, o Estado favoreceu, de todas as formas, os grandes grupos econômicos, que eram parceiros dos militares à época para deslocamento para cá.

 

Então, se criou a Sudam para favorecer a destinação de recursos para a abertura das fazendas, mudou a legislação para criar os incentivos fiscais, quem quisesse vir investir aqui deixava de pagar imposto nos seus estados de origem, nas suas atividades econômicas nos outros estados, terra a disposição, sem critério nenhum, de tamanho, quantitativa a ser destinado para cada grupo econômico e, na lógica dos militares, no projeto desenvolvimento dos militares, O objetivo era deslocar esses grandes grupos econômicos para cá e intensificar a pecuária extensiva na região. Mas as populações que residiam aqui, os posseiros, indígenas, ribeirinhos, os pescadores e muitos outros, que como eu falei no início, tinha posta à terra, mas não tinha propriedade, esses não fizeram parte do plano de desenvolvimento dos militares, não contavam no modelo de desenvolvimento dos militares, até porque consta nos registros que não sobrevoou que um dos presidentes, um dos ditadores, presidente do Brasil à época, sobrevoou a região e entendeu que era uma região, um espaço vazio, sem ocupação.

 

Olhando de cima, parecia um espaço vazio, porque era uma região de floresta praticamente intacta, só que embaixo tinha muita gente já morando. Então, a partir do golpe militar, a gente pode dizer que o desenvolvimento dessa região é antes do golpe e posterior ao golpe. Desenvolvimento que eu digo na ótica dos militares. E aí esse modelo pensado pelos militares criou muitos problemas de ordem social, de ordem é de destinação das terras em relação a problemas ambientais graves e conflitos em violação de direitos das populações que já residiam aqui além de outros problemas né.

 

Sarah

Ótimo. Sobre essa questão, aprofundando um pouco mais, a gente tem que a ocupação da fase da macaxeira, ali na região do massacre, contou com 10 mil pessoas, que é considerado um dos processos maiores que a gente tem na região desse tipo até então pelo tempo histórico que a gente tá falando e na sua dissertação você descreve o massacre de Eldorado Dos Carajás como resposta né e como estratégia de fortalecimento do MST na região né que é ocupar para mobilizar.

 

A gente queria que você abordasse como que essas mudanças táticas da luta do movimento social refletiram nas transformações da conjuntura regional, como que a luta de classe se expressou nesses conflitos por terra, porque que a violência na região é tão intensa e continua sendo até hoje, de uma maneira muito diferente do resto do país, e porque que se trata de uma violência endêmica, o que mudou, o que permanece, fazendo essa transição, por exemplo, de Eldorado para Pau D'Arco?

 

José Batista Afonso

Eu vou abrir um parênteses aqui, antes de chegar na questão do MST, envolvendo a atuação do MST, porque tem outros elementos que seria interessante considerar. Como eu estava dizendo na pergunta anterior, essa região, principalmente na região chamada Bico do Papagaio, que é encontro dos rios Tocantins e Araguaia, era uma região muito marcada pela posse da terra, pela presença de posseiros, que exerciam atividades agrícolas à margem dos rios, tinha posse, mas não tinha propriedade, como já disse. Com o golpe militar, as terras dessa região passaram a ser distribuídas indiscriminadamente para pecuaristas, grupos econômicos de outras regiões do Brasil, capitalistas de outras regiões do Brasil, até do exterior. Então, a primeira reação contra essa distribuição sem controle das terras foi a chamada reação dos posseiros, na região do Bico do Papagaio, que pega os municípios do lado do Pará.

 

Um belo dia, uma comunidade que exercia a posse há 10, 15, 20, 50 anos era despertada com um oficial de justiça na sua porta, dizendo que essa terra pertence ao grupo econômico tal, que reside em qualquer outra região do Brasil, e que vocês têm que desocupar, porque tem uma decisão aqui de reintegração de posse a favor desse proprietário. Aí começou a chamada luta dos posseiros, resistência posseira. Começou nessa região chamada Baixo Araguaia, e foi justamente na região onde teve a atuação da guerrilha do Araguaia. E os métodos utilizados pelos posseiros para fazer a resistência contra essas invasões desses grupos econômicos patrocinados pelo Estado e pelos militares, era então nos moldes da guerrilha.

 

Os homens se embrenhavam na mata e se organizavam coletivamente no interior da floresta e tentavam fazer a resistência contra pistoleiros, que eram contratados para tentar expulsar as famílias, e contra policiais, que naquele momento, polícia e pistoleiro sempre se misturavam. Bom, então isso ficou conhecido como a luta dos posseiros.

 

Nesse contexto, por exemplo, nesse período que foi assassinado, o padre Josimo Moraes Tavares, do outro lado, no Maranhão, Tocantins, não sei, e o padre Josimo era, inclusive, filho de Marabá. E, bom, o outro elemento que precisa ser considerado é que como implantar a pecuária extensiva numa região em que predomina a floresta nativa? Então, como transformar a floresta em pastagem? Aí precisava de muita mão de obra.

 

Estamos falando de um momento em que nem quase se usava motosserra, praticamente era foice e machado. Imagina o quanto de estatística de mão de obra que seria necessário para transformar essas áreas de floresta em pastagem, para a implantação da pecuária extensiva. Aí vem a propaganda militar de deslocamento de populações pobres de outras regiões para essa região aqui, nessa propaganda, por exemplo, que minha família veio. Só que quando chegavam aqui, que iam procurar emprego em fazendas que estavam sendo abertas ou serrarias que faziam exploração madeireira, descobriram que uma prática que nem se pensava que existia era a prática do trabalho escravo, era submetida a trabalho escravo. Ou seja, trabalhava quando derrubava centenas de hectares de floresta, quando ia receber o dinheiro, os direitos, não recebia. Então, começou a ser denunciado na região os primeiros casos de trabalho escravo contemporâneo. Aí os migrantes aos milhares que chegavam, vendo a área, isso já alguns anos depois, as terras todas distribuídas entre grandes grupos econômicos, aí a decisão foi, olha, em vez de ser escravo nas fazendas, vamos fazer a ocupação da terra. Então começou um processo de ocupação dessas fazendas por migrantes que vinham.

