No último fim de semana, nos dias 25 e 26 de março, a Comissão Pastoral da Terra na Bahia (CPT-BA) junto aos grupos de jovens acompanhados, organizações parceiras como o Levante Popular da Juventude, Centro Agroecológico do Semiárido (CASA), Sindicatos e a Juventude das Escolas Famílias Agrícolas, participaram de um encontro em parceria com a comunidade indígena de Serra do Padeiro.
(Texto e Imagens por Beni Carvalho, agente da CPT Bahia)
O encontro reuniu 120 jovens vindos do Centro Norte, Centro Oeste, Sul e Sudoeste da Bahia. O objetivo do encontro foi envolver as diversas propostas de formação que vem sendo realizado pela CPT Bahia através de uma troca de experiências e estudo com vista à empoderá-los para o fortalecimento da luta na defesa dos territórios e na luta pela terra.
A Serra do Padeiro é uma comunidade indígena Tupinambá que reside há séculos na região do Sul da Bahia, no município de Buerarema. A comunidade ficou conhecida nacionalmente pela sua história de bravura e resistência que provocou a prisão, em 2010, do Cacique Babau pela acusação de “invasão de terras”, porém com a pressão dos órgãos de direitos humanos e a resistência garantiram a soltura e a continuidade na luta que transformou Serra do Padeiro em uma das comunidades indígenas mais organizadas e fortes nacionalmente.
E foi de frente para a Serra do Padeiro, local que segundo os indígenas abrigam os encantados que protegem a comunidade, que iniciou logo cedo a chegada de diversos jovens ansiosos e cheios de expectativas para conhecerem as experiências de organização e lutas do grupo.
Relato de experiência
O encontro começou com um lindo momento de espiritualidade feito pelos indígenas através do Toré, que segundo eles é o momento anterior a qualquer atividade a ser realizado na comunidade. O ritual composto de muito canto, vibração e energia contagiou todos os jovens presentes. Foi o momento de boas-vindas.
Em seguida, foi realizada uma caminhada pela comunidade e pelas áreas de produção de cacau associada ao frescor da Mata Atlântica. Durante essa atividade, Célia, uma das lideranças da comunidade, trouxe o histórico da região, das lutas, e os valores que para eles são imprescindíveis para construção de uma nova sociedade. Para ela, o cuidado com o outro e com o meio ambiente é algo que eles não abrem mão. “Compreendendo as florestas, rios, animais como um corpo vivo do qual fazemos parte e por isso a necessidade de manter sua preservação para fortalecer a vida”, reforçou.
Sentados no chão de folhas secas e debaixo da sombra fresca dos cacaueiros e árvores nativas, todos presentes ouviam atentamente as experiências e humildade daquele povo guerreiro. Ainda na parte da manhã, no mesmo local, houve um debate sobre a conjuntura conduzido por Bruna, do Levante Popular da Juventude, que destacou as quatro grandes crises (econômica, política, social e ambiental) que estamos enfrentando no momento. Destacando a necessidade do nosso povo se unir e fortalecer a construção de muitas lutas com vista um projeto popular de sociedade.
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A caminhada se estendeu até à tarde, conhecendo diversas áreas de retomadas e de produção. No percurso, foram realizadas paradas para a apresentação das experiências de lutas, resistência e construção de alternativas populares ao sistema capitalista, como as lutas dos povos tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto do Oeste da Bahia, destacando a tentativa de criminalização de cinco trabalhadores da comunidade de Porteira de Santa Cruz, zona rural do município de Serra Dourada-BA.
Essas pessoas reivindicam a regularização de seu Território de Fecho de Pasto, conhecido na região como Larga, usado também por outras comunidades de Santana, Tabocas do Brejo Velho e Baianópolis, que foram presos no dia 07 de março de 2017 pela Polícia Militar da Bahia.
Na segunda parada, a região Centro Norte apresentou entre as experiências o curso de formação de lideranças, “Liderar”, enquanto espaço que vem contribuindo para a qualificação na luta de diversos trabalhadores da região.
O Levante Popular da Juventude apresentou também as escolas de formação que vem sendo realizadas nacionalmente, como as atividades “Semana Nós por Nós” enquanto tarefa de solidariedade construída entre a juventude nos bairros periféricos e pobres do Brasil; e a experiência dos Saraus enquanto espaço de cultura, poesia, lazer e política para formação da juventude.
Para encerrar o momento de troca da tarde, a juventude foi convidada a tomar um banho em um lindo rio como preparação para a noite cultural. Esta foi aberta com um Toré que fez todo mundo vibrar e suar ao redor de uma fogueira. A confraternização continuou até a madrugada com forró e músicas regionais.
Último dia de encontro
Todos já estavam de pé logo cedo com o olhar de expectativa para as próximas experiências e de tristeza por estar chegando ao fim. O Cacique Babau abriu o domingo com uma fala que trouxe muitos ensinamentos e aspectos da conjuntura. Para ele, a formação da juventude e envolvimento deles na continuidade da luta e organização é fundamental, pois “caso as lideranças que temos caiam em um momento de batalha, tenhamos quem nos substituir sem paralisar a luta”, e continuou, “o PT tirou mais de 20 milhões de pessoas da miséria absoluta, porém não organizou esse povo que nesse momento não consegue estar na rua para derrubar esse governo que está aí”, declarou Babau.
Logo após esse momento, todos os presentes foram conduzidos para conhecer uma das áreas simbólicas na luta de retomada para o povo Tupinambá. A luta e a resistência foram apresentadas por Teti, uma das lideranças da comunidade, com muita alegria e disposição que contagiaram os presentes. Na análise de Teti, a resistência que fizeram quando foram cercados pela Policia Federal em 2008, possibilitou uma vitória moral que conduziu logo após, diversas retomadas vitoriosas por parte da comunidade.
Retomando a sombra dos cacaus e do frescor da mata atlântica os presentes destacaram as experiências e elementos do “Bem Viver”. Cidinha da CPT Centro Norte, destacou que “a experiência de Serra do Padeiro é uma relação concreta de fraternidade e solidariedade em contra posição ao projeto do capital”.
Os jovens do CETA também falaram da importância da participação da juventude em todas as tarefas da comunidade como algo fundamental e a ser incorporado por todas organizações. Já Teti, liderança indígena, definiu o “Bem Viver” enquanto a perspectiva de falar a verdade sem temer, cultivando e trabalhando para uma vida de liberdade.
Para Gilmar da CPT, o trabalho permanente com todas as gerações, a partir do envolvimento e cultivo da cultura, é de extrema importância para a permanência viva das tradições. “A espiritualidade enquanto elemento que move, orienta e fortalece a luta dos povos da comunidade”, ressaltou.
Outros participantes destacaram a luta, resistência, organização e disposição da juventude indígena nos processos de retomada e fortalecimento da comunidade. E no encerramento do encontro, todos os participantes, mais uma vez, se jogaram nos belos rios que banham a comunidade e confraternizaram com alegria, disposição e compromisso em seguir na luta, construindo resistência nas ruas contra esse projeto de morte que ai está, e fortalecendo as experiências que possam se concretizar em contra posição ao projeto do capital.