COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Bispo emérito da cidade de Goiás e conselheiro permanente da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Dom Tomás Balduíno participou em Fortaleza, Ceará, do Simpósio "50 Anos do Concílio Vaticano II e 40 Anos da Teologia da Libertação – O que o Espírito diz às Igrejas?”. O evento, que se encerrou no último sábado, foi realizado pelo Movimento Formação Cristã Libertadora. Em entrevista a ADITAL, Dom Tomás falou sobre as mudanças na Igreja geradas pelo Concílio Vaticano II, enfatizou o importante papel dos leigos e leigas e contextualizou o cenário da América Latina.

(página Adital)

 

ADITAL – O Concílio Vaticano II foi o momento em que a Sagrada Escritura foi o foco central, voltou a ser o interesse central da Igreja e começa, sobretudo, a chegar às mãos do povo, nas mãos dos cristãos, dos leigos. Isso causou alguma mudança dentro da Igreja?

Dom Tomás Balduíno- Causou muitas mudanças. Eu falo do caso da América Latina em que havia já uma busca de contato com a bíblia, com a palavra de Deus nas comunidades, sobretudo, considerada em situação de inferioridade com relação aos crentes que lidavam muito bem com a bíblia. Então, entre nós, tivemos a grande chance de Carlos Mesters, do grupo dele, do CEBI, da leitura popular da bíblia. Isso foi como o ovo de Colombo e difundiu muito a bíblia entre nós.

 

ADITAL - A Igreja Povo de Deus despontou também quase que, se não em contradição, mas como novo valor do Concílio. A Igreja do lado hierárquico não acompanhou essa mudança. Como o senhor vê essa questão, sobretudo, pensando no futuro com tantos teólogos quase que afastados?

Dom Tomás Balduíno- A questão do Povo de Deus tornou-se uma proposta pra dentro da Igreja, que mexeu na estrutura, por isso, teve mais reação por parte da Cúria, eles não esperavam aquele esquema que colocasse o Povo de Deus antes da consideração sobre a Igreja hierárquica. E isso, então, com o Sínodo de 85 já programado por João Paulo II foi a bancarrota, acabou, foi supresso. Quer dizer, teoricamente, ou então curialmente supresso. Na realidade é a nossa força, é a força da nossa pastoral na América Latina, é o Povo de Deus com todas as consequências de participação, de contribuição, de presença, de contradição.

 

Adital - Sobre a situação da América Latina, hoje nós podemos dizer que há sinais claros de iniciativas concretas que apontam não só para um futuro, mas que mostram uma continuidade. Vendo esse passado, pensando nesses sinais e olhando o futuro, como é que o senhor avalia essa vivência desses setores de Igreja?

Dom Tomás Balduíno- Antes de falar desses sinais, que são sinais luminosos, eu queria mostrar a estratégia, utilizada, sobretudo, pelo Papa João Paulo II de abranger toda a estrutura da Igreja. Ele pegou desde a formação do seminário até a nomeação dos bispos. Passando também pelo direito canônico e pela repressão da Teologia da Libertação. Pegou também o colegiado, uma vez que a nomeação de bispos era de acordo com o sistema romano, então, o colegiado foi desaparecendo e reaparecendo as províncias eclesiásticas. Isso foi uma estratégia que perdura como peso até hoje em toda a diocese, em toda a Igreja no mundo inteiro. Há sinais claros, concretos de vida continuando com o Concílio Vaticano II, vivendo esse carisma na América Latina. Primeiro os frutos de Medelín, que são as organizações sociais camponesas, indígenas de mulheres que hoje existe. Vivemos as consequências queridas e planejadas por Medelín no sentido das comunidades, dos seus agentes sujeitos, autores e destinatários da sua própria caminhada. Isso está acontecendo mais em uns países do que em outros. Considero, por exemplo, Equador e Bolívia países onde isso é muito flagrante. Depois, dentro da própria Igreja o fortalecimento das CEBs, os encontros de CEBs é um apelo, o pessoal vem, é um grupo minoritário, mas muito representativo e significativo em todo o Brasil. Também as Pastorais Sociais como tem crescido, como tem se fortalecido agora em comunhão ou intercâmbio com as diversas organizações sociais populares. Depois os congressos, as organizações de lideranças de teologia, as jornadas mostram que a semente não foi destruída, a semente está produzindo frutos. É muito interessante, acho que se interliga no mundo inteiro com as diversas tentativas de romper essa estrutura monolítica da Igreja.

 

Adital - O que falta hoje para os leigos serem mais autônomos, tomarem as decisões? Esse Simpósio Teológico que estamos fazendo deveria ser multiplicado no sentido de dar aos leigos os meios pra se sentirem mais seguros nas suas posições e para tomarem mais iniciativas. O que falta para eles agirem?

Dom Tomás Balduíno- Há 20 anos ou mais que venho pensando e tentando passar adiante. Primeiro é que o futuro está na mão do laicado da Igreja, não da hierarquia. Bananeira que já deu cacho não presta mais. Tem sua função, mas a força da Igreja é o laicado. E o Concílio ascendeu um pouco timidamente sobre isso, mas o caminho para superar essas dependências, essas mil dependências da paróquia ou então do Bispo, uma linha de criar uma autonomia é a escola de teologia, a escola bíblica. É verdade que nós temos pastorais autônomas, temos uma pastoral autônoma, que é a Comissão Pastoral da Terra, que eu considero uma estrutura leiga, tem Bispo na direção porque foi pedido pela CNBB, mas o que vale ali é a presença do laicado. E quando isso é formado, quando tem base teológica e sabe ver o futuro, isso não só serve de defesa para a pessoa ou grupo, mas serve também de caminhada, de serviço ao mundo, um serviço necessário que não é só a hierarquia ou os missionários que vão fazer, mas leigos até com mais eficácia, com fermento na massa.

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