 

Naquele momento, no Brasil, ainda no período militar não tinha MST aqui, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais era controlado pelos militares, não tinha organização nenhuma. Então, quando tinha uma ocupação ou alguma situação de violência, procurava quem? Procurava a igreja. Era o único órgão até aquele momento que não tinha... não estava sob controle dos militares, porque a diocese de Conceição em Marabá era uma espécie de oposição aos militares. Então, batiam na porta da igreja, com a criação da CPT em 1975, a CPT passou a ser a porta de apresentação de denúncia pelos trabalhadores. Aí então o sul e o sudeste do Pará se transformou, no final da década de 60, década de 70, em uma área de conflitos permanentes, de um lado, posseiros já existentes que resistiam nas suas terras, posseiros que já moravam aqui, e migrantes que também chegaram depois, começaram a fazer processo de ocupação, e do outro lado, os grandes grupos econômicos, fazendeiros e pecuaristas que vinham de outras regiões, ou aqueles que residiam aqui de famílias influentes. E aí transformou o sul do Pará numa região de intensos conflitos, o sul e o sudeste do Pará, região de intensos conflitos, com muitas mortes. Naquela altura, mortes, inclusive, dos dois lados.

 

E aí a região ficou muito conhecida justamente por esse alto índice de violência no campo. E estamos vendo, nesse cenário, nessa altura, final da década de 1980, o MST estava ainda em outras regiões do Brasil, no centro-sul, na região sul e sudeste do Brasil. E aí houve contato do MST com o pessoal do sindicalismo de Conceição do Araguaia, e o MST decidiu abrir uma frente em Conceição, que era a porta de entrada principal naquela região. Só que, quando o MST se instalou lá no final da década de 1980, percebeu que ali já não era mais um município com a existência de muitos latifúndios, porque a ocupação dos posseiros, que já era tradição na região, tinha ocupado a maioria dos latifúndios. E era um município pequeno e geograficamente isolado. E aí a decisão do MST foi sair de Conceição e vir para Marabá.

 

A primeira tentativa de ocupação do MST em Marabá foi fracassada, porque Marabá era o local que estava o exército instalado, a Polícia Federal, e sempre de olho em qualquer movimentação de camponeses, eles entendiam o que era resquício da guerrilha do Araguaia, que tinha sido, vamos dizer assim, perseguida e derrotada, de certa forma, anos antes. Então, quando o MST tentou fazer a primeira ocupação em Marabá, as suas principais lideranças, seis delas, foram presas, antes da ocupação, presas pela polícia federal. E os meios de comunicação da região todas estamparam, nova célula da guerrilha do Araguaia desarticulada em Marabá. Então, o MST passou a ser visto como uma nova célula da guerrilha. E aí o Marabá também não deu certo, o MST decidiu se deslocar para Parauapebas.

 

Aí o Parauapebas tinha duas situações a serem consideradas. Primeiro, muito próximo do antigo garimpo de Serra Pelada, que tinha sido desativado no final da década de 80, e milhares de garimpeiros estavam na região sem saber para onde ir. Então, o MST, naquela altura, era uma alternativa muito viável para os ex-garimpeiros que estavam na região, porque o garimpo de Serra Pelada foi fechado. Além do mais, Parauapebas era a região do maior empreendimento minerário financiado pelos militares, que era o Projeto Ferro Carajás. Para ali, milhares de migrantes se deslocavam a cada ano. Então, o MST escolheu justamente essa região. E ali conseguiu fazer a primeira ocupação bem-sucedida, que foi na região de Rio Branco, Fazenda Rio Branco, que foi o primeiro assentamento do MST aqui no Pará, Pia Rio Branco. Em seguida, vem a ocupação de um imenso latifúndio da família Lunardelli, que era muito conhecida à época, que resultou no maior assentamento do MST até hoje aqui na região, que é o assentamento Palmares.

 

E aí, a partir da conquista de Palmares, o MST e a ocupação de Palmares foi uma ocupação massiva. Acho que, em termos comparativos, talvez tenha sido até maior do que a ocupação da fazenda macaxeira, não tenho esses dados certos, mas foi uma ocupação muito massiva. E é nesse contexto que surge o acampamento que resultou na tentativa de ocupação da Macaxeira e que resultou no massacre de Eldorado. É importante fazer esse parênteses para chegar na questão que você pergunta.

 

Na verdade, a chegada do MST aqui na região... ela foi vista pelo outro lado, pelos setores ligados ao latifúndio, pelo próprio Estado, como uma espécie de tentativa de ressuscitar a guerrilha do Araguaia. Uma espécie de... sempre foi vista como um movimento revolucionário. E aí, até então, as ocupações dos posseiros, elas eram ocupações... vamos dizer assim, a metodologia utilizada era... da guerrilha mesmo, era enfrentamento dentro da floresta, a maioria eram homens, as mulheres ficavam nas vilas e eram ocupações, de certa forma, mais clandestinas, porque não podiam aparecer, porque senão eram assassinados pelos pistoleiros e policiais que eram aliados.

 

Então, o MST chega, ao trazer a experiência de um acampamento, massivo, com homens, mulheres, crianças, à margem da estrada, cortar a cerca e entrar para dentro da fazenda, isso foi para o latifúndio e para os... vamos dizer assim, pelos que controlavam a política, que à época, pelos governantes, foi uma provocação, era uma provocação, eles viam o movimento como inimigo, que precisava ser destruído, desarticulado na região. Então, foi nesse contexto de tentar desarticular o MST na região, impedir que o MST se territorializasse na região, que o massacre começou a ser construído.

