Crimes se inserem no contexto de disputa pela posse de terras pertencentes à União em área conhecida como Fazenda Navarro. Em agosto deste ano a CPT Regional Araguaia-Tocantins publicou nota denunciando o conflito que resultou na morte de um agricultor e em situação de violência contra 100 famílias do Acampamento Maria Bonita, Gleba Anajá, na zona rural do município de Palmeirante (TO), a 115 quilômetros de Araguaína.
Texto/imagem: Secom/MPF
A Justiça Federal no Tocantins recebeu, nesta sexta-feira (26), denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra 11 pessoas acusadas de invasão de terras da União na zona rural do município de Palmeirante (TO), ameaça a camponeses, além do homicídio de um trabalhador rural e tentativa de outro. O grupo liderado pelos irmãos pecuaristas Júlio Cezar Eduardo e Wanderley Eduardo da Silva, é apontado ainda como responsável pelos delitos de organização criminosa, falsidade ideológica, sequestro, disparo de arma de fogo, incêndio e dano.
Os crimes se inserem no contexto de disputa pela posse de terras pertencentes à União em área conhecida como Fazenda Navarro. Embora a Constituição determine que terras públicas, preferencialmente, sejam destinadas à reforma agrária, aquela propriedade nunca havia sido afetada para criação de um assentamento. Como forma de protesto contra a demora do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na regularização das terras, um grupo de camponeses decidiu criar o acampamento Maria Bonita no local. O MPF destaca que, conforme preconizado no Estatuto da Terra (Lei 4.504/1964), esses trabalhadores rurais são titulares do direito de acesso à propriedade da terra economicamente útil.
Conforme narra a denúncia, o surgimento do acampamento contrariou o interesse dos irmãos Júlio Cezar Eduardo e Wanderley Eduardo da Silva, que pretendiam tomar para si as terras, mediante a obtenção fraudulenta de título de propriedade da área. Nesse contexto de conflito fundiário, a Procuradoria da República no município de Araguaína (TO) passou a acompanhar a situação, tendo sido constatadas por nove vezes práticas de violência ou ameaça contra os trabalhadores, todas atribuídas a Júlio Cezar e Wanderley.
Milícia rural – A fim de fazerem impor sua vontade nos conflitos pela posse da terra, Júlio Cezar Eduardo e Wanderley Eduardo da Silva constituíram organização criminosa, na forma de milícia rural. Entre os integrantes, estavam o policial civil aposentado Jackson da Silva Oliveira, conhecido como “Polícia Agrária”, o policial militar José Pereira da Paixão, o “Cabo Paixão”, além de Ricardo Porfírio de Sousa (“Ricardinho”) e Aldaires Pereira de Araújo (o "Dairão"). Estes dois últimos, envolvidos diretamente no homicídio do camponês Getúlio Coutinho dos Santos, morto com dez tiros, e na tentativa de homicídio de Adreson Alves de Oliveira, além de participação no sequestro de Gilmar Marcos de Souza. Também fazem parte do grupo dois filhos de Júlio Cezar Eduardo: o médico veterinário Antônio Eduardo Neto, braço direito do pai, e o estudante Júlio Cezar Eduardo Filho, apontado como autor de fraudes no processo de regularização da Fazenda Navarro junto ao Incra.
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Falsidade ideológica – De acordo com a denúncia do MPF, os pecuaristas líderes da organização criminosa determinaram que Júlio Cezar Eduardo Filho inserisse, em 2012, declaração falsa em documento particular (formulário de declaração de aptidão à regularização fundiária) a fim de fraudar pedido de regularização fundiária apresentado à Superintendência do Incra no Tocantins, referente ao imóvel rural consistente no Lote 268, da Gleba Anajá (Fazenda Navarro), de modo que a propriedade do bem lhe fosse transferida.
Invasão – Em 6 de agosto deste ano, por ordem dos irmãos Júlio Cezar e Wanderley, “Dairão” e “Ricardinho”, além de outros dez integrantes da milícia rural, ainda não identificados, foram até o acampamento Maria Bonita para expulsar “a qualquer custo os trabalhadores rurais” da área. Na ocasião – além de matarem Getúlio Coutinho, terem deixado ferido Adreson Alves e sequestrado Gilmar Marcos – atearam fogo em cinco casas, fizeram disparos de armas de fogo e utilizaram um trator para demolir a ponte que dava acesso ao acampamento Maria Bonita.
Informações obtidas a partir dos dados telemáticos extraídos do aparelho celular de Júlio Cezar Eduardo, apreendido durante a Operação Terra Arrasada, da Polícia Federal, revelam a premeditação da ação criminosa promovida no acampamento – conversas entre integrantes do grupo criminoso mostram negociação dos envolvidos para adquirir a munição que seria usada.
Por fim, o MPF ressalta que os homicídios, tentado e consumado, foram cometidos mediante pagamento, pois os líderes da organização criminosa remuneravam os membros da milícia; por motivo torpe; valendo-se de recurso que dificultou a defesa das vítimas, em razão do grande número de jagunços (12 no total); e para assegurar a execução de outro crime, qual seja, o delito de invasão de terras da União.
Lista dos denunciados e crimes pelos quais são acusados
JÚLIO CEZAR EDUARDO
organização criminosa majorada
falsidade ideológica
invasão de terras da União
homicídio qualificado
homicídio tentado
sequestro
disparo de arma de fogo
incêndio majorado
dano qualificado
(todos em concurso material)
WANDERLEY EDUARDO DA SILVA
organização criminosa majorada
falsidade ideológica
invasão de terras da União
homicídio qualificado
homicídio tentado
sequestro
disparo de arma de fogo
incêndio majorado
dano qualificado
(todos em concurso material)
ALDAIRES PEREIRA DE ARAÚJO (conhecido como “Dairão”)
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
homicídio qualificado
homicídio tentado
sequestro
disparo de arma de fogo
incêndio majorado
dano qualificado
(todos em concurso material)
RICARDO PORFÍRIO DE SOUSA (conhecido como “Ricardinho”)
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
homicídio qualificado
homicídio tentado
sequestro
disparo de arma de fogo
incêndio majorado
dano qualificado
(todos em concurso material)
JOSÉ PEREIRA DA PAIXÃO (conhecido como “Cabo Paixão”)
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
(todos em concurso material)
VALDER VIEIRA CAMPOS (conhecido como “Valdir”)
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
(todos em concurso material)
JACKSON DA SILVA OLIVEIRA (conhecido como “Polícia Agrária”)
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
(todos em concurso material)
GILBERTO JOSÉ DOS SANTOS
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
(todos em concurso material)
GUSTAVO ADOLFO PEREIRA LIMA UBIDA
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
(todos em concurso material)
JÚLIO CEZAR EDUARDO FILHO
organização criminosa majorada
falsidade ideológica
(todos em concurso material)
ANTÔNIO EDUARDO NETO
organização criminosa majorada
invasão de terras da União
(todos em concurso material)