A CNA acabou de publicar um estudo Quem produz o que no campo: quanto e onde II, pelo qual pretende mostrar que a agricultura empresarial, o agronegócio que ela representa, é mais produtivo que a agricultura familiar. Para isso, com a participação da Fundação Getúlio Vargas (FGV), fez uma releitura dos dados do Censo Agropecuário de 2006, divulgados pelo IBGE no final do ano passado.
Com base em supostos “interesses nacionais”, na verdade explicitamente interesses do capital privado, as áreas indígenas continuam sendo invadidas no Brasil, desde 1.500, sob os aplausos daqueles que histericamente condenam as ocupações do MST.
Uma pesquisa encomendada pela CNA (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária) contesta o Censo Agropecuário de 2006, que aponta a agricultura familiar como responsável por 38% do valor bruto da produção de alimentos no país.
Os registros de trabalho escravo apresentam, em 2009, números inferiores aos de 2008.
Em 2009 registraram-se 240 ocorrências de trabalho escravo, envolvendo 6.231 trabalhadores, dos quais 4.283 foram libertados. Destes 108 eram menores. Em 2008, foram registradas 280 ocorrências, envolvendo 6.997 trabalhadores dos quais 5.286 foram libertados. Destes 86 eram menores.
O trabalho escravo, em 2009, foi identificado em 20 dos 27 estados. Importa ressaltar que em todos os estados das regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, menos o Distrito Federal.
O que chama a atenção, em 2009, é que na região Sudeste, onde se registrou o menor número de ocorrências, 21 (38 no Centro-Oeste, 43 no Nordeste; 112 no Norte e 26 no Sul) tenham estado envolvidos 1.605 trabalhadores, e o maior número de resgatados, 1.593. Nesta região, o Rio de Janeiro, com cinco ocorrências, teve o mais alto número de trabalhadores resgatados no ano, 715, seguido por Minas Gerais, 421, Pernambuco, 419, Espírito Santo, 387 e Tocantins, com 353.
Possivelmente este fato explique porque, em 2009, em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, duas usinas tenham falido e outra tenha sido desativada, a do grupo J. Pessoa, em plena época de expansão da cultura de cana-de-açúcar. A chave para entender “este paradoxo, talvez resida exatamente aí: incapaz de concorrer com a produção de cana em outras regiões do país onde a produtividade média da cana é significativamente superior à verificada em Campos, as usinas da região se valiam do trabalho escravo para assegurar competitividade e isto se fazia com a complacência da Delegacia Regional do Trabalho, apesar das inúmeras denúncias do Comitê pela Erradicação do Trabalho Escravo. Com a chegada a Campos, em 2009, de uma equipe do Ministério Publico do Trabalho que passou a fiscalizar de forma mais efetiva as práticas trabalhistas das usinas campistas, o resultado foi o que se viu.”.
Trabalho escravo na produção da cana-de-açúcar
Nas áreas geográficas de concentração já antiga ou de expansão recente da cana-de-açúcar se concentra o maior número de trabalhadores libertados, evolução visível desde 2007. O Norte continua dominando pela frequência da prática do trabalho escravo.
O crescimento do setor sucroalcooleiro e do agronegócio de grãos nos cerrados centrais, em regiões de nova fronteira agrícola, explica boa parte do crescimento numérico: metade dos libertados de 2009, como de 2008 e 2007 foram encontrados em número reduzido de fazendas de cana-de-açúcar: 14 em 2009, 20 em 2008, 7 em 2007. A região Norte, que sempre liderou o ranking em todas as categorias, ainda guarda a liderança pelo número de casos e de pessoas envolvidas, mas é superada pelo Sudeste e pelo Nordeste quanto ao número de libertados. O Norte está em 2009 como em 2008, no terceiro lugar pelo número de libertados (17,5%), após o Nordeste (21,8%) e o Sudeste (37,2%). A Amazônia legal concentrou, em 2009, 69% dos registros de trabalho escravo (como em 2008), 51% dos trabalhadores nele envolvidos (48% em 2008), e 29% dos resgatados (também menos que em 2008: 32%).