 

O massacre não aconteceu simplesmente no dia 17 de abril, teve uma série de movimentos antecedentes que chegaram até o massacre. Inclusive, tem relato de policiais, logo depois da chacina, depois do massacre, que era nesse nível assim: “acabamos com os comunistas, derrotamos os comunistas”, depois de ter 19 corpos à margem da estrada. Então, de fato, o MST traz uma outra dinâmica da luta pela terra na região. A gente pode dizer que a luta pela terra aqui é um pouco assim, antes do massacre e depois do massacre, vai modificar muito essa relação de enfrentamento com o latifúndio e também a forma de organização dos trabalhadores para a defesa e conquista da terra. Se eu fiz esse parênteses aí, só me ajuda aí na segunda parte da pergunta que vocês fizeram, só para me retomar aqui.

 

Carol

Pensar como que as mudanças táticas da luta do movimento social refletem nas transformações da conjuntura? Acho que respondeu, né, Sarah?

 

Sarah

Na verdade, a gente queria que você falasse o que permanece e o que mudou em cada tempo, sabe? Pensando no nosso presente de hoje também, sabe? ApósEldorado.

 

José Batista Afonso

Então, como eu estava dizendo... o Massacre de Eldorado, de certa forma, divide um pouco a história da luta pela terra de antes e depois. Até o Massacre, prevalecia a ocupação no estilo da luta posseira, que era, vamos dizer assim, não era na forma de acampamento, era na forma de enfrentamentos dentro da floresta, no estilo quase que de guerrilha. Depois do massacre, com a chegada do MST se traz uma outra metodologia, que é o acampamento.

 

Até o massacre, havia muita desconfiança do movimento sindical, dos trabalhadores rurais na região, com o MST. Havia uma certa incompreensão, uma certa desconfiança. Com o massacre, acabou acontecendo uma unificação dessas lutas. A aproximação do MST com o movimento sindical e com outros, com a igreja mais ainda, e com outros segmentos que dava apoio à luta pela terra na região. E aí, a partir do massacre, a estratégia principal, tanto para o MST quanto para os outros movimentos que não tinham essa metodologia, passou a ser o acampamento.

 

Então, tem até um historiador aqui da região, por nome de Ayrton dos Reis Pereira, ele escreveu um livro que o título é o seguinte... “Do posseiro ao sem-terra”. Houve essa transição da luta posseiro para a metodologia do sem-terra. Até antes era chamado de posseiro. Depois do massacre, passa a ser chamado de sem-terra. E aí houve um processo de enfrentamento muito duro. Eu diria que o latifúndio na região, a partir daí, foi para a defensiva. Ele perdeu muita força, porque a pressão foi muito forte, a percussão do massacre foi muito grande, e os movimentos sociais, em vez de recuarem, foram para cima.

 

O período pós-massacre é o período de maior número de ocupações aqui na região, de maior número de projetos de assentamentos criados e de maior número de assentamentos de famílias sem terra, e forçou mudanças também. Se lembram que até 1996 não existia sequer um Ministério de Política Fundiária, foi criado no governo Fernando Henrique após o massacre de Eldorado dos Carajás. Na região aqui não existia a superintendência do INCRA, só a unidade avançada, foi criada a superintendência logo depois do massacre. Não existia Ministério Público Federal nem Justiça Federal, foram criados depois do massacre. Então, a repercussão foi muito grande, houve uma pressão para que o Estado também modificasse a sua forma de presença na região.

 

O pós-massacre não significa dizer que houve diminuição da violência, porque a violência está muito ligada à questão do enfrentamento. Se o enfrentamento permanece com o latifúndio, infelizmente a violência é um componente desse enfrentamento. E os anos pós-massacre também resultaram em muitos assassinatos, principalmente de muitas lideranças do movimento sindical e também lideranças do MST. E, inclusive, muitas chacinas posteriores, e chegamos até, por exemplo, ao massacre de Pau d’Arco, muitos anos depois. Então, esse contexto de enfrentamento do latifúndio com sem terra, com os trabalhadores rurais, ele sempre foi muito presente nas lutas aqui na região.

 

Carol

Certo, Batista. Muito obrigada pela sua resposta.

 

Bem, na nossa pesquisa sobre os massacres no campo, nos interessa compreender a ausência de responsabilização nos processos criminais, né? A impunidade no campo, em relação aos poderosos das regiões.

 

Então a gente queria entender do seu ponto de vista como que a gente pode refletir sobre a precariedade da investigação e da instrução criminal do processo de Eldorado dos Carajás e como que isso impacta nessa impunidade. E também entender como que essa precariedade na investigação tem como repercussão um apagamento da memória e também a criminalização das vítimas do massacre.

 

José Batista Afonso

Então, o processo criminal que tinha como objetivo apurar as responsabilidades pelas mortes, em Eldorado dos Carajás, desde o início foi marcado por uma metodologia que a finalidade, nós não tínhamos dúvida nenhuma, era a impunidade. Ou seja, era evitar que os responsáveis principais pelas mortes fossem punidos, tanto aqueles que participaram diretamente dos crimes, executando os trabalhadores rurais sem terra, quanto aqueles que foram responsáveis pela decisão de, vamos dizer assim, da ação da polícia naquele local.

 

Então, desde o início se percebeu que seria muito difícil a punição dos responsáveis, principalmente por se tratar de policiais militares, até porque era comum na região a polícia atuar em conjunto com pistoleiros na defesa do latifúndio, assassinando, prendendo injustamente, assassinando trabalhadores, torturando, e os policiais ficarem totalmente impunes. Assim como também era comum a impunidade em relação aos pistoleiros, quem não conhece a história do famoso Sebastião da Terezona, que chefiou a pistolagem aqui na década de 1980, que tem sob sua responsabilidade dezenas de assassinatos, inúmeras chacinas, e nunca foi julgado e condenado por nenhuma dessas mortes. Pensar em levar um mandante de crime para a cadeia também isso era, na região, isso era feito inédito. Até então isso não existia.

