"Diante da Palavra de Deus, de sua promessa e de suas advertências, entendemos que neste momento histórico, somos desafiados a assumir uma responsabilidade critica e propositiva sobre as atividades mineradoras em nossa região e em nosso planeta", trecho da Carta da 4ª Romaria das Águas e da Terra da Bacia do Rio Doce.
Fonte: CEBs do Brasil | Imagem: Greenpeace
Guiados pelo tema: ‘Bacia do Rio Doce, nossa “Casa Comum”’ e o lema: ‘Vão-se os bens da Criação, ficam miséria e destruição! E agora José?’, a Diocese de Itabira/Cel. Fabriciano, com muita alegria e esperança realizou a 4ª Romaria das Águas e da Terra, em Itabira (MG), no dia 02 de junho, na Paróquia Nossa Senhora da Piedade.
A Romaria é promovida pela Província Eclesiástica de Mariana: Arquidiocese de Mariana, Diocese de Caratinga, Diocese de Governador Valadares e a Diocese de Itabira/Cel. Fabriciano. Foram convidadas a Diocese de Guanhães, Colatina, São Mateus e a Arquidiocese de Vitória, do estado do Espírito Santo.
Segundo Dom Marco Aurélio Gubiotti, Bispo de Itabira/Cel. Fabriciano, nossa Igreja quer ser uma voz profética e fazer ecoar uma forte denúncia do descaso para com a vida e a dignidade do ser humano. “Bem como à fauna e à flora, o desrespeito aos direitos dos atingidos e os graves danos causados ao meio ambiente”, afirmou. “Exigimos enquanto Igreja anunciadora e denunciadora a responsabilização dos criminosos e o devido reparo aos danos causados ao meio ambiente”, concluiu.
Participaram comunidades, pastorais, movimentos, serviços, sindicatos, associações, organismos, todas as forças vivas que compõem a Caminhada da nossa Província Eclesiástica e demais dioceses e arquidioceses.
Bacia do Rio Doce, Nossa Casa Comum
Vão-se os bens da criação, ficam miséria e destruição! E agora José?
Somos um povo peregrino, povo em romaria, em busca da terra prometida, construtor do reinado de Deus, que é um reino “de justiça, paz e alegria no Espírito Santo” (Romanos 14, 17). Por isso caminhamos na força de um sonho maior, solidário com todas as pessoas que têm “fome e sede de justiça”, a justiça do Reino, sempre por ser atingida e realizada. Trazemos nossa solidariedade com todas as vítimas dos acidentes/crimes socioambientais provocados pelas empresas mineradoras em nossa Minas Gerais e outras regiões deste planeta, anunciando-lhes uma boa notícia: “felizes os que choram”. Suas lágrimas fecundam toda criação, pois, “também a própria criação espera ser libertada da escravidão da corrupção, em vista da libertação que é a glória dos filhos de Deus” (Romanos 8, 21).
Caminhamos pelas terras sagradas de Itabira que contêm “noventa por cento de ferro nas calçadas e oitenta por cento de ferro nas almas”, como canta o poeta. Itabira é a síntese de nosso Estado, a terra mineira prometida por Deus ao seu povo de ontem e de hoje, conforme descrita, de forma minuciosa, na bíblia, em Deuteronômio 8,7-14; 8,19; 29,21-23. Neste texto sagrado Deus garante que o seu povo vai encontrar uma terra boa e com muita água. Terra boa para agricultura e até para a mineração. E Deus mesmo estabelece um limite para a sua exploração, mediante normas de conduta, que garantam o bem comum, protejam as pessoas e a natureza. Quando estas regras são descumpridas vem a maldição (29,21-23). “Olhe! Javé seu Deus vai introduzir você numa terra boa: terra cheia de ribeirões de água e de fontes profundas que jorram no vale e na montanha; terra de trigo e cevada, de vinhas, figueiras e romãzeiras, terra de oliveiras, de azeite e de mel; terra onde você comerá pão sem escassez, pois nela nada lhe faltará; terra cujas pedras são de ferro, e de cujas montanhas você extrairá o cobre. Quando você comer e ficar satisfeito, bendiga a Javé seu Deus pela boa terra que lhe deu. Contudo, preste atenção a si mesmo, para não se esquecer de Javé seu Deus e não deixar de cumprir seus mandamentos, normas e estatutos, que hoje eu ordeno a você”.
Diante da Palavra de Deus, de sua promessa e de suas advertências, entendemos que neste momento histórico, somos desafiados a assumir uma responsabilidade critica e propositiva sobre as atividades mineradoras em nossa região e em nosso planeta. Conscientes de que somos herdeiros das promessas divinas, e de que “O Senhor Deus é nossa força, ele nos dá pés ligeiros como os da gazela e nos faz caminhar nas alturas” (cf Habacuc 3,19), subimos ao Pico do Amor, no bairro Campestre e chegamos à Paróquia Nossa Senhora da Piedade trazendo os gritos de toda a população da Bacia do Rio Doce, nossa casa comum e os gritos da mãe terra, assumindo uma verdadeira “conversão ecológica”, como nos adverte o Papa Francisco: "As religiões têm um papel fundamental a desempenhar, pois para garantir um futuro sustentável corretamente, precisamos reconhecer nossos erros, pecados, faltas e falhas, o que leva a um sincero arrependimento e desejo de mudança. Desta forma, podemos nos reconciliar com os outros, com a criação e com o Criador". Somente assim, podemos “nos comprometer a promover e implementar um desenvolvimento sustentável, apoiados pelos nossos mais profundos valores religiosos e éticos, considerando que, o desenvolvimento humano não é apenas uma questão econômica ou dos especialistas: é uma vocação, um chamado que requer uma resposta livre e responsável de todos, que se desenvolvam em conjunto com a nossa irmã Terra e nunca contra ela".
Condenamos o atual modelo econômico devastador e destruidor, que é voraz, orientado apenas para o lucro: Vão-se os bens da criação, ficam miséria e destruição! Propomos uma mudança de paradigma em todas as nossas atividades econômicas, incluindo a mineração, pois somos responsáveis por entregar às gerações futuras um mundo melhor do que este que recebemos. Temos conhecimentos e condições suficientes para reorganizar a vida em sociedade para além do sistema extrativista, materialista, individualista e consumista, que quer a todos devorar.
Somos também solidários com a Igreja Pan Amazônica em seu Sínodo a se realizar em outubro, na busca de novos caminhos para a Igreja e por uma ecologia integral.
Itabira - MG, 2 de junho de 2019
Romeiros e romeiras da 4ª Romaria das Águas e da Terra da Bacia do Rio Doce