No segundo dia do II Encontro Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, os participantes debateram formas de organização social que se contraponham ao paradigma desenvolvimentista do capitalismo.
(Cristiane Passos - CPT / Fotos: Tiago Miotto e Guilherme Cavalli - CIMI).
Ruben Siqueira, da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), iniciou o debate retomando um documento do século XVI que traz o início da construção da sociedade brasileira, ainda a partir da perspectiva colonialista, em que outra potência europeia, a França, passa a disputar com os portugueses o domínio desse modelo social no país. Nenhuma alteração viria em relação à imposição de um modelo desenvolvimentista de sociedade, desconsiderando totalmente as experiências dos povos que aqui já viviam. A ideia de um plano desenvolvimentista para a sociedade brasileira já fixou raízes no início da sociedade colonial.
Até hoje este é o modelo que ainda tenta se impor, não só no Brasil, como no mundo. Com novas roupagens e fases, o desenvolvimentismo, o neodesenvolvimentismo ou mesmo, já dito hoje, o hiperneodesenvolvimentismo, tem a mesma base de raciocínio: o capitalismo precisa manter sua máquina e produzir em detrimento da capacidade do planeta, em detrimento de outras ideias de sociedade, de consumo e mesmo de produção.
“Não existe desenvolvimento bom. O capitalismo e sua ideia de desenvolvimento e exploração de recursos ambientais e humanos nunca vai ser bom, nunca vai ser verde, como eles tentam passar”, analisou Ruben.
O Bem Viver
Padre Paulo Suess, assessor teológico do CIMI, trouxe o Bem Viver como um modelo de sociedade que se contrapõe ao modo capitalista, priorizando os saberes dos povos originários. “Nós temos uma missão para converter essa sociedade. Temos o argumento de que somos o futuro, pois se a natureza, que nós defendemos, for destruída, isso vai atingir a todos e todas”, analisou.
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Para Paulo, dentro da perspectiva do Bem Viver e de uma sociedade mais equilibrada, devemos priorizar a sobriedade feliz ao invés da alegre irresponsabilidade (superficialidade). O Papa Francisco também desenvolve essa ideia em sua encíclica, a Laudato Sí, em que fala que não podemos separar a questão ecológica das questões sociais. A natureza é uma aliada fiel aos pobres, pois encontra-se junto aos pobres mais maltratados.
“A sobriedade é libertadora porque restabelece a nossa relação com o mundo. Precisamos nos converter ecologicamente, mudar nossas práticas pelo mundo. O desapego é essencial para a construção livre, não sejamos escravos das coisas, precisamos nos desapegar. O desapego desestabiliza o sistema, a redução do consumo desnecessário faz isso. Não significa simplesmente abrir mão, mas desprender-se, libertar-se, purificar-se. Recusar a práticas obsessivas de acumulação”, enfatizou Suess.
Para ele, a vida com mais simplicidade é possível, junto à natureza. “Precisamos construir um consenso mundial, bem característico dos povos indígenas, a partir desses paradigmas. Nós que temos o privilégio de saber, temos também o dever de agir”, finalizou.