 

Então, vamos dizer assim, essa impunidade estruturada, ela iria certamente fazer presente, fazer parte do processo de apuração do Massacre de Eldorado. Então, desde o início, se percebeu essa dificuldade. Primeiro, os policiais não tinham as cautelas, a cautela é o documento que liga o policial à arma que ele estava utilizando, desapareceram com as cautelas. Os policiais não usavam identificação. Bom, a identificação é importante para que podia ter provas testemunhais que ligasse aquele policial à execução de determinada pessoa. Não teve perícia no local do crime, não teve reconstituição no local do crime. Os corpos foram retirados imediatamente depois, nem ficaram no local para a perícia. A necropsia nos corpos, me lembro que veio um perito articulado pelos deputados federais, Nelson Mancini, foi proibido inicialmente fazer a perícia nos corpos, só depois de muita pressão é que liberaram. E aí, no curso da investigação, se percebeu que havia uma preocupação de construir a impunidade, inclusive isentando de investigação os responsáveis pelo mando. Então, o comandante-geral da Polícia Militar foi excluído das investigações.

 

O então secretário de segurança pública foi excluído de responsabilização e o então governador do estado também excluído da responsabilização. Sobraram os comandantes que ali estavam e os policiais. Mas numa investigação mal conduzida, como identificar os policiais responsáveis pelas execuções? Estamos falando de um batalhão de 155 policiais. No tribunal do júri é necessário que haja minimamente identificação dos responsáveis, individualização das condutas.

 

A não individualização das condutas ela dificulta muito a punição dos responsáveis numa sessão de tribunal do júri. Então o processo foi tão mal conduzido, inclusive na véspera do segundo julgamento, que o primeiro foi anulado de forma escandalosa pela posição parcial do juiz que conduziu o processo ao tribunal do júri. E na véspera da realização do segundo julgamento foi indiferido uma perícia feita à época pelo perito Ricardo Molina, que era peça fundamental de prova no processo.

 

Então, com isso, inclusive, o Movimento Sem Terra decidiu abandonar o tribunal do júri e a partir daí não acompanhou mais as sessões de julgamento. E o resultado foi o que nós conhecemos, apenas os dois comandantes foram condenados e ninguém mais. Todo mundo foi, o restante, todos foram absolvidos. Mas isso, a gente tem que entender o que aconteceu no Massacre do Eldorado, infelizmente, era uma... uma prática e um método de atuação do judiciário, da segurança pública, do Estado, dos governantes do Estado, que sempre foram... os poderes foram sempre... tinha uma relação muito forte com o latifúndio, com os proprietários de terras. Quem era proprietário de terra na região e quem é, não só tem um poder econômico muito forte, mas tem influências políticas muito grandes e mais do que influências políticas, nessa região nossa aqui, eles exercem diretamente a administração pública. Por exemplo, até o período do Massacre de Eldorado, os delegados de polícia eram indicados. Quem é que indicava? O prefeito, o vereador. Quem era o prefeito? Quem era o vereador? Era um latifundiário! Então, a justiça, a polícia, o poder executivo, legislativo, eram praticamente dominados pelo latifúndio. Então, pensar em punir os seus pares era uma coisa muito difícil.

 

Então, essa impunidade estruturada acabou sendo uma marca registrada em todos os processos que se buscava apurar a responsabilidade por crimes no campo no Pará. Lembrem-se que o primeiro mandante de crime condenado no Estado do Pará por crime no campo ocorreu no ano 2000. Foi o fazendeiro Geronimo Alves de Amorim, responsável pelo assassinato do sindicalista Expedito Ribeiro de Souza, ocorrido em Rio Marinho, em 1991, depois de uma pressão nacional e internacional muito forte. Foi o primeiro caso depois da existência de décadas de conflitos e mortes no campo, nessa região.

 

Sarah

Eu estou aqui correndo, escrevendo a relatoria, mas muito bom saber desse posterior. Um dado recente também que eu estava vendo é que, por exemplo, em Xinguara, que é a sua região aí, até pouco tempo atrás, de 140 pessoas assassinadas, nenhuma foi levada à responsabilização. Então, 100% de impunidade no mesmo local, então…

 

José Batista Afonso

Os casos que nós conseguimos levar os responsáveis a julgamento, seja pistoleiro, intermediário ou executor, executor, intermediário ou mandante, são aqueles casos que se conseguiu dar uma repercussão nacional e até internacional para o caso. Massacre de Eldorado, caso da irmã Dorothy Stang, o caso João Canuto, o caso do Zé Cláudio da Maria e outros poucos contados a dedo. Os casos que nós não conseguimos, que se chegasse a uma repercussão e uma pressão maior, estão na vala comum da impunidade.

 

A maioria absoluta dos homicídios sequer foram investigados, poucos investigados, muitos inquéritos não concluídos quando concluídos os processos, muitos deles não foram também concluídos, os acusados beneficiados pela prescrição e, em alguns casos, quando condenados, não são presos para cumprir as penas. Eu me referi aqui ao caso João Canuto, sindicalista assassinado em Rio Maria, em 1985, um caso muito conhecido, depois de 18 anos, aconteceu o julgamento e os dois fazendeiros mandantes foram condenados, mas até hoje nunca foram presos para cumprir as penas e nem poderão mais serem presos porque já prescreveu o direito do estado de recolhê-los cumprir a pena. Então assim, a luta não é só a luta que é travada pela disputa pelo controle das terras.

