A ONG Global Witness divulga Informe Mundial sobre os riscos do impacto da COVID19 sobre a vida das comunidades rurais, povos tradicionais e organizações e movimentos sociais que lutam pelo direito à terra e em defesa do meio ambiente. Mesmo com a pandemia, os conflitos e ameaças contra lideranças populares e movimentos sociais ao redor do mundo tem aumentado. A ONG pede que tanto a sociedade quanto os governantes não tolerem esse tipo de ação e criminalização, e cobra que a distribuição justa da terra, o direito ancestral ao território e o meio ambiente saudável, serão elementos fundamentais para a recuperação do planeta pós-pandemia. Confira o documento:
(Global Witness)
O mundo como o conhecemos está mudando exponencialmente. O impacto da COVID-19 na saúde global e nos sistemas financeiros repercutirá por décadas. Dado que as vidas e os meios de subsistência continuam sendo a principal prioridade, muitas manifestações deste vírus continuarão a se reproduzir a curto, médio e longo prazo. Na Global Witness estamos empenhados em fazer parte do movimento em prol de um planeta, daqui para frente, mais resiliente. Isto inclui a defesa de ativistas ambientais e da terra. Os Estados e as empresas devem fazer o mesmo.
De fato, é do interesse deles fazê-lo. É do conhecimento público que o desmatamento e a perda de vida selvagem são dois dos principais contribuintes para o aumento de doenças infecciosas. Para evitar uma pandemia futura, os gestores governamentais precisarão ouvir os ambientalistas, líderes indígenas e ativistas comunitários que estão se posicionando para proteger a natureza. Os ativistas e militantes da linha de frente também podem ser a voz principal no combate às desigualdades que exacerbaram o impacto do vírus e na proposição de formas mais sustentáveis de se fazer negócios no futuro. Mas isso somente se eles estiverem seguros o suficiente para fazê-lo.
Ameaças aumentaram
Assim como para demais defensores dos direitos humanos, ameaças e ataques contra ativistas ambientais e da terra, e povos e comunidades tradicionais, não diminuíram neste período de crise da COVID-19. Na verdade eles parecem ter acelerado. Da Colômbia à Nigéria, da Indonésia às Filipinas e outros, a Global Witness e seus aliados receberam relatórios confiáveis de:
Defensores, lideranças e grupos sociais confinados em um local conhecido e subsequentemente alvejados, e às vezes até assassinados, por grupos armados estatais e não estatais.
Tribunais suspensos e audiências a portas fechadas, deixando defensores criminalizados trancados por longos períodos de tempo, com recurso legal limitado.
Limitações draconianas à liberdade de expressão, incluindo medidas de censura - que foram posteriormente aplicadas para prender aqueles que defendem suas terras ou direitos ambientais.
Governos que invocam a COVID-19 como motivo para encerrar protestos, mesmo em países sem presença registrada do vírus, ou onde os manifestantes observam as regras de distanciamento social.
Maior vigilância e intimidação dos defensores, sob o pretexto de poderes emergenciais.
Os povos indígenas estão na linha de frente da batalha para evitar a ruptura climática. No entanto, elas também estão desproporcionalmente vulneráveis à COVID-19 - com os governos negligenciando suas necessidades de cuidados de saúde e mineradores e madeireiros ilegais entrando em seus territórios sem precauções, trazendo a ameaça da doença para eles.
Com a maioria das ONGs e muitos movimentos sociais realizando suas atividades on-line durante a quarentena, os temores pela segurança digital – e pelo bem-estar psicológico – são enormes. Muitos defensores populares são forçados, relutantemente, a dar prioridade à luta diária de suas famílias pela sobrevivência, com empregos e meios de subsistência em risco, impedindo a sua capacidade de protesto e de organização.
