Cerca de 12 mil pessoas participaram da 39º Romaria da Terra do Rio Grande do Sul, que aconteceu em São Gabriel, fronteira Oeste do estado, na última terça-feira (9). Antes da Romaria, mas dentro de sua programação, aconteceram o 10º Encontro do Povo Guarani e o 11º Acampamento da Juventude. Confira:
(Por Catiana de Medeiros, MST/Imagem: Leandro Molina)
“Este é um momento de reflexão, oração e agradecimento por tudo o que a terra nos dá. É onde viemos buscar novas forças e renovar nossa fé para seguir produzindo e trabalhando no campo, porque a luta pela vida e a terra é diária e eterna”, explicou a assentada da reforma agrária Adriana de Almeida, 39 anos, enquanto acompanhava romeiros e romeiras na caminhada da 39ª Romaria da Terra.
O evento aconteceu na última terça-feira (9), em São Gabriel, na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, região conhecida como o coração do latifúndio gaúcho, que tem em sua marca a monocultura de soja transgênica e o uso abusivo de agrotóxicos.
Mas São Gabriel também tem histórias de luta e resistência: é onde as forças da segurança do Estado mataram o Sem Terra Elton Brum da Silva, em 2009, durante reintegração de posse da Fazenda Southall. Hoje, o município conta com oito assentamentos e abriga 700 famílias Sem Terra que produzem arroz agroecológico e outros alimentos livres de venenos.
Foi em São Gabriel que também tombou o herói indígena Sepé Tiaraju e seus 1,5 mil companheiros que lutavam em defesa da terra, do seu povo e de uma vida pacífica em seu território. Esta edição da Romaria, organizada pela Comissão da Pastoral da Terra Regional Rio Grande do Sul (CPT-RS) com o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Diocese de Bagé e Conselho Indigenista Missionário (Cimi), provocou a reflexão sobre os 260 anos do martírio, completados no dia 7 de fevereiro.
Confira a Carta do 10º Encontro do Povo Guarani: “Essa terra tem dono”, foi Ñanderu que a revelou para nosso povo Documento final do 10º Encontro Sepé Tiaraju
Na caminhada, cerca de 12 mil trabalhadores do campo e da cidade fizeram suas orações e acompanharam o legado deixado por Sepé e os indígenas massacrados. Ela iniciou na Sanga da Bica, no Centro da cidade, onde o herói foi morto, e encerrou no Parque Tradicionalista Municipal. Durante o trajeto, ocorreram sete paradas em celebração às reduções jesuíticas: São Francisco de Borja, São Nicolau, São Miguel Arcanjo, São Lourenço Mártir, São João Batista, São Luiz Gonzaga e Santo Ângelo Custódio. Já no parque, romeiros e romeiras participaram de missa celebrada pelo bispo da Diocese de Bagé, Dom Gílio Felício.
Este ano a romaria teve como tema “Cuidar da Terra, Casa Comum”. Conforme Simonne Pegoraro, da coordenação da CPT-RS, além de lembrar o martírio de Sepé, o intuito foi refletir sobre a relação do homem com a terra e o meio ambiente diante da realidade de esgotamento, exploração e violência.
“Temos muito a aprender com os povos indígenas, quilombolas e camponeses, que têm em suas raízes o cuidado e a preservação da terra, e que não a vê como objeto de exploração, mas que se vê como parte dela”, argumentou Simonne.
Demarcação de terras indígenas
Integrando a programação da romaria, entre os dias 5 e 9 de fevereiro, para celebrar a luta de Sepé Tiaraju e discutir a questão indígena no Brasil, cerca de 700 índios Guarani do RS, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Argentina participaram do 10º Encontro do Povo Guarani.
Segundo o cacique Santiago Franco, da Aldeia Yuy Poty, localizada no município de Barra do Ribeiro (RS), o principal tema abordado foi a demarcação de terras no país, o qual corresponde hoje às mais importantes e urgentes bandeiras erguidas pelos indígenas.
“Nossa maior preocupação é com a demarcação do nosso território, que está paralisado por falta de atitude do governo. Nós vivemos com muitas dificuldades e queremos saúde, educação e que o governo reconheça nossa cultura e o direito que temos de viver como brasileiro e de termos liberdade”, disse Santiago.
Acampamento da Juventude
Ainda em comunhão às temáticas da Romaria da Terra, ocorreu de 7 a 9 de fevereiro, também em São Gabriel, o 11º Acampamento da Juventude. O Evento envolveu desde oficinas, com debates sobre questões de gênero, agroecologia, agitação e propaganda, entre outros temas, até atividades de integração dos jovens do campo e da cidade.
“A nossa juventude tem um vínculo com a terra, mas precisamos cuidar dela, da natureza, da nossa casa comum. E esse compromisso e responsabilidade não são apenas de quem está no campo, mas também dos jovens da cidade”, declarou Liciê Scolari, da coordenação do acampamento.
A juventude ainda acompanhou análise de conjuntura com o coordenador nacional do MST, João Pedro Stedile. Ele levou para o centro do debate as crises econômica, social, ambiental e política do país e motivou os jovens a continuarem a luta por uma sociedade mais justa e igualitária.
“Estamos semeando em terra fértil e tenho certeza que todos vocês vão se tornar militantes da classe trabalhadora, para que o povo, com consciência, possa seguir a luta por uma sociedade mais justa e igualitária, assim como fez Sepé Tiaraju. Precisamos continuar essa batalha e eliminar todo o tipo de opressão e exclusão”, apontou Stedile.