 

Os trabalhadores rurais e os movimentos sociais, ao fazer a luta, ao fazer as ocupações, estão disputando o controle da terra, mas aqui, além do controle da terra, é a luta também contra o Estado que está do outro lado, o Estado latifundiário, o Estado da região, o poder judiciário, que muitas vezes, grande parte dos seus membros são aliados também do latifundio e a dificuldade de vencer esse problema grave, eu diria assim, que é o sistema de impunidade construído para favorecer não só aqueles que cometem os crimes contra as pessoas, mas também cometem outros tipos de crime, crime contra a relação de trabalho, trabalho escravo, crimes contra o meio ambiente, crime de apropriação ilegal de terra pública, falsificação de documento público, grilagem, então, todo esse conjunto de crimes praticados pelos latifundiários, pelos homens das telas, são acobertados por esse manto da impunidade.

 

Sarah

Eu só lembro da minha atuação como advogada criminal. Você fica anos no processo, estudando, estudando, às vezes para não chegar em lugar nenhum, sabe? É bem triste.

 

E agora assim, continuando um pouco da linha dessa conversa sobre o hoje, a gente queria que você comparasse bem de fato agora Eldorado dos Carajás com o Pau D'Arco e como você percebe a diferença na qualidade da investigação, da produção probatória e com a responsabilização das pessoas. Pau D'Arco não chegou até hoje a nem ir para o tribunal do júri, então assim... não tem como a gente falar numa grande diferenciação nessa questão, mas a gente queria saber quais mudanças conjunturais na região que você se potencializa na diferenciação da luta de ontem e de hoje. Quais os riscos de hoje e quais os riscos de ontem? E é isso, a gente só tem mais 30 minutos, então a gente tem que aproveitar bem essas perguntas.

 

José Batista Afonso

O Massacre de Eldorado e o processo criminal que se seguiu representou também uma certa escola para os advogados populares. O Massacre de Pau d’Arco, quando aconteceu, a gente ficou muito atento àquilo que não deu certo no massacre de Eldorado dos Carajás, em que a gente poderia ter adotado uma estratégia um pouco diferente. É claro que temos que considerar o tempo, porque Eldorado foi em 1996 e Pau d'Arco em 2011. Tem muito tempo entre esses dois fatos. 2017.

 

Sarah

2017

 

José Batista Afonso

2017 desculpa. Em 2011 foi o assassinato do José Cláudio e da Maria. Então, nesse período houve muita mudança no processo penal, então, tem que levar em consideração isso. Mas, quando aconteceu o massacre de Pau d'Arco, eu cheguei lá também imediatamente após, a gente ficou atento a alguns aspectos.

 

Primeiro, a luta principal nossa tinha que ser, não podemos concordar que a investigação seja da polícia civil. Aí a luta número um tem que ser uma articulação, a estratégia número um tem que ser uma articulação muito pesada para a gente conseguir que a polícia federal entre no caso para fazer a investigação. Não estávamos discutindo naquele momento federalização, isso aí ia ser complicado e poderia ser mais na frente, mas no primeiro momento é investigação apenas. E aí a gente já tinha os precedentes, porque no caso da missionária de Dorothy Stang, a Polícia Federal colaborou também investigando, abriu inquérito próprio. E aí fomos então, nos articulamos com, me lembro, com o Conselho Nacional de Defesa dos Direitos Humanos, com o Ministério Público Federal, tinha à frente a doutora Débora Duprat, e aí conseguimos que o ministro da Justiça, à época, autorizasse a polícia federal para investigar o caso. Tivemos muita sorte que não veio só um delegado, ou não foi a polícia federal do local que foi autorizada a investigar, veio uma equipe da polícia federal de outro estado para cá, que veio delegado, investigador e perito, a equipe completa. Então isso foi fundamental. E a luta principal era individualização das condutas.

 

A gente já tinha o exemplo de Eldorado. Não conseguimos identificar as condutas. Individualizar as condutas, melhor dizendo. Não conseguimos individualizar as condutas. Então, nesse caso, temos que fazer uma batalha para tentar individualizar as condutas, porque eram um número menor de policiais, 29 policiais que participaram do massacre de Pau d’Arco, mas a gente sabia muito bem que, entre os 29, não foram todos eles que apertaram o gatilho, e nem todos eles estavam na cena do crime. Então, como identificar quem estava na cena do crime e individualizar as condutas? E isso foi extremamente importante, o trabalho da polícia federal foi excelente, o delegado muito bom, fez um excelente trabalho. E aí a investigação andou por um caminho tão, vamos dizer assim, acertado e foi fechando o quebra-cabeça de forma que... de forma que alguns dos responsáveis ficaram numa situação bastante delicada de negar a participação na autoria dos crimes. E aí a gente tem que contar também que havia, entre polícia militar e polícia civil, um desentendimento, porque a decisão e, inicialmente, a execução foi da polícia militar, e depois a polícia civil entrou na segunda parte, de certa forma, para ser incriminada também junto com os militares.

 

Então, com isso, a gente acabou conseguindo um feito inédito, que eu acho que nunca aconteceu, que eu tenho conhecimento em nenhum outro processo no Brasil, que foi a concordância em dois dos policiais em fazer a delação premiada. Então, isso acabou fechando o quebra-cabeça e individualizando as condutas. É claro que ainda poderia... talvez algum ou outro dentro dos 29, foram denunciados, salvo engano, 17, né, dos 29, um ou outro além dos 17 poderia ser incluído, mas as provas que conseguiu se reunir não foram suficientes para apresentar a denúncia do número maior, mas pelo menos a certeza que daqueles 17 eles estiveram realmente presentes na cena do crime e participaram diretamente das ações criminosas.