Sem exceção, essas pessoas estão preocupadas em saber se os amplos poderes emergenciais implementados para conter e enfrentar esse vírus letal podem vir a ser usados abusivamente na repressão do ativismo, na redução das liberdades cívicas e no ataque aos que defendem seus direitos. As medidas de resposta da COVID-19 já estão sendo aplicadas de maneira diferenciada aos ativistas: ao mesmo tempo que os governos libertam prisioneiros para reduzir a propagação da pandemia nas prisões, os defensores detidos geralmente permanecem presos.
Os ativistas em situação de risco nem sempre recebem o apoio que deveriam. Governos, diplomatas, financiadores e empresas responsáveis devem demonstrar criatividade e empenho para encontrar formas de se envolver, dar apoio e proteção aos defensores ameaçados sem que propaguem o vírus.
Manutenção do status quo e medo do futuro
Enquanto os ativistas lutam contra essas novas restrições, algumas empresas respondem à relativa falta de controle social para avançar com operações controversas, pressionar por regulamentações mais flexíveis e requerimentos rápidos. Essa situação só vem a reforçar as principais causas dos riscos enfrentados pelos defensores. Os governos não devem defender o oportunismo em tempos de crise internacional e devem se comprometer a criar um estímulo econômico pós-COVID-19 sobre uma base sólida de direitos humanos e proteção ambiental.
Uma resposta sustentável, resiliente e justa à pandemia será aquela em que os direitos sejam mantidos e os que os defendem sejam ouvidos. No entanto, há sinais de alerta de que alguns podem estar seguindo o caminho oposto. Nos Estados Unidos, o governo federal recuou na aplicação das leis ambientais, assim como vários Estados simultaneamente criminalizaram o protesto ambiental.
A sociedade civil precisará estar atenta.
A sociedade civil está respondendo, mas será que os governos e as empresas também vão responder?
De forma inspiradora, mesmo sob pressão e com mais restrições, as organizações de direitos humanos, ambientais e populares de todo o mundo estão se reunindo para encontrar respostas criativas, bem como reunir e registrar dados. A Global Witness faz parte de um esforço da Coalizão de Defensores do Meio Ambiente e da Terra para monitorar sistematicamente os incidentes relacionados à COVID-19 e identificar tendências. As ONGs e movimentos sociais estão acompanhando as ameaças às liberdades civis e o impacto da COVID-19 sobre as populações indígenas, bem como respostas às crises dadas pelo empresariado e pela ONU.
Não apenas os direitos dos trabalhadores e o direito à assistência médica correm um risco enorme quando os ativistas não podem fazer a devida verificação porque estão enfrentando ameaças. Se queremos construir um planeta mais resiliente e justo depois que a crise passar, é essencial que os defensores do meio ambiente e da terra estejam mais protegidos. Esses defensores estão na linha de frente da luta contra o colapso climático e são a chave para uma recuperação econômica verde em todo o mundo - interrompendo os danos ao meio ambiente, que nos protege de doenças infecciosas, e enfrentando empresas irresponsáveis que buscam seus lucros a qualquer custo.
A longo prazo, é fundamental considerarmos como as empresas responsáveis podem operar de maneira a colocar as comunidades e defensores locais no centro da tomada de decisões, e não em risco. A Global Witness recentemente publicou orientações sobre como as empresas e os investidores podem fazer isso.
A curto prazo, governos e empresas devem:
Usar as comunicações públicas e privadas para enfatizar que o papel dos defensores do meio ambiente e da terra é mais importante do que nunca e que represálias contra eles não serão toleradas.
Dedicar recursos para identificar o aumento de riscos relacionados a represálias em investimentos, operações e cadeias de suprimentos, e tomar medidas para prevenir e mitigar quaisquer riscos identificados, bem como para apoiar defensores do meio ambiente e da terra em todo o mundo.
Usar canais seguros para garantir que as informações sobre o impacto ambiental ou nos direitos humanos de projetos comerciais em potencial, cheguem às pessoas afetadas, permitindo-lhes a oportunidade de se envolver na tomada de decisões de maneira segura.
Comprometer-se a colocar a terra e os direitos ambientais, e aqueles que os protegem, no centro de qualquer resposta à COVID-19.