Melhorar a imagem
Em 2009, mais de 330 empreendimentos sucroalcooleiros aderiram ao Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar, iniciativa articulada pela Secretaria-Geral da Presidência da República junto a representantes de patrões - União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica) e Fórum Nacional Sucroenergético – e de empregados - Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo (Feraesp), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). O acordo é para “salvar” a imagem desgastada da exploração de trabalhadores, a maioria deles formada por migrantes nordestinos em busca de sustento no Centro-Sul.
Três das usinas que assinaram o Compromisso Nacional estão na “lista suja” do trabalho escravo. E desde quando o acordo foi assinado, não faltaram libertações de usinas “comprometidas” com o “aperfeiçoamento” das condições de trabalho nos canaviais. Em outubro de 2009, 55 pessoas foram encontradas em condições análogas à escravidão na Destilaria Araguaia (ex-Gameleira), do Grupo EQM (Eduardo Queiroz Monteiro). Outra unidade da Agrisul, do Grupo J. Pessoa, foi responsabilizada por um flagrante de escravidão envolvendo 122 pessoas, em Campos dos Goytacazes (RJ), em novembro de 2009.
A Cosan S/A, dona de 23 usinas - 21 no Estado de São Paulo e duas em construção: uma em Goiás e outra no Mato Grosso do Sul -, quatro refinarias e dois terminais portuários e ainda dos postos Esso de combustível e detentora das marcas de açúcar União e Da Barra, teve o nome inserido na atualização semestral da “lista suja” do trabalho escravo em 31 de dezembro de 2009 por conta de uma fiscalização que libertou 42 trabalhadores da Usina Junqueira, em Igarapava (SP), em 2007. A empresa recorreu à Justiça que suspendeu a inclusão do nome da lista. Mas, pouca gente soube que, em 2009, duas usinas da própria Cosan foram autuadas com graves irregularidades trabalhistas.
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A edição de Conflitos no Campo Brasil que está sendo lançada marca os 25 anos de registros ininterruptos dos conflitos em que estão envolvidos os trabalhadores e trabalhadoras do campo e da violência por eles sofrida. São números dramáticos que revelam o caráter extremamente conflituoso e violento do modelo agrário-agrícola em desenvolvimento no Brasil nesses últimos 25 anos (1985-2009) e que revelam a face oculta do tão decantando agronegócio.
2.709 famílias, em média, anualmente expulsas de suas terras!
63 pessoas, em média, anualmente assassinadas no campo brasileiro na luta por um pedaço de terra!
13.815 famílias, em média, anualmente despejadas pelo Poder Judiciário e cumpridas pelo poder Executivo por meio de suas polícias!
422 pessoas, em média, anualmente presas por lutar pela terra!
765 conflitos, em média, anualmente diretamente relacionados à luta pela terra!
92.290 famílias, em média, anualmente envolvidas em conflitos por terra!
A análise da evolução do número de conflitos, de assassinatos e expulsão de famílias e de pessoas presas e famílias despejadas, foi dividida em cinco períodos distintos que mostram as vicissitudes dos trabalhadores no campo brasileiro.
1º Período: entre 1985 e 1990 - Predomínio da violência do Poder Privado com destaque para o número de pessoas assassinadas.
2º Período: entre 1991 e 1995 - Retomada paulatina da ação dos movimentos sociais com o aumento de 38% na média anual de ocupações de terra em relação ao período anterior.
3º Período: entre 1996 e 2000 - Intensificação da mobilização em torno da luta pela terra: é o período de maior média anual de ocupações e de famílias envolvidas nessas ações. Há um significativo aumento da média anual de conflitos por terra (90%) e também da média anual de famílias envolvidas nesses conflitos (142%).
4º Período: entre 2001 e 2002 - Refluxo em todos os indicadores de conflitos de violência em relação ao período anterior, no rastro das medidas criminalizadoras dos movimentos sociais do governo FHC.
5º Período: entre 2003 e 2009 – É o período de maior conflitividade em toda a série histórica de 25 anos. É o período recordista na média anual de conflitos e o segundo na média anual de famílias envolvidas nesses conflitos, com níveis praticamente iguais aos do 1º período. É o segundo em relação à média anual de ocupações e de famílias envolvidas nas mesmas. Só perde para o período 1996-2000. Do lado do poder privado, o número de famílias expulsas atinge a maior média anual, e houve retomada dos assassinatos. Também nesse período se deu a maior média anual de famílias despejadas – 22.000 famílias por ano – e de 380 pessoas presas anualmente.