 

Então essa atuação na chacina de Pau d'Arco, no Massacre de Pau d’Arco, que ela teve esse... esse diferencial, inclusive agora quando ocorre aqui outros casos, a gente sempre tenta articular a participação da Polícia Federal, vou lembrar aqui um caso recente, a chacina lá de São Félix do Xingu, onde foram assassinados três, o Zé do Lago, a esposa dele e uma filha de 15 anos. Um ano e meio depois, a Polícia Civil do estado do Pará concluiu a investigação sem indiciamento de ninguém.

 

Então, erramos talvez lá atrás, a gente deveria ter exigido a participação da Polícia Federal desde o início, agora estamos na luta para tentar que a Polícia Federal assuma o caso. Então, vamos dizer assim, o caso do massacre de Pau d’Arco que ele traz algumas lições importantes para a gente, e diria que foi um processo de investigação bem sucedido. Agora, o que se vê depois é uma luta permanente. Julgamentos dos recursos, desaforamento, realização do Tribunal do Júri ai é uma luta permanente que continua.

 

Carol

Muito interessante,Batista, que você está trazendo, que na sua percepção, mais do que o próprio salto democrático do sistema de justiça em si, houve principalmente um acúmulo do aprendizado da luta da advocacia militante, né, da advocacia popular nesse processo, né, que vocês, o que vocês perceberam que deu errado, né, que não funcionou, ou que eram as estratégias para impunidade lá em Eldorado, vocês lutaram para que não se repetisse posteriormente, né. Muito interessante.

 

E você falou também… bastante de uma representação de classe do poder judiciário. Então queria entender assim, existe um conflito de interesse entre os juízes? Há um constrangimento entre os juízes da região e os poderosos considerando também que no processo de Eldorado dos Carajás ele passou na mão de oito juízes sendo que a maioria deles se considerou pediu esse afastamento e se considerou impedido. E aí também entender qual que é a diferença da postura do judiciário nesses processos particulares em que os réus são policiais ou agentes do Estado em comparação com a maior parte dos processos criminais no Brasil.

 

José Batista Afonso

Então a luta que se trava aqui nessa questão do campo não é uma luta apenas contra os responsáveis pelo crime. A luta que se trava é uma luta contra o próprio Estado, porque o Estado, aí o Estado que eu digo representado pelos três poderes, ele tem um lado, e na região aqui sempre foi muito claro, que esse lado é o lado dos grandes proprietários de terra, aqueles que concentram o poder econômico, e, em razão disso, exercem influências políticas muito fortes.

 

Então, isso... o judiciário, o Ministério Público, a polícia estão dentro desse enfrentamento, tem lado nessa história. Claro que não posso aqui generalizar todos os juízes, todos os promotores, não. Dentro da instituição também tem muita gente comprometida, muita gente que, vamos dizer assim, tem uma compreensão dessa questão da aplicação da lei, da luta pela justiça, da responsabilização dos responsáveis pelos crimes e de justiça social. Então, a gente não pode generalizar, mas é inegável que partes do poder judiciário, da polícia, do Ministério Público, a gente ao fazer o enfrentamento no processo contra aqueles que decidiram ou executaram as mortes, a gente está fazendo enfrentamento também com esses setores. Não é à toa que vocês já disseram aí no Massacre de Eldorado, vários juízes e juízas não quiseram atuar alegando razão de foro íntimo, é aquela razão que não tem que dar explicação para ninguém e chegou um momento em que todos os juízes criminais da capital se negaram a assumir o caso, depois da anulação do primeiro julgamento, que foi uma atuação escandalosa do juiz que presidiu aquele júri. Mas isso não aconteceu só em relação ao massacre de Eldorado, que estava no banco dos elos, a polícia militar do estado do Pará. Isso aconteceu em muitos outros casos em que a polícia não estava no banco dos réus. Vamos lembrar o caso do Expedito Ribeiro, em que também houve negativa de juízes da capital e presidiu o Tribunal do Júri. Não é nem presidir o processo, só presidir o Tribunal do Júri, porque os processos foram desaforados para a capital.

 

O caso do José Dutra da Costa, o Dezinho, também só na fase do Tribunal do Júri, que foi desaforado de Rondônia para Belém, quando foi julgado o mandante do crime, todos os promotores da capital se negaram a fazer a denúncia do mandante no tribunal do júri. O juiz que presidiu o processo, que ele aplicou para o pistoleiro a pena foi máxima de 30 anos, mas para o mandante do crime a pena foi mínima de 12 anos. que depois do julgamento ele foi flagrado, o juiz que presidiu o processo, foi flagrado numa escuta, em que ele negociava a venda de sentença, e em razão disso ele foi afastado, foi aposentado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará. Então assim, o judiciário sempre na sua atuação, ele sempre se manifestou majoritariamente de um lado.

 

Então, a luta contra... os responsáveis pelos crimes é a luta contra o próprio Estado, que está do lado daqueles que praticam os crimes, não só no sentido de distribuir as terras para esses setores, como garantir a sua permanência nessas terras, mesmo que de forma fraudulenta, e garantir que quando se pratica crimes, seja contra o meio ambiente, contra as pessoas, nesse enfrentamento, que eles sejam, de certa forma, de alguma forma, responsabilizados.

 

Então, de fato, é que se trava, em relação à luta pela terra, uma luta de classes. É uma luta de classes. E isso ficou muito claro, principalmente na atuação do MST na região. O MST de um lado e o latifúndio do outro. Porque o movimento sem terra é um movimento que sempre teve mais expressão, mais popularidade nas suas ações. Então, isso sempre foi muito claro.

 

Carol

Muito bom, muito obrigada, Batista. Seguindo, a gente queria entender também como que o MST, durante o processo e também diante da... de... de tudo isso que você está apontando, da atuação do Poder Judiciário, como que ele usou, taticamente, o processo para a divulgação da violência no campo da região?

