COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

A partir de demandas dos estados de Roraima, Amapá e Rondônia, a CPT vem debatendo e acompanhando a destinação de terras públicas da União para finalidades que não cumprem a Constituição Federal, bem como os impactos dessas ações para os povos e comunidades do campo. A partir disso, Contag e CPT passaram a dialogar a questão da transferência e doação de terras de domínio federal para os referidos estados, sem a observância da correta destinação. Todo esse debate resultou na proposta de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), que foi protocolada no Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 15 de dezembro de 2021, sob o número ADI 7052. No dia 15 de março, a CPT entrou na ação como amicus curiae.

A preocupação de ambas organizações é que esse processo se dê de forma adversa, sem que sejam cumpridas as garantias constitucionais. A doação, conforme processos em andamento, afeta de maneira direta, terras em comunidades tradicionais, quilombolas, indígenas e mesmo áreas de assentamentos de trabalhadores e trabalhadoras rurais.

Para a CPT, a ADIN é de extrema relevância para preservar os direitos constitucionais dos povos campesinos e comunidades tradicionais que têm sido diretamente afetadas, em função do não cumprimento da destinação de terras públicas para materialização da função social da terra e preservação do meio ambiente equilibrado.

O que essa Ação significa para os povos do campo?

A ADI apresenta algumas propostas de medidas, como o pedido para que o STF conceda medida cautelar com base na Constituição Federal; manifestação do Presidente da República; manifestação das duas Casas do Congresso Nacional, que aprovaram as disposições questionadas; a intimação da Advocacia-Geral da União para que se manifeste sobre o mérito da demanda, nos termos da lei; diálogo com o Procurador-Geral da República; entre outras medidas.

Para a coordenadora nacional da CPT, Isolete Wichinieski, “É garantia constitucional os direitos dessas comunidades de usufruir e permanecer em seus territórios, com preservação de seus modos de vida. A ADI afirma, também, a importância de destinação das terras que são públicas para aqueles a quem é de direito, de acordo com a Constituição Federal”.

Em artigo publicado no portal da Contag, o desembargador aposentado do TRF-4, Manoel Lauro Volkmer de Castilho, explica o que significa essa ADIN. “Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade é uma ação judicial em que uma pessoa jurídica habilitada nos termos da Constituição pede uma declaração de que a lei ou ato normativo questionado contraria ou não a Constituição. Assim, a ação ou é procedente porque contraria a Constituição e o Tribunal então declara sua inconstitucionalidade, ou o Tribunal julga improcedente o pedido quando a lei é no mesmo sentido da Constituição dizendo então que ela é constitucional. Mas há casos em que a lei ou o ato normativo que se quer discutir pode permitir mais de uma interpretação seja porque a redação dela é ambígua, seja porque é incompleta, seja porque com o tempo os costumes ou práticas vão se modificando, ou enfim, porque de fato ela pode ter sentido indeterminado que é preciso acomodar diante dos princípios constitucionais. Nessas hipóteses, a jurisprudência do Tribunal tem admitido uma terceira posição. Isto é, tem admitido que a ação possa ser procedente mas sem declarar a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo questionado. Em outras palavras, o Tribunal diz que a lei vale, mas a ela se deve dar apenas a interpretação que seja compatível com a Constituição Federal. É o que se chama de interpretação conforme a Constituição, e constitui modalidade muito utilizada para esclarecer qual o sentido correto da lei em face da Constituição. E é assim porque o sentido da Constituição deve sempre prevalecer e então as leis inferiores só valem se estiverem conforme a Constituição”.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade pede, basicamente que: o Tribunal Supremo declare que a União só pode entregar: a) terras que não estão aplicadas a seus serviços e que por isso estão aptas à reforma agrária; b) que não se caracterizem como necessárias a proteção ambiental; c) e que não estejam ocupadas por indígenas, quilombolas ou populações tradicionais ainda que essa ocupação não esteja reconhecida oficialmente. Pede-se, também, que os estados, ao receberem as terras, respeitem essas mesmas circunstâncias protegidas na Constituição Federal.

Sendo assim, as organizações pedem ao STF que o Tribunal declare que as terras federais entregues aos estados devem ser aplicadas conforme a Constituição em processos de distribuição ou reforma agrária, de forma que garanta que essas finalidades sejam rigorosamente observadas e não sejam desviadas ou ignoradas pelos estados, dando acesso às terras públicas e à propriedade a quem não as detenha. Para Volkmer, “quando o Tribunal julgar a ação vai então afirmar que as leis referidas serão constitucionais somente se forem aplicadas em estrita obediência aos critérios constitucionais da reforma agrária, da função social da propriedade e da rigorosa atenção aos critérios legais de regularização das ocupações (já existentes) no mesmo sentido exigido para a reforma agrária”.

 

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