Distribuição dos conflitos pelas regiões geoeconômicas
A conflitividade relacionada à terra é um fenômeno generalizado. A distribuição dos conflitos por região geoeconômica aponta um equilíbrio: 35% se concentraram na Amazônia, 34% no Centro-Sul 34% e 31% no Nordeste. Já em relação ao número de famílias envolvidas, o Centro-Sul tem 39% do total, contra 33% da Amazônia e 28% no Nordeste.
Quando se analisam as Ocupações de Terra, a predominância dessa demanda está na região Centro-Sul com 47% do total de ocupações, contra 38% no Nordeste e somente 15% na Amazônia.
Já a Violência do Poder Privado se concentra mais na Amazônia, com 63% do total dos assassinatos entre 1985-2009, ficando o Centro-Sul e o Nordeste praticamente empatados com 19% e 18%, respectivamente. Também a Amazônia se destaca pelo número de famílias expulsas, com 39% do total do país, o Nordeste ocupa o segundo lugar com 33% e o Centro-Sul com 28% do total.
Também é na Amazônia que se concentra o maior número de pessoas presas em conflitos agrários (52% do total do país, contra 34% no Centro-Sul e somente 14% no Nordeste). Já em relação às famílias despejadas, a região Centro-Sul registrou 47% do total de famílias despejadas, contra 29% no Nordeste, e 24% na Amazônia.
Relacionando o número das diversas formas de violência com a população rural do estado tem-se um quadro que aponta a intensidade da violência no país, aparecendo o Mato Grosso em primeiro lugar, com um índice de 22,40, seguido pelo Mato Grosso do Sul,16,68; Roraima 14,65; e Pará 12,26.[1] Os dois primeiros colocados estão na liderança da expansão do agronegócio no país.
Os números registrados neste período revelam também que há uma correlação direta entre o avanço da mobilização democrática da sociedade brasileira e o avanço da violência do poder privado: o período pós-ditadura civil-militar (1985-1990) aí incluída a Constituinte e, segundo, o da eleição de Luis Inácio Lula da Silva. A diferença entre o período pós-ditadura civil-militar (1985-1990) e o que corresponde ao do governo Lula da Silva (2003-2009) é que, embora tenha aumentado a violência do poder privado em ambos, a violência do poder público também aumentou no período 2003-2009, sobretudo com o aumento do número de famílias despejadas, num evidente processo de criminalização dos cidadãos que lutam pelo direito à posse da terra de trabalho.
Quadro-Síntese da Violência no Campo Brasileiro 1985-2009
Fonte: LEMTO-UFF e GeoAgrária-UERJ com base nos dados da CPT.
[1] Estes índices foram elaborados relacionando o número de Conflitos, com a população rural do estado e são obtidos mediante a divisão da % que cada Unidade da Federação tem no total do número de conflitos no Brasil em todo o período, pela % de população rural de cada uma das Unidades da Federação. Assim, se uma determinada UF tem 10% do total dos conflitos no país na série histórica de 1985-2009 e têm 10% da população rural do país, seu índice será 1.0 (10 dividido por 10). Assim, sempre que uma UF tem índice menor que 1.0, ela está contribuindo menos que a sua proporção de população rural para a conflitividade geral do país. E, consequentemente, sempre que seu índice for maior que 1.0, significa que aquela UF está contribuindo mais do que sua proporção de população rural para o fenômeno sob análise. Para efeito de cálculo de população rural para todo o período de 1985-2009 foi utilizada a média ponderada da população rural dos Censos 1991 e 2000 e das contagens da FIBGE de 1996 e 2006. A mesma metodologia de cálculo foi utilizada para cada uma das variáveis.
Ministro da Justiça condena como covardes os mandantes de crimes contra trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil. Luiz Paulo Barreto recebeu ontem, 29 de abril, a Comissão Pastoral da Terra e representantes de outras organizações do campo, para a entrega dos 25 relatórios anuais publicados pela CPT desde 1985, o Conflitos no Campo Brasil, além de uma lista com os casos de assassinatos e julgamentos entre os anos de 1985 e 2009, e uma Nota Pública da entidade sobre os casos de agentes de pastoral perseguidos e ameaçados em todo o país.