 

José Batista Afonso

Então, o processo, ele sempre foi uma fase de enfrentamento, e esse enfrentamento não é só no sentido de livrar, tentar isentar de responsabilidade os responsáveis pelos crimes, como também, e com isso é conseguir a absolvição deles, mas também construir um discurso contrário aos movimentos sociais.

 

Então, o embate, por exemplo, nos tribunais do júri sempre foi marcado, o processo de Eldorado dos Carajás, isso foi muito claro, muito evidente, é a tentativa de criminalização da vítima. Então, aqui no Pará, por exemplo, todas as vezes que acontece um crime de uma liderança ou de um trabalhador em disputa pela posse da terra, em muitos casos, a iniciativa primeira da polícia é tentar responsabilizar a vítima, é tentar encontrar alguma coisa na vida dela que justificasse de alguma forma que alguém matou aquela pessoa por essa razão e não pelo conflito pela posse da terra.

 

Em inúmeros casos aqui, nós nos deparamos com essa estratégia, então, com isso se constrói um discurso da violência contra os trabalhadores que são assassinados e trabalhadoras e de criminalização. Isso está presente no caso do Expedito, no caso do João Canuto, no caso da missionária Dorothy Stang, no caso do José Cláudio e da Maria, e em muitos outros casos, sempre se buscou criminalizar as vítimas, para livrar os principais responsáveis pelos crimes. E esse embate sempre foi muito presente durante os processos e os julgamentos no sentido de deslegitimar as lutas, desmoralizar a atuação dos movimentos e enfraquecê-los nos seus enfrentamentos aqui no Estado. Isso não é diferente em outros estados do Brasil. Faz parte de uma estratégia do latifúndio, muitas vezes incorporada pelo Estado também, para poder, através do processo da criminalização, buscar isolar os movimentos sociais, promover o descrédito em relação às suas principais bandeiras de luta e isolá-los de alguma forma, mas ainda bem que isso não tem funcionado, os movimentos têm tratado isso como enfrentamento, como luta de classe, e um aspecto que precisa ser enfrentado também no curso das ações criminais.

 

Sarah

Muito bom. Eu vou fazer em bloco as duas últimas perguntas, viy Caro para a gente poder aproveitar esse finalzinho aqui do nosso tempo precioso. Ele falou alguma coisa.Heloisa, abre para nós.

 

José Batista Afonso

Se passar uns cinco minutos ou dez, as meninas esperam ali na escola.

 

Sarah

Então, depois dessa parte sobre as táticas, sobre a questão da criminalização, a gente queria que tu falasse sobre a questão da atuação dos institutos e da própria institucionalidade na região do Incra e do Iterpa, Eldorado foi vanguarda de conseguir abrir esses lugares na região que antes não existiam, essas institucionalidades, desculpa, o meu “goianês” não permite falar algumas palavras.

 

Então, como que tu vê a questão da regularização fundiária legalizada, da reforma agrária na região? Se houve alguma mudança desde a abertura, na época de Eldorado dos Carajás até hoje? E sobre como que você traduziria... tacando pra você agora responder a nossa pergunta de pesquisa sobre a impunidade na região. Quais seriam as razões desses casos de massacres nessa nova república do Brasil, olhando principalmente para o caso de Eldorado dos Carajás? Então, seriam essas duas perguntinhas sobre isso.

 

José Batista Afonso

Então, primeira parte da pergunta, depois se eu me alongar, vocês podem intervir e reforçar a segunda parte. Essa questão é da atuação dos órgãos de terras aqui no Estado. Aí eu diria assim que os órgãos de terras, o Iterpa e o Incra, sempre foram aparelhados pelo Estado para, vamos dizer assim, responder principalmente aos interesses do latifúndio.

 

Se hoje nós ainda temos problemas graves na atuação do Incra e na atuação do Interpa no Estado, imagina algumas décadas atrás. Então, esses órgãos... vamos pegar o Incra, por exemplo. Quando os militares precisavam de rapidez para distribuir as terras da região para os grandes grupos econômicos, que estavam se deslocando para o Sul, Sudeste do Pará, eles resolveram, então, intervir no Incra e criar o Getat, Grupo Executivo das Terras do Araguaia Tocantins, militarizar a questão da terra. E aí, é claro, através do Getat e da federalização das terras do Estado, através do Decreto 1164, perdoe se eu errei o número, mas é um decreto de início da década de 70, federalizou as terras a 100 quilômetros do lado esquerdo e direito das rodovias federais existentes e ser planejadas.

 

Então, só no estado do Pará, por exemplo, cerca de 70% das terras foram transferidas de domínio do estado para a União, simplesmente com a adição desse decreto. Isso abriu caminho para transferir milhões de hectares de terras da União para esses grandes grupos econômicos e pecuaristas, mas não se preocupou, em hipótese alguma, em regularizar ou fazer a distribuição das terras, a reforma agrária para os pequenos. Então, a atuação dos órgãos de terra sempre foi para favorecer o latifúndio em todos os sentidos, transferir milhões de hectares de terra para o domínio público, para o domínio privado, de forma muitas vezes totalmente escandalosa, e mais do que isso, criminosa. E isso sempre foi uma prática muito comum aqui no estado do Pará. E não é, por mais que o tempo tenha passado, não se mudou muito. O estado continua transferindo para o domínio privado, de forma, em muitos casos, ilegal, milhares de hectares de terra. E as novas leis de regularização fundiária, tanto federal quanto estadual, elas provam que o crime compensa. Ou seja, os grileiros invadem as terras públicas, desmatam ilegalmente, praticam trabalho escravo, praticam uma infinidade de crimes ambientais, na certeza de que o Estado vai regularizar essas áreas em seus nomes sem muita dificuldade.

