"A Comunidade Quilombola dos povoados de Cruzeiro e Triângulo, em 2008, foi Certificada pela Fundação Cultural Palmares e, desde então, tornou-se vítima de diversos casos de hostilidade, incluindo racismo e outras formas de humilhações". Confira o documento na íntegra:
A comunidade sofre, há mais de sete anos, com atos de violência física e psicológica, promovidos pelos agentes ligados ao Estado e ao latifúndio, incluindo fazendeiros, capangas, vereadores, policiais civis e militares. A violência também se expressou por intermédio de uma decisão do Juízo local, que, de forma arbitrária, concedera, em 2009, liminar de reintegração de posse (despejo), a qual acirrou os conflitos e embates diretos. Atualmente, tramita na Justiça Federal nova ação possessória contra a comunidade quilombola solicitando mais despejos.
As práticas ostensivas de racismo e incitação à violência estão presentes nas instituições locais: dentro das escolas públicas (por alguns professores e diretores), no debate político promovido por parlamentares, em rádios, além de manifestações públicas que externam repúdio e incentivam a expulsão, aos gritos de “fora quilombola!”. A prática do crime de racismo, inclusive, já fora identificada como recorrente pelo Laudo Antropológico produzido pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), no âmbito do processo de regularização e titulação do território, tendo sido constatada, também, em depoimentos registrados por pesquisadores do NERA (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Questões Agrárias da Universidade Federal do Maranhão). Trata-se de uma situação insustentável! Pior ainda se pensarmos no risco de isso se propagar como prática rotineira no Estado do Maranhão, estado com maior número de comunidades quilombolas com procedimento para titulação de territórios quilombolas.
Segundo os quilombolas de Cruzeiro, estão se tornando comuns na região a promoção de ameaças do tipo “quilombolas tem que morrer”, que “estão passando da hora de morrer”, que vão “aparecer com a boca cheia de formigas”. Os membros da comunidade são acusados de ser um bando de “ladrão”, “vagabundos”, “invasores” e “assassinos”. A própria polícia local está sendo denunciada por se utilizar dessas calúnias e injúrias e respaldar a violência, o abuso de poder e o racismo promovido pelo grupo opositor aos quilombolas.
O barracão, localizado dentro do território quilombola, no qual eram realizadas reuniões e outras atividades, foi queimado quatro vezes, ao longo desses sete anos. O último incêndio ocorreu no mês passado, em fevereiro. Em várias ocasiões, casas e roças foram queimadas e destruídas, animais foram mortos e famílias foram impedidas de trabalhar em suas terras, o que afeta a subsistência delas. O clima é de absoluta tensão! Num ambiente como esse, houve um homicídio, no dia 16 de fevereiro do ano em curso, seguido por tentativas de linchamentos contra as famílias e lideranças quilombolas.
O conflito foi agravado pela morosidade do INCRA e a pelo modo como se deu a intervenção do órgão no processo de titulação. O Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) contém ilegalidades, sérios e graves erros formais e antropológicos. Entre estes, se destacam: a violação do conceito de terra ocupada por comunidade quilombola, a inobservância do critério de autodefinição étnica e da identificação das formas de resistências históricas à escravidão, o cerceamento do direito da comunidade de participar de todas as etapas de elaboração do RTID, o abuso de poder da equipe técnica, que desconsidera o teor e os consensos realizados no Laudo Antropológico para a delimitação do território tradicional. Essa intervenção desastrosa resultou, em 2015, numa redução, pela metade, da área a ser titulada como território quilombola! Com isso, passou a respaldar a ação de capangas ligados à dita “proprietária” Noele de Jesus Barros Gomes, filha de Manoel de Jesus Martins Gomes (Manoel de Gentil), denunciado como mandante do assassinato do quilombola Flaviano Pinto Neto, em 2010.
Diante desses gravíssimos e sucessivos conflitos, dramas e tragédias, estamos vindo a público solicitar à presidenta Dilma Rousseff e ao governador Flávio Dino, medidas urgentes e eficazes para a garantia da tranquilidade, segurança, integridade física, direito à identidade e à terra dos quilombolas.
Comissão Pastoral da Terra – Maranhão
Caritas Brasileira – Regional Maranhão
Conselho Indigenista Missionário – Maranhão
Pastoral da Criança – Maranhão