 

Quando eu digo Estado, tanto o Estado do Pará quanto a União, então as leis de regularização fundiária existentes, tanto da União quanto do Estado do Pará, no sentido de garantir a transferência das terras para os grileiros, para os latifundiários, Llegalizar o crime, é dizer que o crime compensa, porque se o recorte temporal, por exemplo, quando foi criada a primeira lei do terra legal em 2004, esse recorte depois foi para 2008, 2017, só não foi para 2019, o governo Bolsonaro, porque a medida provisória que ele lançou foi derrubada. E já se fala… novamente mudar esse marco temporal para 2000 e, não sei, até 2020. Espero que isso não aconteça. Mas isso mostra que a distribuição das terras nesse país sempre foi marcada pelo interesse do capital. E aí o capital, tipo o sojeiro e outros, aqueles do agronegócio considerado moderno, eles não vão para essa frente primeira da invasão das terras. Aí é onde entra o grileiro, o madeireiro, o latifundiário considerado bota suja, para fazer enfrentar esse caminho mais difícil primeiro e depois abrir o espaço para a expansão do agronegócio, entre aspas, de forma mais legalizada. Então esse é um problema que nós nos debatemos com ele, porque os institutos de terras continuam tendo como prioridade a transferência de milhares de hectares de terra pública no Pará e na Amazônia para o domínio privado, e fazendo vista grossa para todo tipo de crime que se comete contra a natureza e as pessoas. Desculpa, agora eu peço sua ajuda para...

 

Sarah

Sim. Não, eu só queria fazer um comentário que na minha cidade, aqui no interior do Goiás, tem um... abriu praticamente ontem um... um açougue com carne bem mais barata que em outros lugares, porque o dono dela, que é o Alan Guimarães, que é um dos fazendeiros mais ricos, ele tem milhões de fazendas no Pará, com muito boi, é tudo terra de grilagem, e por isso que a carne é mais barata, sabe? Então, é gente fazendo dinheiro no país todo com isso. Essa é uma última pergunta.

 

A gente queria que você respondesse, traduzisse um pouco do que você acha que seriam as principais razões da impunidade nesses casos de massacre, olhando principalmente para o massacre de Eldorado do Carajás.

 

José Batista Afonso

Então, a impunidade é uma estratégia, é um componente da violência no campo e da concentração da terra. Sem a impunidade, imagino se houvesse punição pelos responsáveis, tanto pelos crimes contra as pessoas e também os crimes contra a natureza, contra o meio ambiente, certamente a distribuição das terras poderia ser feita de outra forma, com outros critérios. Então a impunidade é um componente desse modelo de concentração das terras nas mãos de poucos e de manutenção do poder do latifúndio. Então eles precisam, eles necessitam de que seus crimes sejam mantidos impunes.

 

Então, por isso, vamos batalhar de todas as formas para evitar que a responsabilidade pela prática criminosa contra o meio ambiente, contra as populações, contra as pessoas, não seja devidamente apurada quando os crimes ocorrem. Então, essa tem que ser uma... tem sido e tem que continuar sendo uma luta da sociedade, dos movimentos sociais organizados, das populações do campo, de enfrentamento a esses sistemas, que têm a impunidade como componente principal para garantir, vamos dizer assim, a dominação daqueles que controlam as terras. Então, isso tem que ser enfrentado, porque só no estado do Pará, por exemplo, de acordo com os registros feitos pela CPT, nas últimas quatro décadas, são aproximadamente uns mil camponeses que foram assassinados na luta, na disputa pela posse e permanência nas terras. É o Estado campeão de assassinatos de lideranças, são mais de uma centena de lideranças assassinadas também nas disputas pela posse e permanência na terra. É o Estado também com o maior número de chacinas e massacres no campo. E isso a gente tem que entender que está nesse contexto de expansão do capital em direção à Amazônia. Não é por acaso que o Estado do Pará é o campeão da violência no campo e das violações de direitos humanos no campo. É porque ele está nessa fronteira. É o Estado que tem sofrido essa ação, mais direto pelo seu tamanho, sua extensão geográfica, e por ter várias frentes de expansão do capital em diferentes regiões desse Estado.

 

Então, a violência é um componente que faz parte desse processo de expansão e, é claro, a impunidade é outro elemento essencial para esses setores. Então, fazer um enfrentamento com isso é uma necessidade das populações, dos movimentos sociais, de todas aquelas entidades de direitos humanos que fazem a defesa dos direitos dos camponeises, defesa da floresta nessa grande região da Amazônia.

 

Carol

Certo, Batista. Nossa, muito obrigada Batista. Essa era a nossa última pergunta para você e você foi certeiro nela.

 

É um privilégio para nós ter oportunidade de dialogar e te ouvir bastante também nessa manhã de hoje. Muito obrigada, tanto pela sua força na militância, na sua atuação, de toda a sua trajetória, quanto por contribuir do início ao fim, né, agora estamos chegando ao fim da nossa pesquisa. Obrigada mesmo.

 

José Batista Afonso

Agradeço pelo convite aqui, pelo... ah, desculpa.

 

Sarah

Não, pode falar primeiro.

 

José Batista Afonso

Não, eu que agradeço pelo convite aqui para essa conversa, né? Extremamente importante, fico contente de participar de alguma forma desse projeto de pesquisa. Já participei de outras reuniões com o coletivo para conversar sobre a metodologia de pesquisa e dando também as contribuições que a gente pode daqui da nossa região.

 

Considero um projeto extremamente importante e estamos aqui à disposição. e precisarem só acionar, a gente entende que essa é uma ação prioritária. Bom trabalho para vocês e continuamos no caminho.

 

Sarah

E é isso, prazer em conhecer.

 

Carol

Prazer.

 

José Batista Afonso

Um abraço e bom trabalho para vocês. Parabéns pela iniciativa. Muito obrigada,

 

Carol

Muito obrigada. A gente não vai te atrapalhar mais não.

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